Morre Mãe Bernadete, líder quilombola, assassinada a tiros

Bernadete denunciava a exploração ilegal de madeira em Área de Proteção Ambiental. Ela chegou a reclamar, com o STF, as ameaças que sofria.

Crédito: Divulgação/ Conaq

A líder da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq) Bernadete Pacífico, mais conhecida como Mãe Bernadete, foi assassinada a tiros no terreiro que comandava em Simões Filho, região metropolitana de Salvador, na noite desta quinta-feira (17).

Além da Conaq, ela estava à frente do Quilombo Pitanga dos Palmares e era mãe de Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, mais conhecido como Binho, assassinado há seis anos.

A instituição lamentou a perda e pediu união e determinação para continuar o legado que ela deixou. “Sua dedicação incansável à preservação da cultura, da espiritualidade e da história de seu povo será sempre lembrada por nós”, diz o texto. “Sua ausência será profundamente sentida. Seu espírito inspirador, sua história de vida, suas palavras de guia continuarão a orientar-nos e às gerações futuras”.

Suposta proteção

Bernadete estava sob proteção da Polícia Militar, por meio da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos da Bahia (SJDH), já mais de dois anos.

No entanto, segundo o advogado, a “proteção” se resumia a rondas “simbólicas” no entorno de onde ela morava, uma vez que uma viatura a visitava uma vez por dia, em geral, no dim da tarde.

“Bernadete recebia ameaças de várias frentes, que foram intensificadas quando madeireiros ilegais passaram a ameaçá-la. Ela sempre deixou claro os riscos que corria e ficou sob o programa a pedido dela mesma”, afirmou o advogado da família, David Mendez.

Ameaças

O quilombo Pitanga dos Palmares, que era liderado por Bernadete, tem cerca de 290 famílias que habitam uma área de 854 hectares. Lá, 120 agricultores produzem diversos produtos, como farinha para vatapá, além de frutas e verduras como abacaxi, banana da terra, inhame e maracujá.

No entanto, a comunidade vinha sendo alvo de extração ilegal de madeira, já que o local é uma Área de Proteção Ambiental. Por isso, Bernadete os denunciava.

“Recentemente ela relatou para a gente, em três ocasiões, que pessoas passavam pela casa dela à noite dando tiro para cima, como se fosse uma espécie de recado, de aviso. Fora as comunicações de boca–boca. Então não era novidade para ninguém”, continuou Mendez.

A líder chegou a relatar, inclusive à presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, que as ameaças feitas por madeireiros estavam se intensificando.

“Acho que quando chega até a morte, a revolta já é muito grande. O descaso das autoridades, principalmente quando se trata do povo negro […] Recentemente, perdi um outro amigo e amiga de quilombo também. É o que nós recebemos: ameaças. Principalmente, de fazendeiros e de pessoas da região. Hoje, vivo assim: não posso sair que estou sendo revistada, minha casa é toda cercada de câmera, me sinto até mal com um negócio desse. Mas é o que acontece”, disse a vítima, em julho, para Rosa Weber.

Repercussão

O ministro Silvio Almeida, dos Direitos Humanos, enviou equipes para Simões Filho e manifestou solidariedade à família.

“Recebo a informação de que Yalorixá Bernadete, defensora de dh e liderança do Quilombo Pitanga dos Palmares, foi assassinada. Determinei o imediato deslocamento das equipes do
@mdhcbrasil até Simões Filho, na Bahia. Expresso minha solidariedade aos familiares e à comunidade”
, publicou Almeida no Twitter.

O presidente Lula também se manifestou nas redes sociais, enviou representantes ao quilombo e afirmou que “aguarda investigação rigorosa do caso”.

Governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT) disse que não permitirá que os defensores dos direitos humanos sejam vítimas da violência no estado.

O assassinato de Mãe Bernadete será investigado pela Polícia Federal.

LEIA TAMBÉM:

Camila Bezerra

Jornalista

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador