Aldo Fornazieri
Cientista político e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política.
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As esquerdas e os privilégios, por Aldo Fornazieri

O Brasil vive uma situação assemelhada à da França de 1789. Os ricos estão cada vez mais ricos. Cerca da metade da população vive com até R$ 400,00 por mês. Aos pobres da periferia resta o abandono, a violência, a pobreza

Arte Agência de Notícias da Favela

As esquerdas e os privilégios

por Aldo Fornazieri

Uma notícia importante passou quase despercebida na última semana de janeiro: a partir de pressão popular, os vereadores do Município de Cachoeira Paulista, cidade que tem pouco mais de 25 mil eleitores, reduziu os seus salários de R$ 4,2 por mês para R$ 1,6. Sob os intensos protestos que ainda continuam e que resultaram numa repressão brutal com dezenas de mortos e milhares de feridos, no Chile, os deputados viram-se constrangidos a reduzir os seus salários e do alto escalão governamental em 50%. Claro, algum cínico poderá vir com a resposta pronta: “Isto não resolve os problemas”. Trata-se de meia verdade, pois sem atacar os privilégios, que são de muitas ordens, não se reduzirá as desigualdades.

A América Latina é a região mais desigual do mundo, e também a mais violenta. É uma região que precisa de uma Revolução Francesa. Esta revolução teve, dentre suas causas principais, as desigualdades sociais e os privilégios da aristocracia. A  aristocracia tinha a exclusividade sobre a força, os bens, a satisfação, o luxo, o requinte das artes e os prazeres do espírito, descreve Tocqueville. Ao povo restava o trabalho, a grosseria, a ignorância, as doenças. O clero e a nobreza tinham uma infinidade de privilégios. A rigor, não pagavam impostos e até podiam cobrar impostos do povo e dos servos. Os camponeses viviam na pobreza. A desigualdade era brutal.

O Brasil vive uma situação assemelhada à da França de 1789. Os ricos estão cada vez mais ricos. Cerca da metade da população vive com até R$ 400,00 por mês. Aos pobres da periferia resta o abandono, a violência, a pobreza e todo tipo de intempérie social, econômica e ambiental. A rigor, as periferias das grandes cidades não têm representação política nas Câmaras de Vereadores, nas Assembleias Legislativas e na Câmara Federal. Em regra, são vítimas da manipulação, da demagogia e do engodo dos políticos.

De acordo com alguns levantamentos, os políticos, o alto funcionalismo dos três poderes, as altas patentes militares e policiais, os juízes, os membros do Ministério Público, entre outros setores, recebem privilégios de várias tipos. Privilégios como aposentadorias privilegiadas, pensões privilegiadas, penduricalhos privilegiados, férias privilegiadas, julgamentos privilegiados, salários privilegiados, gastos privilegiados. Os salários dos políticos, dos juízes, do alto funcionalismo são indecorosos e criminosos. Mais da metade dos juízes recebem acima do teto constitucional. Paladinos da moralidade como Sérgio Moro e Deltan Dallagnol estavam entre esses que recebiam privilégios criminosos. Assessores de deputados e vereadores chegam a receber acima de R$ 20 mil por mês.

O Brasil gasta mais de R$ 700 bilhões por ano com 11,5 milhões de  servidores da ativa – cerca de 20 vezes mais do que o programa Bolsa Família. Há um desequilíbrio salarial enorme no interior do funcionalismo: uma casta de privilegiados é responsável por uma grande parte desses gastos. O Brasil gasta bem mais do que seus vizinhos e do que os padrões internacionais com a folha de pagamento do funcionalismo – cerca de 10% do PIB, algo que gera déficit e impede investimentos em infraestrutura e em programas sociais estruturantes. Note-se que as comparações internacionais dizem que o número de funcionários públicos no Brasil é relativamente baixo. Isto é uma prova de que os privilégios são absurdos. É preciso fazer uma reforma administrativa profunda que combata os privilégios e derrube os altos salários. Se o salário mínimo é corrigido pela inflação, o salário dos servidores, dos deputados, dos políticos em geral e dos juízes precisa obedecer o mesmo critério se se quer uma sociedade mais igual e mais justa.

