O improdutivo “rolezinho”; por Cláudio Andrade

O Brasil definitivamente consegue ser atrasado até no “rolezinho”. Esse fenômeno é realidade há anos em shoppings dos EUA. Aqui só estamos vivenciando-o agora, mas mesmo assim, reputo-o como insignificante e sem propósito.

Nesse contexto, aproveito o espaço para opinar acerca dos limites conferidos aos cidadãos que desejam se reunir em um shopping center. Inegável a utilidade e conveniência desses ambientes uma vez que com a violência que assola as cidades brasileiras, o shopping se tornou um refúgio repleto de atrativos gastronômicos e culturais.

Certo, ainda, que o número cada vez maior de shopping centers deve-se, dentre outros motivos, à inviabilidade de os cidadãos contribuintes frequentarem praças e jardins públicos. Ou será que alguém prefere o gelo seco do ar-condicionado dos shoppings ao ar livre da natureza?

Dentro dos shoppings, o risco de ser assaltado é menor do que nas ruas, o que faz com que seja mais frequentado. Porém, quando centenas de jovens resolvem agendar  um encontro em um espaço privado sem que os proprietários possam precisar os efeitos e consequências, surgem as indagações: quem tem mais direito? O jovem cidadão com o famoso  constitucional “ir e vir” ou o proprietário do estabelecimento?

Há defesa para os dois. Os jovens, até que se prove o contrário, estão organizando um ato lícito e pacífico mesmo que a consequência, em certos casos, seja a depredação ou o furto, como ocorreu recentemente em São Paulo.

Impossível não manter, em defesa desses jovens, o benefício da dúvida. Como saber quantos irão ao shopping e quais deles eventualmente furtarão ou depredarão algum estabelecimento? Não se trata de entrar no mérito se são ou não menores de idade.

Por outro lado, devido à qualidade que os shoppings ostentam de privacidade, os proprietários dos estabelecimentos têm o direito de preservação da integridade de seu espaço da forma que entendam mais segura. Isso inclui o ingresso em Juízo para impedir a concretização do “rolezinho”, como já ocorreu.

Na verdade, o que me intriga é essa mobilização feita por jovens para um desfecho sem maior sentido. Por que não se organizar para lutar por direitos mais importantes e urgentes, que são constantemente desrespeitados como a saúde, a educação e a segurança pública?

Dar um “rolé”, na época em que eu era adolescente, consistia em um ato realizado nos momentos de ócio e não em dias úteis em que esses “mobilizadores” deveriam estar estudando ou trabalhando e a internet sendo usada para fins instrutivos.

Acho improdutivo que a mídia continue dando margem a esse tema. Os jovens precisam entender que não é dando um “rolé” que se constrói algo produtivo. Ao contrário: às vezes, é preciso sentar e concentrar-se para mobilizar-se de forma ordeira, visando a resultados benéficos.

Por que essa mobilização não está sendo feita nos espaços públicos? Estariam esses jovens receosos de não serem notados ou é porque os espaços abertos não dão a sensação de invasão?

Estamos iniciando o ano de 2014, tentando fechar as feridas de 2013 e não será dando um “rolezinho” que nossos jovens estarão acrescentando algo benéfico e edificante, muito menos mobilizando-se em favor de uma causa sem qualquer sentido substancial.
 

Luis Nassif

18 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Rolezinho

    Devido as altas temperaturas neste verão, todas pessoas de diversas classes sociais procura o shopping por causa do ar condicionado. Simples, o resto é preconceito.

  2. Rolezinho

    “…às vezes, é preciso sentar e concentrar-se para mobilizar-se de forma ordeira, visando a resultados benéficos.”

    Tá aí explicitada a base filosófica dos que não querem mudar nada. Na minha opinião, esse trecho é representativo de todo o discurso do autor. É impressionante o malabarismo retórico que os conservadores fazem pra defender interesses que não os do povo.  

     

  3. Brasileiro é Burros mesmo…

    Puta merda!

    Que tipo de estabelecimento de vendas, não quer a frequência semanal ou mensal de 2000 jovens potenciais consumidores de grife de marca. Que só querem um pouco de atenção.

    Brasileiro não sabe ganhar dinheiro mesmo. Também a maioria das lojas nos Shoppings são lavagem de dinheiro, o objetivo é dar prejuízo.

  4. Artigo de quem está

    Artigo de quem está completamente por fora.

    Recomendo a leitura desse outro, aqui:

    Os debates extremados à direita e à esquerda estão ignorando as pessoas que participam do rolezinho. É hora de entender a periferia

    por Leandro Beguoci

    O rolezinho, a reunião de jovens e adolescentes em shoppings que nasceu na periferia de São Paulo e já se espalhou por outras partes do país, virou o assunto do verão deste 2014 de eleições e Copa. Um arrastão de palavras de ordem, à direita e à esquerda, tomou o debate e colonizou as discussões com conceitos confusos, fora de lugar. De repente, festas de funk ostentação viraram manifestações de marxistas culturais contra a civilização ocidental e as reações a elas, vindas de gente tão pobre quanto os jovens, uma prova irrefutável do apartheid brasileiro.

    De fato, as reuniões de lazer e a reação a elas foram contaminadas pelo debate político que acontece nas áreas de classe média e classe média alta. Elas foram simplificadas, estereotipadas. O debate se reduz aos exageros, criando adversários irreais e estereotipados: ou as pessoas são elitistas ou comunistas. Mas o mundo real, bem, esse é bem mais complicado. E, no meio desse debate maluco, os sujeitos do rolezinho foram desumanizados e se tornaram categorias para defender posições no debate histérico que vem se desenhando para este ano.

