
Os desafios da Colômbia
por Marco Piva
Com uma vitória histórica, o economista Gustavo Petro e a advogada Francia Márquez Mina assumem em agosto a presidência e a vice-presidência da Colômbia. Para chegar ao principal posto do país, derrotaram os partidos tradicionais no primeiro turno e, no segundo, o candidato populista de direita Rodolfo Hernández, um outsider conhecido como “Trump colombiano”. A margem da vitória foi estreita (pouco mais de 3%), o que indica uma polarização que deverá ser enfrentada com diplomacia e senso de responsabilidade de lado a lado.
A Colômbia tem uma história marcada pela violência política onde não poucas vezes o próprio Estado foi seu principal promotor. Paramilitares, guerrilhas e narcotraficantes são personagens que simbolizam décadas de uma guerra não declarada, onde as principais vítimas foram e continuam sendo a população. Líderes dos movimentos sociais, sindicalistas e políticos progressistas sem qualquer vínculo com a insurgência armada são alvos preferenciais dos agentes de segurança e das milícias sustentadas por parte da oligarquia rural.
Os desafios para o novo governo são muitos, especialmente no que diz respeito à relação com as Forças Armadas, acostumadas a realizar operações repressivas contra civis e que contam com forte apoio militar dos Estados Unidos por meio de bases norte-americanas instaladas no país.
Não foi à toa que a principal bandeira eleitoral do presidente eleito trouxe como símbolo a paz. Sem paz não há vida. E a vida tem que ser “sabrosa” (saborosa) como enfatiza a vice-presidente Francia Márquez Mina, uma advogada afrodescendente de origem humilde que se agigantou na campanha.
Diante de um desemprego que atinge 12% da população, com uma inflação anual acumulada de 10% e a recente inclusão da Colômbia no Mapa da Fome, as expectativas pelas mudanças são enormes e urgentes.
Gustavo Petro garantiu a maioria dos votos alicerçado em dois fatores: a experiência político-administrativa e a ideia-força da esperança. Mulheres e jovens foram seus grandes eleitores. Foram aqueles que levaram adiante as gigantescas manifestações contra o governo de Ivan Duque em 2021, mesmo em meio a uma pandemia avassaladora. O medo à repressão foi substituído por uma valentia que até então não estava no radar dos sucessivos governos conservadores.
Portanto, falar de amor e paz, com respeito à dignidade das maiorias, trouxe resultado eleitoral. Propor a reforma agrária, garantir os direitos cidadãos como emprego, saúde e educação e implementar uma política energética baseada em fontes alternativas ao petróleo constituíram uma plataforma ousada para um país com graves problemas econômicos e sociais.
A distensão política com a efetivação dos acordos de paz de 2016, a recuperação da soberania nacional com uma política externa independente, maior alinhamento com países da América Latina e a pacificação das relações diplomáticas com a Venezuela vão merecer prioridade do novo governo.
Com uma pauta extensa dessas, tão urgente e necessária, a dupla Gustavo Petro e Francia Márquez deverão garantir, em primeiro lugar, que a unidade política alcançada pelo Pacto Histórico se mantenha e se perpetue. Será esta a condição prioritária para evitar que a direita colombiana, golpeada na eleição, não volte a impor seu modelo de violência no país.
Marco Piva é jornalista, apresentador do programa Brasil Latino e diretor de comunicação da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP).
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