Xadrez da linguagem da ultradireita, de Olavo de Carvalho a Pablo Marçal, por Luís Nassif

O ataque ao “politicamente correto” ajudava a destruir consensos civilizatórios construídos ao longo de décadas e de guerras.

O fenômeno Pablo Marçal representa a terceira onda da ultradireita e, se não for parado, caminha para substituir a Hidra de Lerna do Bolsonarismo – que tem no corpo de Jair e nas três cabeças de Eduardo, Carlos e Flávio, sua expressão mais concreta.

É um processo já analisado pelos pioneiros dos estudos da psicologia de massa do fascismo. Quando o chefe fracassa, tende a ser substituído por outro, que para destronar o anterior, tem que mostrar mais força e mais coragem verbal. E a linguagem é elemento vital nessa disputa.

Peça 1 – a linguagem da ultradireita

O ponto inicial do desmonte institucional do país foi a mudança na linguagem pela chamada parcela “culta” da opinião pública – a que se desinforma pela mídia. O novo normal passa a ser a substituição da polêmica formal pela ofensa, misturada com teorias conspiratórias das mais variadas.

O primeiro publisher brasileiro a entender a linguagem da ultradireita foi o infame Roberto Civita, o herdeiro que destruiu a editora Abril e a revista Veja.

Lembro-me até hoje da estreia. O primeiro artigo foi de Tales Alvarenga, um ex-diretor de redação da Veja que, na época, era colunista. A linguagem tinha uma virulência ofensiva inédita.

A primeira cobertura foi na campanha de defesa das armas, uma capa bancada pela Associação de Rifles dos Estados Unidos.

As características da linguagem eram nítidas desde o começo (com o auxílio do Gemini):

Discurso de ódio: a linguagem  utilizada para incitar o ódio, a discriminação e a violência contra grupos minoritários.

Populismo e simplificação: Recursos como a simplificação, a generalização e a emoção para mobilizar as massas e construir uma narrativa maniqueísta.

Conspiracionismo: A disseminação de teorias da conspiração.

Identidade e pertencimento: Para construção de uma identidade coletiva e um sentimento de pertencimento a um grupo homogêneo e superior.

Uso de novas tecnologias: A internet e as redes sociais têm papel fundamental na disseminação da linguagem.

Em cima desses princípios, foram desenvolvidos truques retóricos, dos quais o grande professor foi Olavo de Carvalho.

O uso de linguagem de bar para atacar as instituições dessacralizava todos os ritos e hierarquias que caracterizam a democracia liberal. 

O ataque ao “politicamente correto” ajudava a destruir consensos civilizatórios construídos ao longo de décadas e de guerras. As reações às grosserias eram tratadas como “mimimi”.

Seguiu-se uma guerra cultural que visava destruir todas as celebridades que pudessem representar pensamento progressista, de músicos populares a escritores, de políticos a jornalistas.

A parte mais brutalizada da classe média caiu imediatamente no canto das novas gralhas. Lembro-me que, bem no início do processo, fui com minhas três menininhas – duas filhas e uma neta – a um cinema em um shopping do Bosque da Saúde. Estávamos na fila da pipoca quando um sujeito furou a fila. Dei-lhe uma chamada. Sua reação foi padrão:

  • Deixe de ser politicamente correto.

No meu livro, “A Conspiração Lava Jato” – que aborda a década maldita de 2010 e a conspiração do impeachment -, prestes a ser lançado, o ponto de partida para a selvageria foi a incorporação do preconceito e a mudança da linguagem pela mídia corporativa.

Peça 2 – o fator Olavo de Carvalho

Olavo de Carvalho foi o primeiro a perceber os novos  caminhos do renascimento do fascismo e o modelo de negócio da nova classe, a dos influenciadores. Criou comunidades de alunos na Internet e, presencialmente, em Curitiba. Montou grupos na Internet. Ganhou dinheiro com aulas virtuais. Ou seja, descobriu as possibilidades da Internet para atrair seguidores, com seu discurso de ódio, e desenvolver novas formas de negócio.

Foi o grande mestre da retórica da ultradireita, as respostas desconcertantes. Por exemplo, o “e daí” que servia para desarmar qualquer indignação contra ataques descabidos a personalidades consagradas da cultura nacional.

Peça 3 – do preconceito à grosseria

Os primeiros a perceber o preconceito social, decorrente da ascensão das classes populares, foram Jô Soares e suas “meninas” e Arnaldo Jabor. Foi um período em que a classe C passou a frequentar ambientes da classe média, e o Rio de Janeiro vivia os últimos momentos da super-auto-estima do carioca. Mas ainda dentro da linguagem convencional da mídia.

Jabor deu o passo seguinte, incorporando a linguagem agressiva e um anticomunismo dos anos 50 com suas pirações conspiratórias.

Destaco no livro:

“Confesso que a primeira vez que ouvi Arnaldo Jabor falar em “comunismo viral”, julguei que fosse apenas mais um roteiro teatral para atender à demanda da mídia por cronistas vociferantes. Ele citava Jean Baudrillard e voltaria a citar inúmeras vezes.

Segundo Baudrillard, o comunismo, hoje desintegrado, tornou-se viral, capaz de contaminar o mundo inteiro, não através da ideologia nem do seu modelo de funcionamento, mas através do seu modelo de desfuncionamento e da desestruturação da vida social – vide o novo eixo do mal da América Latina”.

Quando abriu o mercado para cronistas de ódio, Jabor foi acompanhado por alguns colunistas menores, como Cora Ronai, Nelson Motta e Guilherme Fiúza, no jornal O Globo.

Peça 3 – a criação de personagens

Mas o investimento mais pesado foi feito pela revista Veja em parceria com a Editora Record, dirigida editorialmente por Carlos Andreazza. Aliás, quando foi substituído por Rodrigo Lacerda na Record, a mudança foi registrada assim em nota oficial da editora: ”Rodrigo Lacerda é um nome do primeiro time do mercado editorial. Certamente conseguirá imprimir sua marca, sem perder de vista os valores da Editora Record, que preza pela diversidade de pensamento e pelo debate”.

Veja foi a primeira a trabalhar na construção de personas. Os dois primeiros projetos foram Diogo Mainardi e Reinaldo Azevedo.

Por aqueles tempos, a revolução da informática marcava uma mudança geracional, uma nova era na economia, na qual havia espaço para os jovens talentosos, montados em suas startups, enfrentando o sistema.

A construção de Mainardi foi cópia do jovem cronista do filme “O poder da mídia”. Uma emissora de TV foi cooptado para participar de uma disputa no mercado de telecomunicações. Selecionou um jornalista de cultura e passava para ele dossiês de toda ordem, até torná-lo uma figura política relevante. A partir daí, passou a ser instrumentos do lobby de comunicação.

Já o personagem Reinaldo Azevedo se formou na melhor escola Olavo de Carvalho, usando todas as simbologias do fascismo. 

Passou a usar símbolos – o chapéu Panamá -, que era vestido por seguidores ululantes em cada lançamento de livros. E recorria aos ataques mais desqualificadores possíveis. Vítimas eram tratadas como “canalhas”, “Mão Peluda”, frequentadores da sauna gay, tudo isso em veículos que abandonaram completamente os rituais da mídia.

Apedrejou uma professora de psicologia da USP, de 70 anos, denunciando-a como traficante, por orientar um trabalho de redução de danos em ecstasy. Denunciou os alunos do Colégio Pedro 2º no Rio, por conta de reuniões políticas estudantis. Atacou ministros do Supremo que se recusavam a endossar o golpe do impeachment. Exercitou um antipetismo feroz, praticou um moralismo que antecedeu o que viria depois. Foi a personificação mais completa do Coringa.

A partir de certo momento, surgem os influenciadores, toscos em estado puro, expelindo grosserias de um modo muito mais autêntico e natural do que jornalistas travestidos. Não havia mais diferença entre o ululante cronista de Veja e o ululante influenciador bolsonarista.

