Relator da cassação Dilma-Temer diz que esquema na Petrobras era cruel

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Jornal GGN – Herdando as relatorias que pedem a cassação da chapa de Dilma Rousseff e Michel Temer, podendo ocasionar a queda do peemedebista da cadeira do Planalto, o ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Herman Benjamin, teve duas constatações, após acompanhar os depoimentos dos envolvidos do esquema de corrupção na Petrobras: de que o esquema não era generalizado, mas localizado, e que era “cruel” com os integrantes: quem não entrasse no esquema não era contratado, e quem entrasse não podia sair.
 
Mas o tempo de decisões de Herman Benjamin é tão decisivo quanto o próprio processo e a tentativa de Temer de separar a investigação contra ele com a de Dilma. Isso porque, se Temer for condenado ainda neste ano, o que é mais improvável de ocorrer, haverá novas eleições para a escolha do presidente da República. Mas se afastado no próximo ano, a decisão do novo presidente caberá ao Congresso, grande base aliada de Michel Temer.
 
Do Jota
 
 
Por Livia Scocuglia
 
Antes de ouvir os depoimentos de envolvidos no escândalo da Petrobras, o ministro Herman Benjamin, relator do processo que pede a cassação da chapa Dilma/Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tinha a ideia de que a empreiteira estava “podre”. Agora, está convencido de que a corrupção na petroleira é localizada e concentrada, sobretudo, nos cargos de chefia.

Em entrevista a quatro jornalistas, durante o VI Encontro Nacional de Juízes Estaduais, na Bahia, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) apontou o que o impressionou nos depoimentos: valores brutos “estratosféricos” movimentados no esquema e o tratamento “normal” que os envolvidos conferiam à corrupção. 

O ministro conta ainda como acompanha de perto todos os depoimentos do que classifica como o maior processo da história do TSE.

Herman Benjamin é personagem determinante em duas frentes.

No TSE, relata quatro ações apresentadas pelo PSDB que buscam cassar os mandatos da presidente afastada Dilma Rousseff e do interino Michel Temer por suposto abuso de poder político e econômico na disputa. Em caso de condenação na ação, Temer perderia o mandato de presidente, o que exigiria novas eleições – pelo voto direto dos eleitores, se o processo for encerrado neste ano; ou pelo Congresso, caso termine a partir do ano que vem.

No STJ, Benjamin é relator da operação Acrônimo, que investiga suposto esquema de corrupção envolvendo verbas do BNDES na época em que o governador de Minas Geral, Fernando Pimentel (PT), comandava o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

“Antro de corrupção”

Benjamin conta que três aspectos dos depoimentos prestados ao TSE o deixaram impressionado. O ministro afirma que mudou sua ideia de que a Petrobras era um “antro de corrupção” e que o esquema era generalizada. Após ouvir vários depoimentos ficou convencido de que a corrupção na estatal é localizada e atinge, sobretudo, os cargos de chefia por dois motivos principais: o fato de haver concurso público e os altos salários.

“Eu achava que a Petrobras era um antro de corrupção – do peão ao presidente. Posso estar equivocado, mas a impressão que tenho é de que há um alto grau de profissionalismo na empresa. E de certa maneira isso bate com a avaliação, com a imagem que a Petrobras tem internacionalmente – de capacidade, de técnicos, de confiança mesmo na empresa. Não é uma empresa que tem uma imagem ruim, ficou [com a imagem ruim]”.

O ministro afirma que, pelos depoimentos, extraiu que o sistema era “cruel” com seus participantes: quem não entrasse no esquema não era contratado e quem entrasse, não podia sair. Se a empresa participasse do esquema, mas não pagasse [a propina], o contrato não era finalizado e os pagamentos eram feitos. Mas a partir de terminado aquele contrato, a pessoa não contratava mais com a Petrobras.

“Aprendi muito com esses depoimentos”, afirmou.

“Valores estratosféricos”

Benjamin afirma ainda que ficou impressionado com os valores brutos movimentados. Os números, segundo ele, não se comparam a nenhum dos casos com os quais se deparou quando atuou no Ministério Público ou nos dez anos como ministro do STJ.

“São valores estratosféricos. Nós, seres humanos normais, não temos condição de avaliar o que se pode comprar com aquilo. Os operadores perderam o controle do dinheiro e faziam acerto de contas por amostragem. Era dinheiro demais”, afirmou.

“Normalidade da corrupção”

O ministro citou ainda a surpresa com a “normalidade da corrupção”, com a ideia de que todas as empresas participam do esquema de corrupção e o vocabulário usado para se referir ao pagamento de propina como “comissão” e “taxa padrão”.

“A normalidade da prática, isso que me impressionou muito, não era exceção. E segundo praticamente todos, isso ocorre na administração pública brasileira de uma forma geral”, lembrou.

