Burguesia – Que classe! Fedorenta, mas perfumada, por Mouzar Benedito

Mouzar Benedito reúne as melhores frases e ditados sobre burguesia e classe média. De Oscar Wilde a Marilena Chaui, passando por Karl Marx e Silvio Santos.

Intervenção espirituosa em outdoor de empreendimento imobiliário na avenida Rebouças, em São Paulo. Foto: Artur Renzo. Maio de 2019.

do Blog da Boitempo

Burguesia – Que classe! Fedorenta, mas perfumada

por Mouzar Benedito

Vejam uns conceitos referentes a uma só palavra, que retirei de um dicionário e pensem em quem se identifica com eles: 1. “Que ou aquele que não tem grandeza nem abertura de espírito por excessivo por segurança, êxito material, bem-estar etc.”. 2. “Que ou o que demonstra contar com horizontes estreitos: ser antiprogressista, preconceituoso, reacionário, ou nada entender de coisas do bom gosto e da arte, ou ter inquinações e sentimentos pouco elevados (todos considerados como características dos burgueses)”.

Sim, referem-se à palavra burguês. Claro que há outros significados, como o original dos tempos da Idade Média: natural ou habitante livre de um burgo, que gozava de relativos privilégios. Está no dicionário Houaiss.

Burguês no conceito popular, hoje, é o sujeito rico, de preferência muito rico. Mas a classe média não pode ser chamada de burguesia?

A filósofa Marilena Chaui provocou furor na mídia ao falar da classe média, que tem a ver com esses conceitos de burguesia. Ela disse: “A classe média é uma abominação política, porque é fascista; é uma abominação ética, porque é violenta; e é uma abominação cognitiva, porque é ignorante. Fim.”. E concluiu: “Eu odeio a classe média”. E olha que ela falou isso num tempo que parecia bem menos ruim do que o atual.

Bom… A classe média não é homogênea, para começar tem média-alta, média-média e média-baixa. Em sociologia, a classe média engloba os que exercem profissões liberais, os pequenos industriais e comerciantes, além dos quadros médios da função pública ou do comércio e da indústria. Enfim, dá para incluir na classe média até os intelectuais, que dependem de um emprego para viver, embora com certas “qualidades”. Aliás, Ralph Emerson, filósofo estadunidense disse: “Todos os grandes homens saíram da classe média”.

Dentro da classe média há gente que foge do padrão: o intelectual “tem gosto e interesse pronunciados por coisas da cultura, da literatura, das artes etc.”, é uma pessoa com uma certa cultura geral, tida como pensador, sábio… O burguês citado é bronco e gosta de ser bronco. Tem dinheiro e condições para mudar sua condição mas não muda, ao contrário, tem preconceito contra os que não são como ele. No conjunto, a classe média se identifica com a alta, tem os ideais da classe alta mesmo sendo explorada por ela. Mas, relembro as minorias dentro dela.

Jornalista e outros profissionais podem se sentir com vernizes intelectuais, mas são ou não são classe média? Nós jornalistas podemos nos situar entre estes que, em termos econômicos e condições de vida são sem dúvida da classe média, portanto burgueses (pequenos ou médios), embora muitos de nós discordantes do padrão que ela representa em termos políticos e culturais.

Profissionais liberais como médicos, advogados, dentistas, engenheiros e outros com formação universitária, não só podem ser identificados como burgueses como, acho, compartilham (em sua maioria) os ideais burgueses. Claro, tem médicos que fogem disso (vide os que optam por saúde pública, por exemplo), assim como advogados, dentistas, engenheiros etc. Conheço vários que não se assemelham nem um pouquinho com os burgueses que cito.

O que reparo nos tempos atuais é que as pessoas que se encaixam perfeitamente no figurino que citei no início deste texto estão em todas as partes. São mais comuns do que moeda de um real. Encontra-se por onde a gente vá. Até em faculdades. O ódio à cultura, ao pensamento libertário, ao progresso humano, ao bom gosto, é uma característica dominante numa vasta quantidade de brasileiros (não só). Tem deles em todas as camadas da classe média, nas ditas “elites” e até na classe trabalhadora.

Então, aí vão umas frases coletadas por aí que falam de um tipo de gente da “classe média”, da burguesia, e também de uma elite escrota que pensa e age igualzinho a essa burguesia. Na verdade, são frases sobre “classe”, seja qual for ela. Mas com preferência por essa burguesia ideológica típica, que sempre existiu mas agora é mais exibida, inclusive no Brasil.

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Cazuza: “A burguesia fede. / A burguesia quer ficar rica. / Enquanto houver burguesia / Não vai ter poesia”.

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Falcão (o músico): “Eu sei que a burguesia fede, mas tem dinheiro pra comprar perfume”.

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Milton Santos: “A classe média não quer direitos, quer privilégios, custe os direitos de quem custar”.

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Milton Santos, de novo: “Existem apenas duas classes sociais, as do que não comem e as dos que não dormem com medo da revolução dos que não comem.”.

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Mary McCarthy: “Só os idiotas da classe média acreditam que ficar em dia com a última novidade em literatura melhora o seu status no mundo”.

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Oscar Wilde: “Só há uma classe de pessoas que pensa mais em dinheiro do que os ricos. São os pobres.”

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Oscar Wilde, de novo: “Uma grande paixão é privilégio de quem não tem nada que fazer. É a única ocupação das classes ociosas de um país”.

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Marx e Engels, na Ideologia alemã: “As ideias dominantes numa época nunca passaram das ideias da classe dominante”.

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Marx e Engels, no Manifesto comunista: “A burguesia rasgou o véu da emoção e de sentimentalidade das relações familiares e a reduziu a uma relação monetária”.

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Alain Touraine: “Substitua ‘burguesia” por ‘globalização’ e eis o mundo atual descrito por Marx”.

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Marx e Engels, no Manifesto Comunista: “Os que no regime burguês trabalham não lucram e os que lucram não trabalham”.

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Francis Bacon: “Há pouca amizade no mundo, sobretudo entre pessoas da mesma classe”.

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Benjamin Constant: “O direito à insurreição não pertence a ninguém […]. Nenhuma classe pode fazer da insurreição um monopólio”.

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Marquês de Maricá: “Mudai um homem de classe, condição e circunstâncias, vós o verás mudar imediatamente de opiniões e de costumes”.

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Paulo Francis: “Ser da classe média é achar Godard o máximo”.

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Domitila Chungara: “A burguesia sempre foi brutal, mentirosa e ladra”.

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Emiliano Zapata: “O burguês, não contente em possuir grandes tesouros dos quais ninguém participa, rouba o produto do trabalho do operário e do peão”.

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Carlos Drummond de Andrade: “Preso à minha classe e algumas roupas, vou de branco pelas ruas cinzentas”.

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Victor Hugo: “A miséria das classes baixas é sempre maior que o espírito de fraternidade das classes altas”.

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Eu: “Nem só da classe média vive a imbecilidade”.

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Eu, de novo: “Classe média de todo o mundo, uni-vos. Assim a gente compra uma televisão só”.

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Aldous Huxley: “O burguês é um perfeito animal humano domesticado”.

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Frida Kahlo: “Acho que é melhor nos separarmos e eu ir tocar minha música em outro lugar com todos os meus preconceitos burgueses de fidelidade”.

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Antônio Lobo Antunes: “Quem lê é a classe média”.

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Noam Chomsky: “O problema da classe média é que ela não está nem aí para os privilégios dos ricos, mas sim para a possibilidade dos pobres terem algum”.

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Aécio Neves (em 2013): “A presença maciça da classe média no movimento de protesto coloca em xeque, com ênfase, as contradições do PT”.

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João Pedro Stédile: “O papel do movimento não é agradar a classe média, que sempre foi oportunista. Não vim aqui para puxar o saco de vocês”.

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Silvio Santos: “A melhor maneira de viver é como um cidadão de classe média. Tudo o que passa disso, na minha opinião, é troféu. O dinheiro para mim representa apenas troféus de sucesso, troféus de vitória”.

