O Brasil retirou Dilma. Não deveria ter medo da saída de Temer, por Sakamoto

Enviado por Cintra Beutler

do Blog do Sakamoto

O Brasil retirou Dilma. Não deveria ter medo da saída de Temer

por Leonardo Sakamoto

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou que uma eventual cassação de Michel Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – no julgamento que definirá se a campanha de sua chapa com Dilma Rousseff cometeu abuso de poder econômico e político em 2014 – e uma consequente eleição indireta seria ”mais uma confusão” ao país. E teme, com isso, a retração de investidores.

“O Brasil está há muito tempo de pernas para o ar, está começando a assentar um pouco. Levar muito tempo em um julgamento que põe em risco a situação vigente tem consequências negativas”, afirmou à rádio em entrevista à rádio CBN.

O comentário é um tanto quanto oportunista, uma vez que ele e seu partido não levaram isso em consideração no processo que desaguou no impeachment. Sem contar que a ação que pede a cassação da chapa foi movida pelo próprio PSDB quando Dilma ainda estava no poder. Ela deveria ter sido julgada pela assinatura de decretos de suplementação orçamentária e pelas ”pedaladas” fiscais em 2015. Mas sabemos que isso era formalidade. As justificativas presentes nos discursos dos deputados federais na votação do impeachment passavam pelos erros na condução econômica do país e pela corrupção em seu governo. Já a razão prática era a tentativa de entregar alguém ao sacrifício e trocar o comando para ”estancar a sangria”.

O fato, como todos sabemos, é que Dilma havia perdido o respaldo político e popular por conta da crise e das repercussões da Lava Jato. Já o atual governo federal segue com o respaldo do PSDB por estar implementando as reformas defendidas pelo partido. Por isso, diante de graves acusações de corrupção envolvendo Michel Temer, sua cúpula de governo e sua base de apoio no Congresso Nacional, o discurso seletivo do ”deixa disso” e do ”não fale em crise, trabalhe” tem suas vedetes.

Muita gente boa vem alertando dos riscos de uma queda de Michel Temer, com o Congresso Nacional elegendo indiretamente alguém de sua confiança para um mandato-tampão até o final de 2018. Pois há uma chance considerável que a faixa presidencial seja entregue a algum ser inominável, se ele garantir a preservação da classe política atual. Mas há quem defenda uma interpretação da legislação que permita eleições diretas – saída mais democrática, que garantiria legitimidade à aprovação de reformas ou o retorno dos projetos à prancheta de desenho. Tudo depende de força política e apoio popular.

Como venho dizendo aqui há mais de dois anos, com o impeachment os dois partidos políticos que foram a maior esperança do país e em torno do qual a democracia brasileira se consolidou nas últimas duas décadas caminharam para uma Destruição Mútua Assegurada. A guerra suja aberta abriu caminho para que se jogasse a criança fora com a água suja do banho, ou seja, para que instituições democráticas fossem menosprezadas. No vácuo, pessoas decretaram a inutilidade da política – que, teoricamente, deveria ser uma das mais nobres práticas humanas.

Os principais nomes do PSDB amargam índices ridículos nas pesquisas de intenção de voto para 2018. O povo percebeu que o partido está envolvido na mesma corrupção que denuncia. E o PT, ah o PT… Esse desidrata em público, por seus próprios erros e delitos. Ainda depende de Lula para continuar respirando por aparelhos. Em outras palavras, seu futuro depende do fato de ele não ser condenado em segunda instância em 2018.

Há quem acredite no perigo de ”salvadores da pátria” que, prometendo nos tirar das trevas, nos jogariam no abismo, sem o empecilho de freios e contrapesos. Novos nomes podem se apresentar, inclusive usando o PT e o PSDB como plataforma. A pergunta é se eles representariam os ideais democráticos que estavam na fundação de ambos os partidos ou serão a maneira mais fácil de voltarem ao poder, rifando a dignidade e ignorando a autocrítica.

Ao final de tudo isso, sobrarão muitas baratas, que serão referência política e poderão ser eleitas. Porque, se por um lado, são asquerosas, por outro, são resistentes. Sua espécie estava lá antes de nós e estará muito depois de irmos embora.

Mesmo diante desse risco, temos que ir até o final e depurar o sistema, culminando em uma grande Reforma Política – mais importante, hoje, que as Reformas da Previdência e Trabalhista. Porque resolver esse imenso passivo é, inclusive, a melhor ação contra a multiplicação de baratas.