Com o tempo, Mainardi continuou um jovem, mesmo de cabelos brancos, e desapareceu na poeira. Inegavelmente mais talentoso, Reinaldo se refez, depois que os raios da Lava Jato atingiram Michel Temer e Aécio Neves e a invasão dos influenciadores o deixou em companhias socialmente desagradáveis. Tornou-se um democrata radical, defensor de Lula e da democracia. E com brilho.

Mas a porteira havia se escancarado. Por ela passou a boiada da Lava Jato, a boiada muito mais feroz das milícias-militares de Bolsonaro e chega-se, agora, ao ápice da loucura, com Pablo Marçal.

Peça 4 – o bolsonarismo 1.0

Dado o tiro de partida do mensalão, com a parcialidade irresponsável do Supremo Tribunal Federal e da Procuradoria Geral da República, todos os abusos foram permitidos. 

A mídia alimentou as primeiras ondas da ultradireita, que se organizaram em torno da Lava Jato. Nas redes, tornaram-se presas fáceis da família Bolsonaro, assessorada por profissionais de Steve Bannon, e pelos primeiros influenciadores.

As jogadas iniciais consistiam em colocar uma matéria difamatória contra uma vítima, em algum site. Depois, abrir centenas de links para a matéria, além de espalhá-la pelas redes sociais. Repetiam o mesmo padrão Reinaldo Azevedo, sem a Veja, mas contando com as redes de disseminação de WhatsApp.

O bolsonarismo em rede consagrou o tipo popular convencional, grosseirão, intelectualmente limitado, preconceituoso até a medula, trazendo a besta fera dos porões do país para o Palácio do Planalto.

O novo modelo indiferenciava tudo, jogava no mesmo ambiente organizações criminosas, grupos militares, políticos do centrão, aventureiros de toda espécie.

Peça 5 – o bolsonarismo 2.0

Com Pablo Marçal é inaugurado o que o competente jornalista da Folha, Igor Gielow, batizou de bolsonarismo 2.0.

A Internet permite criar um mundo de ficção e de conspirações. O estilo Marçal age em várias frentes:

  1. O atrevimento sem limites, afrontando autoridades, tribunais, mídia.
  2. O moralismo caricato do bolsonarismo.

Mas, em cima dessas receitas conhecidas, um raciocínio rápido e a capacidade de construir um mundo baseado nos melhores filmes de ficção.

Como a psicologia de massa define o pensamento conspiração? O hommus bobus, personagem do cronista americano H. L. Mencken, é um solitário. Quando se junta a outros, ganha uma sensação de força inédita. Se conseguiu se tornar forte em um passe de mágica, passa a aceitar qualquer improvável como factível.

Marçal usa essas características para criar um mundo de fantasia de filmes de ficção.

Em seu projeto, o crime será combatido com inteligência artificial identificando a mera intenção de cometer crime e remetendo para o lugar policiais e drones. O roteiro foi copiado do filme Minority Report, dirigido por Steven Spielberg e baseado no conto de Philip K. Dick. Nele, a polícia de Washington D.C. utiliza uma tecnologia avançada para prever e prevenir crimes. A PreCrime, divisão especial da polícia, é composta por três “precognitivos”, indivíduos com a capacidade de visualizar crimes futuros através de sonhos vívidos.

Já começa a despertar oportunistas políticos de sempre, como Marcos Ideiafix Cintra, o homem do imposto e da proposta única.

Em Marçal, no entanto, a criatura parece ter dominado o criador. Antes de conquistar o poder, ele passou a atropelar vários itens do código eleitoral e – atenção, Tábata! – do código do consumidor. O esquema de Pablo Marçal para reprodução paga de cortes, com participação do “cortador” a obter “cortares” subordinados é pirâmide e fere o Art ii, inciso 9º da lei 1521/1951, também conhecida por Lei dos Crimes contra a Economia Popular.. O esquema está mais para Amway do que para pirâmide pura, mas continua provocando o mesmo resultado.

Marçal é a maior vocação que aparece, até agora, como o Milei brasileiro. Se não for parado enquanto é minhoca, virará jibóia.

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15 Comentários

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  1. O que causou mais espanto, Nassif, foi a clientela dos cursos de Olavo de Carvalho. Advogados, promotores e até juizes/juízas tratavam ele como se ele fosse filósofo, pedagogo, jurista e guru intelectual. Ele vendeu uma quantidade exorbitante de livros e ei suponho que ainda continue sendo um campeão de vendas. Alguém precisa estudar e discutir esse fenômeno editorial.

  2. Ai, Nassif, ai, ai.

    Tudo isso que foi narrado não é novidade, cada etapa de transição tecnológica, e de expansão capitalista experimentou um correspondente na sua base de comunicação de massas, e em cada uma delas, havia esse fenômeno empurrando tudo para uma ação extremada.

    Sim, é um perigo que parece novo, mas não é…ele é permanente, porque imanente ao modo de funcionamento desse modo de organizar a vida em sociedade, a partir de uma estrutura (infra) que tem na expropriação da mão-de-obra e na concentração da riqueza a sua essência.

    O que talvez assuste é que agora estamos enfrentando um momento de ruptura, quando o capitalismo parece dar lugar a uma forma inédita, que prescinde das formas conhecidas de alienação de trabalho, e de concentração da riqueza, passando às formas de geração de antivalor, e não mais de valor (mais valia).

    É aí que o nazista da Faria Lima é mais assustador, porque está despregado das formas institucionais de controle político do capital, aquilo que você tanto preza e chama de “democracia”.

    Uma alegoria: Hitler, apesar de tudo, poupou Paris. Pois é, esse pessoal, como admite o Steve Bannon, não vai poupar nada, nem ninguém (“vocês sentirão saudades de Trump”, disse ele).

    Outra questão desconhecida ou ignorada por você, o grande apelo dele não é essa forma agressiva, ou intempestiva e desafiadora de falar.

    O que é crucial nele é o discurso que seduz os desalentados, ou os desvalidos e sem esperança, que de tão massacrados, só ouvem agora os urros da besta fera antissistema.

    E nisso, Marçal e Hitler não têm qualquer diferença.

    A esquerda não consegue falar para esses desesperançados, e pior, não quer.

    Acha que é portadora de um “ensinamento” de uma verdade que deve ser aceita, porque detém uma “autoridade política e moral” que ninguém mais enxerga ou aceita.

    Enquanto Lula agrada a Faria Lima com o calabouço fiscal, e tenta a todo jeito parecer um líder de confiança do mercado, o lumpen confia na aberração, porque, para eles, tanto faz, tanto fez, eles já perderam tudo, inclusive, a esperança.

    Junte-se a isso, um bando de jovens zumbis, descerebrados pelas redes sociais, com uma classe média ressentida, e voilá, tempestade perfeita.

  3. Enquanto isso, em BH, liderando as pesquisas um apresentador de programa policialesco (mais um) liderando as pesquisas. Mas não chega aos pés de um Marçal. Se é que isso é consolo

  4. Brutas figuras como pablo marçal vicejam em sociedades onde há precarização do trabalho, renda e educação. Axel Honneth, Filósofo da Escola de Frankfutt assim define essa propensão de um grupo anónimo se atrelar a um líder “onipotente”, em sua tese “O eu no nós: reconhecimento como força motriz de grupos”:

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    Sociologias
    Dossiê • Sociologias 15 (33) • Ago 2013 •
    https://doi.org/10.1590/S1517-45222013000200003
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    O eu no nós: reconhecimento como força motriz de grupos
    The I in we: recognition as a driving force of group formation
    AutoriaSCIMAGO INSTITUTIONS RANKINGS
    Resumos
    Neste texto, analisam-se o conceito de grupo e suas manifestações, buscando contrapor às perspectivas categoriais da psicanálise e da teoria sociológica, consideradas incompletas em razão de estilizações unilaterais que impedem uma conexão conceitual básica entre as duas disciplinas, uma terminologia que, de partida, seja neutra frente às alternativas positiva e negativa de inserção do eu no grupo. Para tanto, o grupo, independentemente de seu tamanho e tipo, inicialmente deve ser compreendido como um mecanismo social fundado na necessidade ou no interesse psíquico do indivíduo, porque o auxilia na estabilidade e ampliação pessoais. O artigo descreve, em linhas gerais, o arcabouço categorial unificado, recorrendo ao conceito do reconhecimento. Num primeiro passo, apresenta-se brevemente a premissa de que a dependência individual de experiências de reconhecimento social explica por que o sujeito individualmente aspira a ser membro em diferentes modelos de agrupamentos sociais. Num segundo passo, tenta-se corrigir a imagem idealizada de grupo anteriormente introduzida, ao tematizar as tendências regressivas que frequentemente codeterminam a vivência no grupo. Por fim, segue-se a ideia de retirar gradativamente aquelas idealizações que estavam na base da premissa inicial de uma diluição harmônica do eu no nós do grupo.

    Teoria do reconhecimento; Psicologia social; Agrupamentos sociais; Individualização; Socialização

    This paper analyzes the concept of group and its manifestations, seeking to contrast the categorial perspectives of both psychoanalysis and sociological theory, which are considered incomplete because of unilateral stylizations that prevent a basic conceptual connection between the two disciplines, with a terminology conceived to be neutral faced with positive and negative alternatives for insertion of the self in the group. To this end, the group, regardless of its size and type, should be initially understood as a social mechanism based on the individual’s psychic need or interest, because it helps in his stability and personal development. The article outlines the unified categorial framework resorting to the concept of recognition. In a first step, I briefly present the premise that the individual’s dependence on experiences of social recognition explains why the subject individually aspires to membership in different models of social groupings. In a second step, I try to correct the previously introduced idealized image of group, by thematizing the regressive tendencies that often co-determine the experiencing within the group. Finally, I proceed with the idea of progressively withdrawing those idealizations that were based on the initial premise of a harmonic blending of I in we in the group.

    Theory of recognition; Social psychology; Social groupings; Individualization; Socialization

    DOSSIÊ

    O eu no nós: reconhecimento como força motriz de grupos

    The I in we: recognition as a driving force of group formation1

    Axel Honneth

    Livre-docente em Filosofia. Diretor do Instituto de Pesquisa Social e catedrático de Filosofia Social na Universidade de Frankfurt am Main (Alemanha). E-mail:[email protected]

    RESUMO

    Neste texto, analisam-se o conceito de grupo e suas manifestações, buscando contrapor às perspectivas categoriais da psicanálise e da teoria sociológica, consideradas incompletas em razão de estilizações unilaterais que impedem uma conexão conceitual básica entre as duas disciplinas, uma terminologia que, de partida, seja neutra frente às alternativas positiva e negativa de inserção do eu no grupo. Para tanto, o grupo, independentemente de seu tamanho e tipo, inicialmente deve ser compreendido como um mecanismo social fundado na necessidade ou no interesse psíquico do indivíduo, porque o auxilia na estabilidade e ampliação pessoais. O artigo descreve, em linhas gerais, o arcabouço categorial unificado, recorrendo ao conceito do reconhecimento. Num primeiro passo, apresenta-se brevemente a premissa de que a dependência individual de experiências de reconhecimento social explica por que o sujeito individualmente aspira a ser membro em diferentes modelos de agrupamentos sociais. Num segundo passo, tenta-se corrigir a imagem idealizada de grupo anteriormente introduzida, ao tematizar as tendências regressivas que frequentemente codeterminam a vivência no grupo. Por fim, segue-se a ideia de retirar gradativamente aquelas idealizações que estavam na base da premissa inicial de uma diluição harmônica do eu no nós do grupo.

    Palavras-chave: Teoria do reconhecimento. Psicologia social. Agrupamentos sociais. Individualização. Socialização.

    ABSTRACT

    This paper analyzes the concept of group and its manifestations, seeking to contrast the categorial perspectives of both psychoanalysis and sociological theory, which are considered incomplete because of unilateral stylizations that prevent a basic conceptual connection between the two disciplines, with a terminology conceived to be neutral faced with positive and negative alternatives for insertion of the self in the group. To this end, the group, regardless of its size and type, should be initially understood as a social mechanism based on the individual’s psychic need or interest, because it helps in his stability and personal development. The article outlines the unified categorial framework resorting to the concept of recognition. In a first step, I briefly present the premise that the individual’s dependence on experiences of social recognition explains why the subject individually aspires to membership in different models of social groupings. In a second step, I try to correct the previously introduced idealized image of group, by thematizing the regressive tendencies that often co-determine the experiencing within the group. Finally, I proceed with the idea of progressively withdrawing those idealizations that were based on the initial premise of a harmonic blending of I in we in the group.

    Keywords: Theory of recognition. Social psychology. Social groupings. Individualization. Socialization.

    Ainda que o conceito “grupo” tenha enorme plasticidade e possa ser utilizado para fenômenos sociais muito distintos, cada época histórica extrai da multiplicidade das manifestações alguns traços especialmente marcantes para construir, com eles, sua própria imagem de grupo. Nessas construções, espelham-se medos e esperanças, temores e expectativas, que são impulsionados por vivências típicas de época sobre a união de indivíduos em associações relativamente estáveis e duradouras. Um breve olhar sobre a movimentada história do século 20 já revela quão diferentes têm sido as associações que foram feitas com o surgimento e a disseminação de grupos sociais sob a impressão de determinadas experiências, rapidamente generalizadas. No início, a experiência do grande grupo anônimo e submisso à autoridade captura tanto a atenção social, que o conceito de grupo, de Freud e Canetti até Adorno, está marcado quase totalmente pela imagem da massa regressiva2. Mais tarde, depois do final da Segunda Guerra Mundial, frequentemente esta concepção negativa é transferida à categoria da gangue, do pequeno grupo de jovens violentos, em cujo uso popular se espelham os medos da crescente sociedade de bem-estar face aos perdedores que ela própria produziu3. Paralelamente às estilizações negativas, no entanto, também faz parte da história dessas imagens sociais sobre o grupo, no século 20, o surgimento de construções positivas, nas quais se refletem esperanças de um efeito benéfico dos agrupamentos sociais. Depois que a psicologia social estadunidense descobriu as funções civilizatórias dos grupos de jogos e de vizinhança (cf. Cooley, 1963), depois que Piaget, em seu estudo inovador sobre o desenvolvimento moral da criança, provou a importância socializadora do grupo de pares (Piaget, 1976, cap. 3), firmaram-se rapidamente expectativas exageradas sobre a existência de grupos sociais primários, nos quais se via uma garantia natural de relações sociais livres de conflito. E hoje, em consequência da popularização do comunitarismo, a figura da comunidade cultural tomou o lugar desse ideal de grupo, em cujo ambiente impregnado de valores, o indivíduo deve poder desenvolver uma personalidade forte, que ele não pode atingir nas meras relações jurídicas da sociedade.4

