Observatorio de Geopolitica
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ONG financiada por Soros encomendou pesquisa Vox Populi anti-Maduro, por Eduardo Vasco

Um dia após a eleição venezuelana, a A4D publicou um comunicado acusando Maduro de fraudar as eleições e chamando a Venezuela de “ditadura”

Reprodução Fox News

ONG financiada por George Soros encomendou pesquisa Vox Populi anti-Maduro

por Eduardo Vasco

Segundo pesquisa do instituto Vox Populi, 63% dos brasileiros acham que o presidente Nicolás Maduro perdeu para o opositor Edmundo González nas eleições realizadas em 28 de julho na Venezuela. O levantamento foi publicado na sexta-feira (23) pelo blogueiro Leonardo Sakamoto, do UOL, e foi encomendado pela ONG Action for Democracy.

O instituto difundiu um corte ideológico, que indicou que 62% dos entrevistados de esquerda acreditam que Maduro fraudou as eleições, opinião que é compartilhada por 64% dos entrevistados de centro e 77% dos de direita. A mesma pesquisa também aponta que a maioria dos entrevistados (inclusive de esquerda) acha que o presidente Lula não deveria apoiar Maduro, não acredita nos argumentos do governo venezuelano para comprovar sua vitória nas urnas e apoiaria uma pressão mais forte de Lula contra Maduro.

Não há nada de estranho se esse for o verdadeiro pensamento da maioria dos brasileiros. Desde a semana anterior ao dia das eleições há um bombardeio desinformativo do monopólio de meios de comunicação sobre a Venezuela, na tentativa de deslegitimar a vitória de Maduro. Mesmo a esquerda, da qual uma parcela significativa é absolutamente alienada da realidade e acredita em tudo o que diz a burguesia, tem entrado na onda.

Mas se nos atentarmos para quem encomendou (ou seja, pagou) essa pesquisa, vamos descobrir uma organização que faz oposição pública a Maduro e ao chavismo.

A Action for Democracy é uma ONG fundada em fevereiro de 2022 e sediada nos Estados Unidos. Um dia após a eleição venezuelana, a A4D publicou um comunicado acusando Maduro de fraudar as eleições e chamando a Venezuela de “ditadura” – assim como Rússia, China e Irã (“curiosamente”, os principais rivais do governo dos EUA).

Isso não é nenhum absurdo, vindo de uma organização que reconheceu que financia a oposição golpista da Venezuela – chamada de “movimento democrático venezuelano” por seu presidente e diretor executivo, David Koranyi. Nestas eleições, esse “movimento democrático” foi representado por González, ex-diplomata envolvido com os esquadrões da morte da ditadura de El Salvador nos anos 80, e María Corina Machado, a mais destacada agente do governo dos EUA na Venezuela.

Apesar disso, a ONG “rejeita fortemente qualquer acusação [contra ela] de interferência estrangeira em qualquer eleição”. Porque não é só na Venezuela onde ela tem interferido. Aliás, o trabalho da ONG na Venezuela não é público. Foi revelado em uma conversa vazada de Koranyi.

A A4D apoia publicamente apenas 12 organizações, distribuídas por quatro “Estados-campo de batalha”, segundo sua própria definição: Hungria, Itália, Ucrânia e Brasil. Todos eles, quando da fundação da ONG, eram governados pela extrema-direita.

O principal “campo de batalha” da ONG é a Hungria. Koranyi é húngaro. O tesoureiro da organização, Chris Maroshegyi, também tem origem húngara. Kati Marton, membro do conselho consultivo, também é húngara.

Húngaro também é o especulador financeiro multimilionário George Soros, que é o principal financiador da Action for Democracy, segundo o diário Magyar Nemzet, um dos maiores jornais da Hungria. A A4D não divulga quem a financia, ao contrário da mínima transparência que tem sido consenso entre as principais ONGs internacionais.

Assim como combate a “ditadura” venezuelana, a A4D combate também a “autocracia” de Viktor Orbán, primeiro-ministro desde 2010. Orbán é representante de um setor da burguesia húngara que tem lutado, em determinada medida, contra o domínio do grande capital internacional, seu rival. E Soros, que se naturalizou americano e vive nos Estados Unidos desde meados do século passado, é o principal oponente de Orbán – principalmente à recusa de Budapeste de se aliar com o Ocidente contra a Rússia.

Soros talvez seja a maior personificação do capitalismo contemporâneo – ou seja, o imperialismo neoliberal, onde os monopólios controlam a economia mundial. Magnata do capital financeiro, utiliza parte dos lucros que arrecadou com a exploração dos países mundo afora nas últimas décadas para financiar golpes de Estado a partir de suas ONGs “filantrópicas”. Foi assim na antiga “Cortina de Ferro” do leste europeu, na Ucrânia, na Venezuela e em muitos outros lugares. E continua sendo.