    Ninguém ouve ou sabe o que esses jovens pensam, mas praticamente todo mundo no Facebook, no Twitter, em algumas colunas nos jornais e nas revistas sabe o que eles deveriam pensar. Ninguém sabe qual a intenção que eles têm com esses eventos, mas, do lado de cá do rio, todo mundo já tomou as decisões por eles. Pouca gente do centro expandido já visitou o shopping Itaquera ou Campo Limpo, mas não faltam pessoas que já decidiram que ou eles são nobres centros contra a barbárie periférica ou símbolos poderosos da segregação à brasileira.

    Esse texto é dividido em três partes. Ele abre com uma história pessoal, avança para algumas hipóteses sobre o rolezinho e termina com pinceladas sobre as reações aos encontros. Mas o principal objetivo é tentar oferecer um caminho para a discussão que devolva às pessoas, façam ou não rolezinho, a humanidade que foi perdida na fúria das discussões. Na área delimitada pelos rios Tietê e Pinheiros, a periferia ainda é um sujeito desconhecido. É uma espécie de Cazaquistão que fala português.

    O tédio

    Entre 1995 e 1999, eu e os meus amigos passávamos as semanas esperando o dia em que finalmente um shopping seria construído no terreno em que, por muito tempo, funcionara uma fábrica de produtos químicos. O terreno estava abandonado fazia bastante tempo, e sempre surgiam boatos de que um grupo teria comprado o terreno para erguer, nas palavras de um dos jornais da cidade, “um moderno centro de lazer e compras, com direito a McDonalds”. Quando ele fosse erguido, ficaria a 20 minutos a pé de casa. Naquele pedaço da Grande São Paulo, na periferia de Caieiras, na divisa com Franco da Rocha, um shopping era tudo o que a gente poderia aspirar na vida. Com McDonalds, então… Seria o nosso shopping. Na nossa área.

    Mas esse shopping nunca foi construído, e os nossos dias seguiram iguais. Quando estávamos no começo da adolescência, nossa diversão era jogar bola na rua de paralelepípedo. Eu sempre invejava as crianças que moravam em Pirituba, um bairro na periferia de São Paulo onde minha avó morava, porque as ruas de lá eram asfaltadas, as crianças não perdiam as unhas do pé por causa de uma pedra mal colocada e o esgoto não passava no canto da rua e levantava aquele desagradável odor de urina fortalecida pelo sol quente do verão. Mais velhos, eu e os meus amigos organizávamos algumas festas na casa de um, na casa do outro, e todos torcíamos por uma quermesse de igreja. Mas nunca saíamos do bairro.

    A avenida dos Estudantes, no centro de Caieiras, não era muito receptiva. Havia áreas bem marcadas para cada “tribo”: quem gostava de música eletrônica ficava no começo da avenida, quem adorava rock, no final, quem curtia sertanejo, no meio, quem gostava de axé ficava numa rua ao lado da avenida. Mas os meus amigos gostavam de rap, de pagode, e não havia muito espaço no centro de Caieiras para quem curtia essas músicas e se vestia como Mano Brown. O jeito era ir para Osasco, Perus, Pirituba, para algum lugar onde fosse possível se divertir com os amigos, conhecer umas meninas, beber alguma coisa. Só valia a pena ir para o centro da cidade se fosse com carro. E com muita gente. Caso contrário, era constrangedor.

    Uma vez, a gente foi até o centro, a pé, com muita gente – mas, ainda assim, em número menor do que as outras tribos. Fomos parados pela guarda municipal porque estávamos em bando, segundo um deles. Tomamos uns tapas na costela, e fomos liberados. Ao chegar em casa, minha mãe me esperava, rindo, dizendo que uma das alunas dela, no colégio em que ela dava aula, no centro da cidade, tinha ligado dizendo que “o Leandro está andando com bandidos”. Naquela época, eu tinha uma bolsa de estudos na escola em que minha mãe dava aula (só havia duas escolas particulares na cidade). E a menina estava na minha sala. Minha mãe perguntou a ela como eram os bandidos com quem eu andava, e ela descreveu o Zé Luís, vizinho e um grande amigo de infância. Nós dois rimos – agora, de tristeza. Os pais dele eram do Piauí, e ele era mulato. Aliás, naquela turma do bairro, eu era o único cara branco. Os meus amigos todos, assim como boa parte do bairro, era formada por negros e mulatos. Ao se vestir como Mano Brown, Zé Luís, um sujeito com horror a crime, virou ladrão.

    Quando sai da cidade para cursar jornalismo, em São Paulo, já tinha perdido o contato com os meus amigos de bairro. Eu passava a maior parte do tempo estudando. Em parte por causa da saudável obsessão familiar com estudos, em parte por causa de uma leve melhora econômica na situação de casa, que deu mais espaço no orçamento para livros e me tirou do trabalho adolescente, e em parte porque eu percebi, ao estudar no centro da cidade, que a faculdade talvez fosse uma alternativa viável para buscar outras coisas na vida que não passassem por esgoto ou batida policial. Muitos dos meus amigos ficaram nas sucateadas escolas estaduais do bairro e só pensavam em conseguir um emprego logo para que finalmente pudessem comprar roupas, tênis, o primeiro carro, telhas para a casa, blocos para o muro alto, geladeira. Eles tinham outras urgências, outras necessidades, outras questões na vida.

