Campello apresenta o Brasil que ficou para trás após governos Lula-Dilma

Em entrevista exclusiva para Luis Nassif, ex-ministra do Desenvolvimento Social revela mudanças estruturais nos níveis de pobreza do país que agora são colocadas em risco

Trabalho revela mudanças estruturais nos níveis de pobreza no Brasil

Do Brasilianas

Utilizando a metodologia do Banco Mundial e dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a ex-ministra do Desenvolvimento Social, Tereza Campello, comprova que ocorreram mudanças estruturais, entre 2002 e 2015, que melhoraram a vida dos mais pobres no Brasil em diferentes níveis: renda, acesso a bens e serviços, educação, luz, água, saneamento básico e habitação digna. O trabalho é inédito e se debruça sobre o impacto das políticas de inclusão nos 5% e nos 20% mais pobres do país.

Em entrevista exclusiva concedida para o jornalista Luis Nassif antes do lançamento do trabalho “Faces da Desigualdade no Brasil – Um olhar sobre os que ficam para trás”, que acontece nesta segunda (27) na FGV do Rio de Janeiro, a economista que ajudou a coordenar o estudo apresenta os verdadeiros números da redução da pobreza e extrema pobreza no Brasil, e alerta que o congelamento dos gastos públicos nos próximos 20 anos, obtidos pelo atual governo federal com a PEC 55, e a possível reforma da Previdência estão desmobilizando todo o processo de evolução da curva que estava levando o país a igualar a oportunidade de acesso a serviços básicos para todos.

Números – Em 2002, somente 10,7% dos jovens entre 15 e 17 anos, no conjunto da população 5% mais pobre do Brasil, estavam cursando o ensino médio na idade certa. Em 2015, a porcentagem passou para 39%. Considerando então os 20% mais pobres do país, o salto foi de 16,3% para 43,4%. “A porcentagem ainda é baixa, só que era 10% e passou para 40% em treze anos. Isso é estrutural”, pondera Campello fazendo referência às críticas de que os governos Lula-Dilma somente melhoraram o poder de consumo dos mais pobres.

Continuando em educação, a pesquisadora observa que cresceu em 207% (de 5,7 milhões para 17,5 milhões) o número de chefes de famílias negras que concluíram o ensino fundamental. “Uma questão que já é conhecida na literatura médica é que, para salvar a vida de uma criança, é mais importante a mãe ter escolaridade do que a criança ter acesso a um médico. Claro que é melhor que tenha acesso aos dois, que é o que o Bolsa Família está viabilizando”, completa.

No mesmo período a presença de jovens negros nas universidades cresceu 268%. Em termos de infraestrutura, a água de qualidade chegou na residência de 10 milhões de famílias do Norte e Nordeste, o equivalente a uma Argentina, e o acesso à energia elétrica avançou 7 vezes mais rápido entre os 5% mais pobres.

Campello destaca que, entre 2002 e 2015, 24 milhões de famílias saíram da condição de não ter uma geladeira em casa. Entre os negros, esse número passou de 64 milhões para 107 milhões de pessoas.

“Não estamos falando de qualquer bem de consumo, mas de um bem essencial do ponto de vista de segurança alimentar. Quem não tem uma geladeira não consegue se organizar para comprar um alimento que possa ser dividido na semana”, reforça a economista.

O acesso a celulares também aumentou significativamente entre os 20% mais pobres de 8,7% em 2002 para 86,6% em 2015. “Não é só acesso à comunicação, internet e lazer, para quem é pobre é uma oportunidade de trabalho. Uma parte grande do pessoal que trabalha por contra própria não precisa mais de escritório, daquela portinha, agora ela usa o telefone para marcar um serviço”, explica.

Com base na metodologia do Banco Mundial Campello aponta que foi reduzido de 9,3% para 1% a população em situação de pobreza crônica multidimensional, ou seja, não apenas que vive com menos de 1,90 dólar por dia, mas também sem acesso aos diferentes serviços de políticas públicas. Esse índice foi maior do que a queda da pobreza de renda que no período passou de 9% para 3%.

“Foi a primeira vez que, em um país como o Brasil, isso aconteceu. Muitos países tiveram queda na pobreza de renda, mas quando você olha a pobreza multidimensional, não caiu tanto quanto aqui. Ou seja, junto com a melhoria de renda não teve melhoria da educação, da saúde, saneamento, acesso à água, saúde como teve no Brasil. Aqui conseguimos direcionar recursos públicos, benfeitorias, desenvolvimento, acesso à emprego e infraestrutura para um conjunto da população mas, principalmente, para os mais pobres”, destaca a ex-ministra.

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A partir desse percurso de combate à pobreza foi possível aumentar a porcentagem de negros, indígenas e quilombolas que tiveram melhoras nas condições de vida, portanto populações que, durante centenas de anos, foram as mais excluídas do processo de aprimoramento de renda e serviços públicos no Brasil.

E qual foi a estratégia de política aplicada entre 2002 e 2015 não realizada antes? Tereza mostra que foi criar uma equipe multiministerial para combater os vários níveis de desigualdade e sobrepor os mapas da desigualdade para direcionar as políticas que faltavam onde a população mais precisava.

“[No exemplo do Mais Médicos o Ministério da Saúde fez um mapa de onde estavam os equipamentos públicos de saúde que já estavam montados mas não tinham médicos. Jogamos em cima desse mapa onde estavam os mais pobres e foi nesses territórios que o programa começou a acontecer”, relembra.

Veja os números levantados no trabalho Faces da Desigualdade no Brasil – Um olhar sobre os que ficam para trás:

Educação

– Quatro vezes mais jovens de 15 a 17 anos, entre os 5% mais pobres, na escola na idade certa
– Presença de jovens negros na universidade cresceu 268%
– Chefes de famílias negras que concluem o ensino fundamental passa de 5,7 milhões para 17,5 milhões em 13 anos

Infraestrutura

– Água de qualidade chegou a quase 10 milhões de novas famílias do Norte e Nordeste – equivalente a quase uma Argentina
– Acesso à energia avançou 7 vezes mais rápido entre os 5% mais pobres

Habitação

– Número de famílias em domicílios precários baixou para 7,5%

Bens de consumo

– Ampliação de 24 milhões de novas geladeiras para quem não tinha. Entre os negros, passa de 64 milhões para 107 milhões os que vivem em lares com geladeiras
– Acesso a celulares entre os 20% mais pobres cresce de 8,7% em 2002 para 86,6% em 2015

 
Redação

4 Comentários

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  1. Infelizmente pelas

    Infelizmente pelas desonerações destrambelhadas havidas com DILMA  ..pelo corte e atraso que já se verificavam nos investimentos públicos e privados ..pela queda de arrecadação com estouro nas contas INTERNAS e EXTERNAS que já era uma dura realidade ..pelo endividamento crescente das empresas e famílias..

    .

    ..pelo artificialismo que se tinha no cambio, em muitas taxas, preços e tarifas públicas  ..pela SELIC deixada, de 14,5% aa, com taxa de risco ascendente  ..pela crise político institucional permanente..

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    ..devo  reconhecer que este balanço apresentado entre 2002-2015 esconde uma parcialidade que só o tempo irá clarear .. só após fechado o balanço dos efeitos do GOLPE é que, penso,  saberemos efetivamente o que foi de avanço estrutural ou foi devido a um sopro conjuntural

    .

    e triste é constatar que pra cada dia perdido com os golpistas no PODER (que ninguém se atreve a desafiar e remover) ..com a possibilidade crescente de que em 2018 NÃO haverá eleições, quanto menos cancelamento de alguns atos golpistas (ou, se houver, haverá alta probabilidade que o regime mude e que LULA fique de fora)  ..é triste constatar que muitos destes números estão mais pra euforias dum Cruzado, do que para uma reforma efetiva de base 

    1. Respeito muito as suas intervenções nesse espaço…

      …porém acredito que nem todas as críticas procedem (concordo com a parte das desonerações, foi algo infantil, mas isso só é visível para mim agora), com relação à “devo  reconhecer que este balanço apresentado entre 2002-2015 esconde uma parcialidade que só o tempo irá clarear” não podemos nos fiar a isso.

      Existe ainda na esquerda (algo que não mas exste em mim) uma espécie de positivismo que a cega, a ilusão de que quando falamos “educação” ou ainda “mais educação” fazemos eco junto aos nossos opositores que gritam “mais educação”, mas não é a palavra é a mesma, mas eles querem outra educação, ainda mais compartimentada e exclusivista, esses objetivos “realmente alcançados” não darão fruto (todo fruto, em partes ainda irá surgir algo daí) porque não será permitido sua consolidação na sociedade, o golpe ataca esses números porque quer atingir a realidade através deles.

      Fora os erros (em sua maioria estratégicos) alguns dispositivos forma criados.

  2. Achei muito interessante os dados

    Achei muito interessante os dados mostrados pela Campello que eu inclusive desconhecia, apesar de sempre ler e estar envolvido nas noticias e estudos político e sociais. 

    Muito bacana ver como ela é uma excelente técnica e gestora além de ter demonstrado a alta capacidade de coleta e análise de dados e de trabalho conjunto dos ministérios. Foi feito realmente um trabalho muito profissional, multidisciplinar e com conhecimento do tema. Como ela mesma disse, não foi só consumo. 

    Entretanto, é muito importantre salientar que tão importante quanto estes programas é sim a tributação às grandes fortunas, revisão do sistema tributário regressivo e a auditoria popular da dívida pública. Estas ações acelerariam a redução da desigualdade além de possibilitar orçamento perene ás políticas sociais. 

    Apenas o dinheiro não resolve a questão social. Como a própria ex ministra mostrou, é necessário capacidade técnica, gestão e conhecimento aliados ao dinheiro, mas um não anda sem o outro. Por isso estes pontos acima são tão importantes. 

    Eu, por exemplo, nem lembrava que a Dilma tentou tributar jatinho e lancha. Ainda assim, foi uma ação muito tímida, principalmente quando ela estava com a faca e o queijo na mão para aprovar a auditoria da dívida pública, mas ficou com medo dos bancos. 

    O que aconteceu ? A crise não melhorou, os bancos apoiaram o temer e ela levou o golpe do mesmo jeito.  Espero que seja lição aprendida. 

    Outra questão foi a dificuldade do PT durante os 13 anos em divulgar e tornar públicas estas informações atuando na luta discursiva. O que ficou na cabeça de todo mundo foram os 30 milhoes que sairam da pobreza por causa das politicas de transferencia de renda (bolsa familia). A mídia comercial ganhou essa discussão, apresentando esses resultado de forma simplista como se o governo tivesse apenas “dado o peixe sem ensinar a pescar.” 

    Portanto essa posição de boa parte da esquerda não está tão equivodaca assim. Inclusive, a questão educacional foi mostrada de forma muito interessante, mas poucas pessoas tem a dimensão destes dados. 

    É importante requalificar o discurso e as novas etapas de lutas. Que bom, muitas pessoas que não tinham acesso à geladeira, celular, educação fundamental, etc. passaram a ter. Excelente. Isso mudou a vida delas. 

    O que mais virá ?! Afinal, já foram 13 anos. E os outros problemas ?!

    Nesse ponto o governo não soube requalificar o discurso de uma nova revolução. Houve a revolução contra a fome. Maravilha ! As pessoas entendem e gostam do resultado contra a pobreza e miséria, mas qual será a próxima ?! 

    A Dilma tentou a pátria educadora, mas ficou sambada com o ajuste fiscal e o impeachment, demorou muito tempo para dar uma resposta à junho de 2013 e ficou na mão do congresso. Enfim, águas passadas. 

    Algo me diz que que essa nova revolução passa pela subjetividade do que a população em geral entende como país desenvolvido. 

    Acredito em duas frentes principais, sendo: qualidade da educação e transportes de massa.

    Na área educacional isso passa inevitavelmente pela melhoria dos dados educacionais nos testes internacionais, que são a principal forma de análise da população em geral para saber se a educação está melhorando ou não. São esses os dados que nos comparam a outros países e são mostrados nos jornais.  

    Outro ponto é a melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores urbanos, com o desenvolvimento e instalação de transporte de massa metroviário-ferroviário nas grandes regiões metropolitanas, reduzindo o tempo de deslocamento das pessoas, possibilitando o aumento do lazer, aumento da capacitação, acesso à bens públicos centralizados nas grande cidades, redução da ação das máfias do transporte na política local, e inclusive uma política de desenvolvimento industrial com compras públicas e desenvolvimento de projetos por empresas nacionais, saindo da mão das empresas automotivas. 

    Temos os bancos dos brics, as reservas e outras fontes de financiamento para tocar mega projetos nessas duas áreas.  

    Enfim, de técnico de futebol e presidente todo mundo tem um pouco. 

    Mais uma vez, parabens à Campello pelo trabalho. 

     

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