Dois passos para aprofundar golpe, por Paulo Teixeira

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Dois passos para aprofundar golpe

por Paulo Teixeira

Depois de comprar a preço de ouro a maioria da Câmara para salvar Michel Temer de ser investigado por crime de corrupção na última semana, o golpe dá dois passos que conduzem o Brasil à incerteza. De um lado, a proposta de mudança de sistema de governo para o parlamentarismo, que ganha força com a introdução do chamado Distritão nas eleições legislativas. De outro, segue a tentativa de retirada dos direitos políticos do ex-presidente Lula, visando impedir sua candidatura.

A ideia do parlamentarismo, que vem ganhando espaço no discurso do governo e de sua base política e fisiológica, volta à praça porque as forças golpistas não conseguem construir uma candidatura capaz de vencer eleições presidenciais. Como não conseguem vencer eleições para presidente desde 2002, deram primeiro um golpe parlamentar, para derrubar a presidenta legítima, e agora querem abolir a própria figura do chefe do Poder Executivo eleito diretamente pelo povo. 

Na tradição republicana brasileira, a ideia do parlamentarismo sempre surgiu como um recurso das elites para substituir artificialmente a soberania popular. O parlamento, onde os conservadores sistematicamente compõem a maioria, é o seu habitat natural.

A brevíssima experiência parlamentarista na República resultou da primeira tentativa de golpe militar contra Jango, em 1961, e foi repudiada nas urnas pouco mais de um ano depois, no plebiscito de janeiro de 1963.

O povo sabe que essa proposta não lhe interessa. Nas duas vezes em que foi consultado sobre o sistema de governo, disse não ao parlamentarismo. No plebiscito de 1993, a proposta parlamentarista foi derrotada por larga margem. Vale ressaltar que esta consulta ocorreu em um período democrático e de estabilidade, sem ameaças de golpe e convocado pela Constituinte.

No Brasil a Presidência da República goza de extrema representatividade por ser a instância de Poder originada da vontade da maioria absoluta da Nação. É essa força que permite a presidentes progressistas enfrentar a resistência e até a sabotagem dos setores conservadores, que predominam no Congresso graças a imperfeições do nosso sistema eleitoral e político. Presidentes, como Getúlio, Jango e Dilma, foram vítimas dessa distorção.

Além de afrontar a Constituição, seus defensores querem instituir outro sistema de governo sem consultar o povo, que já o rejeitou duas vezes.

O parlamentarismo é a continuidade do golpe, para dar ainda mais poder a um Congresso Nacional desmoralizado por sua atuação no golpe do impeachment, na cobertura a um governo corrupto, na revogação de direitos históricos dos trabalhadores e na cumplicidade com a entrega do patrimônio nacional.

Entregar o Poder Executivo a um parlamento em crise de legitimidade e representatividade é a aposta das elites para cumprir os dois objetivos do golpe: obstruir as investigações de corrupção e continuar retirando direitos da população.

O parlamentarismo é, de fato, o Plano B das elites para impedir que o ex-presidente Lula volte a governar o país, com plenos poderes, e retomar o caminho do desenvolvimento com inclusão. O Plano A, como se sabe, é simplesmente impedir sua candidatura por meio de uma perseguição judicial, que vem ficando cada vez mais clara aos olhos da maioria da população.

A porta de entrada para este golpe dentro do golpe é o “Distritão”, uma mudança no sistema eleitoral que visa garantir uma maioria conservadora e fisiológica na próxima legislatura. Este modelo, historicamente defendido por Michel Temer, fragiliza os partidos, reduz a possibilidade de escolha dos eleitores e privilegia os candidatos com maior poder econômico e acesso aos meios de comunicação. É a chance de sobrevivência dos  investigados pela Justiça e comprometidos com a agenda do retrocesso rejeitada pelo povo. 

O Congresso que temos hoje não tem legitimidade para realizar alterações tão drásticas no sistema político do Brasil. Esta reforma, inquestionavelmente necessária, deve ser realizada por meio de uma Assembleia Constituinte exclusiva, convocada e eleita para essa finalidade.

A superação da crise política passa necessariamente por eleições diretas para presidente e pela convocação de uma Assembleia Constituinte exclusiva para reforma política. A reintrodução do parlamentarismo no debate legislativo só nos leva a pensar na antecipação do pleito presidencial, antes que seja esvaziado por mais um ataque à Constituição.

Paulo Teixeira é advogado com mestrado na USP, deputado federal pelo PT-SP e vice-presidente nacional do PT. 

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