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Marco Maia: “A elite brasileira não gosta de ciência e tecnologia, pois eles não permitem que o Brasil seja desenvolvido e emancipe seu povo, gostam de ser colônia dos países desenvolvidos”

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Jessé de Souza: “A elite não odeia os pobres, ela tem uma indiferença blasé, quer o dinheiro dela e pronto. Mas uma parte da classe média tem sim uma relação de ódio com o pobre”.

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Lula: “A classe média deveria entender que, ao receber algum recurso, o pobre gasta”.

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Joseph Goebbels: “A classe média não é anticomunista porque acredita na ameaça do comunismo para a nação e as tradições nacionais, mas porque tem medo que os comunistas vão roubar sua fortuna, tranquilidade e segurança”.

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Joan Bardeletti: “Parti do pressuposto que uma classe média crescente significaria um avanço democrático. Mas quando falei com as pessoas percebi que estavam envolvidas em política apenas quando lhes era conveniente”.

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Ferdinand Lassalle: “Se a classe operária tudo produz, a ela tudo pertence”.

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Fernando Meirelles: “Os cineastas brasileiros são parecidos: pertencem à classe média, leem os mesmos livros, veem os mesmos filmes”.

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Victor Hugo: “Quiseram, erradamente, fazer da burguesia uma classe. A burguesia é apenas a parte satisfeita do povo. O burguês é o homem que hoje dispõe de tempo para ficar montado. Uma cadeira não constitui uma classe”.

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Warren Buffet: “Enquanto os pobres e a classe média combatem por nós no Afeganistão, e enquanto muitos americanos lutam para chegar ao fim do mês, nós, os mega-ricos, continuamos nos beneficiando de isenções fiscais extraordinárias”.

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Émile Henry: “Não existe burguesia inocente”.

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Herman Hesse: “A burguesia prefere a comodidade ao prazer, a conveniência da liberdade e uma temperatura agradável para o mortal fogo consumidor interno”.

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Darcy Ribeiro: “Não há lugar melhor para fazer um país do que este, mas o Brasil tem uma classe dominante ranzinza, azeda, medíocre, que não deixa o país ir pra frente”.

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Darcy Ribeiro, de novo: “Nós temos uma das elites mais opulentas, antissociais e conservadoras do mundo”.

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Mario Benedetti: “A verdadeira divisão de classe sociais deveria ser feita levando-se em conta a hora em que cada um sai da cama”.

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Julio Cortazar: “Sou um burguesinho cego a tudo o que se passa além da esfera da estética”.

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Gabriela Mercury: “O tambor vem vestido de chita rasgando seda para a burguesia”.

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Santiago Dantas: “A Índia é um país com uma elite maravilhosa e um povo de merda. O Brasil é um país com um povo maravilhoso e uma elite de merda”.

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Guilherme Boulos: “A burguesia brasileira pede um Estado mínimo e enxuto para o povo, mas desde sempre teve para si um Estado máximo. Privatizar os lucros e socializar o prejuízo, esta é sua diretriz.”

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Luís Fernando Veríssimo: “Sou pelo fim do seu extermínio [da classe média] e pela demarcação das suas terras. No caso de não ser possível estabelecer-se um santuário, poderia se pensar em cotas anuais de abate”.

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Eu: “Executivo insensível também pode ter nó na garganta: o da gravata”.

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Flaubert: “Chamo de burguês toda pessoa de pensamento vulgar”.

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Luís Antônio Medeiros: “No Brasil, quem tem uns dentes na boca já é elite”.

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Anônimo: “A melhor coisa que a burguesia faz é filha”.

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Valéry Larbaud: “O dever, eis o nome que a burguesia tinha dado à sua covardia moral”.

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Eu: “Privilégio de ‘gente fina’: o que a elite cultural e política faz ideológica e intelectualmente não se chama prostituição, mas pragmatismo”.

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Eduardo Galeano: “O que são pessoas de carne e osso? Para os mais notórios economistas, números. Para os mais poderosos banqueiros, devedores. Para os mais influentes tecnocratas, incômodos. Para os mais exitosos políticos, votos”.

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John Lennon: “Se tomássemos o poder na Inglaterra, teríamos a tarefa de limpá-la da burguesia e manter as pessoas em um estado mental revolucionário”.

