Especialistas criticam caráter punitivo do pacote anticrime de Moro

“Quem vai para a cadeia é o pequeno traficante. Isso não impacta o tráfico nem as organizações criminosas”, pondera professora de Direito Penal e Criminologia

Jornal GGN – Toda a produção carrega o DNA do seu autor. Especialistas em Direito convidados para debater o pacote anticrime (PL 882/2019), proposto pelo ministro da Justiça e Segurança, Sérgio Moro, na Câmara dos Deputados avaliam que o texto tem um caráter exageradamente punitivo.

“Essa lógica da intimidação geral, da eficácia repressiva, é muito boa para vender livro e se eleger, mas, concretamente, o aumento nominal das penas, por si só, desacompanhado de outras instâncias, não tem eficácia, não funciona”, ponderou o advogado e doutor em Direito Penal pela Universidade de São Paulo Alberto Zacharias Toron.

Assim como outros debatedores, ele criticou as mudanças como o aumento do tempo de encarceramento e limitação das possibilidades de liberdade condicional. Eles avaliam que essas medidas não tem efeito na redução da criminalidade, além disso, fragilizam os direitos e garantias individuais.

Toron também observou negativamente a possibilidade de ampliação do instituto da legítima defesa. “Ampliar o conceito de legítima defesa para abrigar situações de medo e violenta emoção é dar uma espécie de carta branca para que se possa matar”, refletiu.

O doutor em Direito Penal se refere especificamente do trecho do Projeto de Lei que permite que o réu que estiver respondendo pela morte ou agressão contra outra pessoa invoque a “violenta emoção” como legítima defesa. Segundo esse dispositivo do pacote anticrime de Moro, quando a ação criminosa ocorrer por conta de “medo, surpresa ou violenta emoção” o juiz poderá reduzir a pena pela metade ou até deixar de aplicá-la.

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O professor discordou ainda de outros dispositivos do PL, entre eles o que impõe limitações aos embargos infringentes (recurso cabível contra acórdão não unânime) e o que acaba com o efeito suspensivo do recurso da pronúncia (decisão que determina o julgamento por júri popular).
“O processo precisa ser eficiente, sim, porém a ideia de processo traz outra coisa cara à cidadania: o respeito às garantias do acusado.”

Do mesmo lado, a professora de Direito Penal e Criminologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Luciana Boiteux, analisou que, se for aprovado, o pacote anticrime vai contribuir no fortalecimento das organizações criminosas dos presídios, dado seu impacto no aumento da população encarcerada.

“Quem vai para a cadeia é o pequeno traficante. Isso não impacta o tráfico nem as organizações criminosas”, disse ao lembrar que o tráfico de drogas é considerado crime hediondo desde 1988.

Ela entende que a norma vigente não contribui efetivamente para a redução do tráfico de drogas no país ao não diferenciar claramente usuários de traficantes, juntamente com a falta de investigações dos setores da segurança pública para se chegar aos grandes traficantes.

O relator do grupo de trabalho na Câmara que analisa o pacote, deputado Capitão Augusto (PR-SP), defensor das medidas, destacou que a proposta não foca nos pequenos traficantes.

“Hoje uma pessoa é pega com uma tonelada de cocaína e não fica três anos encarcerada. Se houver um endurecimento [da pena], não será um desestímulo a esse tipo de crime?”, questionou.

Boiteux rebateu o parlamentar destacando que não existem “evidências que comprovem a relação entre o aumento da pena e a redução da criminalidade”, em toda a literatura sobre o tema, acrescentando que até nos Estados Unidos o aumento das punições está sendo reavaliado como estratégia para combater o tráfico de drogas e suas consequências nocivas à sociedade.

*Com informações da Agência Câmara

Redação

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  1. “Ao não consultar e nem sequer avisar a Paulo Guedes sobre a decisão de intervir na política de preços da Petrobrás para atender aos caminhoneiros, Bolsonaro deixou claro que o economista não é mais indemissível. Algo semelhante ocorreu com Sérgio Moro, herói popular do combate à corrupção, cujo pacote anticrime vaga pelos escaninhos do Congresso como um cão sem dono e a PF, sob suas ordens, agora serve de polícia particular ao STF.” – José Nêumanne

  2. O egoísmo, o jogo para a platéia, o jogo de cena, etc… São propriedades de quem tenta criar uma solução pensando unicamente nos louros que podem lhe levar as capas de revistas, as primeiras páginas dos jornais ou aos holofotes que fará refletir seus rostos nas telinhas de televisão. Imagino não haver nada que importe mais, do que a sua promoção pessoal. O resto, não deve vir ao caso. Então, parece que o julgador quer monopolizar tudo, até aquilo que não conhece que não é de sua alçada. Daí, o resultado não poderia ser outro: bate de frente com a realidade, que não perdoa amadores e muito menos sorberbos, ambiciosos e sem humildade.

