A Polícia Civil da Bahia revelou, nesta quinta-feira (16), que a líder quilombola Bernadete Pacífico, mais conhecida como Mãe Bernadete, foi morta a mando de Marílio dos Santos e Ydney Carlos dos Santos de Jesus, ambos líderes do tráfico de drogas na região do Quilombo Pitanga dos Palmares, em Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador.
Já o Ministério Público da Bahia 9MP-BA) informou que seis pessoas foram indiciadas pelo crime que vitimou a ialorixá. Cinco denunciados, entre eles chefes do tráfico, devem responder por homicídio e o sexto participante será indiciado por posse ilegal de arma de fogo.
De acordo com a investigação, a execução da líder quilombola foi motivada pela insatisfação de Sérgio Ferreira de Jesus, de 45 anos, que era vizinho da Mãe Bernadete e foi reprimido por ela por explorar, ilegalmente, madeira.
Mãe Bernadete também teve uma briga com Ydney Jesus, mais conhecido como Café. O traficante é dono de uma barraca de comida, onde eram realizadas festas para vender drogas no quilombo. A ialorixá se opôs a esta situação.
Ligações
Insatisfeito com os posicionamentos de Bernadete, Sérgio de Jesus, o vizinho, enviou áudios para um parente de Josevan Dionísio dos Santos, que em seguida fez com que as mensagens chegassem a Marílio dos Santos, também conhecido como Maquinista, e Café.
“Alisson, fiquei sabendo aqui dentro do quilombo que Bernadete falou que no dia da festa vai cercar tudo de polícia, vai pegar todo mundo aí. Ela tá mandando um carro preto aí cheio de polícia para tirar fotos das barracas. Tudo é policial civil, diz que vai pegar vocês tudo de surpresa. Ela disse que vai dar risada quando todo mundo estiver na cadeia. Você fique ligado aí, ó. Avisa ao Café que ela que está mandando os policiais aí. Fique ligado nos carros pretos, que é polícia, e vai pegar vocês tudo na moita” (sic), diz Sérgio no áudio.
A partir desta mensagem, os traficantes ordenaram a morte de Mãe Bernadete. Josevan Dionísio dos Santos e Arielson da Conceição Santos assassinaram a líder quilombola com 25 tiros, a partir das orientações de Sérgio de Jesus, que indicou o melhor caminho para que a dupla chegasse ao local do crime.
Mais orientações
Após a execução de Mãe Bernadete, Sérgio de Jesus entrou novamente em contato com os traficantes, mas desta vez para pedir que os assassinos dessem fim aos celulares.
“O celular que você levou aí, tira a bateria, enterra o celular que está com o rastreador da (Polícia) Federal. Esconde bem escondido, arranca o chip e desliga o celular. Enterra essa peste, viu, que já está com rastreador um aí que você levou. O dela está com o rastreador”, recomenda.
Arielson Santos, preso desde 1º de setembro, e Josevan dos Santos, foragidos, foram indiciados como executores do crime. Maquinista e Café são os mandantes. Sérgio de Jesus responderá por incitar o assassinato. Já Carlos ‘Gyodai’ foi preso por guardar as armas do crime e ter dado fuga a Arielson da Conceição Santos.
Entenda o caso
Líder da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq), Bernadete Pacífico foi assassinada a tiros no terreiro que comandava com 25 tiros, 12 deles na cabeça.
Além da Conaq, ela estava à frente do Quilombo Pitanga dos Palmares e era mãe de Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, mais conhecido como Binho, também assassinado há seis anos.
Bernadete estava sob proteção da Polícia Militar, por meio da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos da Bahia (SJDH), há mais de dois anos. No entanto, segundo o advogado, a “proteção” se resumia a rondas “simbólicas” no entorno de onde ela morava, uma vez que uma viatura a visitava uma vez por dia, em geral, no fim da tarde.
O quilombo Pitanga dos Palmares, que era liderado por Bernadete, tem cerca de 290 famílias que habitam uma área de 854 hectares. Lá, 120 agricultores produzem diversos produtos, como farinha para vatapá, além de frutas e verduras como abacaxi, banana da terra, inhame e maracujá.
No entanto, a comunidade vinha sendo alvo de extração ilegal de madeira, já que o local é uma Área de Proteção Ambiental. Por isso, Bernadete os denunciava. A líder chegou a relatar, inclusive à presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, que as ameaças feitas por madeireiros estavam se intensificando.
“Acho que quando chega até a morte, a revolta já é muito grande. O descaso das autoridades, principalmente quando se trata do povo negro […] Recentemente, perdi um outro amigo e amiga de quilombo também. É o que nós recebemos: ameaças. Principalmente, de fazendeiros e de pessoas da região. Hoje, vivo assim: não posso sair que estou sendo revistada, minha casa é toda cercada de câmera, me sinto até mal com um negócio desse. Mas é o que acontece”, disse a vítima, em julho, para Rosa Weber.
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