O discurso das ONGs de Soros é exatamente o mesmo da CIA e de todo o Deep State dos EUA. É o mesmo do FMI, do Banco Mundial e das Nações Unidas. Porque são todos órgãos centrais do sistema imperialista. É o discurso que ouvimos 24h por dia na TV Globo, ou lemos nas páginas da Folha de S.Paulo, que são sucursais da imprensa dos EUA. Para neutralizar a luta de classe dos trabalhadores, que precisa do apoio dos outros setores populares como camponeses, juventude, mulheres e negros, espalham uma ideologia que se pretende reformista e progressista (o identitarismo) a fim de dividir esses setores e cortar seu apoio ao proletariado e às ideias revolucionárias (marxistas e anti-imperialistas). O “empoderamento” das “minorias” a partir das instituições “democráticas” (ou seja, do Estado burguês) é a fórmula ideal de alienação de todos esses setores da luta real por transformações sociais. Muitas organizações e indivíduos de esquerda, que são liderados ou influenciados por lideranças pequeno-burguesas (cuja classe social tende a seguir essas ideias), também foram atraídos por esse canto de sereia e acreditam que tanto esse discurso quanto os seus criadores realmente se importam com a sua luta. Por isso, seja ingenuamente ou conscientemente, prestam serviço a essas organizações.

Como esse discurso não agrada aos setores culturalmente conservadores, geralmente de direita, e como a ânsia de dominação imperialista afeta até mesmo a burguesia nacional dos países pequenos – como a Hungria –, que pode se virar à direita mesmo tendo contradições com o imperialismo, então essas ONGs e seus financiadores são equivocadamente considerados de esquerda. Nos EUA, “esquerdista” é sinônimo de “liberal”, tal é o reacionarismo do sistema – Donald Trump está chamando Kamala Harris pejorativamente de “camarada”. A Hungria foi tão colonizada pelos EUA que se transformou em um regime no qual defender as políticas da União Europeia é “ser de esquerda”. Mas quem recebe dinheiro de grandes capitalistas para derrubar governos – geralmente de esquerda, como o da Venezuela – jamais poderia ser considerado de esquerda.

Voltando à Action for Democracy, essa organização tem negado sistematicamente sua relação com Soros. Mas o histórico de Koranyi não o ajuda. Ele também é membro do Conselho Europeu de Relações Exteriores, um think tank financiado, entre outros, pela Open Society Foundations de George Soros (conferir p. 31), e tem ligações com os governos de França e Alemanha e com a OTAN. Também é ligado ao Atlantic Council, um dos principais think tanks dos EUA e que recebe financiamento do governo americano. Chris Maroshegyi trabalhou com ele no Conselho Europeu. Já Kati Marton foi membro de organizações que também são financiadas pela Open Society, como o Comitê de Proteção aos Jornalistas (conferir p. 11) e a New America Foundation.

Não é só com George Soros que a A4D tem relações. Seu conselho consultivo está infestado de membros que trabalham ou trabalharam para o governo dos Estados Unidos, do Reino Unido ou para a OTAN. É o caso do general Wesley K. Clark, comandante da OTAN durante os bombardeios à Iugoslávia, em 1999. Clark e Marton foram filmados admitindo que sua atuação também envolve mudanças de regime na Polônia (agora já governada pela direita neoliberal totalmente alinhada com o imperialismo, ou seja, conseguiram seu objetivo) e na Turquia de Recep Erdogan.

“O que nós temos tentado fazer”, disse Koranyi ao Liberal Europe Podcast, “é ser uma instituição que capta o apoio [dos compatriotas que vivem no exterior] e o canaliza para seus países-natais. Não é apenas a diáspora húngara, mas também a polonesa, a brasileira, a cambojana e a venezuelana”.

O governo da Ucrânia, que também é de extrema-direita (com forte apoio institucional ao nazismo), contudo, não sofre nenhum tipo de ameaça da A4D. Pelo contrário: as ONGs que ela apoia no país são aliadas do governo Zelensky, precisamente porque este serve como bucha de canhão na guerra do imperialismo contra a Rússia. A suposta defesa da democracia e o combate ao extremismo de direita, logo se vê, não passam de conversa fiada para enganar trouxas.

Outro membro proeminente do conselho consultivo da Action for Democracy é Francis Fukuyama, famoso intelectual do establishment norte-americano por sua famigerada teoria do “fim da história”. Esse conselho inclui também, por exemplo, a vice-governadora da Califórnia e ex-embaixadora americana na Hungria, Eleni Kounalakis; um ex-funcionário do Conselho de Segurança Nacional e dos departamentos de Estado e Tesouro dos EUA, Robert Boorstin; um membro do Conselho de Relações Exteriores dos EUA, Timothy Snyder; o ex-parlamentar e ex-secretário do Exterior britânico David Miliband; e Simon Cheng, ex-funcionário do consulado britânico em Hong Kong e “perseguido” pelo governo chinês devido ao seu “ativismo”.

Segundo o relatório anual de 2022 da A4D (o único disponibilizado em seu site), ela enviou mais de 10 milhões de dólares às 12 organizações que financia. Três delas são brasileiras. O Quid, “um laboratório de comunicação e mobilização para causas” recebeu mais de um milhão de dólares em 2022; o Washington Brazil Office (WBO), sediado nos EUA e que engloba desde organizações de fachada do NED, USAID e Open Society até CUT e MST, que recebeu 130 mil dólares; e o Atlantic Council Brazil Workshop and Report, pertencente ao Atlantic Council, que recebeu 40,8 mil dólares.

Como se vê, se até mesmo a esquerda está contra a Venezuela, isso se deve em grande parte ao dinheiro das fundações imperialistas.

Eduardo Vasco – Jornalista especializado em política internacional, foi correspondente na guerra da Ucrânia e escreveu os livros-reportagem “O povo esquecido: uma história de genocídio e resistência no Donbass” e “Bloqueio: a guerra silenciosa contra Cuba”.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected]. O artigo será publicado se atender aos critérios do Jornal GGN.

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