Xadrez dos militares golpistas, por Luis Nassif

É importante que os militares conspiradores comecem a pensar nos custos da conspiração. Enfrentarão não apenas a reação das instituições, mas as críticas dos colegas, pela desmoralização imposta às Forças Armadas.

Peça 1 – o golpe em preparação.

Não há a menor dúvida de que o Ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, participa da conspiração bolsonarista de colocar em dúvida as eleições. Assim como os generais Braga Neto, Augusto Heleno, Hamilton Mourão, Heber Portella, entre outros.

É aposta alta, com desdobramentos iniciais previsíveis – e consequências posteriores imprevisíveis.

Há inúmeras maneiras de boicotar as eleições, um factoide em torno das urnas de uma região, a não entrega de urnas por parte do Exército – incumbido de transportar as urnas até os Tribunais Regionais Eleitorais -, a introdução de um script malicioso por parte de alguma empresa cooptada.

O jogo dado, em caso de derrota de Bolsonaro, a partir da suspeita lançada, será contar com a agitação estimulada, os atentados dos Clubes de Caça e Tiro, a explosão da violência individual, para implantar um estado de exceção de prazo indeterminado.

Peça 2 – as consequências imediatas

A resistência ao golpe também é previsível.

Com exceção do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o indizível Luiz Fux, praticamente todas as instituições se manifestaram esta semana em defesa das eleições: vários Ministros do STF, o presidente do Senado, o Tribunal de Contas da União, a mídia, quase todos os partidos políticos.

O golpe suscitaria reação internacional imediata, a começar dos donos do dinheiro. Uma coisa é o que a mídia trata genericamente como “mercado” – operadores do dia-a-dia, com compreensão apenas sobre os movimentos da semana. Outra, são os donos do dinheiro, os gestores dos grandes fundos internacionais, as instituições multilaterais, a maioria das democracias ocidentais.

Haverá reação, também, em setores das Forças Armadas, que não endossarão os golpistas, o que estimulará a resistência contra o golpe.

De início, poderá haver adesão de parte do empresariado. Mas não será permanente, especialmente quando se explicitarem as represálias econômicas internacionais, além da indizível dificuldade de Paulo Guedes em gerir a economia. E não se trata apenas da política econômica, mas da notável incapacidade de Guedes em gerir o dia-a-dia da economia, agravada pela desorganização do mercado e do fluxo de recursos internacionais.

Portanto, o mais provável é que cada dia de golpe seja uma contagem regressiva para seu fim, um aumento do caos econômico, e um desgaste rápido do golpismo.

Peça 3 – o pós-golpe

Aí se chega no busílis da questão: como será o dia seguinte ao pós-golpe?

Ao contrário do fim da ditadura de 1964, desta vez não haverá um pacto de impunidade, que livrou da Justiça até crimes contra a humanidade.

A falta de experiência política dos militares de Bolsonaro impede-os de enxergar que nenhum poder é eterno. Hoje em dia, conspiram com naturalidade porque tem Bolsonaro na presidência. E quando cessar a blindagem?

Nem se espere represálias da parte do governo Lula – caso seja ele o eleito. Não será necessário. Bastará acabar com essa loucura do sigilo de cem anos para operações que escondem crimes. Caindo o sigilo, será derramada na praça uma sucessão imensa de suspeitas de crimes, das rachadinhas dos Bolsonaro aos crimes da Saúde, que ficarão à disposição de procuradores de primeira instância, de uma Procuradoria Geral da República independente, de um STF sem o comando de Luiz Fux, de um Tribunal de Contas da União ativo, de uma mídia francamente anti-Bolsonaro.

Não apenas os crimes. Todos os abusos atuais dos generais conspiradores virão à tona. Serão divulgados não apenas as operações suspeitas, mas os empregos distribuídos a granel, os abusos dos salários dobrados, as compras efetuadas, os custos das obras de engenharia militar.

Os julgamentos sobre a invasão do Capitólio, e a tentativa de Donald Trump de explodir uma guerra civil, servirão de modelo para o caso brasileiro.

É possível que o golpe seja bem-sucedido. E, para tal, será sangrento.

É mais provável que falhe. E, aí, é importante que os militares conspiradores comecem a pensar nos custos da conspiração. Enfrentarão não apenas a reação das instituições, mas as críticas dos colegas, pela desmoralização imposta às Forças Armadas.

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Luis Nassif

24 Comentários

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  1. Dá para entrar na OCDE sendo ditadura militar !?
    A Faria Lima se tocou que a gente pode ser mais pária no mercado internacional !?
    Liberais que fazem planos quinquenais !?
    Terceiro mundo é realmente opção de vida….