Chega a ser perturbador perceber como são poucos os políticos de esquerda que combatem os privilégios e propõem medidas para reduzir de forma estrutural as desigualdades. A reforma tributária e a reforma administrativa são fundamentais para reduzir os mecanismos da desigualdade e da iniquidade. Na medida em que os partidos e os políticos de esquerda não combatem os privilégios e, por consequência, as desigualdades, a rigor, passaram para o lado de lá do balcão, subiram para o andar de cima, para usar uma expressão do Élio Gaspari.

Na verdade, os privilégios são uma forma de corrupção. São a mais perversa forma de corrupção, pois se acoberta sob o manto da legalidade. De um ponto de vista de quem defende a igualdade e a justiça, os privilégios representam uma dupla corrupção: a corrupção contra a coisa pública, a coisa do povo; e a corrupção de princípios. O próprio fundo partidário é uma forma de corrupção. As esquerdas que não combatem os privilégios com denúncias e propostas não serão capazes de combater as desigualdades de forma estrutural. Não são esquerdas no sentido estrito do termo se é que este termo ainda tem algum significado para elas.

Se as esquerdas quiserem defender o povo pobre, combater as desigualdades e as injustiças precisam deixar de ser corporativas e de agarrar-se a privilégios próprios. O fato é que as esquerdas estão perdendo bandeiras de luta sucessivamente. São incapazes de abraçar a causa ambiental, não têm propostas para combater a desigualdade, não sabem o que propor para a nova fase da revolução tecnológica e a escassez crescente de empregos, perderam a bandeira da segurança pública e estão perdendo a bandeira de combate aos privilégios. Com isso perdem credibilidade e não serão capazes de conquistar mentes e corações. Não se acreditará que elas mudarão a sociedade, que promoverão a inovação política, que liderarão a marcha para uma sociedade mais justa e mais igual. Se não se reinventarem, as esquerdas ficarão cada vez mais com cheiro de coisa antiga, com fisionomia de uma gerontocracia aristocrática e burocrática, mesmo que existam jovens aprendizes do comodismo.

Se as esquerdas não acordarem do seu plácido sono de bem viventes vermos se multiplicarem eleitores que votarão em Trumps, em Brexits, em Bolsonaros, em Marines Le Pen…Veremos se multiplicarem rebeliões de multidões descontentes com as desigualdades, mas que não têm direção e têm sentidos dúbios. Os líderes precisam perceber que há um profundo mal estar nas populações. Para enfrenta-lo, será preciso articular interesses materiais com valores morais progressistas e libertadores para confrontar a extrema-direita que junta interesses materiais e valores retrógrados. A questão que se coloca para as esquerdas é se elas querem ser vistas como causa e causadoras desse mal estar ou se querem ser vistas como mudança, inovação, futuro, esperança.

Aldo Fornazieri – Professor da Escola de Sociologia e Política (FESPSP).

Aldo Fornazieri

Cientista político e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política.

28 Comentários

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  1. Perfeito! Nossas bancadas de suposta esquerda sabem muito bem espernear, e não fazer mais nada; transformaram mandatos eletivos em empregos públicos vitalícios muito bem remunerados e não querem entrar em bola dividida para não arriscar perder a boa vida; o povo da CLT que se f.; na hora de defender os privilégios de funcionários públicos encostados no Estado votam unidos com a pior direita. A situação é tão escrota que quem tenta acabar com os privilégios milionários dos encostados nos cofres públicos é o ministro Paulo Guedes (não dos militares, porque frente a esses ele também é frouxo). É essa a única autocrítica que a esquerda tem que fazer.

  2. A america latina é mais violenta que a áfrica? Acho que não… mas concordo com todo o resto da argumentação. Se na Suiça um juiz ganha 4 vezes mais que um pedreiro, sem direito a penduricalhos, não há justificativa para os salários nababescos no judiciário, no MPF, no congresso e nas estatais.

