Agência Xeque e a cobertura da Lava Jato, por Luis Nassif

Um tempo atrás, em um evento em Tiradentes organizado pelo saudoso Audálio Dantas, uma mesa discutiu a cobertura da mídia para a Lava Jato. Quando critiquei, uma colega desafiou: “O que você faria se estivesse em um jornal?”.

A resposta era simples: Jornalismo! Deixar de ser mero publicador de releases da Lava Jato e passar a fazer jornalismo.

Nos artigos sobre Otávio Frias Filho, quando morreu, havia várias menções ao seu incômodo com a atitude passiva da cobertura da Lava Jato.

O que significa fazer jornalismo? Primeiro, ir atrás de temas relegados pela Lava Jato. Como diz o bordão, notícia é tudo aquilo que não querem que seja divulgado.

Depois, proceder a duas checagens sistemáticas: a verossimilhança das narrativas da Lava Jato (especialmente dos valores da corrupção divulgados) e a fundamentação jurídica de suas ações.

Vamos a alguns casos recentes.

  1. O suposto superfaturamento do prédio da Petrobras em Salvador

Segundo matérias de ontem, o superfaturamento foi gigantesco. E a contrapartida foi uma propina de 0,75% do valor da obra ao ex-presidente da Petrus, o fundo de pensão dos petroleiros, que investiu no projeto.

Ora, o investidor avalia taxa interna de retorno dos investimentos. Ele não se imiscui em analises técnicas sobre o projeto. É evidente que a propina foi paga pela ajuda na adesão do Petrus ao projeto. Se houve superfaturamento, a leniência foi de outros departamentos.

Ora, diriam os idiotas da objetividade, é tudo propina. Ora, o papel da imprensa é apenas divulgar a denúncia ou zelar pela correção das informações?

É até possível que a Operação tenha os laudos estimando o mega-super-faturamento. Mas não foram divulgados. E, mesmo sendo divulgados, têm que ser submetidos à avaliação de especialistas independentes.

É só conferir o carnaval que a imprensa fez com o ajuste na contabilidade da Petrobras – visando adequá-lo ao novo cenário de preços de combustíveis. Um mero ajuste contábil, no valor de R$ 20 bilhões, foi apresentado como sendo o custo da corrupção na empresa.

  1. A última denúncia contra Lula

A Lava Jato de São Paulo denunciou Lula por um trabalho de lobby junto ao presidente da Guiné, em favor de uma empresa de engenharia brasileira. O fato teria ocorrido em 2011. Portanto, quando Lula não mais ocupava a presidência da República. Não envolveu recursos públicos brasileiros.

A Lava Jato se baseou em um item do Código Penal, que menciona corrupção de autoridades estrangeiras no exercício do cargo. Não há nenhum sinal de recursos envolvidos, de suborno. Lula se vale exclusivamente de seu prestígio pessoal. A empreiteira faz uma doação de R$ 1 milhão para outra pessoa física, o Instituto Lula – que tem contabilidade totalmente independente, não se misturando com as contas pessoais de Lula.

Não houve uma reportagem sequer dando voz a especialistas para questionar a legalidade da denúncia. Ainda mais sabendo-se que denúncias não são medidas neutras, mesmo que rejeitadas pelo Judiciário. São decisões com implicações políticas, que deixam vítimas pelo caminho.

  1. A legalidade relativa

As ameaças implícitas do governo Bolsonaro foram rechaçadas pela mídia. Nunca se pronunciou com tanta ênfase a palavra democracia, direitos humanos, liberdade de imprensa. Mas, ao mesmo tempo, a própria mídia continua praticando o direito penal do inimigo. Aos amigos, o respeito integral às leis e aos direitos. Aos inimigos, a punição sem direitos. E ainda se surpreendem com a ascensão do espírito Bolsonaro.

Nos últimos tempos, há uma corrida louca da grande mídia para recuperar a aparência de isenção, para conferir um mínimo de objetividade à cobertura, para garantir algum pluralismo nas matérias.