    Por mais diferentes que pudessem ser essas construções de grupo típicas de cada época, elas se assemelham muito na tendência formal de sempre selecionar apenas um dos possíveis atributos de agrupamentos sociais e estilizá-lo como a característica que tudo define. Nas concepções negativas, os traços grupais regressivos, ameaçadores do eu, foram generalizados a tal ponto que, da multiplicidade de suas manifestações sociais, restou tão somente a tediosa massa; enquanto nas concepções positivas, os elementos civilizadores, fortalecedores do eu, foram idealizados a tal ponto que, imperceptivelmente, os riscos da perda de autonomia tiveram que passar despercebidos. Na forma dessas perspectivas unilaterais, tais teorias frequentemente influenciaram a consciência cotidiana comum, ao contribuírem para a formação de mitologias sociais, que logo depois estariam refletidas na literatura ou nos meios de comunicação. As imagens sobre o efeito dos grupos sociais que aqui prevaleceram eram, de certo modo, um aproveitamento seletivo de teorias científicas que, por meio de uma abstração metodológica, se haviam concentrado em determinados traços dos grupos sociais. Evidentemente que, desse processo, também resultou regularmente o risco de um circuito fechado, o qual consistia em que as próprias mitologias cotidianas exerciam influência sobre as mesmas pesquisas científicas de cuja generalização popular elas em boa medida retiravam sua matéria prima. Então, paradoxalmente, os pesquisadores tornaram-se vítimas de mitologias sociais para cuja produção eles involuntariamente haviam contribuído, quando, em uma redução consciente, eles se ocuparam de tão somente um aspecto do fenômeno social. Ao longo de todo o século 20, reiteradamente ocorreram tais efeitos retroativos, incontrolados, de imagens sociais popularizadas sobre a formação da teoria. Até hoje prevalece a tendência de deixar sobressaírem-se do grupo social ou apenas os traços regressivos, ou aqueles que fomentam a autonomia, sem levar em consideração seu enraizamento no mesmo mecanismo. Assim, ocorre que, na psicanálise, lamentavelmente, ainda prevalece uma imagem predominantemente negativa do grupo, cuja existência, em seguimento a Freud, é explicada geralmente pelos impulsos de uma compensação da fraqueza do eu. Consequentemente, as atenções se voltam aqui, sobretudo, aos processos regressivos através dos quais, na vida em grupos, camadas primitivas da psique individual são reativadas. Na sociologia e na teoria política, ao contrário, prevalece atualmente uma imagem predominantemente positiva do grupo, totalmente impregnada pela manifestação da comunidade cultural, ou seja, pelo pequeno ou grande grupo integrado por linguagem, tradições e valores. Por conseguinte, as atenções se voltam, aqui, unilateralmente, a processos pelos quais, na forma do desvio face aos sistemas predominantes de valor, são geradas identidades coletivas que devem dar ao indivíduo segurança e integridade psíquica.

    As supressões recíprocas não têm como consequência apenas o fato que as duas orientações na pesquisa não conseguem mais reconhecer o quanto sua própria área de investigação também é influenciada pela outra tendência. Tal como a psicanálise não consegue admitir que a imersão no grupo social pode beneficiar as forças do eu do indivíduo, também na pesquisa sociológica sobre grupos falta a consciência dos riscos que podem ameaçar o indivíduo pela reativação inconsciente de antigas relações com objetos. Mais grave, contudo, é que as estilizações unilaterais parecem impedir radicalmente uma conexão conceitual básica entre as duas disciplinas. As motivações que cada uma aponta como responsáveis pela entrada no grupo diferem tanto, que surge a impressão de se tratarem de dois fenômenos sociais totalmente diversos. Só é possível superar atualmente este risco, tomando como ponto de partida categorial para a explicação de grupos sociais uma terminologia que, num primeiro momento, seja neutra frente às alternativas positiva e negativa. Para conseguir isso, o grupo, independentemente de seu tamanho e tipo, inicialmente deveria ser compreendido como um mecanismo social fundado na necessidade ou no interesse psíquico do indivíduo, porque o auxilia na estabilidade e ampliação pessoais. Mas esta aspiração por uma retaguarda no grupo pode assumir formas distintas segundo o tipo de vínculo socializador ou das experiências sociais posteriores, que influenciam o grau da temática inconsciente no grupo. No que segue, tentarei desenvolver em linhas gerais este tipo de arcabouço categorial unificado, recorrendo ao conceito do reconhecimento. Num primeiro passo, será brevemente apresentada a premissa segundo a qual a dependência individual de experiências de reconhecimento social explica por que o sujeito individualmente aspira a ser membro em diferentes modelos de agrupamentos sociais. A cada forma de reconhecimento de que o indivíduo depende no decorrer de seu desenvolvimento, corresponde analiticamente uma forma diferente de aspiração de membresia em grupo (1). Esta premissa inicial, contudo, ainda contém uma forte abstração, porque são desconsideradas as necessidades individuais de fusão que, geralmente, também se concretizam na vida em grupo. Por isso, num segundo passo, tentarei corrigir a imagem idealizada de grupo que fora anteriormente introduzida, ao tematizar, com apoio em Donald Winnicott, as tendências regressivas que frequentemente codeterminam a vivência no grupo (2). Mas também este passo ainda não é suficiente para ajustar plenamente o conceito de grupo à realidade social. Naturalmente, o comportamento no grupo também pode ser influenciado por projeções e fantasias inconscientes que levam a uma patologização dos processos comunicativos e trazem consigo efeitos destrutivos (3). Portanto, eu sigo a ideia de retirar gradativamente aquelas idealizações que estavam na base da premissa inicial de uma diluição harmônica do eu no nós do grupo.

    I

    Às reflexões que quero expor com relação às diferentes formas de criação de grupos, subjaz uma concepção sobre o desenvolvimento social e da personalidade humana vinculada à teoria do reconhecimento. Sintetizando o resultado de pesquisas fomentadas, de um lado, pela teoria da relação com os objetos e, de outro, pela psicologia social estadunidense em seguimento a Mead, eu parto da convicção de que a formação do eu do sujeito se realiza através da gradual internalização de um comportamento social reativo, que tem o caráter do reconhecimento intersubjetivo. Na medida em que relaciona gradualmente a postura afirmativa, motivadora e reafirmadora de seus parceiros de interação, com sua própria realização de experiências ainda não sistematizadas, a criança pequena aprende a formar um núcleo interno de personalidade que, em certa medida, consiste em camadas de uma autorrelação positiva (Honneth, 2003). Podemos diferenciar mais este processo de socialização, se distinguirmos analiticamente esta autorrelação em vários estágios, em cada um dos quais aumenta o grau da capacidade de autonomia. A diferença entre esses estágios se mede no fato de que, com o aumento do número de parceiros de interação, também se torna mais complexo e exigente o comportamento de reconhecimento, por cuja internalização, a criança em desenvolvimento toma consciência de suas capacidades e direitos. Com base nesta premissa, parece ser pacífico assumir, como ponto de partida, a existência de um estágio na autorrelação infantil, no qual se aprende a conceber as necessidades e desejos experimentados internamente como sendo uma parte da própria pessoa, passível de ser articulada. Com um conceito feliz, que Erik H. Erikson tornou frutífero para a psicanálise, pode-se designar como autoconfiança este tipo de segurança elementar sobre o valor das próprias carências (Erikson, 1974, p. 62). Enquanto a formação desta autoconfiança se realiza através da internalização bem sucedida do comportamento cuidadoso estável da pessoa de referência primária, como via de regra o pai ou a mãe assumem, a realização do segundo estágio já exige a ampliação da rede de parceiros significativos de interação: a criança precisa aprender a desenvolver uma autorrelação positiva adicional, para além da auto-confiança, que consiste na consciência elementar de ser considerada aos olhos dos outros como um ser responsável. Recorrendo às observações, que devemos tanto a George Mead como também a Jean Piaget, é possível supor que esse estágio se realiza através da internalização do comportamento lúdico praticado com outras crianças. A criança desenvolve primeiras, germinais formas de dignidade ou de autorrespeito, na medida em que ela se experimenta nas brincadeiras como um parceiro de interações, cuja capacidade de fazer julgamentos é percebida como importante ou confiável (Mead, 1973, p. 248). Claro que esse processo também é influenciado pela experiência de ser crescentemente respeitado pelos outros membros da família como um sujeito cujas convicções não são mais totalmente irrelevantes na tomada conjunta de decisões. Por fim, o terceiro estágio, com o qual se dá um novo passo na formação da autonomia, de modo algum se realiza somente depois de concluído o segundo, mas, por certo, em paralelo cronologicamente com ele, porquanto as experiências intersubjetivas que a criança necessita fazer, para no final alcançar consciência da importância de suas habilidades físicas e intelectuais próprias, geralmente são realizadas já no período em que ela adquire as primeiras formas de autorrespeito, através da interação com um outro fracamente generalizado (Mack e Ablon, 1983). Aliás, toda essa distinção em três estágios da autorrelação positiva – a autoconfiança, o autorrespeito e a autoestima – não deveria ser compreendida no sentido forte de uma sequência ontogenética. Antes, temos boas razões para admitir que as três formas de autorrelação podem se desenvolver, de forma ainda indiferenciada, já na internalização do comportamento cuidadoso dos pais, e só ser experimentadas posteriormente, no processo de gradativa diferenciação dos parceiros de interação, como aspectos específicos da própria vivência.

