MP do acordo de leniência reafirma papel do TCU

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
[email protected]

Por Rodrigo Pironti

No Conjur

Medida Provisória 703/15 reafirma competência dos Tribunais de Contas

Talvez um dos temas jurídicos mais relevantes do ano de 2016 tenha sido pautado ao apagar das luzes de 2015. Trata-se da Medida Provisória 703/15, publicada no Diário da União de 21 de dezembro de 2015, que altera substancialmente a Lei Anticorrupção em razão de nova regulamentação dos denominados Acordos de Leniência.

Argumentos técnicos sobre a inconstitucionalidade da referida Medida foram lançados e já tomam proporções políticas que talvez sejam impulsionadas pelo descrédito das últimas e recentes Medidas Provisórias editadas pelo Governo ou pela desacreditação política que paira sobre o Executivo Federal nos últimos anos.

Fato é: não parece aceitável qualquer dos argumentos lançados no sentido de desvirtuar o objetivo da Medida. Menos crível ainda parece a razão de tais apontamentos.

Neste sentido, a análise das duas únicas hipóteses que parecem passíveis de enfrentamento técnico e razoável são:

a) pela inconstitucionalidade, aquelas lançadas pelo ilustre Procurador do Ministério Público de Contas junto ao TCU, Julio Marcelo de Oliveira; e

b) pela constitucionalidade, aquelas lançadas pelo renomado Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos da Infraestrutura (Ibeji).

Nas duas hipóteses, os argumentos trazidos neste texto pretendem ser fiéis à Constituição e realizados sob o prisma dos controles internos, inseridos na MP como órgãos fundamentais nos acordos de leniência firmados.

A discussão se dá em razão do artigo 16, caput e parágrafo 14, da MP:

“Art. 16.  A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão, no âmbito de suas competências, por meio de seus órgãos de controle interno, de forma isolada ou em conjunto com o Ministério Público ou com a Advocacia Pública, celebrar acordo de leniência com as pessoas jurídicas responsáveis pela prática dos atos e pelos fatos investigados e previstos nesta Lei que colaborem efetivamente com as investigações e com o processo administrativo, de forma que dessa colaboração resulte: […]

§ 14.  O acordo de leniência depois de assinado será encaminhado ao respectivo Tribunal de Contas, que poderá, nos termos do inciso II do art. 71 da Constituição Federal, instaurar procedimento administrativo contra a pessoa jurídica celebrante, para apurar prejuízo ao erário, quando entender que o valor constante do acordo não atende o disposto no § 3o.”

O Procurador funda seus argumentos basicamente no seguinte aspecto: de que a MP é norma que tem “a pretensão de limitar a atuação do Tribunal de Contas da União apenas ao momento posterior à celebração dos acordos” e de que seria um “verdadeiro ato de violência contra o Tribunal de Contas da União e aberração jurídica o Poder Executivo pretender limitar a forma de agir do controle externo, que tem o poder-dever de fiscalizar o Poder Executivo”.

Já o Ibeji fundamenta sua análise sob o argumento de que “a correção da Lei Anticorrupção, ao afastar a instabilidade do modelo original do acordo de leniência, está em conformidade com as normas constitucionais, destacadamente com a segurança jurídica, com a promoção do desenvolvimento econômico e social e com a proteção do mercado nacional de infraestrutura.”

Frisando ainda que “as novas regras proporcionam, a um só tempo, o ressarcimento dos prejuízos decorrentes da conduta ilícita, a aplicação de sanções contra a pessoa jurídica e a continuidade da atividade empresarial sob um rigoroso programa de integridade.”

Me parece que a constitucionalidade da Medida, afora os argumentos já lançados, com os quais antecipo concordância ao Instituto, deve passar necessariamente pela seguinte análise: Existe independência constitucional dos controles internos e uma atividade de colaboração com a função exercida pelos Tribunais de Contas, ou haveria subordinação daqueles em relação a estes?

Na teoria, os Tribunais de Contas tendem a afirmar – reiteradamente – a autonomia dos controles internos, porém, ao que parece, essa autonomia é sempre dependente de um crivo sacramentador, legitimador, confirmador da atividade de controle interno, em uma vinculação que vai na contramão do texto constitucional. Vejamos.

Não se discute que os Tribunais de Contas são órgãos dotados de autonomia constitucional, independentes e aos olhos da Constituição da República de 1988 sem qualquer vinculação ou subordinação a qualquer dos Poderes constituídos e com competências bem definidas em seu artigo 71; tendo ganhado o rótulo de “auxiliar” em razão da natureza fiscalizatória própria de sua função, complementar e não excludente daquela exercida pelo Poder Legislativo.