    Uma vez, no meio da faculdade, cheguei de sandália, cabelo Blond Power e camisa rasgada na casa dos meus pais. Eu morava numa república no centro de São Paulo, com amigos, e contava moedas (por causa do orgulho renitente e de uma busca teimosa por independência). Meus amigos de bairro estavam com carros tunados, tênis bonitões, na esquina de casa. Parei para conversar com eles. Pareciam rappers de filmes americanos. Eles me sacaneavam, dizendo “pô, foi fazer faculdade e virou mendigo, Yellow?” Como eu era o único branco na rua, eles me chamavam de Yellow porque uma professora de inglês não era boa em ensinar cores. A gente conversou sobre a vida, as famílias, os problemas. Vários deles tinham votado pela primeira vez em 1998 – e no Maluf. Segurança era sempre um assunto sério. Alguns deles eram guardas de mercado, operários na fábrica de papel, motoristas de caminhão, operadores de telemarketing. Naquela época, eles só tinham uma preocupação: mostrar que tinham melhorado de vida e proteger as casas de violência. Mas, aos finais de semana, eles e seus carros com som bem alto, ocupavam o centro da cidade tocando rap no último volume. Mas, agora, a guarda municipal já não tinha como pegar ninguém…

    O rolezinho

    Quando surgiram as primeiras notícias sobre os rolezinhos nos shoppings da periferia de São Paulo, fiz uma viagem particular no tempo –  e acabei lembrando de Chopis Centis, música dos Mamonas Assassinas, do meio da década de 1990, que já falava de rolezinho. O grupo, aliás, é de Guarulhos – uma das cidades em que os rolezinhos 2013/2014 já aconteceram. É impressionante a semelhança daquela década com essa.

    “Eu ‘di’ um beijo nela
    E chamei pra passear
    A gente ‘fomos’ no shopping,
    Pra ‘mó de’ a gente lanchar

    Comi uns bichos estranhos,
    Com um tal de gergelim
    Até que tava gostoso,
    Mas eu prefiro aipim

    Quanta gente,
    Quanta alegria,
    A minha felicidade
    É um crediário
    Nas Casas Bahia

    (…)

    Esse tal “Chópis Cêntis”
    É muicho legalzinho,
    Pra levar as namoradas
    E dar uns rolêzinhos”

    Aqueles adolescentes que agora estampam jornais e sites, em bando, são uma versão mais rica e numerosa dos meus amigos de Caieiras na metade dos anos 1990 – e de tantos outros jovens e adolescentes da Grande São Paulo e da periferia da capital. Sim, mais rica. É sempre bom lembrar que o desemprego naquela década superava os dois dígitos e mal havia crédito para erguer ou terminar as próprias casas. Apenas na metade dos anos 2000 é que os bairros da periferia de São Paulo começaram a perder aquela tonalidade laranja dos tijolos, típica das casas sem acabamento. Ninguém na minha época podia sonhar com um Mizuno de mil reais, claro.

    Essa reportagem do iG resume bem o que era um rolezinho para a gente: se divertir um pouco e tentar ficar com algumas meninas. A diferença é que eles, hoje, podem ir aos shoppings e podem convocar os outros amigos pela internet. Nós, não.

    Primeiro porque os shoppings menos constrangedores naquela época eram o West Plaza, numa Barra Funda cheia de galpões industriais abandonados, e o Shopping da Lapa, ao lado da estação de trem. Mas os dois eram distantes e nem todo mundo tinha dinheiro para pegar o trem até São Paulo. Além do constrangimento: por que ir a um shopping se você mal tinha dinheiro para chegar até ele? Segundo porque não tinha internet, e ai entra um aspecto novo: é possível convocar mais gente para os encontros. E, ao convocar mais gente, o que acontecia na rede passa a ocupar as ruas. Parece óbvio, mas nem sempre o óbvio é óbvio. Os rolezinhos são uma versão, amplificada pelas redes sociais, do que sempre aconteceu nas periferias da cidade.

    E, ao amplificar o volume, eles também chamaram a atenção.

    Os novos rolezinhos, portanto, acontecem num novo contexto, mas com um mesmo objetivo. A internet deu visibilidade e tamanho a algo que sempre aconteceu em escala menor, sem ser visto ou noticiado dos rios para cá. O boom do crédito, a diminuição do desemprego e o crescimento da classe C levaram os shoppings até as periferias da cidade. Os rolezinhos aconteceram, todos, da ponte pra lá: shopping Itaquera, shopping de Guarulhos, shopping Interlagos, shopping Campo Limpo. Eles não chegaram nem ao shopping Eldorado, talvez um dos centros comerciais mais híbridos de São Paulo – ele fica ao lado da ponte e recebe gente tanto da periferia quanto das áreas mais centrais da cidade. Além disso, esses jovens têm mais emprego, mais renda e podem comprar bonés de 200 reais em várias parcelas mensais (ou tem pais que querem dar aos filhos o que não tiveram, inclusive bonés de 200 reais. Isso não acontece só da ponte pra cá). Os rolezeiros são os filhos da classe C, do pequeno milagre econômico da segunda metade da década passada. Deng Xiaoping, o homem que introduziu o comunismo com toque capitalista na China, dizia que enriquecer é glorioso. Na periferia de São Paulo, consumir é glorioso.