    O quadro que resulta dessas reflexões sobre o processo de socialização (Sozialization) humana contém a ideia de um entrelaçamento entre individualização e socialização (Vergesellschaftung) que já permite tirar algumas conclusões sobre a importância dos grupos sociais para o amadurecimento individual. Eu havia afirmado que a internalização da relação de reconhecimento, que gradativamente se diferencia, leva ao surgimento de uma forma complexa de autorrelação, através da qual a criança aprende pouco a pouco a conceber-se como um membro competente de seu ambiente social. De certa forma, o devir da autonomização está entrelaçado com o processo de socialização, pois somente pode cumprir com as normas e habilidades socialmente esperadas aquele sujeito que as assumiu para si como o núcleo prático de sua própria autocompreensão. Mas, para manter vigentes e até mesmo expandir estas formas de autorrelação prática positiva, o sujeito necessita participar de grupos sociais que, de certa forma, representam um espelho do comportamento original de reconhecimento. A experiência de ser considerado importante nas próprias carências, na sua capacidade de julgamento e, sobretudo, nas suas habilidades precisa ser renovada e reconstruída pelo sujeito sempre de novo na vida em grupo, para que ela não perca sua força e vivacidade na anonimidade do outro generalizado. De certa forma, o grupo permite ao adulto que ele siga experimentando aquela postura de reconhecimento direta, ainda mediatizada por gestos e palavras, que em circunstâncias favoráveis ele podia observar durante sua infância nas reações afirmativas das suas pessoas concretas de referência (Flanagan, 1991, parte 2). Nesse sentido, parece-me justificado admitir uma necessidade normal, quase natural dos sujeitos, de serem reconhecidos como membros em grupos sociais nos quais eles possam ver confirmadas duradouramente, através de interações diretas, suas necessidades, sua capacidade de julgamento e suas diversas habilidades.

    Naturalmente, é possível diferenciar esses grupos, num primeiro momento, segundo as distintas formas de autorrelações positivas que neles experimentam uma espécie de reconhecimento reconcretizado. Para poder manter e, eventualmente, fortalecer sua autoconfiança, o sujeito necessita a experiência protetora da dedicação duradoura e confiável, tal como pode ser substancialmente possibilitada através de amizades e de relações afetivas. Nesse caso, não se pode falar propriamente de grupos, uma vez que a intersubjetividade almejada tem, antes, a forma de uma díade que parece ser moldada no equilíbrio entre fusão e separação segundo a estrutura da simbiose inicial. De qualquer modo, possivelmente não seja muito arriscado atribuir também ao adulto o impulso de procurar alcançar nestas formas íntimas, por vezes com conotação sexual, do estar a dois novamente uma consciência do valor de sua própria carência. Já que o amor, uma vez experimentado, não é suficiente para sustentar a autoconfiança conquistada durante o transcurso de toda uma vida, via de regra os sujeitos dependem da repetição de experiências de reconhecimento análogas à simbiose (Honneth, 1992, cap. 5). A situação é diferente naquele tipo de autorrelação positiva que denominei “dignidade” ou “autorrespeito”. Normalmente, o sujeito aprende já com o fim da adolescência a separar a confiança no valor de seu próprio discernimento da confirmação concreta que ele havia recebido anteriormente no grupo dos seus pares. Talvez até a gradativa prática no papel de cidadão ou cidadã baste para dar durabilidade psicológica a este tipo de sentimento de autorrespeito, a ponto de, no futuro, ele se tornar independente de apoio e reafirmação direta. Mas um resultado tão bem sucedido só será possível em casos muito raros, pois, geralmente, a experiência dos deveres e, sobretudo, dos direitos de cidadania face à realização da vida permanece muito abstrata para fornecer suficiente autorrespeito. Por isso, os sujeitos, em especial ali onde o status de sujeito de direito lhes é negado na consciência pública, frequentemente dependem da participação em grupos sociais os quais lhes asseguram uma espécie de respeito compensatório. Segundo uma expressão cunhada por Richard Sennet, estes grupos formam contraculturas do respeito (Sennett e Cobb, 1972, p. 79-89; cf. exemplo em Bourgois, 1995) nas quais prevalecem códigos obstinados de responsabilidade e estima. Assim, o número de seus membros raramente ultrapassa aquele tamanho que ainda permite interações diretas e controláveis, porque elas, no reflexo dos gestos e expressões animadores, precisam ajudar o indivíduo a adquirir uma consciência do valor de sua própria competência para fazer julgamentos. Mas lá onde esta abrangência do pequeno grupo for ultrapassada e, consequentemente, as interações face a face não forem mais possíveis, estaremos na presença de movimentos sociais, nos quais as normas alternativas de respeito se tornaram um meio generalizado. No lugar dos gestos concretos de reconhecimento, nesses grandes grupos anônimos, estabeleceram-se símbolos e rituais coletivamente compartilhados que, no entanto, têm força simbiótica suficiente para prover aos seus membros, mesmo à distância, o respeito compensatório.

    Mas, sem dúvida, o solo mais fértil para a formação de grupos é dado por aquela camada da formação de personalidade que eu anteriormente denominei como autoestima, pois a consciência de que as habilidades próprias são importantes aos olhos dos outros certamente necessita, sempre de novo, uma reconfirmação ao longo da vida, para não se tornar muito fraca e impotente. É bem verdade que a base psíquica para este tipo de autorrelação positiva seja colocada já muito cedo nos casos de uma socialização bem sucedida, porquanto os pais, irmãos ou amigos coetâneos normalmente sinalizam claramente à criança que ela dispõe de um punhado de talentos e habilidades importantes. Mas, com o ingresso na escola e, sobretudo, mais tarde na vida profissional, cresce muito o círculo daqueles de cuja estima a própria autoestima depende, de modo que, em reação à maior vulnerabilidade, também aumenta o desejo de aprovação e confirmação concretas. Na necessidade de encontrar uma estima passível de ser experimentada diretamente no círculo das pessoas afins, está hoje um, senão o motivo central para a formação de grupos. Com a pluralização dos valores e o surgimento dos mais diferentes ambientes sociais, provavelmente essa tendência inclusive aumentou, porquanto praticamente não existem mais padrões de avaliação válidos para toda a sociedade, que pudessem informar, de certo modo anonimamente, o indivíduo sobre a importância de suas próprias realizações. Por consequência, hoje é praticamente incalculável o número de grupos organizados ou informais, cuja existência está dedicada exclusivamente à prática de determinados aspectos valorativos, e os quais permitem que seus membros se reafirmem reciprocamente em suas habilidades e talentos próprios. E a concorrência que normalmente é praticada dentro e mesmo entre esses grupos só é a expressão do fato de que este tipo de estima pressupõe a localização numa ordem classificatória.

    A breve descrição panorâmica que fiz até aqui, da relação entre a necessidade de reconhecimento e a formação de grupos, pode dar a impressão de que todos esses grupos estariam livres de dinâmicas inconscientes. O objetivo da vida em grupo parece tão transparente a todos os membros, os motivos parecem estar tão claramente a serviço da saúde psíquica, que quase não é possível falar da influência de forças e sugestões inconscientes. Esta primeira apresentação, no entanto, é apenas o resultado de uma ficção metodológica devida à pretensão de revelar, primeiro isoladamente, os impulsos totalmente inocentes e, ao mesmo tempo, naturais para a formação de grupos. O panorama muda em um aspecto decisivo, tão logo no desejo de reconhecimento seja tematizada uma camada profunda que está além do controle do sujeito. Pois, com a separação da simbiose inicial, que se constitui no primeiro passo do reconhecimento da independência do outro, segundo Winnicott, a criança é, até certo ponto, sobrecarregada. Por isso, ela preserva, até a idade adulta avançada, o impulso de esporadicamente recair no estado da fusão no qual ela pode se sentir como ainda inseparada do outro sujeito. Quero mostrar, no segundo passo dessa exposição, que toda a vida em grupo é, em certo modo, perpassada por esta tendência. Mas o fato de talvez se tratar de impulsos inconscientes ainda não permite falar, aqui, de uma regressão no sentido patológico.