  2. Tenho algumas dúvidas se é este mesmo o xadrez. Só os sociopatas e psicopatas acreditam que o golpe pode dar certo. O objetivo é esculhambar a eleição e tirar Bozo e Lula do jogo. A maioria da elite não quer mais o Bozo, ele já cumpriu o seu papel. Mas quer menos ainda o Lula ou a esquerda no poder novamente. Vão deixar o golpe fadado ao fracasso destes celerados acontecer. Um golpe de curta duração nem trará tantos prejuízos assim. Será altamente funcional para as elites, dará a senha para uma “terceira via”. E não conte com punição severa aos militares. A elite brasileira não é capaz disso.

  3. Nosso histórico é a direita passar pano nos crimes da própria direita. Temer e Aécio tinham mala de dinheiro e gravação e estão soltinhos

  4. O risco de golpe, hoje, não provêm mais de Bolsonaro. Ele sozinho não conseguiria aplicá-lo. O risco, agora, provêm dos militares. Estes sim, podem tentar consumar o golpe e sustentarem-no por algum prazo de duração não muito longa. Os “pronunciamientos” ambíguos, e os nem tão ambíguos assim, demonstram que não há mais dúvidas de que os militares já compraram a tese do golpe. Com ou sem Bolsonaro. Já nem mais fazem questão de ocultá-lo. As manifestações esparsas de um general ou outro, em que supostamente o golpe é subestimado, fazem parte da tática aprendida nos quartéis. Se não houver alguma força suficientemente poderosa para impedi-los, ou para convencê-los do grande erro estratégico, a deflagração do golpe incendiará o país. Só que desta vez, os militares golpistas não mais serão anistiados. Tempos sombrios nos aguardam. José de Souza, abaixo, pode ter razão: parte da elite quer ver os militares fazendo o golpe sujo para não macularem as mãos. Uma vez desestabilizada a ordem institucional seria aberto, potencialmente, o caminho para a tão “sonhada” terceira via.

  5. Acho relevante as análises produzidas por especialistas na tentativa de explicar o cenário e contribuir para conter mais violações ou agravar a violação da institucionalidade do país. Sem dúvida não podemos prever com exatidão o que irá acontecer. No entanto, os acontecimentos desde 2013 mostram que o caminho até chegar neste estado de coisas que o país vive foi quase que linear e contínuo. Concordo que há pouca inteligência quando se compara o cenário atual com o que se viveu nos anos e meses que antecederam o golpe militar de 1964. O livro da professora Heloísa Starling (Os senhores das gerais, os novos inconfidentes e o golpe de 64) revela bem o trajeto complexo e bem articulado que mobilizou forças sociais, políticas e econômicas naquele momento. Não se vê isso na atualidade, por isso, acredito, assim como Nassif, que no momento atual, com essa cúpula do governo, é improvável um sucesso golpista. O receio é que haja ampliação da violência barata empreendida por bolsonaristas e fanáticos da extrema direita contra lideranças políticas e sociais que defendem a democracia. Neste caso, as instituições precisam agir com rigor e rápido para evitar a escalada dessa violência.

  6. José de Souza, retirando a direita/bolsonaro, e a esquerda/ Lula, o que sobra na 3ª via é o ciro com 8% de apoio popular. É viável?

  7. Existem três franquias de golpe concorrendo na praça: 1). Autogolpe de Bolsonaro – fadado ao fracasso se não contar com apoios provenientes das Forças Armadas; 2). Golpe Militar – Pode contar ou não com a participação de Bolsonaro. A rigor, hoje, Bolsonaro seria um estorvo para setores menos embrutecidos intelectualmente das FFAAs. Pode durar por algum tempo, mas também estará fadado ao fracasso por não contar com o apoio firme e decidido das elites econômicas, vulgo mercado; 3). Golpe das elites – o sonho da terceira via. Este se daria com um apoio discreto e sutil a qualquer uma das duas primeiras franquias. Uma vez quebrada a ordem institucional, a nova ordem seria violentamente atacada pelos setores “limpinhos e cheirosos” da imprensa/mercado. O caminho para a terceira via estaria aberto e, com algum jeitinho, sem obstáculos representados pelos setores ligados à esquerda. Uma truculênciazinha aqui, outra ali, com o apoio envergonhado das elites para não se comprometerem demasiadamente, deixaria o caminho livre e desimpedido. Das três, esta parece ser a única com chances de ter êxito por algum tempo. Todas as três produzirão retrocessos ao país e sofrimentos à população, principalmente aos setores mais vulneráveis economicamente. Em todas as três, o papel das Forças Armadas é decisivo. Em todas as três, as Forças Armadas entrariam em uma aventura na qual sairiam amplamente perdedoras. Uma manifestação clara e incisiva de que o(s) golpe(s) não seria(m) tolerado(s), por parte das Forças armadas, jogaria por terra todos os rumores, cada vez mais ensurdecedores. Há que ficarmos muito atentos a essas três franquias golpistas. A anistia aos golpistas, desta vez, não parece estar no horizonte.