Tenho visto muita gente inteligente pedir o fim das investigações da Lava Jato, o fim das delações premiadas, o fim da prisão de empresários e políticos envolvidos em corrupção para que o país volte à ”estabilidade” e encontre um ambiente ”favorável ao crescimento”.

Discordo. O fio do novelo deve ir até o fim, doa a quem doer, atingindo lideranças políticas e econômicas, de todos os partidos envolvidos e não apenas em um ou outro. E chegando ao Judiciário, se possível.

Momentos como este, mais do que uma catarse coletiva ou um show de pirotecnia, devem servir para darmos saltos como sociedade. A suruba institucionalizada do poder público com a iniciativa privada tem comprometido a qualidade de vida de milhões de brasileiros. E muito além da corrupção.

Por exemplo, na construção civil, a vida em comunidades tradicionais em grandes obras de engenharia (rodovias, ferrovias, hidrelétricas e demais rolo-compressores feitos sem o devido planejamento e consulta pública), a dignidade de trabalhadores envolvidos na construção de casas, apartamentos e centros empresariais (trabalho escravo já foi encontrado no ”Minha Casa, Minha Vida”, do governo federal, e em obras da CDHU, do governo paulista), isso sem falar no fato de que a construção civil é um dos principais vetores do desmatamento da Amazônia e do Cerrado (você acha que a madeira da floresta vira só mesa de jantar na sala de europeu e não entra na construção do seu prédio? Sabe de nada…)

A política deveria ser o centro da vida política do país e não um estábulo de interesses pessoais. Mas a roda-viva da terra arrasada agora gira por conta própria.

Uma presidente foi defenestrada. Que se defenestre outro, sem medo, se houver provas. Se a delação de um peixe grande, como Eduardo Cunha, representar o fim do mundo, que venha o meteoro.

Porque só assim o país terá uma chance de encontrar um ambiente favorável ao crescimento, não apenas de sua economia, mas também de sua democracia. Em que todos realmente serão iguais perante à lei, independentemente de sua ideologia ser mais ou menos afinada com o mercado.

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Original em: http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2017/04/03/o-brasil-retirou-dilma-nao-deveria-ter-medo-da-saida-de-temer/

Redação

13 Comentários

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  1. “Esse desidrata em público,

    “Esse desidrata em público, por seus próprios erros e delitos.” Não, Sakamoto. Ele desidrata (?) porque a direita golpista quer acabar com ele. Acho que uma pessoa como você, com esse alcance público, não se pode dar ao direito de errar nessa análise.

  2. Filósofo.

    Quer dizer que o MAL que aflige o Brasil nasce na construção civil, agronegócio, latifúndios, e o que mais?

     

    Ora, se o problema é a relação incestuosa da política com o CAPITAL, a tal da suposta corrupissaum, de que tanto se fala, nascida do financiamento de campanhas com dinheiro das grandes empreiteiras, a primeira coisa a fazer, se a campanha do MPF fosse séria, seria investigar, apurar responsabilidades e denunciar quem criou a tal da corrupissaum, elaborando e promulgando a LEI ELEITORAL PLUTOCRÁTICA em 1997. Adivinha quem foi!! É!! Ele mesmo, conhecido como FHC Brasif que, assim como a Globo/Mossack-Fonseca, já percorreu quase toda a lista de artigos do código penal em infrações conhecidas e comprovadas à lei, embora nunca tenha sequer sido investigado por o que quer que seja. Nem ele e nem a Globo/Mossack-Fonseca. Então, a solução que cabe para o caso brasileiro, é parecida com aquela recomendada pelo mega traficante Juan Carlos Abadia, quando foi preso. Ele disse que se quiserem acabar com o tráfico de drogas, é só acabar com o DENARC, que é o órgão que deveria investigar e não coordenar o tráfico de drogas. O mesmo vale agora. Se quiserem acabar com a corrupção, acabem com o judiciário, com o MP e com a PF que são e estão contaminadas de agentes corruptos que semeiam e cultivam a corrupção há décadas e formaram essas quadrilhas todas que agora tomaram o poder central em Brasilia de assalto.

  3. Se tem uma coisaé pura perda

    Se tem uma coisaé pura perda de tempo é perder tempo com análises das coisas que fhc diz ou das picaretagens que o psdb faz.

  4. A única coisa que corre o

    A única coisa que corre o risco de desidratação é o cerebro de pesssoas progressistas que perdem tempo lendo o Sakamotinho.

