Zelensky, o herói de uma mídia que deixou de lado o jornalismo, por Luis Nassif

Mente a Rússia, mentem os Estados Unidos, mente a OTAN mas mentem, principalmente, os comentaristas que endossam as mentiras e sonegam do seu público as informações, mentindo tão sinceramente que acreditam que é jornalismo as verdades que sonegam ou as mentiras que reiteradamente mentem.

Ontem, na TV GGN, entrevistamos o jornalista americano Glenn Greenwald. Ele tem dois grandes sucessos em sua carreira: a maneira como jogou na mídia o caso Snowden e a Vaza Jato. Em ambos os casos, procurou antecipadamente jornais corporativos e ofereceu parceria. Com isso, superou a cortina de silêncio “patriótico” que marcou a cobertura da mídia no período da Lava Jato e a americana no caso Snowden.

Logo depois da Vaza Jato, Glenn afastou-se do The Intercept por ter sido censurado em reportagem em que abordava os negócios de Joe Biden na Ucrânia. Eram matérias bem fundamentadas – confirmadas posteriormente por outro órgãos – que mostravam o filho de Biden recebendo US $50 mil mensais de uma petroleira estatal, sem dispor de nenhum conhecimento técnico sobre energia. O episódio, aliás, revelava desde então a extraordinária influência do governo americano nos negócios da Ucrânia. Mas os proprietários do jornal consideraram que o grande inimigo a ser destruído era Donald Trump e, por isso, Biden teria que ser poupado.

Glenn demitiu-se por não admitir trocar o jornalismo pela propaganda.

Na entrevista, Glenn explora essas limitações da mídia corporativa norte-americana e brasileira. Mostra que não era segredo para nenhum jornalista bem informado o fato de Volodymyr Zelensky ter sido colocado no poder por uma atuação direta dos Estados Unidos visando justamente assediar a Rússia, tornando a Ucrânia membro da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte).

Explicou os problemas que acometiam, nos Estados Unidos, jornalistas que tentavam fugir do script. Havia uma pressão invencível da opinião pública, considerando-os inimigos da pátria, muito mais agora do que na guerra do Iraque. A partir daí, deixava-se de fazer jornalismo para se tornar propagandista.

Vale a pena conferir a entrevista.

Terminada a entrevista, vou assistir o debate do Globonews, canal em que um dos comentarista erigiu Zelensky à condição de “heroico comediante”.

Lá, assisto a uma surpreendente exposição de Jorge Pontual, correspondente nos Estados Unidos. Admitiu que Zelensky é uma criatura do bilionário russo Ihor Kolomoisky, inimigo de Putin e dono, entre outras empresas, do canal de televisão que o projetou. Mais ainda: admitiu que existe uma milícia nazista incorporada ao exército da Ucrânia – o Batalhão de Azov – também financiado por Kolomoisky.

Ihor Kolomoisky

A que se devia esse ataque de jornalismo? À sua preocupação, compartilhada com os demais comentaristas, sobre o que Putin poderia fazer com essas informações, quando ocupasse Kiev. Afinal, todo país tem seus pecadilhos e seus radicais, e Putin poderia explorar esses fatos para tentar desmoralizar as informações do lado Ocidental – como se fosse algo banal saber que o presidente da República foi apadrinhado por um oligarca russo, ligado aos Estados Unidos, e patrocinador de uma brigada nazista que, depois do presidente eleito, foi incorporada às forças armadas oficiais.

Ou seja, tem todas as informações sobre o personagem. Mas só recorre a elas para avaliar estrategicamente como combater o seu uso político por Putin. Qual o nome que se dá a essa função? Consultor  estratégico do Departamento de Estado? Jornalismo, decididamente, não é.

E seu colega Guga Chacra, conhecendo o histórico de Zelensky, a troco de que lhe conferiria o tratamento de herói da Marvel? Desinformação? Excessos da juventude, assim como Arthur do Val? Não. Já é uma pessoa madura na idade e no conhecimento.

Ficou claro, no comentário de Pontual e nos arroubos de Chacra, que a cobertura internacional não é vítima das fake news do Departamento de Estado: é parceira na sua elaboração. Os correspondentes, como Pontual, sabem que, na guerra, os Estados Unidos mentem tanto quanto a Rússia, que as informações de ambos os lados precisam ser recebidas com reservas, que o papel do jornalismo é filtrar, analisar todas as versões, separar o joio das notícias falsas de lado a lado, e apresentar ao seu público um produto honesto, mesmo com todas as limitações para se chegar aos fatos objetivos. E denunciar as manipulações de Zalensky – o “heróico comediante” que quer jogar o mundo em uma guerra nuclear – não significa avalizar os abusos de Putin.