Mas são medidas paliativas porque falta o essencial: o respeito absoluto aos princípios, à impessoalidade do julgamento, aos direitos fundamentais.

 

Luis Nassif

7 Comentários

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  1. 1. Instituto Lula é uma

    1. Instituto Lula é uma pessoa jurídica, não física.
    2. A menção a Otavinho é um abuso aos que abandonaram o jornal — por não suportarem lê-lo — no período em que ele esteve absoluto no jornal, após a morte de seu pai. Otavinho cometeu todo o tipo de crime contra a informação, desde a invenção do mensalão como fato até a publicação da ficha falsa de Dilma. Perseguir Lula e o PT foi sua meta e aqueles que, de uma maneira ou outra, poderiam lhes apoiar, também sofreram, como o blogueiro dono desse blog e outros que foram sendo descartados e substituídos. 
    3. O O último item é cômico, talvez possa ser classificado como irônico ou cínico. Sua magestade eleita disse que vai acabar com o jornal. Mas o jornal faz editorial contra Haddad, afinal, ele e o PT não fizeram autocrítica e se penitenciaram em praça pública, pedindo perdão por ganhar eleições e ser o único partido político efetivo e real do país. O TSE finge que não vê e que não sabe como apurar o escâdalo do whatsup denunciado pela própria FSP. Mas o jornal esquece do assunto., não é importante. 

  2. Fatos

    Ainda que me engane, percebo que nenhum fato jornalístico traduz a realidade em si.

    O jornalismo sério, quando muito, traz uma versão mais aproximada dos fatos e o quanto possível isenta de tendências.

     

  3. A imprensa corporativa ainda

    A imprensa corporativa ainda não se livrou – se é que se livrará algum dia – do ranço antipetista. Nas matérias críticas contra o novo esquema de Poder não é raro fazerem o contraponto com o petismo. Isso é mais evidente nos analistas; em especial do sistema GLOBO. 

    Sobre a Lava a Jato: querem transformá-la em algo perene, tal qual a Constituição e o próprio Estado brasileiro. É bem possível que na sequência queiram intimar a ONU no sentido de incluí-como “patrimônio da Humanidade”.

    Há até alguns exagerados que pugnam para que seja produzido um documentário sobre a mesma para ser entregue a NASA que por sua vez a colocará numa nave para uma viagem Universo a dentro. Há possibilidade de ser resgatada por uma nave alienígena. Aí teremos a Lava a Jato na sua fase intergalática.

    Tremei ETs!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

  4. Leitura do mundo…

    Já era, fico irritado qdo recebo releases do campo da esquerda de toda a “grande” mídia, não leio, não voltarei a ler e já estou pegando bronca de quem lê. Acabou, a primeira lição desse tipo de “jornalismo” foi em 86 mas eleições estaduais, era ainda adolescente e lá decedi que jamais daria um centavo pelo estadão…  de lá pra cá a fila só foi engrossando, não sobrou nada. 

  5. “A Lava Jato de São Paulo

    “A Lava Jato de São Paulo denunciou Lula por um trabalho de lobby junto ao presidente da Guiné, em favor de uma empresa de engenharia brasileira”

    É crime! Empresa brasileira? O certo é fazer lobby em favor de empresa americana, e não esqueça de levar o boné “Trump 2020”

  6. KAFKA DOS TROPICOS

    Mas não são todos os ex presidentes do mundo que acabam trabalhando para promover negócios graças a seu prestigio de ex presidentes?

    Ora ora… o Lula não pode? Parece que nosso judiciário não quer ver e admitir que o Lula tinha sim muito prestigio lá fora e continuam ignorando suas palestras e suas laureas honoris causa… é de cortar o coração, é de ofender nossa inteligência e também o bom senso comum.

    É tão triste que as vezes tenho a vontade de desistir até de me indignar.

     

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