Bateu o desespero, por Luiz Carlos Bresser-Pereira

Mas diante da estagnação o que faz o governo que está aí há quatro meses? Absolutamente nada.

Bateu o desespero

por Luiz Carlos Bresser-Pereira

Em sua excelente coluna de domingo na Folha, Vinicius Torres Freire, diante da estagnação econômica, diz que “começa a bater o desespero”. “Economistas sorriem amarelo, sem graça com as previsões furadas de recuperação. Mais que isso, parecem desnorteados, sem explicações precisas para o fato de mesmo o broto verde e mirrado do PIB estar murchando. Empresários parecem com medo, nervosos ou acham que a retomada de 2019 deu chabu… Gente do governo começa a falar em ‘pacotes’ e ‘medidas’ para estimular o crescimento.”

Mas como poderia ser de outra maneira? No fim dos quatro anos de desenvolvimentismo equivocado do governo Dilma, o país se viu diante de uma crise fiscal e de uma recessão. Desde janeiro de 2015 (com uma breve interrupção quando Nelson Barbosa foi ministro da Fazenda) estamos vivendo quatro anos de liberalismo econômico ainda mais equivocados, o governo agindo de forma procíclica e, assim, impedindo que a recuperação cíclica aconteça.

Quando acontece um desajuste econômico, como aconteceu a partir de 2014, há duas possibilidades: ou o desajuste se expressa em aumento do deficit público, excesso de demanda e inflação, ou o deficit fiscal está acompanhado por falta de demanda, crise econômica, como aconteceu em 2015. Diante do primeiro caso, o ajuste fiscal é a solução correta, diante do segundo, é preciso lembrar Keynes e, não obstante a crise fiscal, expandir o investimento público enquanto se corta a despesa corrente do Estado.

Ora, os liberais que nos governam não reconhecem essa distinção. Para eles a solução mágica é cortar a despesa pública, seja ela corrente ou de investimento. E é o que têm feito desde a alucinada gestão de Joaquim Levy no Ministério da Fazenda. O investimento público vem sendo cortado impiedosamente, mais do que a despesa corrente porque é mais fácil cortá-lo. O Banco Central, entre janeiro e setembro de 2015 continuou aumentando a Selic, a manteve em 14,25% por um ano inteiro, e só a partir de agosto de 2016 começou a reduzi-la, mas timidamente. O crédito, que a partir de 2014 foi espremido pela crise financeira, assim continuou nos anos seguintes, os bancos aumentando compensatoriamente sua margem para proteger seus lucros. O BNDES, que financiava grande parte do investimento privado inclusive as privatizações e concessões de serviços públicos, perdeu o crédito do Tesouro e vem sendo deliberadamente desmontado. Os valores das aprovações e das liberações do BNDES no 3ª trimestre de 2017 correspondiam, respectivamente, a 20% e 25% dos montantes alcançados no último trimestre de 2014.

Mas diante da estagnação o que faz o governo que está aí há quatro meses? Absolutamente nada. Pouco importa que o elevado desemprego aumente, que a desigualdade volte a aumentar, que as empresas, sufocadas pela falta de demanda, se encolham senão quebrem. Não adota nenhuma política contracíclica. Só fala na reforma da Previdência, que realmente é necessária, mas terá efeitos apenas no longo prazo. Como diz o grande jornalista, Janio de Freitas, também hoje na Folha, “Paulo Guedes, na verdade, está voando entre os astros, distraído. A desculpa é a espera da “reforma da Previdência”, como se fosse um milagre que a tudo ativaria, inclusive a Paulo Guedes.”

Os brasileiros não têm diante de si um governo, mas um desgoverno. Que nos envergonha. Os supostos governantes apenas repetem mantras e propostas arquiconservadoras. Por isso, ainda na Folha de hoje, Antonio Prata escreve uma crônica antológica. Os brasileiros que se dividiam entre desenvolvimentistas e neoliberais, ou entre de centro-esquerda e de centro-direita, agora começam a esquecer duas diferenças diante da loucura bolsonarista. E conclui Prata: “Precisamos de um movimento como o das Diretas Já. Do sociólogo ao metalúrgico. Da feminista negra ao pastor.”

Sim, bateu o desespero. Não apenas nos neoliberais que apoiam o governo na esperança de que ele faça as reformas. Não apenas nos conservadores que nada têm a ver com os olavos de carvalho da vida. Estamos todos desesperados, ou, melhor, estamos todos indignados.

 

Redação

14 Comentários

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  1. Bolsonaro não tem nem competência administrativa, intuição econômica ou sensibilidade humana para reconhecer um erro e corrigir o rumo. Ele continuará marchando para o abismo neoliberal como um bom soldado. O problema é que ele levará o país inteiro com ele.

  2. pode ser que esta destruição seja deliberada para que o povo acredite que a previdência é o vilão e concorde que os bancos e este desgoverno acabem com ela.
    depois que conseguirem a reforma, com apoio deste povo burro e ignorante que existe no brasil e o crescimento não vier, o que dirão?
    Aposto que culparão o Lula, o PT, a Venezuela, o planeta marte, etc etc
    E o pior é que o povo acreditará, principalmente se a globo afirmar que foi isto mesmo.
    Temos o que merecemos.