    II

    A razão que Winnicott dá para sua premissa central, no fundo, é fácil de compreender, mesmo que ultimamente tenha sido apresentada uma série de reservas com relação a ela. Em sua argumentação, o teórico da relação com os objetos tão somente tira as consequências da tese de que, no início da vida humana, precisamos contar com uma fase em que é vivenciada uma unidade simbiótica. Se for verdade que a criança pequena somente aprende a organizar suas forças psíquicas com a ajuda da internalização do modelo inicial de interação do cuidado de parte da mãe (ou de outra pessoa de referência), então parece que o estágio de vivência da unidade é precedido de uma ausência de diferenciação entre sujeito e realidade, no qual não se pode ainda falar de um outro experimentado como independente. Esta fase, bem inicial, para a qual, na psicanálise, há um conjunto de conceitos mais ou menos felizes, que vão de “narcisismo primário” até “simbiose”, pode ser compreendida como sendo um período em que o bebê ainda vê seus próprios impulsos e pulsões tão fundidos com as reações de satisfação correspondentes de parte da pessoa de referência, que, em sua vivência afetiva, não pode existir uma separação entre o seu eu e a realidade (Winnicott, 1984). Portanto, a criança recémnascida não é dependente do cuidado e da assistência de sua pessoa de referência apenas no sentido prático da simples sobrevivência devido a sua situação de carências físicas; também no sentido mais profundo da realização de suas vivências, ela, de modo algum, está separada do ambiente de um comportamento reativo satisfatório que a envolve. Winnicott está tão convencido da importância cabal desta experiência simbiótica original – não apenas para a criança pequena, mas, em princípio, também ainda para a pessoa adulta -, que ele dedica sua teoria psicanalítica essencialmente à explicação daqueles mecanismos com a ajuda dos quais a gradativa percepção de uma realidade independente pode ser efetivada nos primeiros anos de vida. Mas, também aqui, é necessário enfatizar quase imediatamente que, para ele, não se tratava do processo de criação de um esquema cognitivo relativo à realidade objetiva e desprendida, mas tão somente dos mecanismos com os quais a criança consegue reconhecer a realidade de uma pessoa de referência independente de suas próprias fantasias de desejo. A hipótese com a qual Winnicott pretende explicar este passo decisivo no aprendizado da criança pequena consiste na grandiosa ideia dos objetos transicionais, dos quais aqui só posso apresentar um brevíssimo resumo (Winnicott, 1989, p. 10): na relação afetivamente investida com objetos de seu ambiente vivencial, sejam eles partes de brinquedos, a ponta do travesseiro ou o próprio polegar, a criança constitui para si uma esfera autônoma de realidade, normalmente com a tácita aceitação da pessoa de referência, que não pertence nem apenas à vivência interna, nem já ao mundo dos fatos objetivos. Ao contrário, o que justamente caracteriza este tipo de zona “intermediária” de vivência é que ela é vista por todos os participantes como uma esfera ontológica, com relação à qual a pergunta pela realidade sequer se coloca.

    Se for considerada, também, a fase de desenvolvimento na qual ocorre a descoberta de tais objetos transicionais intermediários, então é inicialmente possível presumir que eles são criações substitutivas para a mãe perdida para a realidade externa. Porque eles têm uma natureza híbrida, a criança pode utilizá-los, diante dos olhos dos pais, praticamente para deixar suas fantasias simbióticas originais sobreviverem para além da experiência da separação e, ao mesmo tempo, testá-los criativamente na realidade. Contudo, nessa utilização lúdico-experimental, também se evidencia que a função dos objetos transicionais não pode ser limitada unicamente a assumir simbioticamente o papel da mãe experimentada no estado de fusão; pois a criança não se refere apenas com simbólica afetividade aos objetos por ela escolhidos, mas também os expõe reiteradamente a raivosos ataques e tentativas de destruição. Disso, Winnicott acredita poder deduzir que os objetos transicionais devam ser, de certo modo, elos ontológicos mediadores entre a experiência original do estar fundido e a experiência de estar separado: no trato lúdico dos objetos afetivamente investidos, a criança constantemente tenta superar simbolicamente o abismo dolorosamente vivenciado entre a realidade interna e externa. A circunstância de que a isso esteja vinculado, ao mesmo tempo, o início da formação de uma ilusão aceita intersubjetivamente permite a Winnicott, inclusive, dar um passo adiante e chegar a uma tese de grandes consequências: porque a formação dessa área ontológica intermediária se deve à solução de uma tarefa que permanece atual para o ser humano por toda sua vida, ela é o lugar psíquico de surgimento de todos aqueles interesses que o adulto associará com as objetivações culturais. Não sem alguma tendência para o exagero, Winnicott diz:

    Presume-se, aqui, que a aceitação da realidade como tarefa nunca é completada, que nenhum ser humano está livre da tensão de relacionar a realidade interna e externa, e que o alívio dessa tensão é proporcionado por uma área intermediária da experiência que não é questionada (artes, religião etc.) […]. Essa área está em continuidade direta com a área do brincar da criança pequena que se ‘perde’ no brincar (Winnicott, 1989, p. 23).

    Assim, a ideia dos “objetos transicionais” leva à concepção de que o ser humano manterá por toda sua vida a tendência de se refugiar ocasionalmente atrás dos limites do eu já alcançados para poder suportar a crescente distância do estado original da simbiose. Surpreendentemente, Winnicott não inclui a vida intersubjetiva em grupos no rol das esferas da experiência que permitem tal regressão aliviadora. Contudo, haveria a possibilidade de interpretar determinados períodos de realização da vida em grupo segundo o mesmo esquema que ele descobre nas esferas culturais da arte e da religião. Também naqueles casos em que, durante a práxis em comum, as distâncias psíquicas entre os membros do grupo começam a desaparecer e cresce o sentimento da concordância afetiva, repentinamente parece desaparecer, para cada indivíduo, a pressão para aceitar a realidade externa como uma entidade independente. Todos conhecerão a experiência de só poder se separar de um grupo com um empurrão e mediante o emprego de muita energia, depois de se haver passado algumas horas ou dias num estado de comunhão intensiva. A difícil experiência de separação, no entanto, não se aplica aos membros individuais do grupo nem aos resultados produtivos da convivência, mas refere-se unicamente ao estranho estado de levitação, no qual as fronteiras antes erigidas frente aos outros houveram sido temporariamente derrubadas. Por conseguinte, a fascinante observação de Winnicott pode ser ampliada, no sentido de que, ao lado da arte e da religião, também a intersubjetividade do grupo forma uma esfera de experiência que faz desaparecerem as fronteiras entre a realidade interna e externa; sim, se levarmos a sério sua indicação a respeito da origem dessas zonas intermediárias na brincadeira infantil, então talvez seja possível, inclusive, dizer que a experiência da fusão no grupo representa, para o adulto, o espelhamento mais direto de suas experiências na tenra infância.

