Quem sabe o fim do foro privilegiado melhore os presídios, diz André Singer

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
[email protected]

Foto: Fernando Cavalcanti

Jornal GGN – Em artigo na Folha deste sábado (25), o cientista político André Singer apontou que o debate no Supremo Tribunal Federal sobre o fim do foro privilegiado, ironicamente, serviu para que a classe política seja confrontada com a precariedade do sistema carcerário brasileiro. Isso porque alguns já demonstram preocupação com a possibilidade de ser julgado e processado em primeira instância, com risco de terminar preso antes de esgotar todos os recursos.
 
“Até aqui, alguns poucos petistas e peemedebistas estrelados, mas sem mandato, foram parar nas ‘torres de Londres’ paranaense ou carioca. O PSDB até agora escapou. Se prevalecer o veredito que alcançou maioria no STF, talvez o tratamento se estenda ao conjunto da camada dirigente. Nesse caso, uma regra profunda da formação desta sociedade estará abalada e, quem sabe, até as prisões melhorem”, ironizou Singer.

 
 
Por André Singer
 
Mexer no foro abala o estamento
 
Na Folha
 
A maioria do Supremo Tribunal Federal (STF) mexeu no vespeiro ao propor a limitação do foro privilegiado. Expor centenas de parlamentares a julgamentos na primeira e segunda instâncias, com o seu eventual encarceramento, desloca pedra básica da construção estamental brasileira. Em revanche, no prazo decorrente do estranho pedido de vista de Dias Toffoli, a Câmara pode até ampliar a perda de foro para áreas do Judiciário, o que potencializaria o escopo da mudança.
 
As regras que dão imunidade ao exercício da atividade pública visam a garantir a independência necessária seja para legislar, julgar ou governar. Desde esse ponto de vista, retirar garantias dos que fazem as leis, emitem sentenças ou administram o bem público pode sujeitá-los ao poder do dinheiro ou da força. Ocorre que, no Brasil (e não só aqui), as garantias acabaram por servir como proteção contra acusações de crimes comuns. Isso nada tem a ver com o sentido original do instituto, às vezes até o inverte, pois ajuda a manter nos cargos os que os exercem de maneira argentária.
 
A situação vai chegando a tal ponto que criminosos entram em pleitos eleitorais apenas para fugir da Justiça, o que perverte completamente o sentido do processo. Ao limitar o foro privilegiado apenas às infrações relacionadas ao próprio exercício do mandato, o STF faz um ajuste necessário à revalorização dos parlamentos e da democracia.
 
Mas o alcance da medida não para aí. Dada a profunda desigualdade tupiniquim, o sistema penitenciário, ao qual poderão ser lançados figurões no futuro, constitui um espectro assustador para a elite do poder. No famoso diálogo gravado entre o senador Romero Jucá (PMDB-RR) e o ex-senador Sergio Machado (PMDB-CE), o último chamava o cárcere de Curitiba, por exemplo, de “torre de Londres”, mesmo que as condições dos políticos presos sejam bem melhores do que as da maioria dos detentos.
 
Por alguns séculos, a famosa construção no centro da capital inglesa era o local para onde se enviavam os prisioneiros que perdiam as lutas intestinas da realeza. Acabou associada a local de torturas e execuções. A metáfora é reveladora, pois cair na prisão comum, desde o ângulo da oligarquia pátria, equivale a transitar do céu para o inferno.
 
Até aqui, alguns poucos petistas e peemedebistas estrelados, mas sem mandato, foram parar nas “torres de Londres” paranaense ou carioca. O PSDB até agora escapou. Se prevalecer o veredito que alcançou maioria no STF, talvez o tratamento se estenda ao conjunto da camada dirigente. Nesse caso, uma regra profunda da formação desta sociedade estará abalada e, quem sabe, até as prisões melhorem.
 
Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

4 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Presídios

    As prisões existentes não melhorarão, mas serão construidas algumas novas rigorosamente dentro dos padrões SBClass para abrigar as excelências do PMDB. Do PT, ficarão onde estão. Do PSDB, serão deportadas para as Maldivas, Bali, Florida, Fiji, por aí, com tudo pago, claro.

  2. quem…..

    A teoria é ainda mais impressionante vindo de intelectual tão ligado à esquerda tupiniquim e partidos formadores desta elite dos últimos 40 anos. Quer dizer que 4 décadas esquerdopatas, formadas numa redemocratização sob 30 anos de uma pseudo-Constituição Cidadã, não alteraram a realidade de presídios e a tortura imposta à periferia despejada nestes covis, mas o possível envio desta elite para as mesmas masmorras medievais, então dará visibilidade e possibilidade de enfim seres humanos não serem tratados como animais. Ou pior ainda? E os Defensores dos Direitos Humanos? E os Representantes tão socializantes e progressistas? E a Igreja Católica e suas Comissões Carcerárias? E os Órgãos de Governo? E OAB? E MP? E Poder Judiciário? E ‘Tortura Nunca Mais’? E a ONU? Descobrimos que nada fizeram em quase meio século? Mas contra-cheques e verbas públicas milionárias niunca faltaram, em ano algum neste período todo, não é mesmo? A mulher, a mãe, a avó, a filha, a irmã, a amiga (não importa a idade) do tal preso comum, chega de madrugada no Presídio ou dorme na sua porta. Fica horas até a permissão de entrada, depois passam nuas, por revista minuciosa, pulando de pernas abertas, revistadas com espelhinhos, agachadas ou “de quatro”. Agora que nossos Governos Progressistas, ‘combatentes  contra a Tortura’ é que descobrirão tamanha bárbarie? As Famílias dos presos merecem isto? NÃO !! Os familiares dos ‘novos’ presos da Política, passarão por isto? NUNCA !! E também não merecem tamanha humilhação. Mas não deixa de ser muito esclarecedor sobre a farsa de Estado que construimos pós-anistia de 1979. E a Imprensa neste Circo de Horrores durante este período todo?  O Brasil é de muito, mas muito, mas muito mesmo explicação. Tem mais o que se lamentar?

  3. Com uma esquerda dessas estamos fritos

    Esse senhor que se diz de esquerda saca do chapéu uma teoria maluca dessas e a Folha a publica muy alegremente. Enquanto isso o povo pobre da periferia toma tiro porrada e bomba.

    Fico me perguntando se essa esquerda universitária vive no mundo real, onde cadeia é pra preto, pobre e puta, ou se foi morar em algum planeta acadêmico onde qualquer bobagem que se publica pode ser acrescentada ao currículo Lattes.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador