No Ceará não tem disso não (2), por Walnice Nogueira Galvão

O movimento ascensional começou em 2001 e nunca mais esmoreceu, quando começaram as reformas, que aumentaram o número de horas na escola

Sobral – CE

No Ceará não tem disso não (2)

por Walnice Nogueira Galvão

O panorama do ensino público fundamental no Nordeste não poderia ser mais promissor do que o atual. Levando  isso em conta, não é de admirar quando surgem certas notícias pontuais, que à primeira vista parecem excepcionais mas que se tornam compreensíveis no quadro geral.

Assim, por exemplo, vemos os alunos de uma escola pública de Pernambuco criar uma fralda biodegradável. É o que ocorreu com os estudantes da Escola Técnica Paulo Freire, não desmerecendo o nome de seu patrono e heroi epônimo.

Ou então a surpresa de saber que um terço dos alunos que passam no vestibular do ITA, o Instituto Técnico de Aeronáutica de São José dos Campos, por reputação uma das melhores escolas de engenharia do país, provêm do Ceará. A tal ponto que, dizem, o ITA está cogitando fundar uma filial naquele estado.

Do mesmo modo se compreende que no Enem do ano passado, na prova de redação, o estado que teve mais notas acima de 950/1000 tenha sido o Piauí. Segundo consta, o resultado deve muito a reformas recentes que aumentaram o número de horas que o estudante passa na escola e ao incremento da prática de leitura em sala de aula – entre outras boas medidas.

Ou então nos inteiramos de que quem tirou 1.000 na prova de redação do Enem em 2022 foi a aluna Letícia Marques, filha de mãe solo doméstica, moradora de uma pequena cidade no interior do Ceará.

Mas os dados gerais também são compatíveis com estas informações pontuais e realmente causam admiração. Assim é quando sabemos que as dez melhores  escolas de ensino público fundamental no país todo são cearenses, em ranking medido pelo Ideb. Não é só em Sobral, e já veremos por quê..

Conforme o outro índice utilizado, o Ioeb que mede oportunidades na educação, entre os 50 municípios que ficaram no topo do ranking, se 32 deles eram cearenses, no total 40 eram do Nordeste.

E chegamos ao município de Sobral, no Ceará,, que em 2015  apresentou um Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 8,8. Com essa nota, Sobral bateu simultaneamente três recordes: o do Ceará, da Região Nordeste, e de todos os municípios brasileiros. A nota alcançada ultrapassa até mesmo a média proposta pelo Ministério da Educação e Cultura para 2021 (6,1).

São dados a exigir respeito. Antes, em 2011, ao alcançar 7,3 pontos, a taxa de abandono escolar do 1° ao 5° ano – esse terror dos educadores – tornou-se coisa do passado. O desempenho das escolas municipais permaneceu acima da média do estado (4,9) e também da média nacional (5,0). Dentre as 47 escolas da rede municipal, 35 foram avaliadas pelo Ideb, sendo que 34 aparecem entre as 100 melhores da região Nordeste, e 9 delas estão entre as 100 melhores do país.

Mas não foi de agora. O movimento ascensional começou em 2001 e nunca mais esmoreceu. Nessa data, começaram as reformas, que aumentaram no número de horas na escola  de 6 para 9, e outras medidas estratégicas, a maioria sob a batuta de Izolda Cela. Agora colhem-se os frutos e há vários anos o município sagra-se campeão em escolas públicas estaduais e municipais, apresentando os melhores resultados do Brasil.

Ora, dirão os desmancha-prazeres, estes dados encorajadores devem ser tomados com um grão de cautela. Se as estatísticas mostram pouco ou nenhum avanço das escolas públicas nas regiões mais desenvolvidas – Sul e Sudeste – é porque estas já partem de um patamar mais alto. O que é verdade, embora não invalide os demais argumentos em seu conjunto. É só conferir os resultados, quando medidos por agências externa e independentes, como o ITA, a Prova Brasil, a Rede Educativa, o Inep ou o Enem..

Viemos aproveitando neste texto informações do relatório oficial assinado por Sergio Kobayashi, de 2001 a 2004 secretário municipal da Educação de Caucaia, um dos municípios mais pobres do  Ceará. Trata-se de um documento público, que pode ser acessado por qualquer pessoa. Afora a fina análise, traz numerosos gráficos e tabelas, todos utilíssimos.

Walnice Nogueira Galvão é Professora Emérita da FFLCH-USP

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