Os controles internos, por sua vez, possuem competência pautada pelos artigos 70 e 74 da Constituição e função auxiliar ao Tribunal de Contas em sua missão institucional, conforme expressamente manifesta o inciso V do artigo 74.

Ora, da mesma forma que a função auxiliar dos Tribunais de Contas não relativiza sua relevância, não poderia a mesma função amesquinhar as competências do controle interno ou subordiná-las ao crivo do controle externo, que concederia a “benção” ao ato praticado. Evidente que, na condição de colaboração, os controles internos permanecem independentes e autônomos e afirmam sua constitucionalidade na prática de atos anteriores aos dos Tribunais de Contas e em clara colaboração a estes. É exatamente o que o texto da Medida Provisória promove, uma afirmação absoluta das competências dos Tribunais de Contas e dos controles internos, em complementariedade e colaboração.

Essa racionalização proposta conduz à lógica de que o sistema de controle interno só ganha sentido constitucional na máxima cooperação com o controle externo. Resta claro da análise constitucional que o sistema de controle interno é o responsável direto pela condução e fiscalização ampla e meritória da gestão administrativa de determinado ente/entidade, auxiliando o controle externo no desempenho de suas funções e na tentativa de salvaguarda efetiva dos interesses e recursos públicos.

Veja que os acordos de leniência são atos administrativos legítimos e, como tais, possuem competência imediata determinada no seio do Poder Executivo, o que, por si só, legitimaria sua utilização. Mas a MP foi além e previu a participação do Ministério Público e da Advocacia Pública, em nítida demonstração de legitimação institucional e democrática do acordo celebrado. Entender de outra forma seria retirar – ou ao menos descreditar – a legitimação constitucional do Poder Executivo e do Ministério Público.

É dizer, não é dado ao controle externo utilizar-se de sua função constitucional para alocar os controles internos como “espectadores” das atividades decisivas de gestão e de atos administrativos que lhe são próprios e autônomos por natureza (como são os acordos de leniência). Há que se respeitar a liberdade técnica decisória dos controles internos.

Os acordos de leniência, direcionados “pelas mãos” dos controles internos e como instrumentos de modernização da Administração (já que promovem o desvendamento do ilícito pelo consenso), não podem submeter-se a argumentos anacrônicos tendentes a prejudicar sua implementação por práticas típicas do estamento burocrático brasileiro, tão bem versadas por Raymundo Faoro em sua obra “Donos do Poder”.

A constitucionalidade da Medida Provisória e dos acordos de leniência nela versados não está, como bem evidenciou o Ibeji, tão-somente em sua conformidade com as normas constitucionais e com os critérios de relevância e urgência, pautados na segurança jurídica, na promoção do desenvolvimento econômico e social e na proteção do mercado nacional de infraestrutura, mas, também, na autonomia constitucional dada aos controles internos e no seu papel auxiliar, independente e autônomo dos Tribunais de Contas.  

Dizia Raymundo Faoro que “a história do Brasil é um romance, sem heróis”. Façamos da versada constitucionalidade da MP mais uma página desse romance, composta não por um herói, mas por vários personagens que – em colaboração – conduzam ao seu melhor final.

1. Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:

II – julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público;

Rodrigo Pironti é doutor e mestre em Direito Econômico, professor de Direito Administrativo e Constitucional

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

6 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. a questão foi muito bem

    a questão foi muito bem colocada neste artigo.

    como vem demonstrando, no entanto, no período deste governo popular,

    o tcu tem uma evidente  má vontade política ontra o governo.

    esse estamento buracrático, tão bem exposto por faoro,

    parece que quer governar, mas não foi eleito pelo povo…

    agora deve, se continuar om suas decisões políticas,

    continuar a criar artravancamentos para o governo….

    espero que não…

  2. acho tudo perfeito. Se a cada

    acho tudo perfeito. Se a cada R$ 1 bi roubado o acordo trazer de volta R$10,00 para os cofres público, já é ganho. Além disso, a lei é para benenficiar tudo quando for corrupto e não apenas os petistas

  3. leniência só faz sentido se

    leniência só faz sentido se antes de qualquer investigação ou muita sem achar rnada,  o  criminos se entrega.  Um assasinado, por exemplo, que nada se consegui provar depois de 10 meses de investigação, se criminso se entrega e faz acordo pagando R$ 20,00  para ficar livre, é muito melhor do que ficar insolúvel para semrpe

  4. Não está certo

    Desde que a li pela primeira vez, esta MP 703/15, editada no apagar das luzes, me pareceu uma aberração.