  3. O Guedes é um jogador. Sempre dobrando as apostas e contando com a cartada seguinte. Fato é que a Casa sempre ganha. O dia que for ele a pagar essa conta, parará…

  4. Assim como “em cima do muro” é, sim, uma posição, o desgoverno é efetivamente uma forma de governar, é o cenário ideal ao Capitalismo: a regência da Economia pela livre iniciativa privada. O importante para os adeptos do Capitalismo não é contribuir para a soberania e a prosperidade do país, é ganhar dinheiro, seja como for. Legal ou ilegalmente, ganhar dinheiro é a ordem. Mesmo porque com o estado – e suas leis – reduzido, quem tem dinheiro não precisa se submeter a leis.

    Não adianta culpar esse ou aquele governo, o movimento que visa ganhar dinheiro vem de cada uma das pessoas eivadas pelos dogmas capitalistas que constituem nosso país. E quanto mais pobres forem essas pessoas, mais ganhar dinheiro elas quererão. E quanto mais ricas forem essas pessoas, mais dinheiro elas quererão ganhar.

    Ainda não vi capitalista que gosta de iniciativa pública. Nem de agências reguladores os capitalistas gostam.

    Lembra a história de que o Capitalismo um dia implodirá? Pois é, acredite, está acontecendo. Estamos todos sofrendo as angústia dos estertores desse monstro moribundo.

    Salvam-se os que caminham em direção às soluções coletivas, socialistas, começando, ainda que timidamente, pelo cooperativismo.

    1. Realmente, o pessoal do Itaú e do Bradesco não parecem tão preocupados assim. Se conseguirem esfolar os brasileiros para lucrar com juros de 400%, não hesitarão.

      Agora, a solução política do impasse tem de passar pelo esclarecimento de posições, ou seja, pelo aprofundamento da polarização. A esquerda tem de ser um forte pólo de atração política. Ao contrário, hoje vemos uma política equivocada de “diluição” da esquerda no Congresso e outros fóruns. A política de frente ampla é um equívoco, porque impede a emergência de um projeto viável e alternativo de esquerda como polo político.

      Em frente ampla (e isso se viu de forma cristalina no 1° de maio) você acaba se coligando com aqueles que vetam as suas principais pautas. É uma política que não vê campo político, não vê claramente inimigos, e por isso está fadada a ser uma espécie de suicídio. Tudo em nome de uma “democracia” que, se formos analisar friamente, já era um regime muito injusto e pouco democrático. Contra a barbárie, o socialismo! O movimento forte e autônomo da esquerda! Não à coligação com o PSDB e DEM (ARENA?) pela democracia (!?!?). Se traçarmos um fio da meada cronológico, não faz nem sentido esse papo.

      Um exemplo: você faz um ato no Anhangabaú querendo levar as pautas Fora Bolsonaro e Lula Livre e chega um pessoal absolutamente pelego vetando essas pautas e relativizando até mesmo o “não” à tal da reforma previdenciária. Outro: um dos fatores da derrota do Haddad (sem contar com toda a fraude envolvida) foi a ideia estúpida de se aproximar imageticamente de Bolsonaro, ao invés de se assumir esquerda e confrontar o “projeto” do capetão com todas as palavras. Para existirmos politicamente, temos que DELIMITAR CAMPO, sermos UM PÓLO de atração.

      1. Boa, caro André! Só não sei se há muita precisão em classificações de governos como “direita” e “esquerda”, mas por falta de algo melhor… O PT não é de “esquerda”, o PT é social-democrata e trabalhista, no máximo “centro-esquerda”. A auto-classificação do PT como “esquerda” é que fez o povo do nosso país, assim que passou a poder consumir mais, desapoiá-lo. “O PT deu um tiro no próprio pé quando decretou que pobre agora era classe média. É que classe média não vota em partido de ‘esquerda’.”, classe média adora fantasiar que é, se não elite, quase isso. Pensa em grandes empresas como se isso fosse favorecê-la. Apoia donos de empresa e concentradores de capital, mesmo que a concentração se dê pela exploração dela própria.

        Acho que o PT devia ter investido com muita força e profundidade em induzir a consolidação da pessoa comum como cidadã, não como consumidora. Como você diz, expor com mais clareza a oposição de interesses entre as classes sociais… Será?

  5. Estou completamente desanimado e estarrecido com tamanha ignorância a que estamos submetidos.

    Caminhamos a passos largos rumo à destruição e muitos ainda gritam “mito”. É desanimador demais.

  6. O Temer, junto com Eduardo Cunha iniciaram o desmonte da economia com as “pautas bombas”, sufocando o governo Dilma. O Temer, por sua vez, inventou o desinvestimento por vinte anos e o desmonte da Petrobrás, da Embraer e outras. A lava jato da dupla moro/dallagnol, jogou no fosso da economia as grandes empresas nacionais, em nome do combate à corrupção. O Bozo está dando continuidade a esse esfarinhamento da indústria nacional. O que estamos esperando?

  7. Some-se as tragédias na educação e no meio-ambiente, além das fortes divergências internas no governo.
    Parece que estamos numa nau pilotada à distância por um certo “astrólogo maluco”

  8. Some-se as tragédias na educação e no meio-ambiente, além das fortes divergências internas no governo.
    Parece que estamos numa nau pilotada à distância por um certo “astrólogo maluco”

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