    Só que a classe C e as periferias das grandes cidades não são blocos homogêneos. Eu escrevi sobre isso em 2012, no The Pompeia Times, quando as pessoas insistiam em dividir a cidade em blocos azuis e vermelhos para celebrar (ou maldizer) o resultado eleitoral. Reproduzo alguns, porque eles também servem para o rolezinho:

    “O que se pode tirar dessa situação? Mais perguntas do que certezas. Eu tenho algumas hipóteses. Uma delas é que a desigualdade em São Paulo não se dá apenas na base centro-periferia, no macro. Essa divisão também se dá dentro de cada área da cidade, no micro. Em cada periferia há um centro urbanizado, com uma classe média ou média alta que prefere ficar nestes bairros por razões que só as pessoas que moram lá sabem. Além disso, em algumas áreas do centro expandido, delimitadas pelos rios, há regiões e famílias muito pobres que moram em cortiços, prédios antigos, mas trabalham perto das casas delas.

    Outra hipótese é a dependência das pessoas do Estado. Toda generalização é perigosa e enganosa, mas existem algumas tendências que podem merecer mais atenção. Talvez quanto mais dependente do Estado, mais as pessoas tendam a votar no PT. Quanto menos dependentes do Estado, mais tendam a votar no PSDB – e isso não necessariamente está ligado à renda, mas a uma percepção sobre a vida , sobre valores.

    Observo muito isso quando vou ao Jardim Nardini, na periferia de Pirituba, onde passei muitas férias na vida, na casa dos meus avós. Quem podia trabalhar de carro tendia a votar nos candidatos tucanos. Quem tinha de trabalhar de ônibus, nos petistas. Muitas das pessoas com carro que conheci não valorizavam os estudos, mas ganhos imediatos com a renda do trabalho. Muitas das pessoas sem carro tinham obsessão com a escola e preferiam economizar dinheiro para investir na faculdade ou na escola particular dos filhos. Isso fez com que, em muitos casos, os destinos fossem diferentes: as pessoas sem carro se mudam para áreas centrais e levam com elas o voto petista. E as pessoas com carro continuam na periferia, com seus votos tucanos.

    Eu poderia listar uma série de outras hipóteses. Já vi bairros inteiros votarem em um candidato por causa de uma obra. O Nardini, por exemplo, foi malufista durante muito tempo, por causa da canalização do córrego fétido que cortava o bairro. E se tornou petista com o bilhete único. O vermelho da Baixa Augusta também pode ter explicação nas leis dos prefeitos Serra e Kassab, que colocaram a diversão de adultos no limite da sobrevivência. E há, claro, os valores. Em algumas regiões operárias antigas da cidade, como Mooca, Lapa, Santo Amaro, Ipiranga, há uma certa obsessão, saudável, em vencer pelo trabalho, não pela malandragem. Isso talvez explique por que o PT terá dificuldades por longos anos para voltar a vencer nestas áreas. O mensalão é visto como um atalho, uma maneira de ter uma vida fácil, sem trabalho”.

    A reação das pessoas que frequentam os shoppings das periferias aos rolezinhos não passa nem pela tese de luta de classe, como algumas pessoas à esquerda vem dizendo, nem pela resistência à concretização dos projetos malévolos dos marxistas culturais para dominar o mundo, como algumas pessoas mais à direita vem enfatizando – e vou lhes poupar dos links porque, afinal, o papel do Oene também é dizer o que você não precisa ler. Os argumentos principais das pessoas mais à esquerda é que os rolezinhos são uma manifestação política com o objetivo de ocupar os espaços que são negados aos pobres pela sociedade de consumo. O problema é que não há nenhuma bandeira ou sinal nesse sentido, como nota Vinicius Torres Freire em um bom texto na Folha de S.Paulo. Os rolezinhos não vêm com faixas ou bandeiras. Não há crítica ao consumo, mas elogio às marcas. Essas pessoas já frequentam os shoppings da periferia, onde os rolezinhos acontecem, em grupos pequenos. É difícil ver reivindicação de espaço em um espaço que elas já frequentam. E isso também complica os argumentos da baderna, à direita. Não há crítica ao sistema. Apenas a vontade expressa em roupas de marcas em participar ativamente dele. Os motivos, como mostram uma convocação do rolezinho, são bem mais singelos:

    “GERAL SE TROMBAR NO PLAYLAND AS 15:00
    Bora lotar o aricanduva!!! para o povo não achar q eu estou querendo promover arrastão… vo logo colocar aqui!!!
    eu quero organizar esse evento para apenas ajuntar a galera ,se conhecer e fazer novas amizades :P , não quero promover arrastão ou briga… não to fazendo esse evento para atrasar lado de ninguem…
    VAMOS QUE VAMOS NA PAZ E ALEGRIA!!!”

    O rolezinho não é uma questão simples, mas acho que podemos descartar facilmente as teses extremadas da esquerda e da direita porque elas não encontram nenhum respaldo da realidade. É difícil ver protesto político na vontade de usar um Mizunão de mil num espaço da periferia da cidade que já é frequentado, individualmente, por essas pessoas. E é ainda mais difícil ver marxismo cultural no funk ostentação. É muito difícil taxar de elitismo uma ação de pessoas da periferia contra pessoas da periferia. Como, afinal, acusar um morador de Itaquera de elitismo contra o filho do seu vizinho, também morador de Itaquera?

    Talvez os problemas com o rolezinho passem por outras chaves. A primeira chave é etária. Jovens, sejam eles de onde forem, vão sempre desafiar os pais, os adultos, quem quer que seja. Faz parte do jogo, e desde Chico Buarque ladrão de carros, passando pelas estripulias alcoólicas do jovem George W.Bush, não importa a classe social ou o país, jovens e adolescentes estão dopados por hormônios. Faça um exame de consciência e pense no que você, do alto dos seus 16 anos, aprontava por ai. Ou, como diz a página de outro evento do rolezinho, desta vez agendado para o shopping Penha:

    “Vamos ai pessoal zoa muito conhece novas pessoas e catar muitas minas e curti muito e sem roubo ai so curti mesmo”.