  3. Argumentos bastante toscos. Então a solução para a criminalidade não é encarcerar? O encarceramento é como uma esponja que aos poucos absorve o líquido derramado. Mais criminosos na prisão = Menos criminosos nas ruas. Simples assim. Os EUA têm a maior população carcerária do planeta, embora tenham um índice de criminalidade bem inferior ao nosso. Se a população carcerária dos EUA fosse proporcionalmente equivalente à nossa, a criminalidade lá seria tão grande como aqui. E se a nossa população carcerária fosse proporcionalmente equivalente à dos EUA, a criminalidade aqui teria o mesmo tamanho que lá.

    Outro argumento capcioso é esse de que as medidas só vão pegar os peixes pequenos. É o vício da abordagem política ao fenômeno da criminalidade: supõe-se que se os chefões forem presos, todo o resto da organização vem abaixo. É falso. A organização criminosa tem uma dinâmica própria e descentralizada, se a cabeça é suprimida, logo outra cabeça surge para substituí-la, como a hidra. O crime não pode ser combatido pelo topo, mas apenas pela base, bandido a bandido, como a já citada esponja que absorve o líquido derramado.

    O argumento que achei pertinente foi o do aumento do poder das organizações criminosos, à medida em que os presídios ficam lotados. Mas as organizações criminosas só dominam presídios quando existe uma superlotação com um número grande de detentos que não podem ser monitorados por poucos guardas presidiários. Portanto, o endurecimento das penalidades só será uma solução se for acompanhado da construção de mais prisões e o aumento do número de guardas. Se não for assim, será o caos.

    1. A seguinte frase: Se a população carcerária dos EUA fosse proporcionalmente equivalente à nossa, a criminalidade lá seria tão grande como aqui.
      O cerne da defesa do encarceramento em massa, é produto de qual estudo científico? Ou é mero acho que!

    2. Onde há mais criminosos, num país que mais encarcera ou num país que menos encarcera?

      Há mais criminosos no Canadá, por exemplo, que encarcera menos do que o Brasil, ou no Brasil, que encarcera mais do que o Canadá?

      Porque o índice de criminalidade é muito mais baixo no Canadá do que no Brasil, por exemplo?

      É que lá a sociedade é muitíssimo menos desigualitária do que no Bananistão.

      1. O Canadá encarcera menos que os EUA porque a criminalidade lá é menor que nos EUA. Mas as leis de lá são severas, sim. Seu argumento é um sofisma: você quis dizer, tomamos remédio quando estamos doentes, ENTÂO é o remédio que causa a doença.

        Porque a criminalidade no Canadá é inferior à dos EUA e à nossa, isso decorre de muitos fatores complexos. É simplismo afirmar que tudo está relacionado à desigualdade social. Há muitos países no mundo tão pobres e desiguais quanto o Brasil, mas que têm um nível de criminalidade muito inferior – por exemplo, a Índia e vários países árabes. Na verdade, é tudo parte de uma síndrome mais ampla – a desigualdade social é característica de países pobres, e países pobres também não têm muito recurso para investir em segurança.

        Mas se as causas do crime são variadas e complexas, a solução é uma só e simples: encarcerar.

        1. É simplismo afirmar que tudo está relacionado à desigualdade social mas não é simplismo afirmar que o índice de criminalidade no Brasil está relacionado à pequena quantidade de encarceramento?

          1. Não. Conforme eu expliquei acima, a equação é simples.

            Os bandidos existem em número N, independente da legislação penal.

            Então, Mais bandidos na cadeia = Menos bandidos nas ruas

        2. Sabe-se que, cessando as causas, cessam os efeitos. O Pedro Mundim afirma que as causas dos crimes são variadas e complexas mas a solução é uma só e simples: o encarceramento. Por outro lado, sabe-se que o encarceramento é (e deveria ser) efeito da prática de crimes. Em sendo assim, como pode o encarceramento, o qual é um efeito da prática de delitos, fazer cessar as causas variadas e complexas da criminalidade?

          Sacou, Mundo?

          1. O encarceramento não faz cessar as causas, mas combate as consequências. A água não anula a causa do incêndio, mas apaga o fogo.