“O vocabulário era de tal modo organizado a retirar o sentimento de culpa e de vergonha por ser normal e serem utilizadas expressões que diluíam o caráter criminoso da ação. É compreensível porque eles [os envolvidos] eram pessoas altamente respeitadas na sociedade com prêmios – estou me referindo a presidentes de grandes empresas e próprios diretores da Petrobras”, afirmou, e completou:  “A ideia de ‘pixuleco’, isso é um outro padrão, não é o padrão da linguagem da corrupção no caso Petrobras”.

Maior processo da história do TSE

Segundo o ministro, o processo que visa a cassação da chapa Dilma/Temer é o maior da história do TSE, além de ser o primeiro caso do tribunal que visa a cassação de uma chapa presidencial eleita. Até por isso, o ministro afirma que tem acompanhado todos os depoimentos, o que geralmente é realizado por juízes instrutores.

“Os depoimentos são muito relevantes. Quero levar para os meus seis colegas a minha percepção pessoal de como esses depoimentos ocorreram, o que foi dito. Só estando presente conseguimos relatar a confiabilidade de um determinado depoimento”.

E explica: “Porque depois que está transcrito, isso se perde. Eu vi depoimentos em que a credibilidade, seja com rancor, que fica manifesto ou o desejo de colocar luz mais num partido do que nos outros ou então se proteger a si próprio ou a sua família, isso depende da presença física do juiz no depoimento”.

Benjamin tem sido lembrado pela rapidez com que tem conduzido as investigações. Ao ser questionado sobre isso afirmou: “Eu imprimo o ritmo que acho que o caso merece” e lembra que tem contado com a colaboração dos advogados, o que chamou de “grata surpresa”.

“A grande diferença entre este processo e outros tantos que já passaram por mim em termos dos advogados é que nenhum deles criou obstáculo ao prosseguimento das investigações. Isso não é comum. O advogado usa de mecanismos legítimos para reduzir a velocidade natural do processo”, disse.

Dano

O ministro ainda questiona se nos acordos de colaboração estão sendo colocados os valores de propina como sendo o valor do dano. Segundo Benjamin, esta conta tem que entrar nos acordos de colaboração e leniência, e lembra que a Petrobras ainda enfrenta processo no exterior, “sobretudo nos Estados Unidos”.

Benjamin ainda diz que teme judicialização caso a companhia queira cobrar depois e isso não estiver previsto expressamente no acordo de leniência ou então na colaboração premiada.

“Todas as indenizações que a Petrobras pagar, seja de natureza contratual, seja por conta da legislação de proteção de acionistas minoritários, em decorrência do escândalo que a empresa enfrentou, isso tem que ser debitado na conta de quem causou o escândalo”, afirmou.

“No Brasil se devolve dinheiro da corrupção à prazo. Não vou dizer que é revoltante. Estou fazendo uma constatação. O pagamento que a Petrobras vai fazer nos acordos nos Estados Unidos, tenho dúvidas se serão acordos feitos à prestação. Suspeito que em 120 meses não será. Lá o maior interessado nos acordos não são nem as vítimas, são os advogados, que recebem uma porcentagem que pode ser bem substancial”, diz.

 “A grande lição”

Benjamin afirma que as investigações estão contribuindo para dar transparência ao problema da corrupção que atinge o país e diz que a sensação é de verdadeiro estado de direito.

“Ao contrário dos pessimistas, que dizem sermos o pior país do mundo, que nada funciona, esse processo, como cidadão, me passa uma sensação de verdadeiro estado de direito”, diz, acrescentando: “Você veja, não tenho guarda-costas, já ofereceram, muito mais pela Acrônimo e agora por esse também, mas me recuso a ser um juiz com guarda-costas. Nunca tive nenhuma situação de medo, mas a Polícia Federal está no seu papel de sugerir”.

*A repórter viajou a convite do Enaje

 

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

12 Comentários

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  1. Criminalização do PT

    Lula sua ficha ainda não caiu. O PT não está sendo criminalizado. O PT acabou Lula. Acorda e lidera uma frente contra o golpe. O Brasil é maior que o PT Lula. Aos diabos se você criou o maior partido do mundo e se você tem orgulho disto. As coisas passam, tudo passa na vida. Ninguém mais quer saber de Rui Falcão, Zé Dirceu, Zé Genuíno, Delúbio e outros. Eles no mínimo ficaram nas mentes das pessoas como suspeitos e isso não sairá mais. O processo ainda não acabou e ainda vai fazer mais estragos. Você ainda pode ser poupado. Deixa o resto do PT fazer o que já deveria ter feito, renovando rapidamente o que sobrou e pensa em liderar uma frente de salvação nacional, urgente. O Brasil como falei está pedidno socorro e você falando em salvar o PT?