    O objetivo é diversão. Aqui ou em qualquer lugar do mundo, aliás, como os New Radicals, que não são radicais, já anunciavam num clipe clássico dos anos 90.

    Outra chave é a que abre as portas da diversidade da periferia. Algumas pesquisas mostram que pessoas que moram no limite de uma favela, mas não no seu coração, querem manter toda a distância possível das pessoas que moram nas áreas mais pobres daquela comunidade. Um emprego, uma roupa, tudo é uma marca de progresso, de ascensão, em áreas todas niveladas pela miséria, pelo esgoto a céu aberto, pela falta de educação. Até a música pode virar uma ferramenta. Em Caieiras, as tribos se organizavam por músicas porque, claro, a música que você ouve determina a que parte da periferia a qual você pertence. O simples fato de escutar rock e não rap, lá nos anos 1990, te colocava em outra parte da periferia – igualmente pobre, mas talvez mais respeitável. Eu tinha um vizinho, mulato, que nunca se misturou com a gente porque ele gostava de rock. E quem gosta de rock, ele parecia dizer, era melhor e mais culto do que o restante das pessoas do bairro.

    A última chave de compreensão é a cadeia de preconceito e diferenciação – uma variante da segunda chave. Os vendedores desses shoppings da periferia, tão pobres (ou não suficientemente ricos) quantos os seus clientes que vão comprar os tênis caros com dinheiro vivo, torcem o nariz para aquelas pessoas que são tão próximas – mas de quem elas gostariam de manter distância. Os adolescentes do funk ostentação, por sua vez, compram tênis caríssimos para se distinguir dos colegas de bairro que ainda não conseguiram empregos ou renda para comprar um Mizunão de mil reais. Quando pego o trem para Caieiras, essas redes de diferenciação ficam claras. Não é só em Higienópolis que as pessoas evitam o contato com a “gente diferenciada”. Se há algo constante no mundo é a necessidade de uma boa parte das pessoas em se colocar em rankings para mostrar que, por alguma razão, é melhor do que a multidão. O cara do funk ostentação não quer ser confundido com o vizinho camelô.

    Aliás, a tentativa de fazer um rolezinho-protesto no shopping JK Iguatemi só mostrou o tamanho da nossa ignorância sobre os rolezinhos. Quem mora longe se sente humilhado num shopping como aquele. Não faz sentido fazer um role de ostentação em um lugar em que você nunca conseguirá se exibir para além da enganadora loja da C&A na fachada. A reação do shopping, colocando seguranças privados e pedindo liminar na Justiça, só mostra como também uma parte da indústria do consumo não compreendeu seus clientes e toma reações desmesuradas. As lojas que você coloca, a maneira como organiza o espaço, os acessos aos centros de compras. Tudo isso já serve como uma barreira invisível e delimita claramente quem pode ou não frequentar esses espaços. Até hoje, confesso, ainda me sinto incomodado ao entrar no shopping Iguatemi, na Faria Lima, para ir ao cinema. O passado sempre volta dizendo “tem certeza que você pode entrar nesse lugar?”

    Afinal, não há nada de novo debaixo do sol, como já dizia um trecho do Eclesiastes, da Bíblia, e como mostram os livros dos escritores ingleses e americanos que viram fenômenos semelhantes no século passado. “Jó”, de Joseph Roth, é um bom retrato dos imigrantes e suas agruras para se distinguir em Nova York. Os primeiros capítulos de “O Chalé da Memória”, do historiador Tony Judt, compõem uma excelente análise sobre a dor e a delícia de viver em uma Itaquera londrina no começo do século 20. E,claro, compre “Avenida Dropsie”, de Will Eisner. Os quadrinhos mostram de uma maneira bonita, e triste, a lógica da diferenciação no Bronx. Cada leva de imigrante era discriminada pela geração anterior de imigrantes.

    Sociedades com mobilidade social, em profunda transformação, são interessantíssimas e recusam simplismos – não importa a cor da bandeira ou o volume da gritaria nas redes sociais.

    A reação

    A reação aos rolezinhos, por outro lado, mostra uma história bem mais simples do que o fenômeno, em si. E essa história diz mais sobre o momento em que vivemos do que sobre centenas de adolescentes que organizam uma festa pública no único espaço seguro perto da casa onde eles moram e sobre as pessoas, tão pobres quanto eles, que comem pizza de picanha e tem horror a som com volume alto dentro de um shopping.

    Os rolezinhos são grandes festas em espaços privados. Quem conhece a periferia de São Paulo sabe que existem pouquíssimos espaços em que seja possível fazer uma festa, reunir os amigos ou almoçar fora de casa num domingo. O nó é que os shoppings dos rolezinhos são espaços privados e bem organizados no meio de áreas violentas e pobres. E eles são frequentados tanto por jovens querendo fazer um rolezinho quanto por famílias que querem levar a avó para comer no McDonalds pela primeira vez na vida. Como mostra essa matéria do UOL, o Brasil é recordista mundial de venda de McDonalds. É uma tensão séria, difícil de resolver porque há poucos lugares – e todos eles são privados e estão sob disputa. Há vários grupos de pessoas querendo fazer vários usos distintos dos mesmos centros comerciais.