    1. Ora…..mas o conceito da turma está errado….se o objetivo é reduzir desigualdade, o correto seria brigar para o pedreiro diminuir a distância para o juiz….não o contrário….. entretanto, é mais fácil atacar o funcionalismo, sempre vilão, a plateia é garantida…..
      O salário de um juiz é até correto pela responsabilidade que tem, o errado são as invencionices para aumentar o ganho salarial, com penduricalhos e retroativos generosos…..a maior parte do funcionalismo ganha mal, na média do teto do INSS, e trabalha muito, essa estória que funcionário público não trabalha é lenda urbana…..médicos e enfermeiras trabalham dia e noite, TODOS os dias do ano, assim como policiais, eletricitários, até a justiça tem plantão presencial 365 dias …..
      E o congresso? Vão esquecer? esse sim um elefante branco, inservível ao país, caro, pesado, também tem dois recessos como se aquilo fosse escolinha, ninguém apura a produtividade de ninguém, ninguém regula a assiduidade, um lugar cheio de gente a apontar e pedir retirada de direitos trabalhistas…..deveriam começar por ali….. também é dinheiro público e o exemplo vem de cima….

  3. Dentre os maiores privilegiados estão os ALTOS “comissários” do Estado ..em especial dentro dos Poderes do Judiciário, Forças Armadas e policiais que, inclusive, ficaram de fora ou conseguiram manter alguns privilégios exclusivos nestas recentes reformas.
    Fato é que sem a cobertura da grande mídia qq bandeira que se levante terá pouca ou nenhuma repercussão diante da massa que continua ENTORPECIDA pelo fascínio trazido pelos smartphones e suas “redes sociais”.

    1. E veja que não é um parlamentar petista ou do PSOL, ou de qualquer que se diga esquerda, que teve essa iniciativa, mas um picareta de direita (Rubens Bueno). Aquele da multa para os faróis apagados durante o dia!!???

  4. Professor Aldo, que bom vê-lo de volta. As esquerdas estão seguindo o samba-enredo do atual governo e, até agora, sem uma oposição mais propositiva a isso ai. As propostas de reforma tributaria e administrativa nunca serão aceitas pela “elite” brasileira e nem pela obtusa classe média, que pensa que é elite ou que um dia sera… Levando isso em contra, devemos propor essas reformas ao conjunto da sociedade e, e ai esta o que vai determinar se ganharemos ou não, levar essas e outras propostas de forma que a população entenda de que estamos falando, se interesse e participe. Para ter sucesso, deve ser feito um grande trabalho de Comunicação.

  5. “…Chega a ser perturbador perceber como são poucos os políticos de esquerda que combatem os privilégios e propõem medidas para reduzir de forma estrutural as desigualdades…” Talvez as discussões evoluam e uma Nação comece a sair do coma doutrinário destes 90 anos. Talvez Bipolaridade tenha cura? 700 bilhões de reais ou mais de 20 Bolsas Famílias. Só que não são gastos entre 11,5 milhões de Funcionários Públicos. Metade disto ou cerca de 50%, rega contas nababescas de cerca de somente 20% desta Elite do Estado Ditatorial Caudilhista Absolutista Assassino Esquerdopata Fascista. Ou seja, nem cerca de 2 milhões de funcionários das Nossa Cortes, dos Nosso Feudos recebem cerca de 350 bilhões de reais, enquanto outros 9 milhões ficam com o restante. Existe uma reportagem a este respeito. Quando os Progressistas, a Esquerda chega ao Poder, perguntaram a um Político ( não lembro o nome), se os Salários desta Elite seriam reduzidos (era a esperança nacional. Uma delas, aplacadas pela traição):” Não Somos Nós que ganhamos muito. É o Brasileiro (comum) que ganha mal. Continuaremos assim, mas trabalharemos para diminuir tal diferença” AH!! Bom !!! Mas por que esta discussão enfim chegou até aqui? Por que tais Elites estão seguras, enriquecidas. Direito Adquirido, Aposentadorias e Pensões Nababescas. AntiCapitalistas, Socialistas, AntiImperilistas, Redemocratas, Progressistas com Residências e Famílias dispondo de suas Pátrias em Portugal, França, EUA, onde Filhos e Filhas se formam em prestigiosas Universidades, usando de vultoso Capital e rendimentos mantidos e enviados de “Terra tão atrasada”, que talvez nunca mais pisem de volta. É só ver as matrículas de Harvard !!! Mas tem o Trump e Racismo e Armas e Polícia Rigorosa?!! Mas tem cada Shopping?!! E cada Viagem e Hotel baratos ?!! E Segurança?!! E cada carrão?!! E Disneylândia?!!! Não é mesmo Covas? Diz aí Tiburi? O que você acha Willys? E não sabíamos disto?!! O Brasil é muito óbvio. Pobre país rico. Mas de muito fácil explicação.