    Mesmo neste cenário, o nosso nipo esquerdista puro, prega que todos são farinha do mesmo saco, e até hoje não diz como governar o páis sem o presidencialismo de coalização.

    1. Fui lá e li o artigo. É óbvio

      Fui lá e li o artigo. É óbvio que toda manifestação é válida, cumpre um papel, etc, etc…  Não obstante toda a legitimidade da pauta inicial dos jovens – sobretudo os paulistas- e a análise rápida de uma insatisfação da sociedade (também legítima) com o “sistema” que, ao “esburrar” (?), colocou milhares de jovens nas ruas… vê-se, no mínimo, que o autor  em 2014- um ano depois- ainda estava encantado com as tais jornadas de 2013. Af!

  5. o….

    Quem votou em Temer? Se era parte da chapa como afirmam, deveria ter caído junto com a chapa. Se não era e começaria outro tipo de governo, só deveria fazê-lo com a anuência das urnas. E isto não tem. Mas tudo isto é resultado do Golpe de Origem. Do golpe das Eleições Obrigatórias em Urnas Eletrôinicas. Do golpe da participação da sociedade apenas em apertar um botão e se sujeitar à uma elite pública, esquerdopata, ditatorialmente politicamente correta, anticapitalista e totalmente corrupta que nunca acreditou nem aceitou a democracia. Cuspiu pra cima. O Mundo girou e caiu na cabeça. O cachorro atrás do rabo. Alcançou seu objetivo. Parabéns.  

  6. “A poitica deveria ser…”
    É

    “A poitica deveria ser…”

    É muito ingênuo. Um pato dos golpistas, da UOL, do Otavinho.

    Acorda jornalista! Não basta falar bonito ser amigo de militante.

  7. Sakamoto
    Com todo respeito. Leio aqui q sua opinião não nos leva a lugar nenhum. É apenas um desabafo. Dane-se! Destruam tudo que depois faremos novamente. Faremos quem cara pálida? Em guerra civil? Quem sobrar. Att. Vicente

  8. Aiaiai, Sakamoto sendo Sakamoto

    O Brasil? Como assim? Tal como está colocado aqui é apenas uma abstração. Visto concretamente, NÃO foi o Brasil quem “defenestrou” Dilma. E eu me incluo no Brasil concreto e não retirei Dilma. Dê nome aos bois. Cara, me irrita este seu  esquerdismo de boutique. De quem nunca teve que assumir responsabilidades concretas, dramáticas e fica aí fazendo discursinhos supostamente ousados, puristas e claramente inconsequentes.Vai pegar numa enxada.

  9. A folha de São Paulo já

    A folha de São Paulo já defenestrou o Guilherme Boulos, não deveria ter meda de mandar embora o Sakamoto.

    Ele faz deliberadamente uma tremenda confusão, misturando o impeachment com a ação que corre no TSE.

    Uma diz respeito ao abuso de poder economico, que torna a eleição da Dilma uma farsa, Fraudar as eleições usando dinheiro sem fim de propina é golpear a democracia, que exige que eleições sejam limpas.

    Aliás, saiu da própria boca da Dilma a frase de que nas eleições nós fazemos o diabo, e do Lula que a única coisa feia é perder as eleições. Ambas as frases bem demonstram que não há limites para o que o PT faz nas eleições para ganhar.

    Uma vez que a Dilma, que não foi pro sacrifício para estancar a sangria como disse o Sakamoto, mas porque ela sempre foi o olho do furacão da crise, a causadora da dor e sofrimento e o retrocesso de dez anos que vimos acontecer no plano economico do brasil, foi afastada pelo impeachment, o vice-presidente Temer assumiu.

    Agora retirar o Temer é infringir mais sofrimento ao Brasil.

    Iria haver uma eleição indireta para presidente da república.

    A hipótese de se antecipar a eleição presidencial é de um primarismo que beira a vigarice. Teríamos que mudar a constituição, fazer uma eleição presidencial a toque de caixa, e deixar o Brasil se afundar na crise.

    O Sakamoto é um vigarista intelectual. A folha não deve ter medo de afastá-lo a bem do jornalismo sério.

     

  10. Inclua-me fora disso!

    Brasil nenhum retirou Dilma nenhuma. Golpe é golpe e quem o fez foram os golpista de sempre: direita escravocrata, imprensa venal.

    Pronto, corrigi para você.

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