    Para complicar, esses shoppings dos rolezinhos são bunkers ainda mais fechados do que um shopping como o Cidade Jardim, onde só se entra de carro. São bunkers porque a desconfiança é maior. Porque a violência é maior. Basta ver que, em Campinas, no segundo final de semana do ano, 12 pessoas foram assassinadas na periferia da cidade. Para garantir o básico, como segurança e algum conforto, esses shoppings são áreas cercadas e fortificadas. E, nesse cenário de desconfiança, as pessoas que esses locais preferem receber são aqueles mais previsíveis – famílias, basicamente. Isso justifica policiais, liminares e barrar a entrada de pessoas? Não. Mas ajuda a entender.

    Ainda me recordo do tamanho da minha surpresa quando, faz alguns anos, andei pela primeira vez no Itaim Bibi. Notei, sem entender nada, que várias daquelas casas tinham muros baixos ou não tinham muros. Isso vem mudando, por causa da preocupação das pessoas com a segurança. Mas, em vários bairros da periferia, o muro alto é item de primeira necessidade. É a obra das obras, e isso já vem de bastante tempo, bem antes da construção dos prédios de classe média que se assemelham a uma caixa forte, dado o tamanho da preocupação com segurança. Há um bom livro sobre isso, da antropóloga Teresa Caldeira, chamado Cidade de Muros: Crime, Segregação e Cidadania em São Paulo. No livro, ela analisa como a desconfiança e a segregação são peças comuns a várias áreas da cidade e acabaram ganhando forma visível em muros e grades. Na periferia, em que a violência é altíssima, isso ganha os famosos “contornos dramáticos”. Em um artigo sobre o livro, a professora de Antropologia da UFRJ, Andréa Moraes Alves, resume bem a obra:

    Caldeira apresenta narrativas sobre o crime e os criminosos, mostrando como elas ressignificam a experiência do crime e reproduzem estereótipos sobre a diferença. O discurso sobre o crime é um discurso classificatório que estabelece fronteiras nítidas entre o bem e o mal. Ponto alto da pesquisa de Caldeira, essa parte do livro consegue, através das entrevistas, mostrar esse princípio classificatório em funcionamento. A fala da senhora de classe média, imigrante da Itália, que se refere a outros migrantes mais recentes, os nordestinos, como responsáveis pelo aumento da criminalidade no seu bairro, é um bom exemplo dessa dinâmica de criação de distanciamentos. O princípio classificatório é capaz de transformar a categoria que estaria mais próxima do narrador – pela condição de migrante -, mas que é diferente – de outra classe social -, em um outro distante e condenado. Ainda mais interessante no trabalho, é que essa criação de fronteiras não se limita a um universo social, Caldeira mostra como o mesmo mecanismo atua entre moradores da periferia e de bairros de elite da cidade de São Paulo.

    Em áreas muito violentas, todo mundo é uma ameaça – inclusive o vizinho ou o cliente que escuta som alto. Basta que ele seja um pouquinho diferente. Isso acontece em outras áreas de São Paulo, mas ganha força na periferia. Quando algo parece sair do escopo, a primeira reação das pessoas é apelar para a força. No caso dos shoppings, para a Justiça e para a polícia. Sem mediação, sem diálogo, sem acordo, sem entender minimamente o que ou quem está acontecendo. Na dúvida, é suspeito. Os conflitos, as diferenças, são resolvidos com base nas reações exageradas.

    Qual o próximo passo? Os policiais passam a agir da forma como estão acostumados a se comportar: na base da força bruta. Eles se comportam como uma força de segurança preventiva, a mando de uma organização privada, para reprimir pessoas que não cometeram nenhum crime. E cometem descalabros. Há o caso, bizarro, do menino que foi comprar aliança e acabou multado e agredido. Isso não é novo. Abundam notícias sobre excesso de força policial tanto na periferia quanto no centro – como bem mostraram as reações às manifestações de junho. Não é possível esperar outra reação de uma organização treinada para agir sempre com muita força, ao mínimo sinal de que algo saiu fora do manual. Também não é nenhuma novidade que a relação da polícia pública com organizações privadas é íntima – e complicadíssima. Há centenas de policiais que trabalham como seguranças de shoppings, bares e restaurantes nas horas vagas. Provavelmente, alguns deles ganham mais desses shoppings do que da sociedade – e tem um compromisso maior com o shopping do que com a sociedade.

    A Justiça, que precisa responder às liminares pedidas por shoppings que querem controlar o fluxo das pessoas, também está confusa e longe de um consenso. Ao rejeitar um dos pedidos de “proibição do rolezinho” em um shopping de Campinas, o juiz entendeu que “não houve demonstração inequívoca de que os réus poderiam praticar atos que, por si só, fossem aptos a despertar o justo receio de turbação ou esbulho iminentes”. Mas decisões favoráveis aos shoppings foram conseguidas em São Paulo, o que levantou outros questionamentos: Contra exatamente o quê a Justiça está protegendo o shopping? É possível vetar a entrada das pessoas por roupa, faixa etária, aparência? É possível determinar exatamente o número de pessoas que caracterizam um rolezinho? Eu sei que há uma grande discussão sobre a propriedade privada dos shoppings versus o direito à circulação, mas não é esse o ponto. Os juízes que embarcaram no medo dos shoppings parecem ver o problema de longe, distante, como se legislasse do Brasil para um fictício país distante que fala português com sotaque paulistano.

