“Ocupação” de Alcântara marca início do fim da soberania brasileira?

Para especialista, país ganha ao expandir a possibilidade de uso da sua base, que estava limitado ao lançamento de artefatos brasileiros

Foto: Agência Brasil

Do Sputinik Brasil

O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, está desde o último domingo em visita aos Estados Unidos, com o objetivo de aprofundar os laços bilaterais. Entre as metas mais concretas de sua viagem está o estabelecimento de um acordo para que os americanos utilizem a base brasileira de Alcântara, no Maranhão, medida que tem gerado notória polêmica.

Desde que desembarcou em Washington, Bolsonaro repetiu inúmeras vezes a forte admiração que sente pelos EUA e seu povo, algo que fazia questão de ressaltar desde o período de campanha eleitoral. Movido por uma agenda de alinhamento automático ao chamado hegemon, adotou o discurso norte-americano em relação à Venezuela, acabou com a necessidade de vistos para turistas dos Estados Unidos no Brasil, prometeu facilitar o ambiente de negócios para empresários do norte e fechou uma parceria que permitirá a empresas americanas realizar lançamentos ao espaço a partir do território brasileiro. Mas o que o Brasil ganhará de efetivo com isso?

De acordo com o engenheiro aeroespacial Oswaldo Loureda, professor da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA), o acordo referente ao uso da base de Alcântara representa um compromisso brasileiro de preservação e proteção de segredos e tecnologias norte-americanas que possam vir a entrar em território nacional, tanto na forma de satélites como de foguetes e plataformas, que sejam construídos integralmente por empresas norte-americanas ou que contenham partes ou subsistemas fabricados nos Estados Unidos. Ou seja, o documento dá aos EUA o direito de usar as instalações brasileiras sem que haja transferência de tecnologias para o Brasil.

“A menos que seja feito um outro acordo, é isso que o tratado prevê. Uma proteção. Que é algo natural, que é feito entre todos os países. Todos os países que possuem bases de lançamento operacionais no mundo, hoje, comerciais, assinam esse tipo de acordo, esse tipo de protocolo”, disse o especialista em entrevista à Sputnik Brasil.

Do ponto de vista brasileiro, Loureda explica que o país ganha ao expandir a possibilidade de uso da sua base, que estava limitado ao lançamento de artefatos brasileiros. Com o novo compromisso, o Brasil viabiliza negócios com várias nações, uma vez que “90% da tecnologia espacial” teria algum componente de fabricação norte-americana, segundo ele.

“Em geral, o acordo firmado com os Estados Unidos, digamos assim, traz uma liberdade muito maior para a gente negociar com outros países, que fariam, de certa forma, exigências similares.”

Para Loureda, ao contrário da primeira tentativa de acordo realizada no passado, o atual documento apresenta características técnicas mais elaboradas, com menos lacunas que poderiam ser interpretadas como algo de interesse político ou como “riscos” à soberania, opinião rebatida pelo cientista político Antonio Marcelo Jackson, professor do Departamento de Educação e Tecnologias da Universidade Federal de Ouro Preto.

Segundo Jackson, assim como foi na época do presidente Fernando Henrique Cardoso, a “cessão” de um domínio estratégico, como é a base de Alcântara, para uma potência estrangeira segue sendo um problema muito sério para a política brasileira. Ele acredita que, da mesma forma que ocorreu no passado, a tendência seria o Congresso Nacional vetar essa parceria com os EUA, que, mesmo com alguns ajustes, continua representando uma ameaça à soberania brasileira.

“O que esse acordo estaria dizendo é o seguinte: nós estamos abrindo mão da única coisa que temos. Isso é absurdo”, disse ele em declarações à Sputnik. “É inacreditável o que tentou fazer Fernando Henrique e o que está tentando fazer Jair Bolsonaro”, acrescentou. “É prejudicial porque envolve uma coisa muito séria. Disse e repito: uma parte do domínio espacial envolve ter uma boa localização para lançamento de foguete, e nós temos. Nós não vamos abrir mão então da única coisa que temos. Isso é incompreensível.”

Redação

6 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Sem transferência de tecnologia não tem que ceder nada.

    Aliás, e a investigação da sabotagem na explosão do VLS em 2003? E por que a empresa criada em conjunto com a Ucrânia em 2003 foi fechada em 2018 sem que tenha atingido seus objetivos?

  2. Os EUA vão lançar foguetes em Alcântara ou vai abrir uma fábrica? Não entendi como esse acordo pode gerar negócios com outros países se o Brasil não poderá nem entrar na área reservada aos EUA. Segundo eu li, trata-se de um aluguel, logo só geraria a renda do aluguel.
    Alguém aí pode explicar melhor?

  3. Leigo em estratégia ou economia aeroespaciais, pergunto qual seria a diferença entre lançar satélites de Alcântara ou de uma base no território dos EUA.
    Afinal, não são lançados no sentido vertical até entrar em órbita?
    Quanto a economia, desprezando o “aluguel” (pífio), não haveriam para os americanos custos altíssimos com deslocamento e manutenção de técnicos, cientistas, soldados, CIA, etc?
    E tem um grande perigo, ou já “esquecemos” a tragédia ocorrida com nossos cientistas espaciais, que sepultou nossas expectativas de avanço soberano na área?

  4. Índia, Ucrânia, China, EUA, Russia, França,…Os países usam suas Bases com sua Tecnologia. Qual a Tecnologia que desenvolvemos? FHC já tentara privatizar Território Nacional o transformando em Território NorteAmericano. Nem o Presidente poderia ir até lá sem autorização estrangeira. Ou já nos esquecemos do medíocre FHC? Congresso Nacional e Forças Armadas não embarcaram na imbecilidade. Toda Equipe de Especialistas e Engenheiros de ITA, CTA, USP, Universidades Federais foram incinerados por estarem no lugar do Acionamento dos Foguetes, na hora do acidente. Mas é só coincidência. Não Somos a Pátria das Coincidências?! Alcântara, a partir dito, quase que totalmente abandonada. Mas tudo coincidência!!! Os NorteAmericanos nos mostraram o interesse de Parceria no episódio da compra dos Caças da FAB. Veremos a tal parceria na compra da EMBRAER e no aluguel de Alcântara. Não aprendemos nada com fatos de apenas dois anos atrás. Aliás, o Presidente fez um monte de concessões na visita a Washington/EUA. O que Ele trouxe para Nós Brasileiros? Uma Camiseta?!! Excelente esta parceria que se inicia. O Brasil entra com a bunda. E os NorteAmericanos com a botina.

  5. Tem gente falando que vai usar pra lançar mísseis na Venezuela… vocês têm noção da asneira que é essa afirmação, não se lança mísseis de posição fixa a não ser os balísticos intercontinentais nucleares ou os de médio alcance de países com arsenal nuclear mas não tão avançados como India, Coréia do Norte e outros. Já ouviram falar de um tal de tomahawk? O trabalho seria feito desde o Caribe por submarinos, navios de superfície e aviões.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador