Longe de consenso, polêmica sobre benefícios também é conflito no STF

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Foto: Planalto
 
Jornal GGN – A polêmica sobre benefícios concedidos a magistrados recebe quase o mesmo tratamento que o aumento do salário em um dos pilares do poder, a Corte Suprema. Não à toa, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, sempre defendeu abertamente os reajustes salariais a juízes.
 
Na mesma linha, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, recebeu há seis meses um estudo que barraria a criação de benefícios como o auxílio-moradia. Paralisado, o caso não saiu do papel, segundo informações da coluna de Mônica Bergamo.
 
O estudo é de autoria do corregedor do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), João Otávio de Noronha. É um projeto que prevê a padronização das folhas de pagamento de todos os tribunais do país, de forma a impedir irregularidades.
 
Entre as restrições, estariam rubricas e nomes iguais para benefícios já existentes. Assim, qualquer outro novo benefício a um determinado juiz seria comunicado ao CNJ, que teria a função de aprovar previamente ou negar.
 
Assim que chegou ao gabinete de Cármen Lúcia, o caso foi trancado por um tempo, até que, pressionada, decidiu criar uma comissão dentro do CNJ para estudar o estudo já feito pelo gabinete de Noronha. Seria uma resposta para questionamentos de possível engavetamento: não está engavetado, mas analisado por tempo indeterminado.
 
A exemplo do que admitiu o juiz Sergio Moro, muitos são os magistrados que consideram esses auxílios como um aporte adicional à falta de reajuste no salário de juízes. Entretanto, em agosto do ano passado, o Supremo aprovou o Orçamento de 2018 sem o aumento para juízes.
 
A medida tomada pela Corte maior da Justiça brasileira ocorreu diante da crise econômica brasileira e como forma de demonstração de que o Judiciário estaria sendo um exemplo para as medidas de restrição de gastos no país. 
 
Foram oito votos contra três entre os ministros para decidir administrativamente que o STF enviaria para o governo o orçamento sem a previsão de reajuste. A proposta cumpria a Emenda Constitucional 95, que criou limites de gastos para a administração pública, comportando um aumento de apenas 3% em relação aos gastos com o Judiciário de 2017.
 
“A exigência é de sacrifício de todos os brasileiros. Nunca vi, nos meus quase 40 anos de serviço público, um momento de tanto sacrifício”, disse Cármen Lúcia, à época. “A gente tem um teto, não tem como escapar dele. Sou solidário à magistratura, mas também sou solidário às pessoas que se sentiriam ofendidas com uma pretensão de aumento do andar de cima. A gente não tem como ceder diante da dura realidade dos fatos”, disse Barroso, em agosto do último ano.
 
Apesar de não ter sido unanimidade a defesa por não aumentar os salários dos magistrados, a maioria definiu as regras. Dessa forma, além de ultrapassar linhas éticas, a absorção de benefícios adicionais, como o auxílio-moradia, admitindo que seriam para suprir a falta de reajuste, é também afora do que determinou a própria Suprema Corte, em agosto do ano passado.
 
Como foi verificado no próprio STF, a polêmica não deixa de ser controversa e, por ora, fora de um consenso ou de unanimidades dentro da magistratura.
 
 
Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

4 Comentários

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  1. Remuneração juízes

    Solicito que a matéria seja corrigida, para inclusão de informações completas, que não induzam o leitor em erro. Não é exato relacionar a  falta de reajuste de subsídios apenas ao ano de 2018.

    A explciação é um pouco longa, mas verdadeira.Podem conferir os dados. A  Constituição, quando criou o regime de subsídios, estabeleceu um tripé:

    1) Respeito ao teto ( Art. 37, inciso XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;)

    2) Pagamento em parcela única para determinadas carreiras (§ 4º O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI.)       

    3) Direito a revisão anual do valor dos vencimentos (artigo 37, X – a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;)

    A impresa tem se fixado exclusivamente em exigir que sejam cumpridos os dois primeiros pilares do regime de subsídios, mas tem se omitido e muitas vezes passado informações inverídicas sobre a terceira parte.

    Os subsídios dos Ministros do STF foram fixados em 24.500 reais para janeiro de 2006 (ver lei 11.143/2005). Hoje, passados 12 anos, estão em 33.766 reais.

    Se no período fosse aplicada a correção pelo IGPM, o valor estaria em R$ 48.486,78. Se a correção fosse pelo IPCA, estaria em 47.605,87 reais.Há uma defasegem que, para ser corrigida, depende de um aumento de aproximadamente 40%.

    E a defasagem não surgiu nos últimos anos. As maiores perdas referem-se aos anos de bonança econômica (2008-2012).

    Nesse clima de defasagem contínua, realmente surgiram “soluções remuneratórias” que passam longe do ideal (embora não sejam ilegais), como o pagamento de verbas indenizatórias. Todas sabem que esse não é o melhor caminho.Mas há certa hipocrisia em reclamar de uma solução ruim, sem reconhecer sequer que o problema existe.

    Já adiantando a resposta a um possível comentário,pois  tenho certeza que alguém dirá que o salário ainda é muito alto e que quem não está contente deve ir embora. Observo que não é tão simples.

    Alguns realmente estão começando a se preparar para isso.Mas o serviço público não tem regras equilibradas para disciplinar a situação.

    Fosse na iniciativa privada, alguém que quisesse sair após uma década de descumprimento reiterado de seu contrato de trabalho teria direito à chamada despedida indireta. E, em consequência, teria direito a levantar o fundo de garantia por tempo de serviço e a receber a multa de 40% sobre o saldo. Se tivesse a sorte de trabalhar em empresa com regime de prevdencia complementar, provavelmente poderia levantar o saldo de sua conta.

