
O aumento da violência política, com agressões físicas, ameaças e atentados contra candidatos em diversas regiões do país, foi uma das marcas das eleições 2024. De acordo com o Observatório da Violência Política e Eleitoral, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o número de casos registrados foi quase o dobro das eleições de 2020 e de 2022, colocando em risco a integridade democrática e a segurança pública no Brasil.
Entre janeiro e outubro deste ano, 311 episódios de violência política foram contabilizados, atingindo candidatos e seus familiares. O relatório da UFRJ aponta que a região Sudeste liderou o número de ocorrências, com destaque para o estado de São Paulo, onde 21 casos foram registrados, seguido pela Bahia e Rio de Janeiro no rankin.
Um dos casos mais recentes ocorreu na zona norte do Rio de Janeiro, às vésperas da eleição, no dia 03, quando o carro da vereadora Tainá de Paula (PT) foi alvejado a tiros. Na semana anterior, no dia 25 de setembro, o vereador e candidato à reeleição também no Rio, Joãozinho Fernandes (Avante) foi assassinado a tiros, durante uma caminhada de campanha.
Segundo especialistas, esse cenário revela uma crise mais profunda na política brasileira, marcada pela degradação do debate público e o uso da violência como instrumento de intimidação. “Estamos presenciando eleições cada vez mais violentas, onde as disputas desproporcionais e os ataques pessoais se transformaram em uma ofensiva direta contra a democracia”, explicou o advogado eleitoral Wallyson Soares.
Respostas insuficientes e avanço de facções
Para o advogado, a crescente onda de violência levanta preocupações sobre a capacidade do Estado de garantir a segurança necessária para a realização de eleições livres e justas. A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de autorizar reforço policial em 12 estados — incluindo Acre, Amazonas, Pará e Rio de Janeiro — foi uma tentativa de conter os ataques, mas, para o especialista, essas medidas são reativas e insuficientes.
“O Brasil precisa adotar uma postura mais preventiva em relação à violência política. Quando candidatos ou suas famílias são atacados, estamos comprometendo a própria essência da democracia, que é a livre escolha dos eleitores”, afirmou Wallyson.
A fragilidade das forças de segurança em áreas onde o crime organizado ou milícias exercem influência política também é motivo de preocupação. Segundo o relatório da Universidade, muitas dessas violências ocorrem em contextos de disputa territorial ou controle de facções, aumentando o risco para candidatos que desafiam o status local.
Impacto na representatividade
Os especialistas alertam que, ao ameaçar candidatos, especialmente aqueles ligados a minorias ou movimentos de oposição, grupos violentos acabam por limitar a pluralidade de vozes nas urnas. Esse efeito de exclusão compromete diretamente o direito de escolha do eleitor e pode distorcer os resultados das eleições.
“Em uma eleição, todos os candidatos devem ter as mesmas condições de concorrer. A violência política cria um cenário desigual, onde alguns são forçados a desistir por medo de retaliação ou, no pior dos casos, são retirados à força da disputa”, expôs o advogado especialista em direito penal e eleitoral, Samuel dos Anjos.
Segundo juristas, partidos que incentivam o discurso de ódio são também responsáveis pelo avanço da violência.
A ministra Cármen Lúcia, presidente do TSE, defendeu recentemente a criação de um observatório permanente para monitorar a violência política e ressaltou a responsabilidade dos partidos em adotar uma postura mais ética durante as campanhas.
“Os partidos respondem, mesmo que indiretamente, quando não controlam suas ações. É preciso que fique claro em normas jurídicas quais são os critérios de responsabilidade dos partidos, que indicam seus candidatos”, disse a ministra.
O impacto da cultura da violência
O advogado ressalta a necessidade de a população denunciar a violência. “O Tribunal Superior Eleitoral tem desempenhado um papel fundamental na proteção dos eleitores, mas é crucial que a população denuncie casos de violência para que a Justiça possa agir”, afirmou Samuel. Para ele, a Justiça Eleitoral só pode intervir com eficácia se houver informações sobre os crimes cometidos, e a participação ativa dos cidadãos é essencial para que esses atos sejam punidos.
Segundo a socióloga Nilza Anjos, a cultura da violência compromete a democracia diretamente: “a experiência democrática da população brasileira se dá pela legislação e não nas práticas sociais”. “Ainda lidamos com uma parcela da população que manifesta diferentes formas de intolerância e isso emperra o diálogo, nutre a cultura da violência e trava a democracia como prática de cidadania”, pontuou.
*Informações e declarações: KP Comunicação
Edição: Jornal GGN
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