Caso Dreyfuss em Terrae Brasilis, por Jeová Barros Júnior

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Quando cursei Direito, lembro-me que, vez por outra, numa nota de rodapé, era mencionado o Affair Dreyfuss. Terminei o curso morrendo de curiosidade por conhecer o que tinha sido esse caso.

Muito tempo depois, há dois anos, mais ou menos, comprei um livro para conhecê-lo. É de uma riqueza espetacular! A arte não poderia ter imitado a vida. Se um dia eu pudesse formar uma grade curricular, instituiria uma cadeira, no curso do Direito, na qual, durante um semestre seria estudado esse caso e os desdobramentos dele. Ele é tão maravilhoso e nos ensina tanto, aos amantes do Direito (e, porque não?, do drama humano), que resolvi voltar a ler ele, há cerca de dois meses.

Esse caso, embora tenha ocorrido na França, possui uma ligação direta com o Brasil: é que o primeiro a denunciar ele foi Rui Barbosa, que na época se encontrava exilado em Londres, por causa da perseguição que havia sofrido do governo da República Militar (se não me engano, Floriano Peixoto). Ou seja, um perseguido se condoeu por um injustiçado.

Vamos ao caso? Dreyfuss era um oficial do exército francês que foi condenado, injustamente, por que, supostamente, teria vendido segredos das forças armadas da França para o inimigo alemão.


Isso ocorreu em 1893, sendo que, na década de 1870, a França tinha sido derrotada em uma guerra para a Alemanha, cuja conseqüência foi a perda dos territórios da Alsácia e Lorena. 

Essa ferida aberta permaneceu supurando, no orgulho francês, até a primeira guerra mundial (1918) e foi um dos motivos da segunda guerra (1940). O detalhe é que Dreyfuss só foi condenado porque era judeu, ou seja, foi um bode expiatório, para livrar a cara do verdadeiro culpado.

Para se ter uma ideia, esse caso quase ocasionou uma guerra civil na França, porque metade do país queria a condenação dele (os anti-dreyfusistas) e metade queria a punição desse “traidor” a qualquer custo.

Foi tão grave e causou tanto furor que Émile Zola, romancista francês consagrado, escreveu um artigo num jornal cujo título era “J’accuse”, ou seja, eu acuso, no qual acusou três generais, um ministro de guerra e vários oficiais por terem forjado a acusação e terem encoberto o verdadeiro culpado. Por causa desse artigo, ele foi condenado por calúnia e teve que fugir para Inglaterra para não ser preso.

Em 1899, quando a inocência de Dreyfuss foi comprovada, Zola foi reabilitado: ele que tinha posto a reputação, a fortuna e a própria vida em risco. Tanto é que, até hoje, suspeita-se que ele foi assassinado, pois morreu intoxicado com monóxido de carbono, porque a chaminé da casa dele foi entupida, durante a noite, isso em 1902.

Pois bem, por que me remeto a ele? É que penso que temos o nosso caso Dreyfuss. Depois de oito anos lendo e acompanhando o caso “Mensalão”, para mim, o que houve, na verdade, foi “Caixa 2”, que é crime, mas crime eleitoral. Posso estar errado, porque não sou dono da verdade, mas não posso deixar de expressar aquilo que penso aos mais próximos a mim (colegas, amigos e parentes). Daqui 10, 15 anos, esse caso vai ser estudado e, penso, a história fará jus a verdade dos fatos, restabelecendo a verdade.

O PT cometeu ilegalidade? Cometeu! Mas os autores dessa ilegalidade não podem ser punidos por outra coisa, como se eles tivessem desviado dinheiro público para a compra de apoio político no Congresso.

Quem afirma que houve mensalão e compra de apoio político, desconhece por completo a política, e como a barganha nela é feita, porque tal tipo de apoio não é obtido através de um pagamento mensal, como está na denúncia, mas através de liberação de verbas, aprovação de obras, nomeação em cargos, etc. Pergunto, por exemplo: se houve mensalão, por que nenhum senador esteve envolvido? Só os deputados eram venais?

Querer se punir os supostos mensaleiros por um fato (“Mensalão”), quando o crime foi outro (“Caixa 2”), é o mesmo que alguém furtar a sua carteira e ser punido por estupro. Isso, de forma alguma, é justiça.

Por isso que me bato e sempre repito que o processo “Mensalão” é uma farsa e o julgamento é político; para mim, isso não é Justiça! Pode ter qualquer outro nome, mas não pode ser Justiça. Vou seguir repetindo esse mantra, mesmo que eu esteja sendo quixotesco. 

E encerro com a letra de uma música de Engenheiros do Hawaii:

“Tudo bem até pode ser que os dragões sejam moinhos de vento; 
Tudo bem, ao seu dispor, se for por amor às causas perdidas…
Por amor, às causas perdidas…”

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

9 Comentários

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  1. O mensalão e a justiça

    O mensalão e a justiça brasileira.

    O grande mérito da AP 470 foi o desnudamento da justiça brasileira. Deixou às claras sua forma de atuação. Nada de neutralidade, técnica, respeito aos autos, a letra da lei e ao devido processo. Somente a vontade do juiz. Política pura. Partidária, inclusive. Maquiavel na veia.

    Não era assim antes da AP 470. Afinal, foi com base na autonomia do judiciário que GM concedeu dois HC “cangurus” para libertar Daniel Dantas e outro para Roger Abdelmassih fugir do Brasil. Foi o respeito a um dos mais caros princípios jurídicos, a presunção da inocência, que fez Marco Aurelio libertar Cacciola (seu vizinho no Rio) para ele visitar o principado de Mônaco.

