Informais e subocupados respondem por oito entre cada 10 novos empregos, por Lauro Veiga Filho

Na prática, os dados da PNADC mostram uma deterioração constante e crescente do mercado de trabalho.

Informais e subocupados respondem por oito entre cada 10 novos empregos

por Lauro Veiga Filho

Alvíssaras, exclama o bobo da corte ao receber a edição mais recente da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Afinal, a tão decantada reação do emprego já desponta com força no horizonte azul anil dessa terra abençoada e bonita por natureza. Os dados não mostram isso? O número de pessoas ocupadas no terceiro trimestre deste ano cresceu em torno de 4,0% na média brasileira frente ao trimestre imediatamente anterior, saltando 11,4% se comparado ao mesmo trimestre do ano passado. Tudo bem, o salto ocorreu em relação ao pior momento para o mercado de trabalho na série histórica do IBGE. Mas, enfim, cresceu.

Ironias à parte, claro que a base muito baixa deve ser levada em conta, embora não seja a única ponderação a ser feita. Um olhar mais cuidadoso sobre os números trazidos pela pesquisa, que ganhou nova ponderação para tentar minimizar os transtornos causados pela pandemia, mostra que o crescimento do emprego tem sido turbinado principalmente por informais e por trabalhadores subocupados, que ocupam vagas temporárias ou de meio período, insuficientes para assegurar a remuneração necessária para fazer frente a todos os gastos da família. Uma “grande conquista” fabricada no bojo da reforma trabalhista, que reduziu direitos trabalhistas a pretexto de baixar custos para as empresas e facilitar, ora vejam só, o aumento das contratações.

O total de ocupados em todo o País havia despencado de 95,515 milhões no último trimestre de 2019 para 83,439 milhões no terceiro trimestre do ano passado, correspondendo ao fechamento de 12,080 milhões de vagas. O número de ocupações havia alcançado 89,384 milhões no segundo trimestre deste ano e subiu para 92,976 milhões nos três meses seguintes, o que significou a contratação de mais 9,537 milhões de trabalhadores desde o terceiro trimestre do ano passado, num avanço de 11,4% como já registrado mais acima.

Na prática, os dados da PNADC mostram uma deterioração constante e crescente do mercado de trabalho. O total de subocupados por insuficiência de horas trabalhadas atingiu sua marca mais elevada em toda a série da pesquisa no terceiro trimestre deste ano, num recorde de 7,771 milhões de trabalhadores (ou 8,4% do total de ocupados, frente a 7,5% no mesmo trimestre do ano passado). O número cresceu praticamente 23,9% em quatro trimestres (1,498 milhão de trabalhadores a mais do que no terceiro trimestre do ano passado, quando os subocupados somavam 6,273 milhões). Além disso, o total de informais aproximou-se de 39,965 milhões no trimestre encerrado em setembro último (incluindo trabalhadores sem carteira no setor público, categoria não considerada pelo IBGE ao estimar os números da informalidade no mercado de trabalho). No terceiro trimestre de 2020, a pesquisa contava 33,942 milhões de informais. Comparando os dois períodos, registrou-se um aumento de 17,7%, com 6,023 milhões de informais a mais – o que representou dois terços de todos os empregos criados no período.

Renda estagnada

Juntos, informais e subocupados passaram de 40,215 milhões no terceiro trimestre do ano passado em todo o País para 47,736 milhões na aferição mais recente, numa elevação de 18,7%, correspondendo a um incremento absoluto de 7,512 milhões. Isso significa dizer que praticamente 78,9% de todos os empregos abertos no período foram ocupados por informais ou subocupados. Mais da metade dos ocupados, portanto, algo como 51,3% passaram a ser informais ou subocupados. O dado explica, na média do País, porque o rendimento real (descontada a inflação) atingiu seu mais baixo valor na série histórica do IBGE, iniciada em 2012, caindo 11,1% entre o terceiro trimestre de 2020 e o mesmo trimestre deste ano, saindo de R$ 2.766 para R$ 2.459.

Esse comportamento afetou a chamada massa salarial real (igualmente em valores atualizados com base na inflação). A massa salarial corresponde à soma de todos os rendimentos recebidos pelos trabalhadores e recuou de R$ 225,237 bilhões no terceiro trimestre do ano passado para R$ 223,549 bilhões neste ano (-0,7%), no sexto trimestre de perdas de renda para as famílias. A queda reflete, além da redução do ganho médio por trabalhador, a aceleração da inflação desde o trimestre final do ano passado. Obviamente, o efeito central desses movimentos no mercado de trabalho será um enfraquecimento adicional da demanda, a ser afetada negativamente ainda pelo encarecimento do crédito.

A taxa de desemprego no País baixou de 14,9% no terceiro trimestre do ano passado para 12,6% no mesmo período deste ano. O número de desocupados caiu de fato 7,8% no País, de 14,958 milhões para 13,453 milhões. Esses números mostram melhoria, sim, mas porque aumentou o número de pessoas que passaram a realizar trabalhos de baixa remuneração, em geral temporários, sem férias, 13º salário e outros direitos. Mesmo diante da queda no desemprego e do crescimento do emprego, a massa de renda dos trabalhadores continuou estagnada, numa clara demonstração da deterioração em cena no mercado de trabalho, com a geração de ocupações de baixa qualificação, salários achatados e literalmente direito algum.

Lauro Veiga Filho – Jornalista, foi secretário de redação do Diário Comércio & Indústria, editor de economia da Visão, repórter da Folha de S.Paulo em Brasília, chefiou o escritório da Gazeta Mercantil em Goiânia e colabora com o jornal Valor Econômico.

Este texto não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

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