As dúvidas da semana resumidas em uma palavra, por Gregório Duvivier

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Jornal GGN – Para resumir os últimos acontecimentos envolvendo a morte do ministro Teori Zavascki e os imbróglios nas decisões que paralisam o Supremo Tribunal Federal (STF), o universo político e os brasileiros com o futuro herdeiro da Operação Lava Jato, o colunista, ator e escritor Gregório Duvivier só encontrou uma palavra: “caralho”.
 
E para o uso dela, pediu “desculpas” ao “leitor pudico”, afinal, a palavra “caralho” é “platônica”, “transcendente”, “sempre metafórico” e “pertence ao campo das ideias”. 
 
 
Por Gregório Duvivier
 
Desculpe-me o leitor pudico
 
Na Folha de S. Paulo
 

Peço desculpas ao leitor pudico, mas tem horas em que apenas uma palavra chula pode dar
conta do espanto. Caralho.

“Por que não cacete?”, dirá o leitor pudico. Um cacete, leitor pudico, neste caso não basta. Tampouco porra faria efeito. Claro que porra tem o seu valor. Mas esta semana, especificamente esta semana, pedia um caralho. “E por que não ‘buceta’?”, sugerirão, quem sabe. “Até as exclamações precisam ser falocêntricas?” Mas caralho, explico, tem pouco tem a ver com o falo em si. Diria, inclusive, que o caralho é o oposto do pênis.

Enquanto pênis é o pau quando observado na condição de órgão sexual, o caralho é o pau em sua condição exclamativa ou evocativa. Assim como a língua inglesa diferencia o porco vivo (“pig”) do porco no prato (“pork”), a língua portuguesa difere o pau imanente do pau transcendente. Não se diz, em português, “como é bonito o seu caralho” ou “sinto dores no caralho”. O caralho nunca é o seu, tampouco é o dos outros.

A expressão “ai, meu caralho!” difere da expressão “ai, meu pau” porque pode, inclusive, ser dita por uma mulher, assim como “ai, meu saco” (enquanto o pau é sempre literal e o caralho é sempre metafórico, o saco pode ser ao mesmo tempo literal e metafórico). Por isso, quando alguém se referir à casa do caralho, não estará falando das cuecas, tampouco estará falando de quaisquer órgãos sexuais em que ele possa se encaixar. Da mesma maneira, quando diz-se que uma cerveja é “boa pra caralho” não se está dizendo que a aplicação da cerveja na região peniana trará benefícios à saúde do mesmo.

Antes que os filólogos me ataquem: não estou dizendo que o caralho não tem forma. Tem, sim. Por isso, pode-se comentar que tal cabeça tem “formato de caralho”, ou perguntar, como Noronha em “Sete Gatinhos”, “quem foi que desenhou caralhinhos voadores na parede do banheiro?” (RODRIGUES, Nelson; 1958). O que disse foi que o caralho é platônico: pertence ao campo das ideias.

Peço, então, licença-caralho para usar a expressão platônica à vontade, porque no momento presente eu tô cheio de dúvidas. Ou melhor, tenho dúvidas pra caralho.

Por que caralhos foi cair logo o avião do relator da Lava Jato? Que caralhos ele estava fazendo lá dentro daquele caralho? E por que é que foi cair logo lá na casa do caralho? E o pior: é verdade que estão pensando em pôr no seu lugar o ministro que tem a cabeça em formato de caralho? Isso vai dar uma merda do caralho. 

 

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

15 Comentários

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  1. É ASSIM, É?
    Então vou de

    É ASSIM, É?

    Então vou de Millôr Fernandes:

     29

    O Direito ao “Foda-se” (Millor Fernandes)