No entanto, o discurso recorrente, seja dos comentaristas da Globonews quanto dos veteranos da CNN, é que apenas os russos mentem.

Autora da denúncia fundamental sobre o uso das redes sociais pelo bolsonarismo, em reportagem de ontem, a repórter Patrícia Campos Mello, da Folha, trata as narrativas americanas como “desmascaramento preventivo”, contra a única potência que mente: a Rússia. Na CNN, a irrepreensível correspondente Heloisa Villela é interrompida pelo âncora para afirmar que só a Rússia mente “descaradamente”.

Mente a Rússia, mentem os Estados Unidos, mente a OTAN mas mentem, principalmente, os comentaristas que endossam as mentiras e sonegam do seu público as informações, mentindo tão sinceramente que acreditam que é jornalismo as verdades que sonegam ou as mentiras que reiteradamente mentem.

Verdade ou mentira?
Luis Nassif

13 Comentários

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  1. Saudades do Alberto Dines e do Observatório da Imprensa. Sem falar do Castelinho. Midia familiar – ideologizada entrando com os dois pés na luta politica. Fazendo o jogo do Bozo. Belo papel.

  2. É bom um artigo para constatar, apenas para isso.
    Mas o alerta é inócuo.
    Mundo da pós-verdade, isso já é bastante estudado no mundo principalmente dos Estados Unidos, já é uma completa realidade.
    A verdade praticamente não interessa a mais ninguém, o que passa interessar é a versão dos fatos.
    E isso parece estar consolidado como Cultura.

  3. Viralizou no twitter o termo guerra 68. 24/02/2022 inicio da Guerra da Ucrânia tem mesmo valor que a data inicio das primeira e segunda guerra mundial. O que significa o valor 68 não sei. Alguém sabe até hoje o que significa 666? Seria uma assinatura reservada aos principais do mundo europeu de cada época da história moderna para iniciar o evento numa data cuja soma dá 68?
    O cabo Daciolo um conspiracionista incorrigível notou que a Globonews anumciou o 1o dia da Nova Ordem Mundial.
    Nostradamus, Parravicini, Conselheiro explicam em seus sonhos e transes, essa terra que recebe o sangue humano desde de Abel. No último ato, a platéia atenta espera Jesus.
    Eu estou aqui

  4. é que um lado optou por atacar o outro. alegar motivações de segurança e, por isto, soltar bombas no outro país?

    não entendo a defesa que se faz da Rússia. tire Rússia x Ucrânia e coloque EUA x algum país por eles invadido e veja se você concorda.

    “ah, mas a OTAN, mas os EUA, mas o Capitão América…”. ainda assim, foi a Rússia que optou por bombardear o outro lado. gente está morrendo lá por causa disto e não esperem que as pessoas achem isto normal.

  5. é que um lado optou por atacar o outro. alegar motivações de segurança e, por isto, soltar bombas no outro país?

    não entendo a defesa que se faz da Rússia. tire Rússia x Ucrânia e coloque EUA x algum país por eles invadido e veja se você concorda.

    “ah, mas a OTAN, mas os EUA, mas o Capitão América…”. ainda assim, foi a Rússia que optou por bombardear o outro lado. gente está morrendo lá por causa disto e não esperem que as pessoas achem isto normal.

  6. Vamos apontar como acabar imediatamente esta guerra cruel:
    1. devolução aos eua dos foguetes destes países pobres piranhas que correm perigo por nada, mesmo por que, dizem que eles não valem nada, só coloca estes coitados em grande risco;
    2. Nada, pronto.
    Como brinde muito valioso a rússia abandona a ucrânia, acaba a guerra; volta a fornecer o indispensável gás a europa e esta devolve os imigrantes para a ucrânia, a economia retoma e o mundo volta ao normal.
    Os eua devem acabar com esta ideia idiota de donos do mundo e abandonam os bloqueios econômicos que prejudicam a todos, inclusive aos eua que caminham para o brejo. E, claro, ajudar a ucrânia a se recuperar.
    Pronto, acabou. Vamos tomar uma cerveja!?

  7. Haha boa, Teatro Híbrido!

    Mais uma conspiratta, agora local: 16+16=32, 32+32=64

    Não é nada, não é nada, são os anos dos golpes de Estado (ou tentativas de) perpetrados pela Elite do Atraso.

    Porém, não ria: houve quem lembrasse disso no golpe do primeiro de abril (32 da Intentona Paulista X2) sorriso no rosto e a felicidade dos idiotas, ainda assim sabedores de sua absoluta impunidade.

  8. Que bela explanação, essa é a realidade do que ocorre, dizer que só a Rússia mente? como assim? Os “eua”mentem agora, como sempre mentiram…armas de destruição em massa!!! Lembram??? Infelizmente são iraquianos, não são loiros de olhos azuis…

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