Zê Carota
Ganhou espaço nas redes sociais com suas intervenções. Textos curtos. Rápido no gatilho
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Fernandinho é o novo Barbosa, por Zê Carota

Fernandinho é o novo Barbosa

por Zê Carota

na Copa de 1950, no Brasil, nossa seleção chegou à final contra o Uruguai graças a uma campanha irrepreensível: 21 gols marcados, com direito a goleadas de 6 x 1 contra a Espanha e 7 x 1 (opa!) contra a Suécia.

na partida final, perdeu de virada (2 x 1), calando 200 mil pessoas no Maracanã e, Brasil afora, provocando reações absurdas – houve até casos de suicídios…

o “culpado”?

o goleiro Barbosa, que até então sofrera míseros 4 gols.

qual tivesse sido o único em campo naquele dia, e como se o chute de Ghiggia não fosse um petardo à queima-roupa, indefensável, o culpado era Barbosa, ponto final.

o estigma destruiu não apenas sua carreira no futebol, mas também sua vida pessoal, com as pessoas apontando-o nas ruas e acusando-o de ser “o homem que fez o Brasil chorar”, nenhum clube queria contratá-lo, sobrevivia da caridade do Vasco, ao qual colaborou para a conquista de tantos títulos.

em 1994, a humilhação máxima: foi à concentração da seleção, na Granja Comari, pra saudar Taffarel, que admirava, e demais jogadores, mas foi barrado. temiam que desse azar.

“No Brasil, a pena máxima prevista pela lei é de 30 anos. A minha já dura quase 40 anos, por um crime que não cometi”, disse até morrer, aos 79 anos, em abril de 2000.

na Copa de 1986, no México, sob o comando de Telê Santana – que o passar do tempo mostra ser, até hoje, o último grande técnico da seleção -, tal como acontecera em 1982, na Espanha, jogamos um futebol de encher os olhos, superior ao de todos os adversários, mas sem caneco: eliminados pela França nas quartas-de-final, em disputa de pênaltis.

sem estar em seu melhor dia, Zico desperdiçou, ainda no tempo regulamentar, a cobrança de um pênalti sofrido por Branco, e o jogo terminou 1 x 1.

nos pênaltis, Sócrates, primeiro a bater, desperdiçou.

o zagueiro Júlio César, último a bater, também. o “culpado”? Júlio César.

de nada adiantou ter sido eleito pela FIFA o melhor zagueiro daquela Copa: na Copa de 90, na Itália, foi esquecido, assim como na de 94, nos EUA. motivo: mesmo sendo um dos melhores da posição à época, ninguém esquecera que fora ele (sic), com aquele pênalti batido na trave, que eliminara o Brasil.

copa da Rússia, anteontem.

não importa que desde o início a comissão médica não foi totalmente transparente quanto ao estado físico não de um atleta escalado, mas de vários que, ao longo de suas atuações, apresentaram problemas sérios a partir de situações ordinárias.

dane-se que Tite tenha preterido as virtudes de bom técnico que é em favor do “gestor de pessoas” (eufemismo para uma persona patética, misto de Madre Tereza de Calcutá com Leandro Karnal versão auto-ajuda fantasiada de filosofia, resultando num esquema tático, pra dizer o mínimo, medíocre, facilmente derrotado pelo primeiro adversário minimamente preparado e dedicado que enfrentou, o que, na coletiva pós-derrota, o fez portar-se como estivesse dando satisfações não à torcida, mas aos patrocinadores e à globo.

pouco interessa que, gostando ou não, aceitando ou não, neymar não tenha correspondido a 1/5 do que se espera de quem tem um potencial (e uma promoção) infinitamente superior ao do coletivo da qual é – ou deveria ser – parte.

o “culpado” pela eliminação?

Fernandinho, reserva de um Casemiro suspenso, a quem substituiu à altura, e que, no esforço esperado de um defensor em uma cobrança de escanteio do adversário, até impediu que a bola chegasse a um atacante, mas resultou em gol contra, um erro possível em seu ofício, como possível é qualquer erro em todo e qualquer oficio.

não importa, e não basta ser eleito o culpado, “tem” que ser, humana e moralmente, linchado pelas matilhas hidrófobas, não raro fascistas, que infectam esse país desde os insultos misóginos, na abertura da Copa de 2014, no Itaquerão, à presidenta Dilma Rousseff – seguramente, em ambos os casos, 90% das excrescências falantes e ambulantes são as mesmas.

comum a Barbosa, Júlio César e Fernandinho, o fato de serem negros, e se você considera isso uma “coincidência”, não lhe falta apenas cérebro, mas, sobretudo, caráter, o que o iguala a esses fascistas protegidos pelo covarde e abjeto conforto do ambiente virtual.

o ódio sempre esteve entre nós, sempre, mas somente de pouco tempo pra cá seus portadores orgulham-se de ostentá-lo como virtude moral, patriótica, intelectual, social, no que, de forma nada sutil, são ungidos e protegidos por seus pares no poder.

não faz muito, no Twitter, o apresentador danilo gentili envolveu-se numa discussão com um ativista negro, e, depois de pouco tempo, esgotada sua superficial capacidade de “argumentação”, perguntou ao rapaz quantas bananas ele queria pra parar de tocar no assunto. o rapaz o processou, a justiça de São Paulo o absolveu.

na visão do juiz, foi apenas uma piada de mau gosto, não racismo – e não requer muita reflexão o quanto uma decisão dessas não dá a outros racistas – vide o youtuber cocielo – a certeza de que podem vomitar seu escárnio de forma impune e lucrativa, sustentado por grandes corporações.

por outro lado, o caso Fernandinho não liberta Júlio César, assim como esse caso não libertou o já falecido Barbosa. são apenas novos Barbosas. a sentença para quem comete o crime de racismo dura, se tanto, uma semana, até surgir outro caso, ou, mais comum, até o novo penteado de um jogador, o novo contrato milionário de outro craque, ser a grande notícia do dia. já a sentença para as vítimas do crime de racismo é perpétua. deveria ser o contrário.

ps: nesta Copa, e pela primeira vez, não torci pela seleção. mas torço pela civilidade, sempre. força, Fernandinho.

 

Zê Carota

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3 Comentários

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  1. Campanhas de ódio são
    Campanhas de ódio são inadmissíveis. Talvez estejam pegando no pé do Fernandinho não pelo gol contra, mas pelo segundo gol, onde o mesmo dá dois combates em lukako, todavia se recusa a fazer a falta e evitar a subida belga. No segundo contato, no meio campo, praticamente breca para o belga passar. De todo modo nada disso justifica os ataques pessoais. É só futebol, um esporte, perdemos e acabou.

  2. Triste demais. Em uma imagem
    Triste demais. Em uma imagem Fernanda fala com um Jogador belga ao final é a dor está ali, estampada em seu rosto.
    Muito triste.o Brasil está doente.

  3. Gol contra dá pra

    Gol contra dá pra entender….realmente não é culpa do cara, mas a volta que o Lukako deu nele no meio de campo sem ele ter dado nenum combate mais agressivo (apenas acompanhou o jogador) aí é outra história. Falhou!! E falhou feio!! Não tem desculpa. Fernandinho não é jogador a altura de substituir o Casemiro. Sequer é jogador de seleção. Desculpa, mas é a verdade.

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