    13  O nível de stress de uma pessoa é inversamente proporcional à quantidade de “foda-se!” que ela fala”. Existe algo mais libertário do que o conceito do “foda-se!”? O” foda-se!”aumenta minha auto-estima, me torna uma pessoa melhor, reorganiza as coisas, me liberta. “Não quer sair comigo? Então foda-se!“.Vai querer decidir essa merda sozinho(a) mesmo? Então foda-se!” O direito ao “foda-se!”deveria estar assegurado na Constituição Federal”. Os palavrões não nasceram por acaso. São recursos extremamente válidos e criativos para prover nosso vocabulário de expressões que traduzem com a maior fidelidade nossos mais fortes e genuínos sentimentos. É o povo fazendo sua língua. Como o Latim Vulgar, será esse Português Vulgar que ingará plenamente um dia. “Pra caralho”, por exemplo. Qual expressão traduz melhor a idéia de muita quantidade do que “pra caralho”? Pra caralho” tende ao infinito, é quase uma expressão matemática. A Via-Láctea tem estrelas pra caralho . O Sol é quente pra caralho, o universo é antigo pra caralho, eu gosto de cerveja pra caralho, entende? No gênero do “Pra caralho”, mas, no caso, expressando a mais absoluta negação, está o famoso “Nem fodendo!” O “Não, não e não!” é tampouco e nada eficaz e já em nenhuma credibilidade. O “Nem fodendo!” é irretorquível e liquida o assunto. Te libera, com a consciência tranqüila, para outras atividades de maior interesse em sua vida. Aquele filho pentelho de 17 anos te atormenta pedindo o carro pra ir surfar no litoral? Não perca tempo nem paciência. Solte logo um definitivo: “Marquinhos, presta atenção, filho querido, NEM FODENDO!”. O impertinente se manca na hora e vai pro Shopping se encontrar com a turma numa boa, e você fecha os olhos e volta a curtir a sua musica. Por sua vez, o “porra nenhuma!” atendeu tão plenamente as situações onde nosso ego exigia não só a definição de uma negação, mas também o justo escárnio contra descarados blefes, que hoje é totalmente possível imaginar que possamos viver sem ele em nosso cotidiano profissional. Como comentar a gravata daquele chefe idiota senão com um “é PHD porra nenhuma!”ou “ele redigiu aquele relatório sozinho porra nenhuma!”. O “porra nenhuma”, como vocês podem ver, nos provê sensações de incrível bem estar interior. É como se estivéssemos fazendo a tardia e justa denúncia pública de um canalha. São dessa mesma gênese os”aspone”,”chepone”,”repone” e mais recentemente o “prepone” – presidente de porra nenhuma. Há outros palavrões igualmente clássicos. Pense na sonoridade de um “Puta que pariu!”, ou seu correlato “Pu-ta-que-o-pa-riu!!!”, falados assim, cadenciadamente, sílaba por sílaba. Diante de uma notícia irritante qualquer um “puta-que-o-pariu!” dito assim te coloca outra vez em seu eixo. Seus neurônios têm o devido tempo e clima para se reorganizar e sacar a atitude que lhe permitirá dar um merecido troco ou o safar de maiores dores de cabeça. E o que dizer de nosso famoso “vai tomar no cu!”? E sua maravilhosa e reforçadora derivação “vai tomar no olho do seu cu!”. Você já imaginou o bem que alguém faz a si próprio e aos seus quando, passado o limite do suportável, se dirige ao canalha de seu interlocutor e solta: Chega! Vai tomar no olho do seu cu!”. Pronto, você retomou as rédeas de sua vida, sua auto-estima. Desabotoa a camisa e sai à rua, vento batendo na face, olhar firme, cabeça erguida, um delicioso sorriso de vitória e renovado amor-íntimo nos lábios. E seria tremendamente injusto não registrar aqui a expressão de maior poder de definição do Português Vulgar: “Fodeu!”. E sua derivação mais avassaladora ainda: “Fodeu de vez!”. Você conhece definição mais exata, pungente e arrasadora para uma situação que atingiu o grau máximo imaginável de ameaçadora complicação? Expressão, inclusive, que uma vez proferida insere seu autor em todo um providencial contexto interior de alerta e auto-defesa. Algo assim como quando você está dirigindo bêbado, sem documentos do carro e sem carteira de habilitação e ouve uma sirene de polícia atrás de você mandando você parar: O que você fala? “Fodeu de vez!”. “Liberdade, igualdade, fraternidade e foda-se!!!”

     

  2. Use com moderação

    Vão faltar palavrões neste ano em que cada semana valerá por seis meses.

    Até o final do ano estaremos de volta às cavernas, as ocas já estarão todas ocupadas pelos amarelinhos.

    As cerimônias tribais seguem aquela mesma coreografia da Paulista.

  3. Gregório Duvivier é hoje um

    Gregório Duvivier é hoje um dos principais nomes da esquerda e deveria ser preparado pelo PT como uma boa opção para a Câmara Federal em 2018. Se morasse no Rio, teria meu voto

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