    Já o servidor público, se quiser sair, mesmo no caso de descumprimento reiterado pela Administração de um direito que lhe assistia, não tem direito a qualquer tipo de indenização.

    Não tem FGTS, não tem multa e perde  todos os valores que contribuiu para o regime proprio de previdência. Pensem que um um juiz contribui com cerca de R$ 3.000,00 por mês. Ao longo de 15 anos, mesmo sem considerar juros e correção, o prejuízo passa de R$ 500.000,00, só no que se refere à mudança de regime previdenciário.

    Talvez fosse o caso de baixar um pouco o tom dessa caça as bruxas e discutir a questão com um pouco mais de racionalidade.

     

    1. O problema de fato não é

      O problema de fato não é simples. Um obstáculo que vejo é que nossa Constituição às vezes peca pela analiticidade, adentrando em minúcias ou prevendo “direitos” que podem depender de vários fatores do mundo real. Esta disposição quanto à revisão remuneratória, embora a intenção seja boa, sobretudo num contexto de governantes com alguma rixa com os servidores, não deveria num cenário ideal estar inserida num texto constitucional. Primeiro porque, sob uma ótica estritamente econômica, há certos momentos em qualquer país onde a prudência manda ter cautela na revisão de qualquer gasto público, afinal os recursos que pagam os servidores derivam essencialmente da arrecadação tributária estatal, a qual encontra limites na capacidade econômica momentânea do país. Se o país passar por dificuldades conjunturais, ainda que haja inflação (encontrando no limite um cenário de estagflação), não seria nada salutar crescer os gastos públicos e justificá-los à população, de quem em última instãncia derivam os recursos para financiamento da máquina estatal. E é justamente esta dependência de outras variáveis que pode fazer com que alguns dispositivos constitucionais soem como letra morta, embora haja governantes que descumpram seus comandos por outras razões nada republicanas (isto, no entanto, é texto para outra discussão). Ainda assim, se houver alguém que queira defender algum engessamento jurídico relativo à matéria, talvez fosse melhor deixar isso a cabo de uma Lei Complementar ou outro dispositivo legal, cuja mudança não fosse tão litúrgica e com regras mais factíveis (revisão anual dependente não só da inflação, como do crescimento econômico etc.). 

      Outro ponto que reflete esse engessamento constitucional concerne à vinculação remuneratória. E não recordo de outras categorias no texto constitucional que tenham menção explícita de vinculação de seus rendimentos ao subsídio pago ao STF, que não os juízes e procuradores de justiça de um modo geral. Com efeito, esta vinculação remuneratória acaba por gerar um efeito cascata em toda esfera federal e estadual, ocasionando situações esdrúxulas, em que estados nanicos que mal possuem recursos para pagar dignamente outras profissões têm que garantir um subsídio relativamente elevado para seus juízes e procuradores, pois, segunda a hermenêutica jurídica, a magistratura seria una (claro que este princípio só é lembrado na hora de querer obter benesses que outro grupo possui)!

      De um modo geral, do ponto de vista administrativo o Estado brasileiro é muito desorganizado, onde quem detém mais poder e lobby junto a quem efetivamente decide consegue extrair uns nacos maiores do orçamento público. Não existe uma política remuneratória clara e um pouco menos desigual, onde cargos que desempenhassem atribuiçoes similares devessem ter ganhos similares, independentemente de origem de Poder ou órgão. Mudar algo nesta seara, no entanto, é como mexer num vespeiro, onde sempre haverá uma resistência à mudança do status preestabelecido. 

  2. Derrapagem perigosa…

    … sobre a revisão anual do valor dos vencimentos…

    … talvez esbarre em algumas questões pra lá de interessantes, que, inclusive, diz respeito a uma prática em muitos Estados e municípios.

    Não atribuindo aumentos reais aos vencimentos dos funcionários públicos da administração direta, Estados e municípios (o estado de São Paulo é pródigo na coisa) tem se valido de acrescentar valores aos vencimentos na forma de adicionais, que, na realidade, não são nem de longe o que aparece como penduricalho.

    Estou falando de salários baixos, que, repito, nem se comparam com os “auxílios-paletó em Miami” (minha nossa, tem que ser muito cafona pensar que Miami é um lugar para comprar blazer). 

    Agora, também existem aquelas verbas de representação, que, depois de um certo período, o funcionário pode solicitar a incorporação do valor no salário.

    Isso é mais dado em autarquias. E é um dado interessante. Podemos citar a USP; os cargos que recebem verba de representação nem sempre são cargos técnicos, muitas vezes são cargos políticos, de confiança, o que gera uma distorção incrível. E é facílimo criar um cargo desses; basta saber qual a ordem de quem vai assinal o papel. Exagero? Oras, é inconcebível que exista um servidor que realmente trabalhe e que alguém esteja num cargo acima com verba de representação e que simplesmente assine o documento que aquele que trabalha efetivamente realizou? É assim que se esquenta um currículo.

    Por isso, chuto que a coisa não é “só” o penduricalho. Talvez vá mais além e não tenhamos a noção disto. 

  3. Mortiça & Postiço
    Mortiça & Postiço. Deveriam logo se enrabichar….vou guardar o registro do quanto ela fica alegre quando se encontra com o golpista..são tantagofotos grotesca de quando os dois se encontram que da uma mega exposição trash: patrocinada pela Shell

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