    1. O líder nas enquetes

      Será que estamos falando do mesmo Lula? O ex-Presidente que aparece sistematicamente como o favorito para presidir o país pela maioria dos entrevistados?

  2. Justiça???

    Não pode haver justiça nesse esquema de “lawfare”. Não sei a origem desse juiz, mas faça-me o favor…Estado de Direito ? Onde? Como?

  3. Espanto seletivo

    O juiz se diz espantando, e classifica como o maior processo da história do TSE.

    Isso porque ele não leu, não se interessou, ou seja lá o que foi que ele fez, ou provavelmente para não ter como referencial o escândalo do Banestado.

    Ironicamente o PT abriu as portas durante seus governos para as oposições, a grande mídia, e os fascistas usarem desse instrumento para condená-los.

    O que está claro é que o nazista Bornhausen, conseguiu cumprir a sua tarefa: acabar com essa raça.

    O PT dormiu em beço espêndido com o republicanismo do Lula, e deu no que deu.

    É bom lembrar que o escândalo do Banestado ocorreu no governo FHC, que não se investigava nada, e o nazista Bornhausen foi o maior beneficiário do esquema das CC5 com o roubo de várias dezenas de milhões de dólares, depositadas no exterior.

    Mas é estranho o PT cair nessa armadilha, porque o que está ocorrendo hoje, por incrível que pareça vem da década de 1950, que ainda não acabou.

    Esse lapso de “democracia” que teve apenas dois ex-presidente que terminaram os seus mandatos: FHC e Lula.

    Essa conclusão está por mais do que esclarecida quando se lê o livro recém lançado do professor da USP Alessandro Taviani, “O assassinato de JK pela ditadura”.

    Isso fica claro na entrevista do professor no CAF.

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=FHw_xJtSgoA%5D

  4. Clarificar!…

    Não existe e nunca existiu esquema de corrupção instalado na Petrobras.

    A governança da empresa é de classe munidal, blindada a esse tipo de prática.

    Picaretas não prestam serviço a Petrobras.

    Ocorre que agentes da empresa, no ambiente externo, negociavam favorecimentos para si e outrém. Fora da governança. 

    Só uma investigação policial poderia detectar essa prática.

    Os contratos são bilionários e as margens de lucros também.

    Meia dúzia fizeram esses acertos  em uma empresa com milhares de funcionários.

    O delito foi de alferiri benefícios pra si e pra outrém. Somente.

    O resto é narrativa do MPF pra criminalizar o PT!…

    Pena que a Petrobras não esclarece!…

     

  5. Brasil

    O Brasil precisa de uma FRENTE AMPLA POPULAR urgente. O PT precisa entender que destruiram a imagem dele. Foram mais de 10 anos de massacre midiatico, O maior lider popular deste pais precisa reconhecer que a sua epoca ja passou, ele precisa apoiar o Ciro Gomes.

  6. Os subMoros é uma classe em

    Os subMoros é uma classe em crescimento, cada dia surge mais um. Com o mesmo discurso, as mesmas bravatas e a mesma blindagem da mídia. A banalização da empáfia corporativa.

  7. Incrível.

    “A normalidade da prática, isso que me impressionou muito, não era exceção. E segundo praticamente todos, isso ocorre na administração pública brasileira de uma forma geral.”

    O que mais me impressiona é o alegado despreparo dos juízes. Até as pedras conhecem a corrupção sistêmica, como dado cultural de nossa sociedade, desde sempre. É como a alegada ingenuidade de Carmen Lúcia…

    “Como assim, estou favorecendo empresas farmecêuticas?”, poderia alegar.

    Entendo que juízes prefiram os pedestais e as bolhas para viverem. Mas será possível que esses profissionais julgam ser possível julgarem sem contato com a realidade factual, que baseiem-se apenas em livros e manuais? Nunca ouviram falar, por exemplo, em “carteirada”? Nunca conversaram nem com maliciosos promotores, sempre desconfiados até por força de suas profissões? Não conhecem nenhum engenheiro que lhes fale francamente da maravilha que é – ou era – participar de alguma grande obra estatal?! A ser sincero o espanto de Herman Benjamin. esses juízes precisam sair mais de casa, da Academia, ter contato também com o mundo real e não só com o teórico.

  8. A Lava a Jato denegriu a imagem da Petrobrás

    Em vez de jogar fora a água suja do banho, a Lava a Jato jogou fora o bebê, isto é, jogou fora a Petrobrás e premiou seus ladrões com a impunidade e com a lavagem a jato do seu dinheiro sujo.

    1. Perfeito!

      E com uma canalhice dessa monta o Sr.Ministro ainda vem se dizer otimista, que temos um “estado de direito”! Só pode ser ironia, ou uma cara-de-pau ainda maior que a do Moro.

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