Samarco forneceu produto nocivo à saúde para limpeza da água do rio Doce

Renato Santana
Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.
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“Samarco não somente poluiu de maneira intensa o rio Doce, como agravou de forma relevante outros impactos já existentes", diz MPF

Desastre após rompimento de barragem da mineradora Samarco. Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

A manifestação do Ministério Público Federal (MPF) à Justiça Federal de Belo Horizonte (MG), em que pede a suspensão da captação de água do rio Doce, denuncia também que a Samarco ofereceu um produto nocivo à saúde para a limpeza da água do rio Doce destinada ao consumo da população de Colatina.  

De acordo com o MPF, a empresa forneceu ao Serviço Colatinense de Saneamento para tratamento e limpeza da água produtos coagulantes e floculantes, em especial, o Tanfloc SG, que acabou por implicar novo risco à saúde humana.

 “A conduta da Samarco não somente poluiu de maneira intensa e perene o rio Doce, como agravou de forma altamente relevante outros impactos já existentes, perpetuando-os”, disse o MPF na manifestação à Justiça Federal. 

O Tanfloc SG é um coagulante auxiliar utilizado no tratamento de águas em geral e de efluentes industriais. O uso do produto químico teria sido sugerido e fornecido pela Samarco para municípios afetados pelo desastre.

De acordo a assessoria de imprensa da empresa, procurada pelo GGN diante das denúncias do MPF, a “Samarco informa que presta os devidos esclarecimentos nos autos do processo”.

Laudos técnicos

De acordo com um dos laudos apresentados pelo MPF, nas Estações de Tratamento de Água de Colatina a dosagem utilizada do Tanfloc não cumpriu o previsto na norma ABNT NBR 15.784/2014, “em quadro de  incalculável perigo”. 

Segundo os peritos citados pelo MPF, o produto pode causar perda de peso e neoplasias, sendo classificado pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (Iarc, do inglês International Agency for Research on Cancer) como carcinogênico, tumorigênico e teratogênico. 

“Tais malefícios são causados pelos resíduos de formaldeído, usado como uns dos reagentes químicos no processo de fabricação do floculante, sendo normal que o processo de reação química não seja completo, deixando resquícios dos reagentes”, assevera o documento.

Dosagens elevadas

Os testes apontaram que todas as dosagens testadas do Tanfloc SG foram maiores do que a dosagem máxima recomendada de 10 mg/l. Ainda segundo o laudo pericial, a utilização do Tanfloc para o tratamento da água no município de Colatina ocorreu completamente a esmo.  

“Sem a adoção de quaisquer providências de controle da qualidade da água após o tratamento para consumo humano, o que pode explicar a utilização de dosagens tão elevadas do produto na maior parte do período de aplicação”, completa o documento agora sob análise da Justiça Federal.

Tanfloc é alvo de mais uma ação

Desde novembro de 2021, os riscos à saúde humana potencialmente causados pelo uso do Tanfloc SG também vêm sendo discutidos em outra ação civil pública, ajuizada por associações de moradores locais e de produtores rurais e artesãos do Espírito Santo. 

Conforme traz a público o MPF, os proponentes desta ação relatam que, após o desastre, muitos municípios que estavam impossibilitados de captar a água do rio Doce para consumo humano passaram a ser assediados pela Samarco, que forneceu e recomendou o uso do Tanfloc.

Outra fonte de captação

Entre outros pedidos, que as mineradoras Samarco, Vale e BHP sejam condenadas a arcar solidariamente com todos os ônus, despesas e investimentos necessários para viabilizar que todas as cidades impactadas que fazem a captação de água no rio Doce passem a ter outra fonte de captação. 

As associações de moradores pedem que as empresas sejam obrigadas a custear e a providenciar, por meio de caminhões-pipa, o abastecimento das cidades na exata proporção do consumo atual médio da população, além de fornecer três litros de água mineral para cada cidadão de tais localidades.

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