Eliara Santana
Eliara Santana é doutora em Linguística e Língua Portuguesa, com foco em Análise do Discurso. Ela é pesquisadora associada CLE/UNICAMP, onde participa do projeto Pergunte a um/uma Cientista. É integrante do Observatório das Eleições. Desenvolve pesquisa sobre desinformação, desinfodemia e letramento midiático no Brasil.
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Em NY, mulheres denunciam: “Damares mente”, por Eliara Santana

Na inauguração do Espaço da Mulher Brasileira,  as ativistas se colocaram diante do público e à frente da ministra para afirmarem: “Você não nos representa, nos envergonha!”

Foto DDB-NY

Em NY, mulheres denunciam: “Damares mente”

por Eliara Santana, especial para Jornal GGN

A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, a pastora Damares Alves, estava ontem (17 de março) em Nova Iorque, EUA, para inaugurar o Espaço da Mulher Brasileira no Consulado do Brasil nos Estados Unidos. O evento foi uma iniciativa para denunciar e combater a violência contra a mulher.

Curiosamente – ou não –, a ministra é reconhecida por gastar muito pouco dos recursos da sua pasta no combate à violência de gênero e em programas para o público feminino. Em 2020, ano em que começa a pandemia e explodem casos de feminicídio, a pasta de Damares gastou metade da verba disponível para combater a violência contra a mulher. Para a pastora, que ficou famosa ao espalhar aos quatro ventos a fake news poderosa do kit gay, parece que as questões de gênero se resumem a vestir rosa ou azul. Aliás, Damares é tão obcecada por isso que usou o mote em sua fala em rede nacional pelo Dia Internacional da Mulher – menina veste rosa; menino veste azul. Parece que a ministra pastora desconhece que, de rosa ou azul ou amarelo ou vermelho ou lilás, as mulheres no Brasil têm sido vítimas de uma violência constante e crescente.

A pequena preocupação dela com a realidade das mulheres no Brasil é bem visível. Em outubro de 2021, o Ministério Público Federal questionou a ministra e abriu um inquérito civil para exatamente verificar o investimento mínimo do orçamento do Ministério. Ou seja, ela deixou de usar recursos já previstos, o que impactou profundamente as políticas de igualdade e os programas de combate à violência contra a mulher. 

Além de não usar o dinheiro disponível no Ministério para os programas voltados às mulheres, Damares Alves também é criticada por, deliberadamente, promover um desmonte dos programas voltados para proteção aos defensores dos direitos humanos.

Pois bem, com esse currículo, lá estava ela inaugurando, em NY, o Espaço da Mulher Brasileira. Parece piada de mau gosto ou aquelas peças que o destino prega – no caso, peças que o destino vem pregando no Brasil e nos brasileiros desde 2015, quando Aécio Neves abriu a boca grande pra dizer asneira e soltar os cachorros doidos depois da eleição.

Felizmente, muitas vozes se mobilizam para dizer que as coisas não estão certas, que nada disso é normal ou natural; muitas dessas vozes, fora do Brasil. E algumas delas estão no grupo Defend Democracy in Brazil (DDB), grupo maravilhoso do qual tive a honra de participar quando estava em Nova Iorque. E essas ativistas maravilhosas estiveram no evento do Consulado para dizerem, com todas as letras: DAMARES MENTE. 

Na inauguração do Espaço da Mulher Brasileira,  as ativistas se colocaram diante do público e à frente da ministra para afirmarem: “Você não nos representa, nos envergonha!”. E ressaltaram que Damares era a  “Ministra da violação aos direitos Humanos”.

O evento no Consulado era exatamente para marcar a inauguração de um espaço de denúncia e combate à violência contra a mulher. Mas eis que um homem, da tropa de apoio à ministra, se dirigiu ao fundo do local e tentou arrancar a faixa da mão das ativistas. Elas o identificaram como o deputado federal José Medeiros, do Mato Grosso, da bancada ruralista.

Como relatou uma das ativistas, que não quer se identificar porque tem medo de represálias, “uma das companheiras segurou a faixa, ele forçou e acabou arrastando-a até a porta, até que ele entrou numa sala levando a faixa. A ativista gritou que ele estava violando a propriedade dela, como diz a  lei nos Estados Unidos”.

A Assessoria da ministra negou a presença do deputado citado em NY, mas as fotos mostram o contrário, como vocês podem ver:

Legenda: deputado ao lado da Ministra e se direcionando às ativistas

A sensação de perplexidade tomou conta das ativistas, que sabem o significado de um espaço como aquele para a mulher brasileira. Segundo uma delas relatou: “Do lado de fora, muitas lamentavam, pois esse espaço é muito importante para a mulher brasileira, principalmente para as vítimas de violência doméstica; lamentável que seja inaugurado com a presença de uma ministra que minta tanto e desrespeite mulheres de todas as raças e etnias, e ainda ouse querer se eleger senadora. A atitude do deputado Jose Medeiros contradisse todos os discursos anteriores”.

Pois é. Como lembraram muito bem, Damares Alves sairá do Ministério em abril para se candidatar ao Senado. Ela tem uma base muito boa e está em vários programas de rádio, falando de Deus, da família e de rosa e azul. Desde a posse, eu venho falando sobre ela, sobre a potência da voz dela e sobre os perigos que ela representa. É a base moral do governo Bolsonaro e contribui muito fortemente para manter as hordas atiçadas.

No mais, fora o espanto por mais esse escárnio de um governo que é, em si mesmo, um escárnio constante, parabenizo, com muito orgulho, as companheiras do DDB. Deram um recado precioso.

Foto: Divulgação DDB – de Nova York.

Eliara Santana

Eliara Santana é doutora em Linguística e Língua Portuguesa, com foco em Análise do Discurso. Ela é pesquisadora associada CLE/UNICAMP, onde participa do projeto Pergunte a um/uma Cientista. É integrante do Observatório das Eleições. Desenvolve pesquisa sobre desinformação, desinfodemia e letramento midiático no Brasil.

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