    Não importa se ela foi editada visando destravar a cadeia de Óleo e Gás neste momento. Aliás, são nestes momentos que legislações casuísticas, para serem disfarçadas, trazem no seu ventre um monstro que afetará toda a vida nacional.

    Sempre foi assim, tenta-se resover o problema da hora sem se importar com suas consequências futuras.

    Ora, essa MP simplesmente afirma que, o poder contratante pode, em determinado momento, fazer um acordo de leniência ( tolerância ) com o contratado que não cumpriu o que foi objeto do contrato.

    Num país onde todos conhecem a seriedade e as boas intenções dos administradores públicos, isso é uma aberração.

    Imagino eu aqui, um “bem intencionado” prefeito negociando uma obra que não sairá do papel, apesar da contratada receber por ela. Diria ele ao contratado:

    “Não esquente a cabeça, você pega o dinheiro, não faz porra nenhuma e depois fizemos um acordo de leniência e está tudo certo”

    É mais que óbvio que o controle externo, os tribunais de contas, tem obrigação de participar destes “acordos”.

    No mais, como já coloquei anteriormente, existe decisão recente do STF que diz que, quem diz se um empresa é idônea ou inidônia, é o TCU. Nenhum poder público vai porder ele próprio, através de um acordo de leniência, garantir à empresa que ela não será decarada inidônea posteriormente, como prevê essa MP.

    http://www.conjur.com.br/2015-mai-21/tcu-declarar-empresas-inidonea-decide-plenario-supremo

  5. acontece que  o  TCU  so  tem

    acontece que  o  TCU  so  tem  a obrigaçao  de  cobrar  os  prejuizos que foram dados  ao  governo,  nao  cabe  a ele  invesrtigar nada, nao ´e  da  sua competencia. Sua  obrigaçao  é  ressarcir os  cofres  publicos . e  ao  poder  executivo  de solucionar os  problemas  com  os  acordos  de leniencia. o  que  pode  trazer  de  volta  milhares  de  empregos   e sub-empreitieros  de volta ao mercado. O maximo  que o  tcu  pode  fazer  é   apresentar seu  parecer  o  executivo  segue  se quizer. 

    O SR  Bonna  anda  falando  em  prejuizos  futuros. Ora  sr  Bonna  os prejuizos  ja  estao  ai  porque  a  lava  jato  todo  dia  deflagra uma nova operaçao  e   vai   adiando  as  coisas  e  nunca  chega a  lugar nenhum. Resultado  nós  vamos   ver  o  resultado  no futuro  se  nao  se  resolver isso  na  leniencia.,  

    Acontece  que  empresa  nao  ROUBA,  nao pratica  CORRUPÇAO, nao  sonega ,  quem o  faz  seus  seus  socios,  seus diretores-presidentes.  e  eles  sim  é  quem tem que  responder.porque entao  prejudicar  as  empresas  que  sao detentoras  de  um  vasto  conhecimento  e  tecnologia, e  que  estao  presente  no mundo todo. trazendo  divisas  para o  Brasil. e  é  justamente  isso que  esta incomodando os  EUA  que  resolveu  atraves dos  seus  lambe botas  como  Moro  Aecio  investir  contra  essas empresas  e  ate  contra o  nosso maior  fisico  nuclear  o  Almirante  Othon, Por que  fizeram  esse  ataque  ao  Almirante  se  ele nao tem  nada  a  ver  com  a Lava  jato? Poerque  querem aproveitar o  momento  que  o governo  est  sendo  atacado  como  responsavel  para  corrupçao na  Petrobras  para  destruir  o programa  nuclear  brasileiro e a construçao dos submarinos  em  estaleiro  nacional. é  isso  que  esta  incomodando  os  americanos  que  usam  de todos  os  meios  torpes  para  destruir  todo o  sistema  de progresso  alcançados  nesse  ultimos 12  anos. 

    Se  intere  mais  srt  Bonna  o  sernhor  nao  esta  falando  coisa com coisa,  parece  ate  um daqueles  fakes  DE  AECIO  entrando  em  tudo  e  dando  opnioes  que  nao faz o menor  sentido. 

     

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador