Mini-Reforma Política: “mais do mesmo”, por Pedro Cavalcante

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Mini-Reforma Política: “mais do mesmo”

por Pedro Cavalcante

Após um ano de debates no parlamento brasileiro, foi sancionada pelo Executivo a mini-reforma que passa a viger nas próximas eleições de 2018. Se o cenário das eleições presidenciais continua nebuloso, no âmbito do Legislativo, os efeitos dessa reforma política na representação podem ser sintetizadas pelo jargão “mais do mesmo”. 

Impulsionados pela necessidade de se ajustarem às restrições do fim do financiamento de pessoas jurídicas, os legisladores não conseguiram gerar consensos para efetivamente atacar as principais mazelas do nosso sistema político-eleitoral, oriundas da conjunção do voto proporcional de lista aberta com coligações e sem cláusula de barreira. Logo, foram introduzidas mudanças com impactos ainda incertos e inócuos.

A principal alteração com resultado imediato é a criação do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) com estimativa de injetar R$ 1,7 bilhão nas eleições de 2018, ou seja, quase seis vezes o montante de recursos públicos destinado aos partidos em 2014. Entretanto, o novo Fundo ainda está bem distante dos cinco bilhões declarados pelas legendas. Considerando que a principal fonte de financiamento eram as empresas, agora proibidas de doar, e contabilizando quatro anos de inflação, essa conta não fecha. Nesse contexto, além do FEFC, os esforços dos congressistas convergiram em três frentes principais.

A primeira, do lado dos gastos, é a imposição de limites variáveis por cargos e unidades da federação. No caso da campanha presidencial, o limite é de setenta milhões reais e, na de deputado estadual até um milhão. É difícil acreditar que uma campanha vitoriosa em 2018 para presidente gaste 1/7 do que a chapa de Dilma gastou ou que os deputados estaduais e federais que transitam de avião para fazer campanha em estados de grande extensão vão gastar bem menos que em pleitos anteriores. Isto é, valores bastante irrealistas diante do aumento dos custos de produtos e serviços nos últimos anos e, principalmente, se comparados aos gastos das eleições passadas.

Do lado da arrecadação, a inovação da mini-reforma advém das novas regras para a doações eleitorais de pessoas físicas via financiamento coletivo, o denominado crowdfunding. A prática vem sendo bem sucedida em ações de mobilização social, apoio a startups e obteve na campanha do democrata Bernie Sanders à presidência dos EUA, no ano passado, seu modelo de referência. No entanto, imaginar que apenas a utilização de uma moderna ferramenta digital vai alterar a cultura de doação individual no Brasil, quase inexistente, especialmente na conjuntura de enorme repulsa à classe política, é muita ingenuidade ou puro ilusionismo.

Por fim, a pior parte ficou a cargo do veto presidencial que excluiu da reforma o único dispositivo que, de fato, alteraria positivamente o status quo: o limite de contribuição de dez salários mínimos para cada doador. Sob o argumento de “garantir maior isonomia dos pleitos eleitorais”, a decisão do chefe do Executivo em manter em 10% dos rendimentos brutos do doador no ano anterior à eleição tende a gerar justamente o oposto. Em outras palavras, os candidatos mais abastados poderão se autofinanciar e as empresas continuaram  a burlar a restrição por meio de doações de seus executivos, como fizeram nas eleições municipais de 2016.

Em síntese, os prováveis efeitos nas próximas eleições são: custo maior aos contribuintes; baixa renovação e mais elitização na representação. Bom pro empresariado e pra bancada BBB (boi, bala e bíblia), péssimo à democracia. 

A parte positiva vem do veto à esdrúxula censura à internet e da Emenda Constitucional recém promulgada que estabelece o fim das coligações nas eleições proporcionais e uma cláusula de barreira, que embora modesta e gradual, devem alterar um pouco o sistema partidário e eleitoral brasileiro. Porém, a Emenda só passa a vigorar a partir de 2020, enquanto isso vamos nos acostumando com o que temos. Como diz um famoso político-circense: “pior que tá não fica”, será?

Pedro Cavalcante é doutor em Ciência Política.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

2 Comentários

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  1. Lavagem eleitoral.

    “a decisão do chefe do Executivo em manter em 10% dos rendimentos brutos do doador no ano anterior à eleição tende a gerar justamente o oposto. Em outras palavras, os candidatos mais abastados poderão se autofinanciar e as empresas continuaram  a burlar a restrição por meio de doações de seus executivos, como fizeram nas eleições municipais de 2016.

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