FMI pede desculpas por ter imposto o neoliberalismo por três décadas

Aliança pelo Brasil

FMI pede desculpas por ter imposto o neoliberalismo por três décadas

por J. Carlos de Assis

Depois de mais de três décadas nos ensinando as virtualidades do neoliberalismo, e em muitos casos nos impondo as políticas econômicas correspondentes (Consenso de Washington), o FMI acaba de publicar em revista oficial estudo de três economistas de seus quadros sustentando que a agenda neoliberal elevou a desigualdade onde foi adotada, e não promoveu o desenvolvimento. Não sei se fico indignado, ou se aplaudo esse reconhecimento tardio daquilo que, para nós, era óbvio: o neoliberalismo promove desemprego e miséria.

Para não dizer que não falei de flores, registro os meus cumprimentos pelo trabalho de Jonathan D. Ostry, Prakash Loungani e Davide Furceri. Claro, não tenho a menor dúvida de que será desqualificado pelo ministro da Fazenda alemão, que comanda as cavalarias de ataque a qualquer tentativa de busca de alternativa ao neoliberalismo no mundo, sobretudo na Europa do euro. De qualquer modo, como se dizia entre os marxistas históricos, temos que explorar as contradições internas do inimigo!

Os economistas do Fundo, na versão que li do jornal carioca “Monitor Mercantil” – duvido que os jornalões brasileiros e a grande mídia divulguem o documento -, afirmam que “as políticas de austeridade, que frequentemente reduzem o tamanho do Estado, geram custos sociais substanciais, prejudicam a demanda e aprofundam o desemprego”. É importante assinalar que tais políticas são idênticas àquelas com que Henrique Meirelles nos ameaça de forma a acabar de estrangular a economia brasileira.

Contudo, não consigo apagar completamente as chamas da indignação. É revoltante que uma entidade multilateral dominada pelos países ricos passe três décadas e meia nos dizendo que é necessário cortar gastos públicos, fazer equilíbrio fiscal, privatizar, fazer políticas monetárias restritivas, e condicionando seus empréstimos a cumprirmos a risca esse receituário, surge de repente, sem maior aviso, para nos dizer: “desculpem-me, vocês fizeram tudo certinho (haja vista a política econômica do PT), mas estávamos errados. Mudem o foco”!

O fato é que, pelo histórico do FMI, não dá para acreditar na eficácia de documentos desse tipo como orientador de políticas. O estudo é uma manifestação marginal que será devidamente contestada dentro e fora do Fundo. Terá o mesmo destino de certas manifestações anteriores aparentemente progressistas, como a aceitação do controle de fluxo de capitais para evitar abalos financeiros das economias, e que simplesmente jamais foram incorporadas ao centro do receituário tradicional do Fundo.

Mesmo na hipótese de uma “vitória” intelectual nessa questão, não devemos alimentar qualquer ilusão. O neoliberalismo, como é também o caso das “ortodoxias” econômicas em geral, não está na esfera do conhecimento, mas na esfera do poder. A doutrina não é imposta a nós porque é mais “correta”, mas torna-se compulsoriamente “correta” pela relação de poder determinada pela grande mídia, totalmente dominada pelo capitalismo financeiro com suas práticas de agiotagem.

* * *

Acabo de assistir na tevê manifestação de um membro do TCU sustentando a ilegalidade de aporte de recursos do Tesouro para os bancos públicos, notadamente o BNDES. É inacreditável o nível de despreparo, de arrogância e de imbecilidade que está prevalecendo no setor público “concursado”. Contabilmente, a operação não gera dívida pública líquida: cria-se um passivo no Tesouro e ativo correspondente no BNDES. Funcionalmente, é a forma mais inteligente, tipicamente keynesiana, de reverter a recessão ou depressão. Foi o que aconteceu em 2009 e 2010. A dar espaço para esses burocratas partidarizados, vamos abrir mão de todos os instrumentos de reversão da depressão e do desemprego no país.

J. Carlos de Assis – Economista, professor, doutor pela Coppe/UFRJ.

Redação

18 Comentários

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    1. Já coloquei o link no 

      Já coloquei o link no  comentario acima, trata-se de um paper de pesquisadores que nada tem a ver com a direção do FMI.