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Mouzar Benedito, jornalista, nasceu em Nova Resende (MG) em 1946, o quinto entre dez filhos de um barbeiro. Trabalhou em vários jornais alternativos (Versus, Pasquim, Em Tempo, Movimento, Jornal dos Bairros – MG, Brasil Mulher). Estudou Geografia na USP e Jornalismo na Cásper Líbero, em São Paulo. É autor de muitos livros, dentre os quais, publicados pela Boitempo, Ousar Lutar (2000), em co-autoria com José Roberto Rezende, Pequena enciclopédia sanitária (1996), Meneghetti – O gato dos telhados (2010, Coleção Pauliceia) e Chegou a tua vez, moleque! (2017, e-book). Colabora com o Blog da Boitempo quinzenalmente, às terças.

4 Comentários

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  1. Engraçado que faltou o conceito científico de burguesia, proposto por Marx: o monopólio dos meios de produção. Do jeito que está descrito acima, fica uma geléia conceitual. É melhor se apoiar nas obras científicas, que elaboram os conceitos, do que em verbetes de dicionário, que dão conta de um uso mais geral e espontâneo do vernáculo.

  2. Com ódio que apresenta à classe média, cabe perguntar a que classe pertence Marilena Chauí. Somos todos canalhas? Essa classe não forneceu o pessoal para a vanguarda da maioria das revoluções e mudanças eleitorais? Mas uma coisa está sendo pior que antes: várias definições falavam do amor da classe média pelo cultura, pelo menos para exibi-la. Agora nem pensar. Para quase todos a cultura é Big Brother e música-lixo. As séries de livros e discos da Abril, sucessos nos anos 70 e 80, encalhariam irremediavelmente hoja.

  3. Como diz o ditado: “Quem gosta de miséria é intelectual. Pobre gosta é de dinheiro”.
    Antes de continuar quero dizer aqui que sou classe média, tenho noção da manipulação de informações e ações governamentais e privadas para tirar mais dinheiro de mim e de outros, luto contra isso da maneira que posso e quero, sim, ganhar dinheiro e desejo uma vida melhor para mim, minha família e amigos. Dito isso, quero registrar que acho patética a insistência de intectuais em querer definir o conhecimento que os cidadãos devem ter. Parece que na visão de muitos desses intelectuais todo cidadão deve, além de ter o conhecimento necessário para tocar a sua vida e seu trabalho, ler filosofia, sociologia, psicologia, arquitetura, frequentar museus, participar de saraus de literatura e passar horas analisando a condição humana, sem se preocupar com o dinheiro.
    A média salarial no Brasil é de cerca de R$2.000,00 mensais e eu nunca ouvi falar que os famosos intelectuais, como a maioria da lista acima, tenham doado aos mais desprovidos os recursos “extras”, acima dessa média salarial, que recebem pela venda de livros, por palestras, aulas, etc., frutos do seu trabalho, para se tornarem cidadãos médios em renda, mas com vasto conhecimento das artes e tudo o mais que eles valorizam. Muitos desses se tornaram ou vieram da classe média alta e classe alta, mas gostam de dizer que buscar riqueza é coisa de ignorante tosco e sem imaginação.
    Uma dica para vocês: eruditismo não enche barriga. Conhecer vários museus, ler de tudo e ficar analisando a condição humana não ajuda ninguém a ganhar o susento para vida, a não ser que vá ganhar a vida com isso diretamente. A desenostidade e ambição existem dentro da favela, no bairro aberto, no condimínio fechado de luxo ou não e na alta roda. Não é nem nunca foi previlégio de nenhuma classe. Todos querem progredir desde que o mundo é mundo.
    Tirando o fato de que, boa parte da classe média, é ignorante quanto aos processos de manipulação delas para enriquecimento dos de cima, alienação que não deveria existir, o tipo de conhecimento que cada um busca para sua vida é problema de cada um e esse pedantismo de intelectuais deveria ficar trancado dentro dos saraus de que participam ao invés de ficar fazendo críticas idiotas de vidas que não vivem.
    Intelectuais, por favor, distribuiam sua renda acima de R$2.000/mês aos mais necessitados, assim vocês se tornarão o que querem que outros sejam: pobres com vasto eruditismo.

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