Eliara Santana
Eliara Santana é doutora em Linguística e Língua Portuguesa, com foco em Análise do Discurso. Ela é pesquisadora associada CLE/UNICAMP, onde participa do projeto Pergunte a um/uma Cientista. É integrante do Observatório das Eleições. Desenvolve pesquisa sobre desinformação, desinfodemia e letramento midiático no Brasil.
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Foi Golpe, afinal!, por Eliara Santana

O ministro que mais aparecia no JN para falar bem do funcionamento das instituições e da Lava Jato, finalmente reconhece que pedalada fiscal foi uma historinha idiota inventada pelos grupos de poder

Fabio Rodrigues Pozzebom – Agência Brasil

Foi Golpe, afinal!, por Eliara Santana

Numa velocidade de dar inveja a Rubinho Barrichello, o presidente do TSE e ministro do STF, Luís Roberto Barroso, reconhece, afinal, que as tais “pedaladas fiscais” não foram mesmo o motivo do golpe, camuflado de impeachment, contra Dilma Rousseff em 2016. Agora que Inês é morta, que a Lava Jato se desintegrou, que Sergio Moro derrete, que o Brasil está afundando mais que a cratera do metrô em São Paulo, o representante do Iluminismo no Brasil, o ministro que mais aparecia no JN para falar bem do funcionamento das instituições e da Lava Jato, finalmente reconhece que pedalada fiscal foi uma historinha idiota inventada pelos grupos de poder – com a mídia e o judiciário integrando o núcleo fortemente – para tirar o PT do governo, não apenas Dilma.

Essa fala inédita e tão sincera de Barroso – por favor, vamos ignorar que ele podia ter dito isso há cinco anos, o que certamente livraria o Brasil de ter Jair, o incomível –, foi dita num artigo para a revista do Centro Brasileiro de Relações Internacionais, relatado hoje pela coluna de Mônica Bergamo na Folha de S. Paulo. Segundo Rubinho, digo, Barroso, de modo tão perspicaz, “a justificativa formal foram as denominadas pedaladas fiscais – violação de normas orçamentárias –, embora o motivo real tenha sido a perda de sustentação política”.

Ora, ora, ora… quer dizer então que houve um motivo inventado, que mobilizou Congresso, Judiciário, Mídia, patos amarelos, Fiesp, e um motivo “real” que não podia ser dito à época? É esse o entendimento? Tudo o que se armou à época, toda a construção jurídico-midiática, todas as encenações, tudo foi feito tendo como pano de fundo para o “impeachment” um motivo que não podia ser declarado abertamente? E então, outro foi rapidamente inventado?

E desde quando “falta de sustentação política” é motivo aceitável e claro e justificável do ponto de vista jurídico para um processo de impeachment? Parece-me que falta de sustentação ou de apoio político se resolve nas eleições – mas isso ocorre em países democráticos, não em república de bananas.

Dolorosamente, eu pesquisei esse período enquanto as coisas aconteciam. Dolorosamente, na elaboração da tese, eu via as estratégias sendo construídas – encenações de corrupção, falácia de crise econômica, patos amarelos na avenida com cobertura de TVs e rádios, dobradinha mídia-judiciário, e nada sendo contestado.

Por isso, eu acho um escárnio essa constatação, assim, como se corriqueira fosse – ah, na verdade, não houve pedalada fiscal, houve falta de sustentação política.

Houve, na verdade, um golpe na democracia porque havia um interesse quase cristalino em limar o PT do poder – mas isso não podia ser dito.

E esse golpe nos legou a desgraça do governo Bolsonaro. O golpe nos legou um esgarçamento social alarmante. O golpe nos legou um grupo ligado ao que existe de pior ocupando o poder e dando as cartas. O golpe nos legou um presidente que nega vacina às crianças. O golpe nos tirou os recursos do pré-sal. O golpe nos legou mais de 600 mil mortos numa pandemia que segue sem controle. O golpe nos legou a volta ao mapa da fome.

Em cinco anos, o Brasil afundou, se tornou chacota no mundo, amarga uma crise econômica e social gigantesca.

Era golpe. Nós avisamos.

Eliara Santana

Eliara Santana é doutora em Linguística e Língua Portuguesa, com foco em Análise do Discurso. Ela é pesquisadora associada CLE/UNICAMP, onde participa do projeto Pergunte a um/uma Cientista. É integrante do Observatório das Eleições. Desenvolve pesquisa sobre desinformação, desinfodemia e letramento midiático no Brasil.

7 Comentários

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  1. Foi golpe … com Supremo e tudo …
    O supremo é composto por um bando de covardes … uns mais, outros menos, mas todos covardes.
    Aceitaram a violação da Constituição ou por interesse ou por covardia, não a defenderam como haviam jurado que fariam.
    E quando uma testemunha falta com a verdade sobre juramento ela se torna uma criminosa …
    Então por analogia se sob juramento, os ministros do supremo, disseram que iriam defender a constituição e no final não fizeram prestaram falso juramento, portanto deduz-se que são criminosos.
    Viram ascender o Fascismo, as tentativas repetidas de golpe, mas por pura covardia nada fazem, a não ser enxugar gelo, passar a mão na cabeça do menino mal comportado.
    Agora estamos onde estamos, e tem uns ai, que apoiaram o Golpe de corpo e alma, tentando reescrever a história. Não conseguirão.

  2. 54,5 milhões de votos invalidados porque um punhado de filhos da puta não conseguem respeitar o princípio democrático ou acreditam que o apoio deles é mais importante do que o apoio popular numa eleição válida.

  3. Em se plantando, tudo dá.
    Diga ao povo que fico.
    Independência ou morte!
    Sigam-me os que forem brasileiros!
    Saio da vida para entrar na história.
    Às favas com os escrúpulos.
    Prefiro o cheiro dos meus cavalos.
    É dando que se recebe.
    Que país é este?
    Não me deixem só!
    Esqueçam o que escrevi.
    As instituições estão funcionando.
    COM O SUPREMO, COM TUDO!!!!

  4. O STF é cumplice de tudo que estamos vivendo: nas mais de 630 mil mortes por COVID, na volta da fome, do desemprego, do desespero e da miséria do país e da destruição do país, quando participou do golpe, seja por covardia, por omissão ou por interesse.
    As instituições está funcionando normalmente (é o que sempre dizem)… diga-se de passagem funcionando para aqueles que elas foram constituídas … para a elite brasileira … para a nata do serviço público … não para o povo em geral.

  5. Não, Barroso não está reconhecendo o Golpe!
    Barroso está “apenas” nos contando que o nosso sistema de governo é um parlamentarismo no qual os parlamentares não assumem a responsabilidade por suas decisões, que pautam o governo, mas não caem com o governo quando este falha.
    Está dizendo que o poder está com eles, parlamentares, e que, quando um presidente não tem o apoio do parlamento, apoio este conseguido seja por prestígio ou habilidade política, ou por estar pagando para ter esse apoio, o parlamento pode derrubá-lo por qualquer desculpa!
    Por outro lado, é um “parlamentarismo” que, se estiver acomodado com o presidente o deixa livre para cometer os maiores absurdos.
    Não é possível a esquerda continuar acreditando que pode governar de fato neste nosso presidencialismo fake!

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