  1. http://www.imf.org/external/p

    http://www.imf.org/external/pubs/ft/fandd/2016/06/ostry.htm

    Simplesmente não é esse o tom do paper. Ele pede um balanceamento entre o tamanho do Estado e o tamanho do mercado, algo perfeitamente defensavel por economistas sensatos. É um paper para DISCUSSÃO na linha de MILHARES

    de papers desse tipo que o IMF publica desde que existe. Não é e nem poderia ser um PEDIDO DE DESCULPAS  da Direção do Fundo mesmo porque os tres autores são “researchers”, pesquisadores de economia do Fundo e não AUTORIDADES do Fundo, o paper deles não é uma manifestação do Fundo , é apenas um paper para discussão sem a minima importancia a não ser como material de debate. O Fundo só fala pela Diretora-Geral.

    Os Bancos Centrais do mundo, inclusive o nosso, publicam mensalmente WORKING PAPERS, papeis para debate,

    o nosso BC ainda faz pior, publica a maioria de seus papers só em inglês, já fiz aqui um post contra isso.

    Como sempre é preciso cautela quando se menciona um paper da ONU, da OEA, da OECD, do Banco Mundial, aqui mesmo já chamei  a atenção que um relatorio de um dos mais de 220 organismos da ONU não é UMA POSIÇÃO DA ONU, que só é expressa pelo Secretario Geral e pelo Conselho de Segurança e não pelo “”relator” de qualquer coisa.

  2. Palhaços, sabiam o que

    Palhaços, sabiam o que estavam fazendo, aumentando a concentração de renda, é só pra isso que essa josta serve, desculpas o…………

  3. FMI

    As possíveis desculpas do FMI, me parecem as desculpas da Globo sobre o apoio a Ditadura. Pouco tempo depois , com todas as suas forças, apoiam novo golpe.                                                                                                                                                         Sobre os concursados, não podemos esquecer, que são filhos de pais de classe média, bem criados, estudando em bons colégios,com tempo para estudar e passar em concursos. A geração depois da minha, infelizmente, pensa diferente da anterior, simplesmente porque esta teve um tipo de vida bem mais difícil, não com tantas facilidades,nem oportunidades.            A classe média dos anos 50 era bem diferente da classe média de hoje, Melhorou? Do ponto de vista economico sim, mas do ponto de vista político, piorou.

    1. 30 anos

      Qualquer pessoa que tenha interesse por economia, como é o meu caso, sabe disso hà muitos anos.

      E não precisa ser muito intelegente, so precisa ser intelectualmente honesto.

      Isso explica tudo. Eles não o são. 

      Quantas vidas sacrificadas inutilmente.

      Para que serve  desculpas  agora, se continuamos massacrados e manipulados pelo PIG

  4. Pedir desculpas? Quantos

    Pedir desculpas? Quantos países o FMI arruínou com suas políticas neoliberais malditas? Quantas vidas essa gente destruiu? Quantos país de família foram levados ao desespero por causa da “genialidade” dos técnicos do FMI? 

    Esse pedido de desculpa me fede a tremenda hipocrisia. Tudo que vem do FMI tem cheiro de sacanagem. Ponto final. Pra mim esse documento é mais uma vacina do FMI contra seus críticos, mas duvido que seus dirigentes o levem a sério. Todavia, esfregarão na cara dos seus contestadores.

    Se existice jutiça verdadeira o FMI deveria ser julgado pela Corte Penal Internacional por genocídio e crimes contra a humanidade e as penas deveriam ser idênticas aquelas aplicadas à maioria dos culpados em Nuremberg. Fim de papo.

     

  5. A cereja do bolo é o cara
    A cereja do bolo é o cara arrematar com esse papo de “dívida líquida”. Como se os 500bi no BNDES não precisassem ser rolados e não gerassem despesas bilionárias de juros ao Tesouro, tal qual o restante da dívida….

  6. Para compreender o
    Para compreender o neoliberalismo além dos clichêsPOR GEORGE MONBIOThttp://outraspalavras.net/posts/para-compreender-o-neoliberalismo-alem-dos-cliches/

  7. Neoliberalismo
    Pior é os adeptos do Deus mercado ainda teimarem que ele não existe e que neoliberalismo (UE, não disseram que não existia?!) é social democracia (não a golpista do PSDB, a européia)

  8. Hipócritas do FMI

    Eles sempre souberam que essas políticas neoliberais empobreceriam os povos do mundo.  Mas, elas sempre funcionaram muito bem para os ‘investidores’ pois abriram oportunidades para eles nos países que se submeteram a elas…

    Agora, quando o grande capital está interessado em uma estratégia diferente, mais lucrativa, o FMI aparece com essa ‘revelação’ de que o neoliberalismo ‘aumentou as desigualdades’!  Que hipocrisia!

    Por que eles não dizem abertamente que o sistema está falido, que agora é um ‘deus nos acuda!’ e o negócio é apropriar-se dos recursos naturais do mundo a qualquer custo?

    Ora, há algum tempo, a estratégia dos ‘investidores’ imperialistas tem sido apelar abertamente para o neocolonialismo, isto é, interferências, revoluções coloridas, ocupação de países sem uma classe dominante nacionalista e sem adequado arsenal de defesa…  Só desconhece o que está acontecendo no mundo aquele que não acompanha as notícias na mídia alternativa, onde tudo está sendo registrado.

    O que está ocorrendo aqui no Brasil hoje, por exemplo, é exatamente isso – neocolonialismo, interferência ‘vinda de fora’! –, embora as ditas ‘medidas de austeridade’ estejam sendo tidas como resultado do neoliberalismo atrasado que o governo interino implantou no país.  Entretanto, essas medidas são muito piores do que as conhecidas ‘medidas de austeridade’ – são pura e simplesmente medidas neocoloniais adotadas em estados ocupados.  O Brasil está voltando a ser colônia…

    A situação política no Brasil é muito séria, e os líderes populares precisam mobilizar o povo imediatamente para que uma postura definitiva, massiva contra o golpe se imponha.  Não há tempo a perder, pois ainda podemos reverter o processo.
     

  9. Há males que vem para bem: após recessão vem o crescimento

     

    José Carlos de Assis,

    A recessão que enfrentamos depois de 2015 é um dos fatores do impeachment e o impeachment é irremediável, mas há outros males que podem vir para o bem. A recessão econômica que a presidenta Dilma Rousseff causou como uma forma de enfrentar a desvalorização necessária para corrigir o déficit em conta corrente acabou sendo maior do que o que se previa, mas, com a ajuda da desvalorização, resolveu o problema do déficit e preparou o Brasil para o relançamento econômico via aumento das exportações. É torcer para que o governo fruto do golpe não deixa a moeda brasileira voltar a valorizar.

    Na Folha de S. Paulo de quinta-feira, 02/06/2016, a Laura Carvalho no artigo “É preciso muita fé” faz menção ao artigo – “Neoliberalism: Oversold?” dos autores que você mencionou: Jonathan D. Ostry, Prakash Loungani e Davide Furceri. O artigo de Laura Carvalkho virou o post “Quando a economia é guiada pela fé e não pelas evidências, por Laura Carvalho” de quinta-feira, 02/06/2016 às 10:27, aqui no blog de Luis Nassif.

    Você, semelhantemente a ela, não dá o link para o artigo dos técnicos do FMI. Pensei em colocar aqui como também iria colocar lá no post “Quando a economia é guiada pela fé e não pelas evidências, por Laura Carvalho”. Felizmente o Andre Araujo em comentário que atualmente encabeça este post e enviado sexta-feira, 03/06/2016 às 21:31, já se encarregou desta tarefa. E ele faz uma crítica correta diminuindo a importância do artigo, não só porque o artigo apenas expõe um balanceamento do que é e do que não é recomendável em matéria de política econômica e em que circunstâncias às políticas seriam ou não recomendáveis como também porque não se trata de uma opinião oficial do FMI.

    E considero correta a crítica de Andre Araujo ao seu texto porque a opinião oficial do FMI só se manifesta quando o organismo internacional impõe requisitos a países pobres para emprestar o seu dinheiro. E ai não importa o que os técnicos do FMI digam ou escrevam, quando se trata de emprestar dinheiro, o FMI vai impor regras duras que são muito próximas das regras do liberalismo. Dai que o melhor que se pode fazer é em vez de pedir dinheiro emprestado ao FMI, emprestar dinheiro ao fundo. Felizmente esse é mais o caso do Brasil atual que goza de uma situação bem diferente dos tempos em que o país ia com a língua de fora e o pires na mão pedir dinheiro ao FMI.

    Mesmo sem ser economista e mesmo o admirando bastante, eu ainda sou tentado a trazer um ou outro argumento mais crítico ao seu texto. No entanto vou preferir reproduzir um comentário em relação ao qual eu já fiz três tentativas de o enviar para junto do post “Quando a economia é guiada pela fé e não pelas evidências, por Laura Carvalho”. O meu comentário lá já é um comentário dentro de outro e que aqui com mais este comentário passam a compor três comentários. E na minha terceira tentativa, o comentário que pretendia enviar lá para o post “Quando a economia é guiada pela fé e não pelas evidências, por Laura Carvalho” é o seguinte (Deixei para enviar esse comentário hoje e vejo que a minha terceira tentativa verificada hoje sábado, 04/06/2016 às 00:05 lá foi finalmente aceita):

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    “Jornal GGN,

    O comentário a seguir foi enviado hoje, quinta-feira, 02/06/2016 por volta das 13:32 para você mesmo junto ao post “PIB brasileiro encerra o primeiro trimestre com queda de 0,3%” de quarta-feira, 01/06/2016 às 11:16, e que pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/noticia/pib-brasileiro-encerra-primeiro-trimestre-com-queda-de-03

    E o que eu disse lá foi o seguinte:

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    “Jornal GGN,

    Não tinha muito mais a dizer aqui neste post “PIB brasileiro encerra o primeiro trimestre com queda de 0,3%” de quarta-feira, 01/06/2016 às 11:16, no entanto, dada a escassez de boas notícias e de certo modo de bons posts resolvi acrescentar aqui a indicação de dois links e vou para isso utilizar este comentário.

    O primeiro link é para o post “Queda do PIB em relação a 2015 chega a 5,4%” de quarta-feira, 01/06/2016 às 17:10, publicado aqui no blog de Luis Nassif e sem autoria a não ser de você mesmo, Jornal GGN. O endereço do post “Queda do PIB em relação a 2015 chega a 5,4%” é:

    https://jornalggn.com.br/noticia/queda-do-pib-em-relacao-a-2015-chega-a-54

    Felizmente ninguém se deixou embarcar na cantilena e catilinária que se faz contra o governo da presidenta Dilma Rousseff com base nos negativos dados do PIB. Como eu alertei em comentário lá para o post “Queda do PIB em relação a 2015 chega a 5,4%” e que eu enviei quinta-feira, 02/06/2016 às 02:26, trata-se de um retrato do passado em que se deve analisar com mais atenção o que ocorreu para saber se houve falhas, e se houve quais foram elas, para, se possível, saber como as remediar ou saber como evitar de as cometer novamente.

    E o segundo link é para o post “Quando a economia é guiada pela fé e não pelas evidências, por Laura Carvalho” de quinta, 02/06/2016 às 10:27, com a transcrição do artigo de Laura Carvalho “É preciso muita fé” publicado hoje, quinta-feira, 02/06/2016 na Folha de S. Paulo. O endereço do post “Quando a economia é guiada pela fé e não pelas evidências, por Laura Carvalho” é:

    (Aqui nessa reprodução vou eliminar o link) [Mas nessa nova reprodução eu vou voltar com o endereço que é o seguinte]:

    https://jornalggn.com.br/noticia/quando-a-economia-e-guiada-pela-fe-e-nao-pelas-evidencias-por-laura-carvalho

    Embora o post não trata propriamente da questão do PIB, a Laura Carvalho, sempre com bons escritos, criticando as idéias anacrônicas do neoliberalismo, de certo modo passa ao largo do processo de recuperação da economia brasileira que se iniciou com suporte no câmbio desvalorizado e que deve ter continuidade salvo uma ação mais imprevisível do FED produzindo um aumento do juro que volte a atingir a nossa economia [A redução da abertura de novas vagas de trabalho nos Estados Unidos no mês de maio e informada ontem é um bom sinal para a economia brasileira, pois vai impedir que o FED venha aumentar o juro].

    Nem deveria dizer que a Laura Carvalho passa ao largo do processo de recuperação. Ela parece não acreditar que essa recuperação possa ocorrer. De certo modo, levantar a crítica correta, mas aplicar essa crítica de modo indevido, parece-me muito frequente nos artigos dela.

    Sobre isso talvez eu devesse mencionar um terceiro link. Não tão recente como o artigo anterior dela (Isto é, o artigo deste post “Quando a economia é guiada pela fé e não pelas evidências, por Laura Carvalho”), vale então indicar aqui um ótimo artigo dela falando dos monstros que aparecem quando se tem um processo recessivo, sendo esses monstros representados pelo crescimento da direita, principalmente da direita fascista. Trata-se do artigo “O mar está para monstros” publicado na Folha de S. Paulo de quinta-feira, 28/04/2016, e que foi transformado no post “Recessão alimenta a criação de monstros da intolerância, por Laura Carvalho” de quinta-feira, 28/04/2016 às 14:39, aqui no blog de Luis Nassif e que pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/noticia/recessao-alimenta-a-criacao-de-monstros-da-intolerancia-por-laura-carvalho

    Pelo artigo se observa que ela noticia algo já quantificado estatisticamente que é o crescimento da direita com a recessão, e, ao dar divulgação aos estudos que comprovam esse crescimento, o artigo é salutar. O problema é que ela atribui o crescimento da direita no Brasil apenas à recessão que o Brasil sofreu a partir do segundo governo da presidenta Dilma Rousseff. Ora o crescimento da direita está sendo quantificado no mundo desde que se iniciou a recessão em 2008 e é medida estatisticamente em todos os períodos recessivos estejam eles espraiados pelo mundo ou localizados em um ou outro país.

    E o mais importante é que o Congresso Nacional que está produzindo o impeachment da presidenta Dilma Rousseff foi eleito antes da recessão. O Congresso apoia o impeachment porque vê suporte na sociedade e esse suporte decorreu em muito do quadro recessivo, mas o apoio do Congresso é fruto da formação de direita dos nossos deputados e senadores.

    E a formação de direita dos nossos deputados e senadores tem duas origens, uma é o quadro recessivo mundial que afetou a economia brasileira e com isso foram eleitos mais deputados e senadores de direita e o outro é grande desigualdade de renda no país que favorece a eleição de representantes da classe privilegiada que só não age em defesa da própria classe quando por circunstâncias é eleito um ou outro representante com espírito mais altruísta e de solidariedade. Então em um ótimo artigo, mas que também deixa a desejar, a Laura Carvalho desconsidera essas duas origens antecedentes ao segundo governo da presidenta Dilma Rousseff e que foram fundamentais para a aprovação do impeachment da presidenta.”

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    Bem é isso. No artigo “É preciso muita fé” a Laura Carvalho utiliza de uma crítica correta ao neoliberalismo que embora recente era conhecida há muito tempo. O neoliberalismo prosperou mais pela retórica, salvo na quebra da capacidade de arregimentação da classe trabalhadora, pois um dos grandes representantes do neoliberalismo e que foi o Ronald Reagan foi um dos responsáveis pelos maiores déficits públicos em tempos de paz dos Estados Unidos, ou seja, Ronald Reagan não teria nada de neoliberalismo. Então é até uma perda de tempo criticar o que não existe de fato, mas apenas no palavreado. A não ser mostrar especificamente os resultados nefastos de algumas políticas que foram adotadas pelo neoliberalismo e postas em prática como a quebra dos grandes sindicatos que aumentou a desigualdade de renda.

    E então ao prevê que a aplicação do neoliberalismo na economia brasileira não trará resultados ela esquece que a aplicação do neoliberalismo em muito será uma questão de retórica e de outro quando a economia recupera pelo lado das exportações, a redução do consumo interno não é economicamente de todo ruim. É verdade que a redução do consumo reforça a desigualdade, entretanto, a desigualdade pode ser combatida por outros meios. No entanto, o que deve ser enfatizado em relação ao crescimento puxado pelo comércio exterior é que o setor industrial vai ser o grande beneficiado e com ele o setor trabalhador.

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    Ali por volta de 93 ou 92, G. Henrique de Barroso F. escreveu um artigo na Folha de S. Paulo apresentando as dez regras do neoliberalismo. Lembro de ter feito uma crítica bem extensa ao meu feitio, ou seja, um tanto confusa e difusa e principalmente repetitiva, mas observando que esses defeitos da minha crítica também podem ser atribuídos a certa repetição das ideias neoliberais que remontam ao século XIX, ou até antes, mas que foram fundamentalmente desmentidas com os ensinamentos de Adolph Wagner que deve ter formulado a que ficou conhecida como lei de Wagner no final do século XIX.

    Há pouco sobre Adolph Wagner e a sua lei na internet brasileira. Na Wikipedia em português no verbete Adolph Wagner, que viveu de 25/031835 a 08/11/1917, há o seguinte esclarecimento sobre a Lei de Wagner:

    “[A Lei] sugere que o estado de bem-estar social evolui do capitalismo de livre mercado”

    O entendimento seria que o estado de bem-estar social é uma evolução natural do sistema capitalista de livre mercado.

    No livreto “A Lower Tax Future? – The Economic Role of the State in the 21st Century” de autoria de Vito Tanzi, publicado em 2004, e que durante muito tempo esteve disponível em tradução no site da Receita Federal, Vito Tanzi diz o seguinte sobre Adolph Wagner e a sua lei (pág 11):

    “Also the current role must not be interpreted as putting a floor on public spending as seems to be implied by Wagner’s Law of the growth of the public sector. Wagner’s Law states that as per capita income grows so must the level of public spending as a share of the country’s gross domestic product.” (Cuja tradução segundo o Google tradutor é a seguinte: Além disso, o papel atual não deve ser interpretado como a colocação de um piso para os gastos públicos, como parece estar implícita pela Lei de Wagner do crescimento do setor público. A lei de Wagner afirma que assim que a renda per capita cresce também cresce o nível de despesa pública em percentagem do produto interno bruto do país.)

    E Vito Tanzi faz o seguinte acréscimo em nota de rodapé

    “Adolph Wagner, a German economist, advanced this theory at the beginning of the last  century. That theory would imply that, if in the future the per capita income of a country keeps growing, the current level of public spending is always a floor. As an undersecretary in the Ministry of Economy and Finance in the Italian government, I repeatedly heard the comment that structural reforms could not be made without additional resources.” (Adolph Wagner, um economista alemão, avançou esta teoria no início do século passado. Essa teoria implicaria que, se no futuro, a renda per capita de um país continua a crescer, o nível atual da despesa pública é sempre um piso. Como subsecretário no Ministério da Economia e Finanças do governo italiano, ouvi várias vezes o comentário de que as reformas estruturais não poderiam ser feitas sem recursos adicionais.)

    Para os que tiverem interesse, o endereço do livreto “A Lower Tax Future? – The Economic Role of the State in the 21st Century” é:

    http://www1.worldbank.org/publicsector/pe/PEAMMarcp005/TanziReference.pdf

    O Vito Tanzi é um tanto comedido em expor a Lei de Wagner quando diz que os gastos públicos teriam um piso. O mais certo seria dizer que os gastos públicos aproximam do teto de 100% do PIB à medida que a renda per capita se eleva. Então os que combatem o aumento dos gastos públicos têm uma luta inglória.

    Antigamente eu indicava, com a referência de data, dois editoriais reproduzidos no jornal Gazeta Mercantil, com questionamento sobre os efeitos do neoliberalismo. O primeiro da revista The Economist apareceu logo no início da década de 90 e reclamava que dez anos após a prática de políticas neoliberais, os gastos públicos nas nações mais desenvolvidas haviam crescido de 1% saindo de algo em torno de 35% para algo em torno de 36%. Uns cinco anos mais tarde foi a vez do jornal Financial Times fazer um discurso parecido informando que nos últimos cinco anos os gastos públicos tinham aumentado de 0,5%, indo para 36,5%.

    Penso então que centrar fogo agora no neoliberalismo é chutar cachorro morto. Ou talvez ainda seja pior. Pode ser que a crítica dos técnicos do FMI tenha um efeito diferente do que muitos imaginam, ou melhor, talvez a crítica não seja realmente uma crítica, mas mais uma espécie de armadilha. Afinal se as nações emergentes forem estimuladas a aumentar seus gastos, elas podem ajudar a relançar a economia dos países mais ricos cuja demanda anda bastante estagnada. No fundo os gastos dos países pobres vão estimular via importação a economia dos países ricos.

    Esse desconsideração por amarras que rodeiam os países pobres, parece-me ser um problema que está ocorrendo com os nossos melhores economistas, principalmente porque eles esquecem de levar em conta as circunstâncias para fazer a crítica ao neoliberalismo. Embora sempre tenha buscado elogiar os seus artigos avalio que você em 2015, ao centrar fogo na política econômica da presidenta Dilma Rousseff, prestou até um desserviço ao país à medida em que não buscou analisar aquelas situações em que medidas de restrição nos gastos são mais adequadas que medidas de aumento dos gastos públicos. Diante de uma desvalorização inevitável, talvez para não deixar a inflação sair do controle, era melhor que o governo fizesse uma contenção de gastos.

    Aqueles que defendem o aumento dos gastos públicos não precisam ficar preocupados porque no longo prazo os gastos vão sempre aumentar. Esses defensores dos gastos públicos, e entre eles eu me incluo e incluo você, deveriam preocupar-se mais em criar mecanismos para que o aumento dos gastos públicos tenha aporte de receita. E devem buscar entender também porque há situações que um maior controle dos gastos públicos não produz tantos malefícios como se os apregoa.

    Clever Mendes de Oliveira

    BH, 04/06/2016

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