“O carnaval de 1940 sem Carmen Miranda” por Ruy Castro

” Ao circular em trajes civis pelo salão do Versailles, antes de entrar em cena, Carmen ouviu um “psiu” vindo de uma mesa. Era o poeta carioca Augusto Frederico Schmidt, desgarrado no inverno de Nova York e talvez arrependido de um dia ter cantado num poema os “mármores gelados, rosas frias, Cristos de gelo”. Schmidt não fora ao Versailles pela comida. Fora para ver Carmen, para sentir o calor brasileiro. Mas, naquela noite de fevereiro, ela também estava com frio na alma. 

Abraçaram-se e Carmen desabafou: 

“Hoje é sábado de Carnaval no Rio, Schmidt. Como tudo aqui é cacete e enjoado diante da lembrança de nossa cidade na folia. Estou sufocada, não sei nem como vou enfrentar o público.” 

Carmen não se conformava com que os americanos passassem os três dias de Carnaval como passavam os outros 362 – tensos, contidos, reprimidos. Então fez o melhor possível: cantou tudo de que se lembrou e promoveu um Carnaval pessoal para ela, para o Bando da Lua e para Schmidt no palco do Versailles. E torceu para que o show, irradiado pela NBC e captado pelos rádios dos carros, ajudasse a esquentar a temperatura lá fora, de dez ou doze graus abaixo de zero. 

No Rio, o Carnaval de 1940 também tinha seu motivo de luto: era o primeiro sem Carmen em dez anos – o primeiro desde “Taí”, de 1930, em que ela não tinha um sucesso para defender. Mas as duas cantoras que deixara em seu lugar estavam indo muito bem, e eram responsáveis pelas maiores marchinhas do ano: Aracy de Almeida, com “Passarinho do relógio”, de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira, e Dircinha Batista, com “Upa-upa”, de Ary Barroso. Além dessas, o Carnaval pertencia à batucada “Cai, cai”, de Roberto Martins, com Joel e Gaúcho, e a dois supersambas, “Ó, seu Oscar”, de Ataulpho Alves e Wilson Batista, com Ciro Monteiro, e “Despedida de Mangueira”, de Benedito Lacerda e Aldo Cabral, com Francisco Alves. E, para certos momentos dos bailes, em que baixava uma agridoce lembrança de outros Carnavais, havia duas marchas-rancho, tão lindas quanto tristes: “Malmequer”, de Newton Teixeira e Cristovam de Alencar, com Orlando Silva, e a quase fúnebre “Dama das Camélias”, de Braguinha e Alcyr Pires Vermelho, também com Chico Alves. ” 

Fonte: Castro, Ruy, “Carmen, Uma biografia”, cap. 14 “1940 Silêncio na Urca”, p.237, Companhia das Letras: São Paulo, 2005.

 

vídeos:

1. Aracy de Almeida – O Passarinho do Relógio (Cuco) de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira (1939)

2. Dircinha Batista – Upa, Upa – Meu Trolinho de Ary Barroso (1940)

3. Joel & Gaúcho – Cai, cai (batucada – 1939) de Roberto Martins

4. Cyro Monteiro – Oh! Seu Oscar de Ataulpho Alves e Wilson Batista (1940) 

5.  Francisco Alves – Despedida da Mangueira de Benedito Lacerda e Aldo Cabral 

6.  Orlando Silva – Malmequer de Newton Teixeira e Cristovam de Alencar (1939) 

7. Francisco Alves – Dama das camélias de Braguinha e Alcyr Pires Vermelho (1939)

 

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http://www.youtube.com/watch?v=Jx3rORNc1U8]

http://www.youtube.com/watch?v=AWn5zsqvVvY]

http://www.youtube.com/watch?v=bbMEcQ1RrT4

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Redação

2 Comentários

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  1. Ficou uma belezura!

    Amigo Gilberto, viu como eu estava certa? Ficou ótimo, sem falar que aqui no blog é mais fácil localizar visando futuras consultas.

    Beijos.

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