Não é que ele não aceitará o resultado. Ele não aceitará as eleições, por Hugo Souza

O bloco do autogolpe de Jair Bolsonaro está na rua faz tempo. Nos últimos dias, em escalada acelerada, clarificaram-se dois pontos sobre ele: um sobre seu itinerário, outro acerca de sua composição.

Paragominas – PA, 28/04/2022: cerimônia de regularização fundiária (Foto: Alan Santos/PR).

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Não é que ele não aceitará o resultado. Ele não aceitará as eleições

por Hugo Souza

O bloco do autogolpe de Jair Bolsonaro está na rua faz tempo. Nos últimos dias, em escalada acelerada, clarificaram-se dois pontos sobre ele: um sobre seu itinerário, outro acerca de sua composição.

Muito se fala da possibilidade de Jair Bolsonaro não aceitar o resultado das eleições deste ano, seguindo a cartilha de Donald Trump. Nesta quinta-feira, 5, na laive, Bolsonaro escancarou o que os menos distraídos já sacaram faz tempo: Bolsonaro não vai esperar a realização das eleições para tentar um autogolpe.

“Deixo claro, adianto ao TSE, essa auditoria não vai ser feita após as eleições”, disse Bolsonaro na laive desta quinta, após anunciar que seu partido, o PL, vai contratar uma empresa para fazer uma auditoria privada nas urnas eletrônicas, com a intenção de deixar o TSE “numa situação bastante complicada”.

Sobre esta nuance do autogolpe anunciado, os sinais já estão na praça também: do aviso de Braga Netto, em meados de 2021, de que não haveria eleições em 2022 sem voto impresso até Bolsonaro, em janeiro, dando de ombros para a tragédia das chuvas na Bahia, em atitude incompatível com quem precisa ganhar votos no Nordeste.

De modo que, primeiro, vão-se desfazendo as ilusões de que a escalada autogolpista não passa de uma sucessão de bravatas; depois, acorda-se para o fato de que o autogolpe pode vir – e provavelmente virá – antes de outubro.

“[A empresa] pode daqui a 30, 40 dias, chegar à conclusão que, dada a documentação que tem na mão, dado o que já foi feito até o momento para melhor termos eleições livres de qualquer suspeita de ingerência externa, pode falar que é impossível auditar e não aceitar fazer o trabalho. Olha a que ponto podemos chegar”, disse Bolsonaro horas atrás.

Por fim, o formidável enterro da última quimera: se havia alguma dúvida, ainda que injustificável, de que o alto comando das Forças Armadas está embarcado no autogolpismo de Bolsonaro, o general Paulo Sérgio Noronha, ministro da Defesa, adianta-se agora mesmo para dirimí-las.

A ríspida, selvática exortação feita por Paulo Sergio nesta quinta ao TSE, para divulgação da mais nova leva de pegadinhas sobre as urnas eletrônicas encaminhadas pelos militares ao tribunal, foi o ápice (pelo menos até agora) de um tumulto premeditado que o ministro vem causando nos últimos dias em Brasília.

O tumulto de Paulo Sergio inclui uma reunião cercada de névoa com Luiz Fux, uma nota curta e “dúbia” da Defesa sobre esta reunião e, horas antes da reunião e da nota, uma reunião na Defesa com Bolsonaro, Braga Netto, os comandantes das três forças, o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas e com um general improvável de se ver num encontro de cúpula: Guido Amin Naves, chefe do Departamento de Ciência e Tecnologia do Exército (DCT).

Sobre as urnas eletrônicas, o general Guido Amin Naves já afirmou numa entrevista ao jornal Valor que elas são vulneráveis a ataques. Ao general Guido responde o general Heber Garcia Portella, o homem enfiado por Bolsonaro e Braga Netto do “Comitê de Transparência das Eleições” irresponsavelmente inventado por Luis Roberto Barroso, para lamber coturnos.

Dúbio é o velho novo sentado de pé numa pedra de pau que, calado, dizia: “eram quatro os três poetas, Jacó e Jeremias”.

Bolsonaro, Braga Netto, Paulo Sergio et milicada têm sido muito explícitos.

E para 2 de julho, logo depois da possível auditoria privada das urnas anunciada para “daqui a 30, 40 dias” , acontecerá um grande encontro de atiradores na frente da Catedral de Brasília, uma das três unidades da federação onde os CACs (Colecionadores, Atiradores e Caçadores) já podem requisitar o porte de arma de fogo.

O “meu exército”, portanto, são pelo menos dois.

Já o caminho de Bolsonaro em 2022 é um só. Está traçado, escancarado e já está sendo ostensivamente percorrido, ao som dos violinos de Titanic dos “setores responsáveis deste país”. O ministro da Defesa, até anteontem comandante do Exército, entrou de coturno no jogo, por mais que em trajes civis. O alto comando das Forças Armadas, com seu chefe do Departamento de Ciência e Tecnologia a tiracolo, também.

Falta mais o quê?

Hugo Souza é jornalista.

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Redação

3 Comentários

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  1. Somente agora, consegui entender o por que me perguntaram antes de me filiar ao movimento de combate da ditadura, “Por que militares usam óculos marrom escuros”?
    A resposta é simples, “Para não comerem a farda verde”.

  2. E os banqueiros, dizem o que disso? Não sãos generais que mandam; são eles, covardes por que acoitados atrás das fardas dos milicos, mas quem realmente mandam.

  3. Pode ser que os militares na foto estejam registrando o momento em que o presidente da república permitiu que tirassem uma self, com ele. Também pode ser que seja para indicarem que ele é o preferido e que estão politicamente com o presidente.
    Porém, o fato é que não importa a razão do acontecido porque não irá apagar das fardas, dos escudos e dos brasões das instituições militares, todos os covardes e constantes destemperos que algumas altas patentes praticam conscientemente contra a democracia, contra a constituição, contra o Poder Judiciário, contra o estado de direito e contra a República Federativa do Brasil.
    Então, e sob o olhar complacente do Estado Maior das Forças Armadas, o vexame, as desobediências ao regulamento e a constituição agrava e envergonha cada vez mais a degradação do país, por conta das rebeldias, das desobediências e das infrações que rotineiramente algumas das altas autoridades que as representam praticam sem se preocuparem com a hierarquia e com o péssimo exemplo de comportamento e respeito. Então, pelo visto, só nos resta pensar parecer que o conceito intimidatório de disputa de cargos, usado pela horda miliciana, já conquistou cadeiras nos altos escalões dos poderes institucionais.

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