    Quando tudo isso chega ao lado de cá da ponte, é filtrado pelas lentes do debate político histérico que tomou conta do país. Tudo parece virar apartheid ou comunismo, direito à livre circulação ou defesa da propriedade privada. Todo mundo tem certezas com base em quase nada. Os blogueiros de direita denunciam a conspiração dos funkeiros contra a civilização ocidental. Os blogueiros de esquerda veem apartheid das elites nos shoppings da periferia. Vira um festival livre de loucura, um campeonato nacional de associação livre, em que cada lado atribui um valor a esse encontro de lazer de acordo com a conjuntura política. O fenômeno deixa de ser analisado em si, e passa a ser analisado para servir de arma numa briga muito maior. Esses jovens de Itaquera, do Campo Limpo, de Interlagos, são desumanizados e se tornam aríetes de uma luta da qual eles não têm a menor ideia que estão participando. E as decisões da Justiça, difíceis de entender, só mostram o tamanho do desconhecimento.

    Não há razão para idolatrar ou demonizar os rolezinhos. Talvez haja furtos, talvez haja arrastões, e não há nada que a polícia possa fazer senão impedir que as pessoas pobres que frequentem esses shoppings sejam roubadas ou furtadas. Mas também não faz nenhum sentido impedir que essas pessoas entrem em shoppings pelo simples fato de usarem um boné de aba reta ou um tênis cheio de cores. Os rolezinhos são o que são. E merecem estudos, debates e reflexões melhores do que vem recebendo até agora.

    Porque se tem algo que os rolezinhos legam, com certeza, nesse mar de dúvidas, hipóteses e exageros, é que o nível do debate da ponte pra cá anda bem baixo. E, quando se mete a falar de periferia, esse gigante desconhecido, ganha contornos constrangedores. A periferia é muito mais complicada do que nossos veredictos em 140 caracteres. Como já diria Bob Dylan, há quase 50 anos, em Ballad of a Thin Man (uma música que provavelmente incomodou tanto quanto funk ostentação em seu tempo):

    “Você esteve com os professores
    E todos eles gostaram de sua fachada
    Com grandes advogados você tem
    Discutido leprosos e ladrões
    Você passou por todos
    Todos os livros de F. Scott Fitzgerald
    Você tem um conhecimento literário amplo
    Já se sabe
    Mas algo está acontecendo aqui
    E você não sabe do que se trata
    Sabe, Mr. Jones?”

    Poucas pessoas, hoje, podem dizer que compreenderam as margens da cidade. Quem a entendeu com tino comercial fez dinheiro com ela muito anos antes de qualquer pessoa falar da classe C. Uma delas é Samuel Klein: criou as Casas Bahia e descobriu, quando todo mundo dizia que pobre era caloteiro, que assalariados e remediados pagam prestação em dia. Um Samuel Klein jornalista, acadêmico ou especialista faz muita falta nesse debate sobre os rolezinhos. Eles existem, mas ainda estão quietos. É hora de falar. É preciso mudar os termos do debate antes que os pobres sejam humilhados mais uma vez: perdendo a própria humanidade.

     

    1. Parabéns ao articulista

      Parabéns ao articulista Leandro Beguochi. Foi o único a ver a coisa a partir de uam perspectiva de dentro e usando o chapéu de quase todos os atores desse peço maluca hit de verão: dos adoslecentes rolezeiros, dos remediados que frequentam os shoppings objeto do rolezinhos, dos donos desses shoppings, dos vendendores desses shoppings, dos juízes que concederam as liminares pró (com base do direito de propriedade)  e contra (com base na presunção de inocência combinado com o direito de ir  e vir) os shoppings… Viu também as absurdas “luta de classes”, “racismo” e “apartheid social” engendrada a fórceps pelas esquerdas.

      Minha posição sempre foi muito clara quanto a esse fenômeno: shopping é um espçao privado aberto ao público. Ponto. Os donos têm o direito de salvaguardar esse espaço, pois é dali que tiram o seu próprio sustento e proporcionam o sustento de milhares de trabalhadores. Se os menimso querem se diverir nas férias, tudo bem, façam a coisa de maneira que vinham fazendo há décadas, na boa e na paz. Se querem zoar, em bandos de milhares, que sofram as consequencias, sejam elas preventivas ou corretivas.

      Creio que esse artigo deveria subir. De longe, o melhor feito até agora, repito.

  5. Opinião de quem não conhece a realidade

    Opinião é opinião e essa opinião carece de pontos importantes: compreensão, entendimento, e visão sobre o que é a realidade daqueles que fazem o “rolezinho”. Opinião de meia e sofá, diria, sempre peca pelo simplismo e falta de conhecimentos sobre a realidade. COmo dizem, quando não se sabe é melhor ficar calado. 

  6. E o direito ao lazer?

    Acho irritante um argumento que vejo aqui neste texto, que também é reverberado por vezes sem conta por aí.  Esse argumento, usado em diversos momentos traz sempre a mesma noção: a de que os frequentadores dos rolezinhos deveriam estar estudando ou trabalhando.

    Penso que esse argumento não é válido,  justamente por se tratarem de jovens em idade escolar. Não estamos na época das férias? Os rolezinhos não foram marcados, em sua grande maioria nos fins de semana? Porque então ficar quase que exigindo que estes jovens tenham que estudar ou trabalhar?

    Será que ninguém se percebeu disso? Que esses encontros ocorrem justo no momento em que estes estão em seu tempo livre e, portanto, tem o direito de utilizá-lo da maneira que bem entender?

