Documentário é uma reportagem jornalística que se vale dos recursos da imagem mas, fundamentalmente, a serviço de um roteiro lógico. Vi muitos documentários em que os autores enfiam sucessão de imagens despregadas de um fio condutor, lembrando bastante as pirações dos anos 70, na qual autores – de música, documentários, artes – jogavam borrões na tela supondo estar fazendo vanguarda.
Em contraposição, os documentários de Petra Costa são uma aula não apenas de documentarismo, mas de jornalismo. “Democracia em Vertigem”, de 2019, foi indicado ao Oscar de Melhor Documentário, retratando a violência política cometida contra Lula.
Seu último documentário, longa-metragem, “Apocalipse nos Trópicos” – recém-lançado em São Paulo – é uma aula de jornalismo, na melhor linguagem de documentário, sobre o fenômeno do pentecostalismo. E com os temas devidamente divididos em capítulos, para ressaltar o conteúdo e dar sequência à história.
O personagem central é o histriônico Silas Malafaia, que se revela por inteiro, e é a liderança que emerge da teologia apocalíptica, que traz da ultradireita norte-americana a visão de que o mundo precisa ser destruído para, dos escombros, nascer o novo mundo.
O filme traz o alerta tenebroso do risco do país cair sob um regime teocrático. Mas não trata de modo preconceituoso a ascensão do evangelismo nem o próprio Malafaia – cujo histrionismo fala por si próprio. Mostra dados históricos relevantes, o papel da geopolítica norte-americana no apoio a esses grupos, como contraposição ao papel da teologia da libertação católica. Mostra que os evangélicos entregam o que prometem: amparo espiritual e apoio material aos mais desvalidos, conquistando as periferias das grandes cidades e o povo oprimido com pitadas de religião, auto-ajuda e apoio material.
Depois, envereda pela teologia apocalíptica, presente em diversas vertentes do protestantismo e que está na raiz do ativismo político de alas dos evangélicos lideradas por Silas Malafaia (o documentário é anterior à ascensão do fenômeno Pablo Marçal). . Acreditam em um mundo à beira do colapso, cuja salvação estará em uma intervenção divina. Este é o mote para conquistar crentes e eleitores e pavimentar a conquista do poder político.
O documentário mostra a aliança com Bolsonaro, a fé cega movendo multidões para a vizinhança dos quartéis e aponta os riscos de uma teocracia no Brasil. E tem uma entrevista com Lula, avalizando a eficiência do discurso religioso na política.
Assim como em “Democracia em Vertigem”, o fio condutor é a narração da própria Petra, cuja voz doce, atravessando os turbilhões políticos mostrados pelo documentário, é uma espécie de âncora na racionalidade.
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Max Weber já havia percebido A ética protestante e o “espírito” do capitaliamo.
Sempre me vem à mente a imagem de um pastor, em 1963, segurando com força e balançando a cabeça de uma suposta endemoniada, numa via paulistana, movimentadíssima, captada por Geraldo Sarno, dentro do projeto Caravana Farkas.
Em 34 anos de advocacia, coleciono causos envolvendo religiosos.
Advoguei durante décadas num processo com mais de 40 operários contra a empresa de um rabino. A resistência heróica dele ao processo foi quebrada quando empreguei uma tática de efeito retardado. Primeiro penhorei 10% do faturamento da empresa. Depois esperei pacientemente um ano, período em que ele fez depósitos irrisórios no processo. Findo o prazo de um ano, requeri Perícia contábil para apurar se o valor depositado correspondia ao valor penhorado. O perito apurou que ele tinha que ter depositado um valor substancialmente maior. Requeri ao juiz que determinasse ao depositório (o próprio rabino) que depositasse o valor total sob pena de prisão. Ele só depositou o valor devido quando a prisão dele foi decretada. Depois ele negociou o pagamento do restante em parcelas.
Advoguei contra um pai de santo que ficava fazendo sinais curiosos na mesa durante a audiência. Ele perdeu o processo porque o advogado havia cometido um erro técnico. Mais adiante, apesar de ter arquitetado um desfalque no sindicato de cuja diretoria foi expulso através de uma assembléia em que supostamente não teve direito de defesa, ele contratou um advogado que ajuizou o processo adequadamente e ganhou a ação anulatória da referida assembléia. Curiosamente o advogado dele morreu a tiros dias depois da audiência por causa de uma disputa com o caseiro do sítio dele.
Certa feita processei criminalmente um pastor protestante. Com raiva da ex-esposa, ele enviou uma carta para o Banco em que ela trabalhava dizendo que tinha provas da desonestidade dela. Minha cliente já havia sido investigada e inocentada pelo Banco quando de um desfalque, mas o ex-marido dela disse na carta que tinha provas de que ela tinha se apropriado do dinheiro respectivo. A mentira era tão evidente e asquerosa, que minha cliente resolveu processá-lo criminalmente. No dia da audiência ele só faltou ajoelhar para pedir perdão. Ele admitiu que tinha mentido na carta e que estava com raiva dela por causa da separação, etc… Minha cliente perdoou o cabra. Só no dia da audiência fiquei sabendo que já o conhecia. Eu o defendi quando ele era menor de idade e militante do PT. O futuro pastor havia sido preso por causa de um ato político contra a construção de um viaduto em Osasco. Dentro da delegacia, fui obrigado a dar um totó na canela dele para ele parar de chorar com medo dos policiais.
O último caso ocorreu com um padre católico. Ele foi arrolado como testemunha da empresa no processo trabalhista do meu cliente. Ao prestar depoimento, o padre mentiu descaradamente. Ele disse ter visto meu cliente receber dinheiro diretamente do dono da obra como se fosse autônomo. No momento oportuno, apertei o padre até ele confessar que o requerido (o dono da pequena construtura) frequentava a Igreja dele e havia sido contratado para fazer obras de restauração na mesma. Quanto ao pagamento que disse ter presenciado, ele afirmou que viu o dono da outra obra (aquela em que meu cliente havia trabalhado como ajudante) colocar o dinheiro num andaime na frente do dono da pequena construtura. E afirmou que não sabia se o meu cliente era ou não empregado contratatado ou autônomo. Meu cliente ganhou o processo.
O ponto que une essas três história é o seguinte: não importa a religião do cabra, se for sovina, desonesto ou mentiroso ele será fazer algo errado ou ilícito obrigando a Justiça a punir sua conduta ou se arrepender a tempo para não ser punido. Religiões são excelentes instrumentos políticos, mas dificilmente elas conseguem fazer as pessoas se tornarem melhores do que elas são.
O ponto que une essas três história é o seguinte: não importa a religião do cabra, se for sovina, desonesto ou mentiroso e fazer algo errado ou ilícito a Justiça será obrigada a punir sua conduta ou ele terá que se arrepender a tempo para não ser punido. Religiões são excelentes instrumentos políticos, mas dificilmente elas conseguem fazer as pessoas se tornarem melhores do que elas são.
Sob o império dos especuladores financeiros, que implantaram no Brasil a USUROCRACIA, os teocratas brasileiros vão adotar o deus mercado como sua ´principal divindade.