    1. Ora, Lula está dizendo que vai vencer a eleição, e que mira na desigualdade…..e quem é a favor da desigualdade? Abertamente ninguém, em segredo, muitos….. Lula se esquece que não tem a caneta, ela está em poder do coiso, junto com o d.o…..agora mesmo, o Dino aumentou o salário dos professores…e o PT? O que propõe contra a desigualdade? Até agora nada. …o povo já está cansado de gogó……por que o PT não propõe a redução dos salários e privilégios do congresso? Pra começar, antes de permitir a redução salarial de quem ganha acima de três míninos? Sinceramente….parte da oposição é fingida, vendida e canalha. o povo está só…….

  6. Para que ir para as ruas lutar, enfrentar polícia, se o pastor me diz que é só eu dar o dízimo que eu vou ficar bem, vou ter emprego, casa, felicidade e saúde? Será que ninguém de oposição ainda se deu conta do que temos que enfrentar, qual é o discurso que transforma o povo em gado, manso e obediente, que segue inexoravelmente para o abatedouro de seus direitos? O combate à ideologia, tão presente nos discursos reacionários, é a arma mais usada por eles e é a mais efetiva, porque é a mais divulgada.
    Mesmo não combatendo o real inimigo, não venham dizer que a oposição não faz a sua parte, faz e muito! O problema é que não existe a divulgação, excessões são os comentaristas de jornais, pequenos espaços entre as muitas notícias deformadas e palatáveis sobre o desgoverno que, volta e meia, trazem um pouco de realidade à tona

  7. Qual foi Aldo… Todo mundo sabe que vários militantes de esquerda deixam de lado a ideologia assim que conquistam os privilégios associados aos cargos parlamentares. Isso explica, aliás, porque eles se recusam a lutar contra os privilegiados.

  8. No Brasil de hoje está difícil reverter as ideias de que privilégios são melhores do que direitos, de que cumprimento às leis é melhor do que “carteirada” enquanto estivermos submersos na ideologia capitalista. Enquanto não abandonarmos a ideia de que o indivíduo vale mais do que o coletivo, o chamado “Capitalismo Cultural”, tenderemos à terra sem lei, também conhecida como barbárie. Ainda mais porque a barbárie, distorcida pelos dogmas do capitalismo cultural, fica parecida com liberdade. “Sou livre para impunemente depredar o que é coletivo massacrando o outro.”

    Privilégios: o mendigo que ocupa o melhor lugar sob o viaduto…

  9. Sempre que alguém fala em cortar privilégios dos funcionários públicos encostados no Estado (os reais servidores públicos profissionais sintam-se excluídos dessa configuração), aqueles que ganham merreca no serviço público e que trabalham de verdade acham que é com eles. Não! É com encostados que vivem nababescamente com privilégios de cortes francesas pré-Bastilha. Quem pode admitir aberrações como férias remuneradas de 60 dias (com acréscimo duplo de 1/3), licenças-prêmio, auxílios milionários de toda espécie sobre os quais não incide IR, aposentadorias e pensões milionárias atualizadas com os salários do “ativos” e passados para filhas, amantes, cuidadoras etc, vantagens sobre vantagens, os famosos “atrasados” que quintuplicam salários no Judiciário e no Ministério Público etc etc etc. Usam a autonomia para fazer farra com dinheiro público, desmoralizando a autonomia. A imprensa tradicional brasileira – hoje um lixo, sem exceções – está devendo ao público uma série de reportagens como aquelas que revelaram as mordomias (Estadão quando ainda fazia jornalismo, ainda que de direita). Os picaretas da Folha de São Paulo e dO Globo, que se jactam de prêmios Esso por coberturas triviais, não chegam aos pés do Glenn e seu Prêmio Pulitzer. Quem defende essa farra NÃO é de esquerda, mas da direita mais retrógrada, só não se assume por esperteza e para fomentar uma imagem negativa da real esquerda política (gente inclusive eleita pelo PT).

