Genocídio em Gaza. Desmascarando os ataques da mídia corporativa ao presidente Lula
por André Luiz Furtado
“Entre os fenômenos políticos mais perturbadores de nossos tempos está o surgimento no recém criado Estado de Israel do “Partido da Liberdade” (Tnuat Haherut), um partido político muito parecido em sua organização, métodos, filosofia política e apelo social aos partidos nazistas e fascistas.”
Essas são as primeiras palavras de uma carta aberta, de 1948, ao New York Times, assinada, entre outros, pela filósofa Hannah Arendt e pelo físico Albert Einstein, ambos judeus.
O partido mencionado na carta, governou Israel por décadas, até que se fundiu a outros, dando origem, em 1973, ao atual Likud, partido do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. Netanyahu, que em 22 de setembro de 2023 apresentou na Assembleia Geral da ONU um mapa, que nomeou de “novo mapa do Oriente Médio”, em que a Palestina foi apagada.
Recentemente, mais especificamente no dia 18 de fevereiro de 2024, o presidente Lula concedeu uma entrevista coletiva em Adis Abeba, capital da Etiópia, onde respondeu a uma pergunta sobre a decisão do Brasil de se negar a aderir ao boicote adotado por diversos países ricos à ajuda humanitária para a Faixa de Gaza, onde, como todos sabemos, está em curso um genocídio promovido pelo exército de Israel.
Na sua resposta, Lula afirmou que “o que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler resolveu matar os judeus”.
Tal afirmação gerou críticas da mídia corporativa brasileira através de editoriais e de parte dos seus eminentes jornalistas. A virulência de tais críticas só foi superada pela fragilidade dos argumentos que pretendiam sustentá-las.
Tal fragilidade será demonstrada no que se segue. De imediato, é importante adiantar que a estratégia utilizada nos ataques à fala de Lula foi sustentá-los em falácia, incoerência e mentira.
A falácia utilizada nos pseudo argumentos que aspiravam a demonstrar o erro de Lula é conhecida como a falácia do espantalho, e consiste em substituir o ponto que defende um debatedor por uma deturpação do seu real posicionamento.
Por isso, antes de mais nada, é preciso iniciar deixando registrado o verdadeiro posicionamento de Lula, alvo dos odientos ataques. Disse o presidente: “na Faixa de Gaza não está acontecendo uma guerra, mas um genocídio. Não é uma guerra entre soldados e soldados, é uma guerra entre um exército altamente preparado e mulheres e crianças.”.
Guarde bem essas palavras, será importante para o entendimento do restante.
Além disso, Lula foi muito específico ao apontar qual era o alvo da sua indignada crítica. Eis o que ele disse: “[…] o Brasil não pode deixar de condenar o que o exército de Israel está fazendo na Faixa de Gaza.”.
Guarde essas palavras também.
Agora, a falácia do espantalho.
De modo geral, a deturpação do real posicionamento de Lula por parte da mídia corporativa nacional consistiu em, de uma maneira sub-reptícia, imputar a ele uma comparação genérica e suficientemente abrangente como se ele estivesse estabelecendo uma identificação entre todo o processo que caracterizou o genocídio dos judeus pelos nazistas e o corrente genocídio dos palestinos.
Para tanto, os editoriais de destacados jornais e alguns altaneiros jornalista se esforçaram para criar uma extensa lista de diferenças (algumas reais, outras não) entre o genocídio dos judeus e o dos palestinos.
Dois exemplos.
Exemplo 1: Afirmou o jornalista Reinaldo Azevedo no dia 19 de fevereiro, em um dos seus programas diários: “Infelizmente, o que acontece na Palestina acontece e tem acontecido ao longo da História o tempo todo e coisas até piores do que isso. Então, falar do Holocausto e falar do extermínio do povo judeu para associar àquilo que acontece em Gaza…em primeiro lugar é um problema de proporção, há uma desproporção brutal entre 6 milhões de judeus e de outros grupos que foram mortos e aquilo que acontece em Gaza.”.
Mas, atenção, em nenhum momento Lula pretendeu estabelecer uma proporção numérica entre as vítimas do Holocausto e as do atual genocídio na Faixa de Gaza.
Exemplo 2: Pouco depois o mesmo jornalista ataca novamente com um inequívoco apelo à falácia do espantalho afirmando que: “quando se chama o Holocausto ao debate […] é como se dissesse: ‘bem, vocês, judeus, que sofreram o Holocausto, agora praticam isso’”.
Não há absolutamente nada na fala de Lula que permita que qualquer pessoa com alguma capacidade não nula de interpretação de texto chegue a essa conclusão. O jornalista desconhece o que distingue “exército de Israel” (mencionado por Lula) e “judeus”?
E, não satisfeito, segue o periodista com uma tão pretensiosa quanto despropositada correção a Lula: “[…] e quem pratica aquilo em Gaza não são os judeus, é o governo de Israel”.
Nunca é demais lembrar do que de fato disse Lula: “o Brasil não pode deixar de condenar o que o exército de Israel está fazendo na Faixa de Gaza”.
Como dito anteriormente, a estratégia utilizada nos ataques à fala de Lula consistiu em sustentá-los em falácia, incoerência e mentira. Sobre falácia não creio ser necessário mais exemplos além dos acima analisados para demonstrar a manipulação das verdadeiras palavras de Lula.