    Dessa extensão do diagnóstico de Winnicott resulta a consequência de que a vida intersubjetiva no grupo em geral estará caracterizada por circunstâncias regularmente recorrentes e episódicas, que levam a fusões mais ou menos intensas entre os membros. Mesmo que o espectro dessas vivências coletivas de fusão seja extremamente amplo, todas elas seguem o mesmo percurso de uma gradativa ascensão, um repentino apogeu e um subsequente achatamento da aproximação entre os participantes: seja na forma subliminar da cooperação totalmente irrefletida e vivenciada extaticamente, seja na forma incomparavelmente mais ruidosa do ritmo da dança corporal na massa jubilante, seja no estádio de futebol, no concerto de rock ou no isolamento do grupo de trabalho absolto como que imerso num jogo, as circunstâncias da vida em grupo sempre se caracterizam por aquela tendência a uma fusão quase orgiástica que Durkheim denominou momentos de efervescência coletiva (Durkheim, 1981, p. 296; cf. Joas, 1997, cap. 4). Não se trata, obviamente, de uma temática inconsciente, relativa à qual no interior do grupo pudessem eclodir conflitos que estivessem relacionados às pulsões primitivas; antes, a fusão revivida esporadicamente alimenta o sentimento comum de compartilhar as normas de respeito e os valores à luz dos quais os sujeitos podem se reconhecer reciprocamente.

    Se, portanto, anteriormente tínhamos dito que todo sujeito adulto costumeiramente terá o impulso de se vincular a grupos nos quais o valor da própria personalidade seja espelhado na forma de uma vivência, então podemos agora dar um passo adiante: porque os mesmos sujeitos que dependem da confirmação de sua estima no grupo, ao mesmo tempo, são impulsionados pela necessidade de deixar-se regredir para trás dos limites do eu já alcançados, a vida no grupo sempre estará perpassada por tendências de fusão. Obviamente, os impulsos regressivos que normalmente acompanham tais experiências de fusão não são um indicador de reprimitivizações patológicas, mas expressão da recuperação de vitalidade psíquica, pois todo grupo social, na medida em que cumpre a função de uma reconcretização do reconhecimento intersubjetivo, precisa, nas circunstâncias da comunidade desinibida, reforçar justamente aqueles valores e normas aos quais os sujeitos devem a confirmação de sua estima. Por isso, o equívoco da psicanálise tradicional consiste em igualar completamente estas manifestações “sadias” de regressão com aquelas nas quais energias primitivas são ativadas no interior de grupos de modo ameaçador para a identidade (Honneth, 2007). Claro que também existem tais patologias da vida em grupo, mas elas não devem ser identificadas com as fusões periódicas através das quais o grupo renova sua própria cultura de reconhecimento.

    Com isso, chego ao terceiro e mais breve passo no meu texto. Também as reflexões até agora apresentadas são ainda, de certo modo, o resultado de uma abstração metodológica, pois eu, mesmo levando em consideração as tendências regressivas, tratei o grupo social como se ele sempre fosse livre de temáticas e conflitos que tivessem um caráter estranho e até patológico. É bem verdade que a maioria dos conflitos que tipicamente surgem no interior de grupos são, sobretudo, de tipos quase conscientes, fáceis de serem reconstruídos racionalmente. Em geral, eles estão relacionados à necessidade de interpretação e hierarquização das realizações individuais que os sujeitos devem poder demonstrar para contarem como membros reconhecidos. Do fato de que, no interior do grupo, surgem ordens hierárquicas disputadas resultam concorrências as quais, por sua vez, podem fomentar alianças parciais e fracionamentos. Afinal, desses fracionamentos possivelmente surjam dinâmicas psíquicas que podem fugir do controle a ponto de assumirem dimensões dolorosas e, até mesmo, ameaçadoras da identidade para alguns. Mas nós não nos referimos a esses conflitos quando falamos da patologia de um grupo, pois eles têm um núcleo racional, na medida em que resultam da circunstância da possibilidade de se hierarquizar as realizações individuais, o que pode levar a uma inundação da vida do grupo com posturas estratégicas, rancor e inveja. E, naturalmente, também a obrigação de libertar-se do estado de fusão do grupo, sempre de novo, pode levar alguns membros a reações defensivas e a tendências à negação, pois a tarefa da renovada aceitação da independência do outro nem sempre é fácil de realizar. No entanto, também essas dificuldades individuais de adaptação só causarão uma patologização de toda a vida do grupo, se não houver um número suficiente de membros que prestam uma ajuda totalmente discreta, praticamente terapêutica e normalizada.

    III

    Nos escritos de Freud sobre a psicologia de massa, frequentemente é sugerido que a vida em grupo como tal seja responsável pelas regressões que motivam os membros à subjugação à figura do líder fantasiada como onipotente. Não seriam os defeitos psíquicos do indivíduo, mas a atmosfera sedutora do grupo anônimo o que faria desaparecer as capacidades individuais de controle, a ponto de que as projeções da primeira infância pudessem se tornar o impulso para agir socialmente (Freud, 1999). Também Adorno, por motivos que certamente estão relacionados com o fato de ter vivenciado as massas do nacional-socialismo, por muito tempo parece ter insistido nesse tipo de interpretação. Em seus textos sobre psicologia social, a concepção de que, na vida em grupo, os sujeitos têm pouco controle sobre suas energias psíquicas desempenha um papel decisivo (Adorno, 1972). Somente alguns anos após seu retorno do exílio, ele manifestamente mudou sua concepção, pois, nos “excursos sociológicos”, que ele publicou junto com Horkheimer, no verbete “grupo” encontra-se uma frase que vem amplamente ao encontro da perspectiva defendida aqui: Para qualquer humanidade, a proximidade íntima de pessoas e, com isso, o pertencimento a grupos que permitam contato humano imediato, é um pressuposto óbvio (Institut für Sozialforschung, 1956, p. 64). Segundo esta afirmação, não pode ser o próprio ambiente psíquico do grupo o que leva ao surgimento de manifestações patológicas da disposição projetiva à obediência. Antes, ao contrário, devem ser distúrbios individuais de personalidade dentro de um grupo que devem ter constituído uma ligação tão infeliz, que as relações de interação como um todo são investidas de potenciais conflitivos não resolvidos, dos quais, então, todos membros participam regressivamente. Em oposição a Freud e a alguns de seus seguidores, os grupos não constituem “em geral”, como afirma Kernberg (2000, p. 11), uma ameaça à identidade pessoal. Este tipo de desenvolvimentos ameaçadores só ocorre, se as energias primitivas reativadas dos membros individuais confluírem para uma corrente que arrasta consigo as capacidades de controle de todos os outros. Entre os distúrbios individuais que podem desempenhar um papel dinâmico em tais situações, quero destacar dois que me parecem ser particularmente influentes.

    “Para a patologização de grupos, parece ser responsável, primeiro, o acúmulo de um tipo de personalidade que permaneceu estacionado no estágio das idealizações primitivas por não ter concluído os processos de separação. Indivíduos deste tipo, em possível associação com um comportamento reativo “ocnófilo”, como descrito por Balint (1994, cap. 2), inclinam-se a uma vinculação medrosa a um objeto afetivo ao qual eles atribuíram habilidades onipotentes. Se o número de membros com esse perfil psíquico ultrapassa uma determinada proporção, para além da qual a influência civilizadora dos outros diminui ou se torna insignificante, então, por contágio ou transmissão, o grupo como um todo pode desenvolver um estilo de comportamento patológico. Os membros vivenciam a figura idealizada do líder como todo-poderoso e onisciente e a si próprios, ao contrário, como insatisfatórios, imaturos ou incompetentes. Se o dirigente não corresponder duradouramente ao ideal, então ocorre uma reação de negação ou anulação, seguida de perto pela procura por um líder substituto. Em seu estudo esclarecedor, Bion (2001, cap. 2) descreveu grupos deste tipo como “grupos dependentes”. Eles, obviamente, de modo algum podem cumprir a função de assegurar aos seus membros uma cultura do reconhecimento compacta e vivenciável”. A tese gira em torno de que o ser humano fortalece sua autoestima quando inserido em grupos, vamos colocar, saudáveis. Para a derrocada de pablo marçal é necessário que nos debates ele mostre sua fragilidade e insegurança ao ser desafiado por outros candidatos. Fugir ao debate apenas reforça a imagem de “onipotente” e “onisciente” que ele vende.