  10. Oportuna a mensagem. Quem pegou a bandeira da reforma administrativa foi o atual governo. A bandeira da segurança, esta a esquerda já largou faz tempo. Por isso o povo das periferias está votando na direita.

    Nada a estranhar. O leit motiv da esquerda sempre foi encrustar-se na burocracia do Estado. Todo governo socialista consolidado, da ex-URSS às atuais Cuba e Venezuela, nada mais foram ou são do que uma burocracia privilegiada de funcionários do Estado reinando sobre um povo que faz filas para comprar pão e ovos.

  11. É PRECISO Q CANDIDATOS DO PT FAÇAM UMA PROVA, O “PTEM”(de Enem) E AOS Q PASSAREM TENHAM Q CUMPRIR ALGUM TIPO DE TAREFA/METAS,SÓ ASSIM ELEVARÁ E FIDELIZARÁ O NÍVEL DOS CANDIDATOS PARA PASSAR NA “PROVA”(URNA)DO POVÃO,VIVA O BRASIL,RIQUISSÍMO !!!

  12. Cada vez mai me convenço que esse professor não bate bem ou bate bem demais. Tem um discurso que aparenta ser de esquerda, mas sua preocupação principal, agora, e nesse texto, é bater nas esquerdas, antes sobrava mais para o PT e seus quadros. Já lhe sugeri, que para terem legitimidade suas críticas, deveriam estar pautadas na sua ação, ser notoriamente de esquerda, vinda da praxis de esquerda. Se for ou tenha alguma prática de esquerda, não vejo onde. De direita, não assume, mesmo porque a abordagem não ajuda. Estaria no Olimpo, voltado só para um lado, onde estaria esse professor? Só está preocupado, e é o que costumeiramente faz, ralhar, censurar, reclamar dos posicionamentos dos partidos e pessoas que julgue de esquerda, cobrando ações que no seu entendimento deveriam ser tomadas. Desculpe, mas um saco!

    1. Pois, esse povo que reclama, reclama e não propõe nada já deu no saco, inclusive muitos do PT……… é apenas uma forma de reclamar de tudo e não se comprometer com nada ……

  13. Concordo que a esquerda precisa lutar contra os privilégios e contra as desigualdades de renda. No caso das desigualdades, trata-se de lutar por duas reformas: elevação das remunerações mais baixas e taxação das mais as mais altas. Os governos do PT implementaram, timidamente, a primeira, com elevações reais anuais do salário mínimo, e não mexeram em nada quanto à segunda.
    Quanto aos privilégios do funcionalismo público, jogar tudo no mesmo balaio, além de injusto e mentiroso, como faz a grande mídia há décadas, ajuda a desmontar o serviço público, que também vem sendo torpedeado há décadas.
    Dito isso, reitero que a esquerda precisa lutar contra os privilégios, no mais das vezes localizados, mas não exclusivamente, no Judiciário e no Legislativo, e pela melhor qualidade e eficiência dos serviços públicos. A parte do ingresso na carreira está bem equacionada pelos concursos públicos. Mas a parte de avaliação de desempenho e promoção, premiação e, eventualmente, desligamento, não. É essa pauta que a esquerda não pode deixar na mão da direita.
    Em tempo, sou professor titular da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO.

  14. Parece que o professor Aldo Fornazieri está agregando um pouco mais no seu discurso, além do reacionarismo encoberto de um esquerdismo pequeno burguês está agregando a isso tudo a burrice.
    .
    Uma crítica como esta não pode ficar na superfície pois mostraria uma desonestidade intelectual que não gosto de empregar.

    Primeira coisa, os valores que são atribuídos ao dispêndio do funcionalismo público saíram da cartola, pois tamanha afirmação que o Brasil dispende 10% do seu PIB em folha de pagamento é algo que deveria ser claramente citada a fonte. Como não sou burro e conheço os artigos do Professor a longa data, achei logo as comparações estapafúrdias e mentirosas que aparecem no seu artigo, nada mais, nada menos do que Globo, Folha e Veja, a tríade golpista da informação.

    Mas coloquei que as informações são mentirosas, principalmente a de colocar sobre as costas do funcionalismo público as mazelas do Brasil. Mas vamos aos fatos verdadeiros.
    Nas reportagens destes “isentos” órgãos de imprensa surge comparações verdadeiramente falaciosas que replicadas por pessoas que aparentemente tem alguma credibilidade repercutem mais do que nos órgãos mentirosos de imprensa.

    Nestes órgãos de imprensa compara-se os anos de 1986 com 2017, coisa que quando não são consideradas as variações populacionais e econômicas no Brasil, ficam totalmente sem sentido.
    Primeiro de tudo, o Brasil em 1986 possuía 138,5 milhões de habitantes passando para 209,3 milhões em 2017.

    O PIB brasileiro em 1986 era de 266,3 bilhões enquanto com todos os problemas dos últimos anos ele foi em 2017 3.056 bilhões.

    Em resumo a população cresceu 51,3% enquanto o PIB cresceu 10,47 vezes. Se quisermos ficar com um número mais realístico o PIB per capita PPC (por paridade de compra) subiu de US$8.050,00 para US$15.160,00, ou seja, 88,3%, se os salários dos funcionários públicos em média subiram 77% a nível federal, 28% a nível estadual e 40% a nível municipal. Se os valores noticiados na fonte do nosso professor estão corretos o que houve foi um achatamento salarial dos funcionários estaduais e municipais. Os funcionários públicos federais que cresceram em número menor do que o crescimento populacional não tiveram nenhum aumento.

    Quanto o aumento do número de funcionários públicos pode-se dizer que a união e os estados nem cobriu o aumento populacional que houve no período (50% nos estados e 28% na união para um crescimento populacional de 51,3%).

    Agora se o Professor Fornazieri tivesse feito como todo e qualquer bom pesquisador, não tivesse baseado o seu artigo nas fontes “credíveis” da grande imprensa e fosse olhar no trabalho do IPEA, algo mais confiável do que as organizações Globo, teria lido com clareza o que explica a expansão dos quadros do funcionalismo municipal, onde está escrito:

    “O movimento de municipalização da burocracia pública brasileira é uma tendência que ocorre desde os anos 1950, acentuou-se nos anos 1970 e, sobretudo, após a promulgação da Constituição Federal de 1988 (Carvalho, 2011; 2002; Santos et al., 2016; Nogueira e Cardoso Jr., 2011). Os municípios ampliaram suas competências e atribuições, incluído o provimento de serviços que integram o núcleo do Estado de bem-estar – educação, saúde e assistência —, que respondem por parte expressiva dessa expansão. Ademais, colaborou para isso o crescimento do número de municípios do país; de 1980 a 2017 foram criados 1.579 novos municípios, um aumento de 40%”

    Se no lugar de ficar de se pautando pela grande imprensa, o professor tivesse cuidado em ler o trabalho do IPEA veria que o grau de escolaridade do funcionalismo público em geral subiu mais do que a média da população, passando por exemplo de 19% em 1986 para 47% em 2017, em resumo, trabalhos com baixa remuneração que existiam no serviço público foram repassados para empresas privadas.
    No lugar de ficarem lendo as meias-verdades convenientemente escolhidas para simplesmente denegrir o funcionalismo público, leiam TRÊS DÉCADAS DE EVOLUÇÃO DO FUNCIONALISMO PÚBLICO NO BRASIL (1986 – 2017): ATLAS DO ESTADO BRASILEIRO.

    1. Parabéns Rogério! Lendo tantas e tão seguidas críticas às esquerdas (segurança pública, privilégios…), chego a conclusão de que tais críticas pregam que as esquerdas tenham exatamente a mesma pauta e visão de mundo da direita, para que todos os problemas brasileiros sejam enfim “resolvidos”. Na verdade, como você deixou claro em seu comentário, o grosso de tais críticas não passa de indigência intelectual mal disfarçada. Nesse caso dos “privilégios” dos servidores públicos levados a baila pelo Tchutchuca do mercado financeiro que faz as vezes de ministro da nossa economia, está perigando de, ao se “sensibilizar” com as tais “críticas”, bancadas e formadores de opinião de esquerda sejam levados a apoiar as reformas propostas por esse governo de desmonte, que em nada atacam os verdadeiros privilégios, apenas dão maior poder aos governo de ocasião para a desmontagem, intimidação, tunga de direitos e aparelhamento do serviço público. Enquanto isso, enquanto as cifras canhestras observadas por você bailam ao sabor dos interesses do mercado, 45% de tudo o que se arrecada no Brasil já está destinado, em 2020, tranquila e silenciosamente para o pagamento dos juros e amortização de nossa dívida pública, aquela jamais auditada como previsto em nossa constituição.

  15. Professor Aldo, esses 700 bilhões pagam salários de professores, bombeiros, policiais, médicos, analistas judiciários…. O ESTADO, em suma. Mas vc sabe bem disso, é profissional de escol.
    Falar de salário de deputado, me parece, é desviar a atenção das fortunas e dos incentivos fiscais. Dos juros, dos oligopólios, da injustiça tributária. Dos profissionais liberais tão queridos pela sociedade que se escondem em PJs e pagam tão pouco imposto.

    Se cortarmos pela METADE o orçamento do senado o país ganha 2 bi. Provavelmente com perdas irreparáveis ao acervo histórico, pesquisa legislativa, assessorias legislativas, representação do parlamento no exterior, etc.

    Que se debatam privilégios, mas não salários de servidores públicos.

    Essa coisa de salário de servidor é quase toda moralismo. Olha esse texto, dois dados soltos, sem qquer análise.

    As pessoas acham que o funcionalismo de hoje é composto por apaniguados que entraram sem concurso e nunca trabalharam. Estamos em 2020, as poucas instituições funcionando adequadamente o fazem pelo trabalho dedicado de servidores.

  16. só não concordo com a parte da revolução francesa, mas concordo sim com as reformas e creio que todos deveriam concordar, pois privilégios só podem ser combatidos com livre mercado, para o livre mercado não existem diferenças de cor, sexo e gênero apenas existe a produtividade, creio ser o que mais se assemelha ao ideal de liberdade que o povo tanto almeja.

  17. O exemplo Cachoeira Paulista, embora verdadeiro, do ponto de vista argumentativo é cascata. Reduzir o salário de R$ 4,2 por mês para R$ 1,6 é um péssimo exemplo, totalmente distorcido e irrelevante. Se o alto escalão peca pra mais, o exemplo citado peca para menos, pois do ponto de vista constitucional R$1,6 é verdadeira bagatela e a discussão é miar no que se pode chamar de dignidade. A complementação do artigo bota os pés no chão brasileiro e no terreiro da burocracia esquerda que merece a chacoalhada, a meu ver.

  18. Perfeito Aldo. Sé hoje li o artigo. Pelo menos existe um articulista no GGN que coloca o dedo nesta ferida. Os privilégios e as mordomias do Estado são herança da Casa Grande. O problema é que a própria esquerda no Brasil é corporativista. Fecha os olhos para esta fonte absurda de desigualdade. Parabéns pela coragem de enfrentar a hipocrisia. O que falta no Brasil é República, e se não devemos cair no moralismo rasteiro, precisamos construir as chicanas legais e administrativas para coibir a ganância, o egoísmo e a pequenez humanas.

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