A morte de Léo Gilson

Fico sabendo agora que morreu Léo Gilson Ribeiro, aos 77 anos. Trabalhei com ele na época áurea da “Veja”, nos anos 70. Trabalhei, é pretensão. Eu era apenas um foca, ele o crítico temido, ferino, terrível como tantos jovens críticos que, depois, amadurecem.

Em Artes e Espetáculos conviviam Léo, o internacionalista, crítico de artes e literatura; Tinhorão, o nacionalista, que fazia uma coluna de Gente impecável; e o Geraldo Mayrink, crítico de cinema e autor de frases antológicas.

A esgrima entre Léo e Tinhorão virou lenda, era de rolar de rir. Léo era um homossexual assumido; Tinhorão um garanhão ao melhor estilo do Nelson Rodrigues (que, aliás, o citou em uma das peças, acho que em “Bonitinha, mas Ordinária”. Um dia o Tinhorão tanto encheu o Léo, que este subiu na escrivaninha com um livro capa dura, ameaçando jogar. E Tinhorão, impassível: “Léo, o máximo que você joga é brochura”.

Sua vítima predileta era o escritor José Mauro de Vasconcellos, do “Meu Pé de Laranja Lima”. Um dia combinei um trote com o Talvani, chefe de reportagem. Ele se enfiou debaixo da sua mesa e telefonou para o Léo, se identificando como o José Mauro, dizendo que tinha acabado de fechar um acordo para a publicação de sua obra pela Abril. E, em seguida, iria subir até o sétimo andar para lhe aplicar uma surra. O Léo saiu espalhando penas para todos os lados.

Doutra feita, fez uma crítica duríssima ao Jurandir Ferreira, farmacêutico-escritor de Poços de Caldas, primeiro patrão de meu pai, aliás. Foi uma crítica feroz. Jurandir respondeu com uma carta comparando-se ao velho que é espancado pelos jovens em “Laranja Mecânica”. Léo passou dias deprimido com os exageros que cometeu, e mandou uma carta se desculpando com Jurandir.

Em um período em que – como hoje – o exercício do jornalismo costuma ser a capacidade de fabricar frases de efeito sobre qualquer tema, Léo esbanjava erudição, bom humor. Era a alegria da redação.

Luis Nassif

8 Comentários

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  1. Que notícia triste! Me lembro
    Que notícia triste! Me lembro do Leo Gilson Ribeiro no copydesk do Jornal do Brasil, no começo dos anos 60, sob a chefia do Tinhorão e tendo como colegas, Claudio Mello e Souza, Lago Burnet, Ferreira Gullar, Nelson Pereira dos Santos, Sérgio Noronha e outros que não consigo mais recordar. Inesquecível! Eu era uma privilegiada foca. Depois tomei outros rumos na vida.

  2. Nassif

    Não sabia da morte de
    Nassif

    Não sabia da morte de Leo Gilson Ribeiro, a quem, como leitor, acompanhei desde os tempos do suplemento literário do Estadão (nossa, acho que estou ficando velho!).

    Com certeza, nesta sociedade do espetáculo, em que imperam as Caras da vida e a superficialidade e as lantejoulas dos videozinhos malandros da internet, sua inteligência fará falta. Muita falta.

    cid cancer
    mogi das cruzes -sp

  3. Nassif:
    nunca estive em uma
    Nassif:
    nunca estive em uma redação em que o Léo Gilson trabalhasse. Mas sempre o li e respeitei pela cultura, embora muitas vezes não concordando com o seu julgamento. Grande perda.
    Sobre o José Ramos Tinhorão, em quem durante certo tempo foi “bem” descer o pau: concordo totalmente com você. É, simplesmente, o maior historiador da MPB.

  4. Lendo seus comentários sobre
    Lendo seus comentários sobre o Leo Gilson Ribeiro, especialmente o temperamento, é que imagino que consegui entender uma passagem. Freqüentemente lia sua coluna na Caros Amigos e gostava. Um dia ele caiu de pau no tradutor (ou na editora) quando foi lançado no Brasil o último livro memórias de JK Galbraith com o título de “Contando Vantagem”. Com base numa interpretação literal da expressão “Dropping Name”, o título original, ele tripudiou sobre a suposta ignorância de inglês de quem escolheu o título.

  5. Nassif

    soube da morte do LGR
    Nassif

    soube da morte do LGR aqui, ele escrevia com aquele desejo de instigar e mostrando de forma nao pretensiosa usando grande erudição, coisa rara nessa epoca de redatores eruditos de proveta…Tinhorão é o homem mais importante na pesquisa de musica brasileira, sério e erudito, controverso, sim. O Tinhorão é muitas vezes ironizado e criticado por gente que não tem o minimo de capacidade e conhecimento para fazê-lo.

  6. Cumprimento
    Boa crônica sobre Léo Gilson. Parecia ser um homem de bem, com bom conhecimento do inglês e do alemão, e uma visão conservadora da Política Internacional. Trabalhamos juntos na Olivetti Industrial, na Conde de Prates. Tínhamos uma posição em comum: a defesa e com-prehensio da Revolução Cívico-Militar de 64, a que modernizou o Estado Nacional. Curiosamente, quase nada se escreveu sobre esse crítico, um tanto apaixonado e por vezes parcial, mas culto e de excelentes leituras. Nem sabia que era homossexual. É pena, com tanta linda mulher em SP, das mais belas que alguém possa encontrar… O que lamento é o esquecimento do escritor brilhante e talentoso, bom conhecedor da Arte Moderna. Parabéns, Nassif, pelo artigo. Foi um gesto de nobreza e estima!

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