    https://doi.org/10.1590/S1517-45222013000200003

  5. Brutas figuras como pablo marçal vicejam em sociedades onde há precarização do trabalho, renda e educação. Axel Honneth, Filósofo da Escola de Frankfutt assim define essa propensão de um grupo anónimo se atrelar a um líder “onipotente”, em sua tese “O eu no nós: reconhecimento como força motriz de grupos”: “Para a patologização de grupos, parece ser responsável, primeiro, o acúmulo de um tipo de personalidade que permaneceu estacionado no estágio das idealizações primitivas por não ter concluído os processos de separação. Indivíduos deste tipo, em possível associação com um comportamento reativo “ocnófilo”, como descrito por Balint (1994, cap. 2), inclinam-se a uma vinculação medrosa a um objeto afetivo ao qual eles atribuíram habilidades onipotentes. Se o número de membros com esse perfil psíquico ultrapassa uma determinada proporção, para além da qual a influência civilizadora dos outros diminui ou se torna insignificante, então, por contágio ou transmissão, o grupo como um todo pode desenvolver um estilo de comportamento patológico. Os membros vivenciam a figura idealizada do líder como todo-poderoso e onisciente e a si próprios, ao contrário, como insatisfatórios, imaturos ou incompetentes. Se o dirigente não corresponder duradouramente ao ideal, então ocorre uma reação de negação ou anulação, seguida de perto pela procura por um líder substituto. Em seu estudo esclarecedor, Bion (2001, cap. 2) descreveu grupos deste tipo como “grupos dependentes”. Eles, obviamente, de modo algum podem cumprir a função de assegurar aos seus membros uma cultura do reconhecimento compacta e vivenciável”.

    A tese gira em torno de que o ser humano fortalece sua autoestima quando inserido em grupos, vamos colocar, saudáveis. Para a derrocada de pablo marçal é necessário que nos debates ele mostre sua fragilidade e insegurança ao ser desafiado por outros candidatos. Fugir ao debate apenas reforça a imagem de “onipotente” e “onisciente” que ele vende.

    https://doi.org/10.1590/S1517-45222013000200003

  6. Nassif, o cidadão comum não entende porque a prisão, a opressão no trabalho não ocorre com a elite. O judiciário brasileiro é lastimoso, por isso a extrema direita ganha adeptos no mundo. É insuportável a hipocrisia da elite e dos políticos que a servem. O cidadão comum Está cansado da dita civilidade que só serve para controla-lo e beneficiar quem tem bilhões. Ontem eu li que em 1965 recebeu 100 mil votos um rinoceronte em São Paulo. O que a extrema direita entendeu e investe é no cansaço da classe média que paga muito imposto e trabalha muito para não ser indigente. Estou me referindo àqueles que ganham até 10 SM.

    1. Sim Jaciara, elegemos o Cacareco, era esse o nome do rinoceronte. Foi festejado em grande estilo, com pompas e circunstância, como soe ao povo quando quer fazer mofa (gozação, zombaria, chiste, irreverência).

  7. Marçal é o presidente em 2026.
    Efeito Orloff: “Eu sou você amanhã”. Como se dizia nos anos 1980, em relação à Argentina e ao Brasil.
    A menos que se convença do risco anticivilizatório ao judiciário antilulista; à Faria Lima e por tabela aos Marinho. E agora pra complicar, também com os operadores do Zuja e do Musk.

  8. Marçal é reflexo do faroeste em que se transformaram as redes sociais

    Não há fiscalização, então tornou-se a terra do Deus dará, e marçal tenta trazer, o que seriam crimes no mundo real, toda a escrotice praticada pela extrema direita no mundo virtual, os quais agem sem regulação

    E como todos sabemos, onde não há poder judiciário, prevalece a Lei do mais forte, no caso, a do maior mentiroso

    A sugestão pra combater esse mundo de crimes seria a criação de polícias virtuais, ou no mínimo de agentes de fiscalização governamental pra tornar esse ambiente no mínimo civilizado

  9. Sou da opinião que todos nós temos, por padrão, independentemente das circunstâncias, um mínimo de bom senso e cuidado com o próximo porque, por não nos vermos temos que ver o próximo e saber que o que acontece a ele, de bom ou de mau, pode acontecer a nós mesmos.
    Sou de opinião também que o perdão deve ser isolado do esquecimento. Perdoar sempre que possível e quando for solicitado, mediante criteriosa análise. Esquecer nunca. Perdão sem solicitação e esquecimento do erro é convite para a reincidência e reiterado abuso. Nossa formação religiosa, entretanto, não nos permite essa inteligência, de maneira que os mais fracos continuam sendo sempre explorados em nome do perdão e do esquecimento.
    Sobre a revista Veja, poucas pessoas perceberam que a partir dela a verdade entrava em degenerescência e os meios de comunicação estavam a serviço do império para uma doutrinação atípica e consistente. Estávamos sob regimes ditatoriais em toda a América Latina, e a palavra escrita era a principal arma dessa guerra. Talvez o último meio de comunicação confiável antes da Veja tenha sido a revista Realidade. Depois disso, só se veiculava o que interessava ao sistema para deformar a visão do público. A mídia também se especializou em idiotização maciça, tão ao gosto de nossos modernos colonizadores, convertendo-nos aos seus valores, afinal, seus mentores e repetidores sempre foram regiamente compensados.
    Falo de perdão para explicar a não redenção de figuras como Reinaldo Azevedo, agora pousando de tio inteligente e bonachão, cheio de saber em nome da “democracia” , falo de bom senso para explicar os zumbis que se permitiram cegar e seguir tipos como o Olavo de Carvalho. Este, formador de nulidades, soube transferir aos incautos todo o seu ressentimento pela sua ignorância e incapacidade de seguir normas de aprendizado. Quebrar normas, juntar-se em bando para quebrar normas tanto quanto um grupo de crianças e adolescentes sai pela rua armada de paus e pedras quebrando a vidraça da vizinhança, chutando latas de lixo e pichando os muros… Aliás os movimentos de pichação e vandalismo começaram no mesmo período e foram sendo tolerados até virarem “arte”. Muitas pessoas, especialmente homens, cuja personalidade carente de autoestima, sentiam-se nulificados pelas qualidades de outros mais ostensivamente inteligentes ou bem sucedidos, se reuniram e foram gratificados pelo falso saber de Olavo de Carvalho, que nos USA, teve acesso ao vasto cabedal de armas de manipulação e autoajuda aplicado aos vendedores de qualquer coisa (e de enciclopédia no brasil). Um comportamento de desprezo pelo próximo, irreverência e conhecimento superficial de qualquer idéia que mostrasse inteligência, conquistou multidões. Afinal, o ensino do país tinha sido modificado e liquefeito pelos anos de ditadura. Não havia parâmetros para se avaliar a solidez de conhecimentos fora do “ensino democrático pós comunismo”. Três gerações se criaram sob esse fenômeno e as instituições, por mais sólidas que fossem, não tinham representantes suficientes que as sustentassem – como seria a obrigação da esquerda. Então fenômenos como o Bolsonaro, Pablo Marçal, Nicolas Ferreira, Gustavo Gayer, Magno Malta, (a maioria deles evangélicos, aliás) são uma consequência lógica da quebra do CONTRATO SOCIAL , o pacto de convivência social pacífica, respeitosa e tolerável, pois que, em maioria, sentem-se livres para não só desrespeitar o próximo como também para lhes negar direitos. Não há punição imediata, e quando há, quase não os alcança. Viraram hordas. Havemos que aguardar o ápice para que se autodestruam ou o cúmulo para que se tornem poder absoluto, porque esses, não têm bom senso por padrão nem isoladamente e nem em grupo, eles formam um desvio padrão.

  10. Há quem ache um absurdo o que China e Rússia fazem controlando as redes em suas jurisdições.
    Os países ocidentais fazem o mesmo, de forma mais discreta ( ou alguém acredita que a NSA não filtra quase a totalidade do tráfego do ciberespaço?).
    Já em Pindorama temos que chamar o Durango Kid e esperar….

  11. Sem dúvida o melhor artigo de Nassif nos últimos tempos!…

    Seria uma boa ideia fazer uma serie documental sobre o papel da

    mídia na ascensão da ultra direita no Brasil!

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