  8. E aí, vem o medo do pior: a violência, gratuita, descabida dos “zelosos cumpridores de ordens” – a banalidade do mal – como na Alemanha nazista; e logo em seguida a intensa campanha pela fim Forças Armadas, aparentemente muito justas reivindicações, já que transformadas em mera pistolagem a serviço da loucura e dos abutres de sempre.
    Eles têm que sair do front político. É urgente. Porém…

  9. reformulando a perguntas do Márcio: Descobriu-se afinal pra que serve 4 mil!! Generais?

    Só uma correção: em relação à desmoralização das forças armadas os golpistas não precisa se preocupar, né pazuelo?

  10. Como se daria a censura em tempos de intrnet de um eventual desgoverno militar?
    Só uma correção: em relação à desmoralização das forças armadas os golpistas não precisaM se preocupar, né pazuelo?

  11. A maçonaria está envolvida até o pescoço nesse enredo do golpe do Bolsonaro. Por isso, abram os olhos quando virem ou lerem declarações de juristas, jornalistas, empresários, políticos de carreira, militares e pastores evangélicos. Todos estão mancomunados e trabalhando para o mesmo objetivo, irmanados conforme orienta a seita. E, para piorar, estão armados até os dentes e com muito ódio nos olhos. Não querem a justiça social (esquerda) no poder. Querem manter os seus privilégios egoístas (direita) para todo o sempre.

  12. Eu espero que.tentem…seria uma.opotunidade para colocar essa turma nos devidos lugares, acabar com as PMs entre outras necessidades…..já deu nos pacovás aguentar essa turma se achando donos do país….e uma.nova constituinte por que essa CF88 já foi trucidada…

  13. Desde ontem não consigo postar comentários (11 anos no GGN…):
    “Sorry, you have been blocked”
    Não sei o que possa estar acontecendo, mas nestes tempos sombrios é bom verificar
    Quem sabe esta singela msg passe?

  14. Parece que o bloqueio de outro comentário meu está relacionado ao conteúdo / tamanho?
    De qq. forma, o resumo dele trata da seguinte hipótese:
    O supervisor do setor de segurança físico/patrimonial da “firma” está contestando, tentando interferir e exigindo ações e satisfações da diretoria e do conselho sobre como eles a dirigem e como escolhem os integrantes da alta direção.
    Em vez da alta direção colocar o supervisor e seu setor de segurança no seu devido lugar, esclarecendo que pode ser punido ou demitido, junto com quem apoiá-lo, fica dando satisfações a ele por, como todos os demais funcionários, terem sido convidados a usar as caixinhas de sugestões da empresa.
    É só isso…

  15. Meu Caro Nassif
    Você abrandou ao concluir o texto. Minha sugestão seria:
    “(…)É mais provável que falhe (…)Enfrentarão, com grande probabilidade, a ocorrência das próprias prisões”.
    É preciso que se diga, COM TODAS AS LETRAS, que serão presos, mais cedo do que imaginam.

  16. cada vez mais aumenta o risco de um atentado contra o Lula, inclusive depois de eleito. Será o auge do golpe, no meio do caos que o talibã militar-evangélico está criando.

  17. Os militares de 64 tiveram o apoio explícito do judiciário, o que felizmente não é o caso, com o bolsonarismo tendo somente dois representantes no STF, escolhidos mais por ambições pessoais do que propriamente pelas qualidades jurídicas
    Apoio externo o Bolsonaro possui zero por cento
    É mais uma bossalidade do mandatário do que uma efetividade, visa manter os eleitores que restarem em catarse sob seu ponto de vista, garantindo votos futuros
    Mas, se a mentira colar colou, como foi a operação lava jato, um emaranhado de excentricidades jurídicas que ferrou o Brasil e onde todos os setores embarcaram na aventura porque não conseguiam votos pra derrubar a esquerda
    A mesma coisa é o Bolsonaro, acredita em seu conto de fadas jurídico miltar e midiático, por isso esse dinheiro todo repassado a órgãos de mídia
    Mas a lava jato foi um golpe que, sobretudo, tinha como alvo a corrupção que continua forte, velada e institucionalizada nesse governo

  18. Se atentarmos para o pronunciamento do moribundo Vilas Boas perceberemos que para a agitação estimulada seria preciso um instrumento que ¨FAIO¨ que seria os meios de comunicação trazendo essas agitações patrocinada por grupos que contaminariam cada vez mais grupos (efeito cascata). Não ha mais espaço nem viabilidade de golpe e o que se espera é que desta vez ais instituições punam exemplarmente esses generais baderneiros e subversivos, os empresários e os políticos que apostaram e se comportaram para o golpe. Quem viver vera?

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