“Tarifaço” dos combustíveis e incertezas agravam cenários futuros para economia, por Lauro Veiga Filho

A inflação atingiu 1,01%, na taxa mais elevada para o mês desde 2015 (quando havia alcançado 1,22%)

Fabio Rodrigues Pozzebom – Agência Brasil

“Tarifaço” dos combustíveis e incertezas agravam cenários futuros para economia

por Lauro Veiga Filho

O “tarifaço” decretado na quinta-feira,10, pela Petrobrás deverá fazer com que as taxas de inflação continuem a subir ao longo das próximas semanas, sob impacto direto do salto nos preços da gasolina, do diesel e do gás de cozinha. Mas a escalada dos preços, que pode não ter sido encerrada agora e nem deverá ser “compensada” pelo pacote “pró-poluição” aprovado pelo Congresso na semana que passou, deverá gerar igualmente efeitos secundários sobre os índices inflacionários, ao provocar aumentos de preços em cadeia, encarecendo os custos de transporte de bens e mercadorias em toda a economia, nos casos do diesel e da gasolina.

A alta do botijão de gás tende a ser parcialmente compensada pelo chamado “auxílio-gás” destinado a famílias de renda mais baixa, mas ajudará a reduzir o poder de consumo de famílias de renda baixa-média e média. Tudo somado – e já contabilizando um novo aperto na política de juros –, as perspectivas para a atividade econômica tornam-se ainda mais incertas, com agravamento do clima de insegurança entre empresas, classe média e trabalhadores em geral.

Antes mesmo de capturar os aumentos mais recentes da Petrobrás, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de fevereiro, medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) entre os dias 29 de janeiro e 25 do mês passado, veio acima das projeções do mercado, que trabalhava com alguma coisa em torno de 0,95% para a inflação do segundo mês do ano (a equipe do Itaú BBA, mais otimista, acreditava num IPCA de 0,90% para fevereiro). A inflação atingiu 1,01%, na taxa mais elevada para o mês desde 2015 (quando havia alcançado 1,22%) e acumula índices acima de 10% em 12 meses pelo quinto mês consecutivo, chegando a 10,54% no mês passado.

Na projeção do banco, o IPCA tenderá a atingir 0,94% neste mês e 0,88% em abril, antecipando-se deflação (inflação negativa ou queda nos preços médios) de 0,31% para maio, o que seria um alento caso a previsão venha a ser referendada pela realidade. O Itaú BBA acredita que a possibilidade de recuo do IPCA em maio estaria relacionada à volta da bandeira amarela para tarifa de energia, mais baixa do que a bandeira tarifária de escassez hídrica agora em vigor. A incerteza está justamente na dificuldade de prever quais serão os rumos da guerra na Ucrânia e saber a duração dos reflexos do conflito sobre a economia global e sobre os preços das commodities, notadamente nos casos do petróleo, seus derivados e do gás natural.

Pressões antes do “tarifaço”

As taxas vinham subindo antes mesmo do “tarifaço” deflagrado na quinta-feira passada, como mostra o acompanhamento feito semanalmente pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). O Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S) havia recuado de 0,49% nos 30 dias finalizados em 7 de fevereiro para 0,28% no fechamento de fevereiro, especialmente por conta do relativo alívio trazido pelos preços dos combustíveis e da energia. Mas voltaram a subir para 0,47% nas quatro semanas encerradas em 7 de março, três dias antes do anúncio do “tarifaço”. A maior contribuição para a alta veio do setor de alimentos, onde a inflação passou de 0,18% na primeira semana de fevereiro para 0,46% na primeira de março, com alta de 13,71% para o grupo hortaliças e legumes. Destaques negativos para cenoura e batata inglesa, com saltos de 53,72% e 18,46%, respectivamente.

De volta ao IPCA do IBGE, o estrago esperado na área dos combustíveis pode ser avaliado com base no comportamento do índice entre as quatro semanas encerradas em 11 de fevereiro e a taxa registrada para todo o mês passado. Excluídos gasolina, etanol, diesel e o botijão de gás, o IPCA pouco sofreria alteração em relação aos 0,99% registrados efetivamente com a inclusão de todos os grupos e subgrupos acompanhados pela instituição no IPCA observado até meados de fevereiro.

Mas, desconsiderados os mesmos itens, teria se aproximado de 1,1%. A diferença é que os preços da gasolina passaram a registrar queda de 0,47%, com baixa de 5,04% para o etanol e recuo de 0,27% para o botijão, mais do que compensando o aumento de 1,65% registrado pelo diesel. Obviamente, as tendências de baixa ou de menor variação (caso do diesel, que vinha subindo 3,78% até 11 de fevereiro) não deverão prevalecer daqui em diante, como bem mostra a atitude dos postos já na quinta-feira, reajustando para o alto seus preços antes mesmo de combustíveis com preços “novos” terem entrado em seus tanques.

O etanol entrou na conta, muito embora, como sabido e conhecido, seus preços não sejam ditados diretamente pela Petrobrás. O problema é que a gasolina é concorrente direta do etanol e as altas de um lado estimulam aumentos no outro (o que nem sempre ocorre quando um dos preços cai). Adicionalmente, as usinas de cana atravessam um período de transição entre o final da safra 2020/21 e o começo da seguinte, 2021/22, o que tende a gerar algum estresse nos preços até que a nova safra comece a entrar no mercado em volumes mais substanciais.

Na leitura das economistas Julia Passabom e Luciana Rabelo, do Itaú BBA, o IPCA de fevereiro “continuou apresentando índice de difusão elevado (de 73,2% em janeiro para 74,8% no dado de hoje) e núcleos subjacentes pressionados. No acumulado dos últimos 12 meses, observamos inflação em serviços ainda pressionada com efeito da inércia e inflação de bens acima do patamar observado nos últimos anos e sem sinais de desaceleração”.

Se o “índice de difusão” (que mede o percentual de produtos em alta no período) manteve-se elevado, os chamados núcleos do IPCA, indicadores que excluem preços mais voláteis ou sujeitos a oscilações mais expressivas entre um mês e outro, atingiram a maior taxa média em pelo menos 13 meses, atingindo 0,99% em fevereiro, frente a 0,87% em janeiro. Em 12 meses, os núcleos passaram a subir 8,38% frente a 7,86% em janeiro (e 3,22% nos 12 meses encerados em fevereiro do ano passado).

Lauro Veiga Filho – Jornalista, foi secretário de redação do Diário Comércio & Indústria, editor de economia da Visão, repórter da Folha de S.Paulo em Brasília, chefiou o escritório da Gazeta Mercantil em Goiânia e colabora com o jornal Valor Econômico.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN

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