            Fazer cessar as causas para cessar as consequências pressupõe que temos conhecimento e controle sobre todas as causas. É um raciocínio cartesiano. Para o combate ao crime, é uma quimera. O crime não tem solução cartesiana, pois as causas são múltiplas, complexas e em geral incontroláveis. Por conseguinte, o crime nunca pode ser extinto, mas apenas reduzido a níveis razoáveis.

    3. O Canadá encarcera menos do que os EUA. Pela lógica Pedromundiniana, a taxa de criminalidade dos EUA deveria ser menor do que a taxa de criminalidade do Canadá. Mas não é. O que deu errado com sua teoria, Mundim?

      “Teoria é quando se sabe tudo e nada funciona. Prática é quando tudo funciona e ninguém sabe o porquê. Na mente do Pedro Mundim, conjugam-se teoria e prática: nada funciona e ele não sabe porque”.

      1. Isso é um raciocínio sofismático. O Canadá encarcera menos porque tem menos crimes. Não tem menos crimes porque encarcera menos. Você quis dizer: tomamos remédio quando estamos doentes, ENTÃO o remédio é a causa da doença.

        Mas as leis no Canadá são severas, sim, como em todo o Reino Unido. Veja o caso do Japão: tem criminalidade baixíssima, mas tem pena de morte. Agora pergunto eu: é a pena de morte que faz o Japão ter criminalidade tão baixa?

        1. O Canadá encarcera menos porque tem menos crimes, já o Brasil tem mais crimes porque encarcera menos. Os tipos de efeito do encarceramento dependem do país?

  4. Então o Canadá encarcera menos porque tem menos crimes mas o Brasil tem mais crimes porque encarcera menos. É isso mesmo?

    Se o Canadá encarcerasse mais, o índice de criminalidade do referido país seria ainda mais reduzido? Ou não?

    O Pedro Mundim afirma que as causas da criminalidade são variadas e complexas. Pois bem. Sabe-se que, cessando as causas, cessam os efeitos. Sabe-se, por outro lado, que o encarceramento é ( e deveria ser ) conseqüência da prática de crimes. Em sendo assim, como se pode combater as causas da criminalidade promovendo o encarceramento, que é o efeito da prática de crimes?

    O Pedro Mundim acha que é simplismo afirmar que o índice de criminalidade está relacionado à desigualdade social mas não acha simplismo afirmar que a solução para se combater a criminalidade é apenas o encarceramento.

    O Brasil é muito mais desigualitário do que a Índia, pois se o PIB da Índia fosse dividido igualitariamente pela sua população, ainda haveria pobres e miseráveis. Já se o PIB do Brasil fosse dividido igualitariamente pela sua população, poderia até haver pobres, mas não haveria miseráveis.

  5. Eu presto atenção no que eles dizem mas não dizem nada:

    O Mundim diz e logo em seguida se desdiz:

    “Mas se as causas do crime são variadas e complexas, a solução é só uma e simples: encarcerar”. – Pedro Mun8dim

    “O endurecimento das penalidades só será uma solução se for acompanhado da construção de mais prisões e o aumento do número de guardas. Se não for assim, será o caos”. – Pedro Mundim

    Inicialmente a solução era única e simplista: bastava encarcerar. Logo adiante, a solução deixa de ser única, pois além de encarcerar, tem também que se endurecer as penas.

  6. Eu presto atenção no que eles dizem mas eles não dizem nada:

    O Mundim afirma e logo em seguida nega o que afirmou, achando que está reforçando, e não anulando o que disse:

    “Mas se as causas do crime são variadas e complexas, a solução é só uma e simples: encarcerar”. – Pedro Mundim

    “O endurecimento das penalidades só será uma solução se for acompanhado da construção de mais prisões e o aumento do número de guardas. Se não for assim, será o caos”. – Pedro Mundim

    Inicialmente a solução era única e simplista: bastava encarcerar. Logo adiante, a solução deixa de ser única, pois além de encarcerar, tem também que se endurecer as penas.

  7. Se o encarceramento não faz cessar as causas da criminalidade, mas combate as suas consequências, e se a água não anula a causa do incêndio, mas apaga o fogo, então se tu fores vítima de uma infecção por germes patogênicos de última geração e se um dos sintomas dessa infecção dor a febre, tu ingeres apenas anti-térmicos, sem se preocupar de tomar qualquer medicamento contra a infecção. Depois tu vens nos contar o resultado. Talkei?

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