    Na AP 470 JB prendeu o passaporte de Dirceu para ele não ir ao enterro de Chavez.

    Depois da AP 470 passou a valer a pressão da mídia, ops, “das ruas”. Os valores mais caros da justiça dissiparam-se. Imparcialidade, autonomia e técnica, dão lugar aos “anseios da sociedade”, a “subjetividade das leis”, ao “contexto que envolve as provas dos autos”. O que era técnica virou política. Simples assim.

    E isso prova duas coisas.

    Primeiro, que nunca existiu esse poder judiciário soberano pairando sobre os demais e imune as “mazelas” políticas. Um poder que seria comandado por senhores de toga preta, sóbrios, sábios e zelosos guardiães dos princípios e regras que garantem a realização da verdadeira justiça.

    Revela-se um poder tão POLÍTICO quanto os demais, com seus vícios e virtudes. Não é técnico, não é autônomo, não é imparcial. Nunca foi. É uma instituição social como qualquer outra.

    Um segredo guardado a sete chaves pelo conservadorismo brasileiro. Ao perder o poder executivo obrigam-se a revelá-lo. Pressionando-o politicamente, quando diziam ser completamente imune a isso.

    Por fim, a AP 470 também mostrou àqueles que clamavam por uma justiça mais sensível aos problemas sociais, o quão perigosa pode ser.

    Mostrou ainda àqueles que criticavam sua morosidade e seus infinitos recursos, o quão importante eles são, especialmente quando se encarna o calvário dos réus.

  2. O induzido é um só: Dirceu

    O induzido é um só: Dirceu estaria sendo condenado para livrar o verdadeiro culpado: Lula. Como alguém pode acredita que um semianalfabeto seria capaz de pensar coisas tão bem engendradas?

  3. j’accuse

    o livro é sensacional, imoerdivel.

     

    especialmente o sub-titulo que lembra muito o momento atual em que textos vao desmontando o “tribunal”, dos quais o nassif nos brinda com varios deles: 

     

    A VERDADE SE POS EM MARCHA E NADA PODERA DETÊ-LA

  4. Excelente artigo. Desnuda  a

    Excelente artigo. Desnuda  a verdadeira face da direita brasileira: manipuladora, agressiva, imoral, desonesta, defensora dos métodos fascistas de ação e, no caso, julgamento. O interessante seria saber quem, quem indicou a Lula o nome de tais juízes aliados da extrema-direita brasileira, pois este não conhecia pessoalmente nenhum deles. Os que indicaram ao presidente tais nomes é que são os verdadeiros traidores, adeptos da desestabilização de um governo democrático  voltado para os interesses da maioria da população. Os julgadores se comportaram neste caso movidos apenas por ódio e preconceito ideológico, assim como o fizeram os aristocráticos militares franceses no caso Dreyfuss, uma lição histórica de manipulação de um processo judiccial. Manipulação que os fascistas e nazistas copiariam mais tarde. E, infelizmente, agora também os brasileiros.

  5. paródias

    Pega leve, Nassif.

    Caso Dreyfuss?!

    A que ponto nós chegamos…

    Que seja. Vamos à paródia.

    Roberto Esterhazy Jefferson…

    Malgrado a ascendência judia, Fux : antissemita convicto…

    Ilha do Diabo: prisão domiciliar…

    Émile Nassif: “Mon devoir est de parler, je ne veux pas être complice.”

    (E onde fica aquela assumida “partialité” capileana?)

    “O PT cometeu ilegalidade?”

    Crime?! Ilegalidade?!

    Sejamos mais elegantes. Digamos que o PT cometeu um ligeiro deslize: “excesso de pragmatismo”. 

  6. Os judeus cometeram e cometem

    Os judeus cometeram e cometem milhoes de injustiças ai pegam algo isolado, que tenho dúvidas que aconteceu desta maneira (por exemplo, será que o enviesamento se deu pelo simples fato do Dreyfuss, ser judeu? ou apenas uma paranóia coletiva naquele momento) para reforçarem que são as “vítimas” de um mundo cruel.

    Não conheço nenhum judeu pobre e/ou perseguido. O judeu mais pobre que conheci fez licenciatura em matemática na USP e morava em higienópolis. O que sei é que os judeus são donos de boa parte da imprensa, dos bancos (do Brasil e do mundo), de Hollywood, da indústria de armas, dos paraísos fiscais, etc, etc.

    O que sei é que hoje os judeus (do mundo inteiro) banca israel, que mata, estupra e humilha diariamete palestinos e árabes. 

    Aí vem com este caozinho de associar o escândalo do”mensalão”ao “caso” Dreyfuss”. Menos galera. Uma coisa nada tem a ver com outra. Somos petistas, fazemos política, com erros e acertos, trata-se de uma disputa de classe. O que a “justiça” está fazendo aqui, faz no mundo inteiro, o seja, trabalha para os mais ricos e mais fortes, como sempre fizeram, nem precisa citar exemplos, fomos apenas vítimas de uma disputa política suja, mas não somos “coitadinhos” como os judeus, por favor.

    E vamos superar tudo isso, mesmo assm, não vamos fazer, do ponto de vista metafórico, o que os “coitadinhos” e “perseguidos” judeus fazem em israel.

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