A seguir, uma gritante incoerência muito repetida.
Tanto Reinaldo Azevedo como Ricardo Noblat e Guga Chacra (para citar somente três exemplos) apontaram o amplamente conhecido genocídio de Ruanda, ocorrido em 1994, como uma suposta evidência do que chamam de erro de Lula quando afirmou que: “o que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler resolveu matar os judeus”.
Lembremos: a horripilante tragédia humanitária ocorrida em Ruanda foi levada a cabo, majoritariamente, com armas brancas e por civis ruandeses contra civis ruandeses. Sim, o que ocorreu em Ruanda foi um genocídio, assim como o é o que ocorre hoje na Palestina. No entanto, as semelhanças entre essas duas catástrofes não vão muito além disso.
Alguém poderia dizer: ‘mas também há diferenças entre o genocídio dos judeus ordenado por Hitler e o que está acontecendo hoje na Faixa de Gaza’. E é verdade! Mas também há, e são mais numerosas e importantes, diferenças entre o atual genocídio do povo palestino e o que aconteceu em Ruanda. E isso não impediu que vários jornalistas equiparassem as duas tragédias enquanto vociferavam contra uma alusão ao Holocausto.
E vale lembrar uma horrível e importante semelhança entre o genocídio dos palestinos hoje e o dos judeus no século XX (e que suponho que foi o que motivou a alusão de Lula ao massacre dos judeus comandado por Hitler): no primeiro, o extermínio dos civis está sendo praticado por um exército altamente preparado. No segundo também foi.
Mas, em Ruanda não. Por isso, é bastante intrigante que haja quem se sinta confortável ao afirmar publicamente que “o que está acontecendo na Faixa de Gaza já aconteceu em Ruanda” ao mesmo tempo que censura qualquer possível alusão ao Holocausto durante uma critica ao atual genocídio na Palestina.
Resta, por fim, falar sobre a artimanha de, descaradamente, lançar mão com total desfaçatez de mentiras para atacar a fala de Lula.
A seguir, três tristes exemplos.
Exemplo 1: O jornalista Ricardo Noblat escreveu que “Lula não distinguiu entre Israel e o atual governo de extrema direita de Israel. Ao não fazê-lo, equiparou os judeus aos alemães nazistas que apoiaram o morticínio nas câmaras de gás.”
Exemplo 2: Em editorial, o jornal O Globo afirma que “ao comparar Israel a nazistas, Lula agride a História”.
Eis a verdade: Lula mencionou Israel em uma única ocasião durante a sua fala de 3 minutos e 42 segundos. Foi quando disse: “o Brasil condenou o Hamas, mas o Brasil não pode deixar de condenar o que o exército de Israel está fazendo na Faixa de Gaza”.
Evidentemente, de nenhuma forma minimamente honesta e lúcida é possível chegar à conclusão que o jornalista e o editorial de O Globo querem nos impor.
Exemplo 3: Com o intuito de evidenciar o suposto “erro brutal” de Lula, o jornalista Reinaldo Azevedo afirmou: “A proposta de Hitler era o extermínio dos judeus, isso era uma causa do nazismo que não tinha a ver com uma declaração de guerra contra outro estado.”.
A atual matança de palestinos tampouco tem a ver com uma declaração de guerra contra outro estado! É fato elementar, globalmente conhecido, inclusive seguramente pelo afamado jornalista que não existe o Estado Palestino. À Palestina é negado o status de Estado. A Palestina não possui exército, não possui aviões e helicópteros de guerra (e nem sequer comerciais ou mesmo aeroportos, aliás, o único aeroporto que havia, foi destruído por Israel em 2002).
Mais uma vez: a Palestina não possui exército. Como bem disse Lula, “na Faixa de Gaza não está acontecendo uma guerra, mas um genocídio […] não é uma guerra entre soldados e soldados, é uma guerra entre um exército altamente preparado e mulheres e crianças”.
A questão que se impõe diante de toda essa polêmica é a seguinte: por que o Holocausto, diferentemente de outros genocídios, como o de Ruanda ou o dos indígenas das Américas, deveria ser mantido numa espécie de pedestal infernal sem que se possa sequer mencioná-lo ao se criticar um genocídio que está ocorrendo diante dos nossos olhos? A quem isso interessa?
O Holocausto foi uma manifestação particular de um fenômeno geral que lamentavelmente é reincidente na História: genocídios.
Tentar censurar uma alusão ao Holocausto quando ela é feita com o intuito de conscientizar e alertar o mundo sobre uma nova manifestação desse fenômeno geral que está se desenrolando sob os olhares apáticos da maioria dos líderes globais, definitivamente não ajuda a frear essa nova catástrofe.
A repercussão global da fala de Lula foi enorme. E isso é ótimo. Os ataques histéricos a ela partiram, essencialmente, de somente dois pontos do Globo: do governo de Israel e seus asseclas e da “nossa” mídia corporativa (e esses dois pontos muitas vezes se confundem).
Mas, para Lula, Einstein e Hannah Arendt a História já reservou um lugar bem distante do deles.
André Luiz Furtado – Atividade Profissional: Professor de Matemática da UERJ.
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