Nudez, por Wilson Ramos Filho

A burguesia enfim percebeu que o capital imobilizado em máquinas, equipamentos, estoques e sistemas de computador não gera riqueza. Sem o trabalho dos empregados o capital é inútil.

Hieronymos Bosch

Nudez

por Wilson Ramos Filho (Xixo)

Desde ontem o capitalismo brasileiro ficou nu. Em muitas cidades houve carreatas repetindo a homicida exortação de que o Brasil não pode parar.

Os burgueses, protegidos dentro dos carrões, exigem que seus empregados voltem a trabalhar para gerar riqueza.

Bingo! Epifania! Revelação! O que gera riqueza não é o capital. É o trabalho!

A burguesia enfim percebeu que o capital imobilizado em máquinas, equipamentos, estoques e sistemas de computador não gera riqueza. Sem o trabalho dos empregados o capital é inútil. Tanto quanto os capitalistas, essa classe parasitária que – sem nada produzir – vive da exploração dos trabalhadores.

Só há riqueza porque houve exploração do trabalho de alguém. O que gera o acúmulo de capital é a parcela não paga sobre o trabalho humano. Essa parte não remunerada do trabalho dos empregados (mais-valia) é acumulada pelos empregadores sob a forma de capital.

Os que desfilaram buzinando fizeram verdadeiro striptease ideológico. Descortinaram para todos como funciona o capitalismo. Exigiram que os governos assegurem e garantam o que entendem ser seu direito, o direito a explorar, o direito a ficar com a mais-valia produzida por seus empregados.

Morrerão milhares de pessoas? Certamente sim. Mas isso está dentro das regras de um jogo chamado capitalismo. Existe um exército de reserva a ser mobilizado para ocupar as vagas dos que fenecerem. O que não admitem – vampiros – é que seus lucros e capital sejam comprometidos por decisões estatais que imponham o isolamento social. Entendem ter o direito de sugar até a última gota de sangue dos trabalhadores, antes que morram ou se tornem inúteis para a exploração.

Para a parcela da burguesia que nelas buzinou histericamente ou que apoiou as carreatas, os trabalhadores são descartáveis, substituíveis, como peças de uma diabólica máquina de moer pessoas, para gerar excedentes
financeiros a quem os explora. O Brasil não pode parar, assim, constitui-se em eufemismo para a exploração do trabalho humano, prestado sob subordinação, que não poderia ser interrompida.

O capitalismo brasileiro está nu. Uma feia, obscena, depravada, nudez. Necrófilos buzinaram, perversos, excitados – e não foram poucos – em defesa de seus privilégios, de seus interesses de classe. São classe exploradora em-si e para-si. Desnudaram-se, deixaram à mostra, impudicos, suas obesidades, reais e metafóricas, em defesa do direito a explorar o trabalho alheio. Pretendem que os trabalhadores se apinhem nos insalubres transportes coletivos, contaminando-se, para produzir os excedentes que engordará ainda mais o capitalismo brasileiro. Os flácidos organizadores das carreatas orientaram os participantes a não saírem de seus veículos. Não são bestas. Temiam a contaminação. Mas não se importam se seus empregados se expuserem. O nome do jogo é capitalismo.

Ficou evidente, com as carreatas, o desejo dos proprietários dos meios de produção e da quase-classe que, sem deles ser proprietária (a classe média), apoia o sistema de exploração vigente. Esperemos que a classe trabalhadora, estarrecida com a nua desfaçatez dos exploradores tome consciência do poder que por óbvio tem, durante e, principalmente, depois de controlada a pandemia.

Wilson Ramos Filho (Xixo), doutor em direito, professor na UFPR, integra o Instituto Defesa da Classe Trabalhadora.

Redação

7 Comentários

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  1. Antes de mais nada não votei no bozo, não concordo ou gosto dele e toda sua equipe e bajuladores de plantão. Muito menos dos demagógicos que agora se dizem arrependidos e aproveitam o momento para ganhar pontos políticos.
    Concordo com sua colocação doutor. Mas não posso deixar de acrescentar que muito se tem falado por aí da sanha capitalista local que olha só para os lucros. Mas tá faltando mais gente para ser cobrada.
    A imprensa corporativa com seu terrorismo midiático “se esquece” daqueles que sempre foram seus parceiros, inclusive nos lucros. O poder público em todas as suas esferas.
    É fácil para quem faz parte do funcionalismo público concursado, eleito pelo povo, indicado por quem foi eleito e indicado pelo indicado do eleito falar abertamente em confinamento e fechamento, tendo a imprensa corporativa como porta voz. O salários e todos os benefícios desse grupo “público” caem na conta todo mês, sem falta. Dá para ficar em casa e até trabalhar home office ou via video conferência. Chique.
    Os autônomos vão perder, os assalariados CLT ou não vão perder, os patrões de todo tipo e tamanho de negócio vão perder. O governo é intimado a gastar (e concordo) dinheiro público para ajudar. E qual será a parte do grupo “público” nessa história.
    Se a crise é para todos, os custos devem ser repartidos entre todos também. Menos os aposentados e pensionistas, penso eu. Acho que passou da hora desse grupo “público” ser convidado a se juntar a nós, os “não públicos”.

  2. Verdade nua, crua e escorrendo sangue, sangue dos trabalhadores, do povo e do povão, socados no pilão do desespero. A mão do pilão não para de socar no trabalho diuturno e aparentemente eterno do capitalismo. Assim será por várias décadas ainda, até que tudo exploda na realidade, e a mão do pilão apodreça com seus dedos unhudos. Hoje percebemos ainda mais o quanto a raça humana é finita. Se não perecer por guerras, perecerá em razão de um minúsculo e quase invisível micro organismo.

  3. Doutor, não tem essa de perceber. Estão cansados de saber. Tanto sabem que as máquinas e equipamentos que adquiriu com o lucro da produção são a fonte da riqueza (os meios de produção), que historicamente ocuparam toda a máquina do Estado, diretamente ou com com prepostos, controlando os parlamentos, o judiciário e toda a máquina do executivo, principalmente as Forças Armadas e as polícias. Desse poder não abrirão mão, não há a mínima possibilidade de arrependimento.

  4. p símbolo dessas passeatas fascistas é o carro importado – lembra o escravocrata do império, importa algo aparentemente chic e escraviza seus semelhantes internamente.
    vide exemplos na obra de machado de assis,mostrados pelo sociólogo roberto schwarz, em machado de assis na perferia docapitalismo ou algo parecido
    – os escravocratas até falavam em iluminismo mas açoitavam sua mão-de-obra, escrava.

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