    Vejo que existe ainda um pensamento muito arraigado nos brasileiros, onde o único destino dos pobres é trabalhar e estudar. Visto dentro de nossa cultura e da realidade até então normal para as classes inferiores, onde os filhos devem trabalhar para ajudar os pais e, se der tempo, estudar. O esforço necessário para manter um padrão mínimo de vida que as gerações anteriores tiveram de empenhar está sendo cobrado dessa geração que invade shoppings.

    Mas a realidade é outra. Com os avanços sociais e de emprego, mais um crédito caro, mas um pouco mais facilitado, esta nova geração não precisa trabalhar de sol a sol para ajudar os pais. Vejo vários jovens de classe baixa que não precisa mais empenhar seu salário para ajudar na casa, ou então nem precisa mais trabalhar. Só estudam.

    Com mais tempo livre, é óbvio que estes adolescentes vão buscar alguma ocupação. E essa ocupação será de algo que lhes de prazer, o que no caso é conhecer novas pessoas. Com essas altas temperaturas, quem vai à uma praça? Não é mais gostoso ir ao ar condiconado do shopping?

    Me incomoda muito este argumento. Exigir de alunos pobres que em pleno janeiro eles procurem um emprego ou fiquem em casa estudando é uma idiotice, uma aberração. Quem fala isso, exige o mesmo de seus filhos? Lembra muito o ideal da Igreja para os negros. Sendo eles pecadores, devido à sua descendência do último filho de Noé,  devem purgar seus pecados pelo trabalho. Não lhes é permitido a diversão. Aquilo que era considerado normal, o fato dos filhos terem que ajudar em casa, se normatizou. É isso que acontece. Ao invés de ficarmos felizes por vermos que a situação melhorou para esses jovens, tendemos a exigir que eles sofram o mesmo que as gerações anteriores. Entra nesse caldo um pouco da nossa visão distorcida do mérito também.  Já que não tiveram que realizar tamanho esforço que nas gerações anteriores, eles não tem o direito de se divertir do jeito que fazem.

    A solução não é só criar espaços para jovens de periferia. Se for isso, corremos o risco de criarmos outra forma de segregação,  onde busca-se a solução para esse corte social. Enquanto não tivermos uma política para jovens que promova a integração entre os jovesn, sem a distinção de classes, o espanto dos frequentadores de shopping ainda ocorrerá. Países avançados,  além de escolas públicas que são frequentadas por todos os estratos sociais, possuem programas de integração entre jovens com atividades, sem esse recorte de classe social.

    Somente no momento em que a população brasileira se perceber como igual, é que acabaremos com esse estranhamento. E isso passa pelo convívio. Minha geração, na casa dos 30 anos, não teve essa experiência. Muito do preconceito está justamente na nossa incapassidade de entender o outro.

  7. Discordo, Cláudio. Os
    Discordo, Cláudio. Os rolezinhos aconteceram no período de férias escolares. Esses jovens não deveriam estar trabalhando, como vc mencionou. Lugar de jovem é na escola. E ferias foram feitas para se divertir. Jovens, normalmente, se divertem nas ferias. Outra coisa, mesmo sendo de natureza apolítica, o movimento despertou várias discussões políticas importantes sobre racismo e segregação. Portanto, mesmo apavorando os lojistas, foi bom ter acontecido.

    1. Não trabaçham quando deveriam

      Não trabaçham quando deveriam trabalhar, no passado era abslotamente normal trabalhar de dia em bancos e empresas e estudar a noite, depois do ECA criminalizou-se o trabalho de adolescentes no Brasil, “”jovem é só para estudar” milhões não trabalham e nem estudam, estamos formando gerações de marginais, porque “”jovem só pode estudar”, fantasia de

      “”Conselhos” e “Procuradorias” para paises no nivel da Noruega. O trabalho é o melhor aprendizado para jovens acima

      de 14 anos, preparando para a vida.

  8. Realidade há anos nos EUA?

    Realidade há anos nos EUA? Aonde? Minha familia mora nos EUA em Boston e Dallas desde 1905 e nunca ouvi falar disso. Se passa um estrano na calçada em Dallas chamam a policia, imagine invadir shoppings.

  9. Ô textinho improdutivo, sô. O

    Ô textinho improdutivo, sô. O Claudio entendo o significado de férias? Entende que adolescente quer mais é curtir a vida, conhecer o mundo, ter novas experiências, e que, infelizmente, os tais shopping center viraram sinônimo disso tudo?

    Por que este texto virou post????

  10. O artigo é pré-histórico?

    A nova realidade social do Brasil é marcada por uma crescente renda da população. Nas classes menos abastadas temos um aumento tão significativo, que lemos ontem aqui no blog: os jovens da classe C gastam/consomem mais que as classes A, B, D, E juntas.

    Essa juventude dos rolezinhos tem mais poder aquisitivo do que se pensa para gastar, segundo o Data Popular são 130 bilhões de reais/ano para consumir. As classes A e B gastam 90 bilhões/ano em consumo/compras.

    Não se pode enxergar e tratar os “rolezinhos” como um “arrastão”. Essa juventude dos “rolés” não sai para roubar tudo que vê pela frente, ela sai com dinheiro nos bolsos e pronta para gastar. E é justamente quem mais impulsiona o consumo jovem no Brasil, segundo o Data popular.

    A realidade do Brasil mudou. Não mais é preciso que a maioria dos meninos/meninas de 13/14/15/16/18 anos saia de casa para trabalhar. Eles estudam e a renda do trabalho do pai e mãe sustenta o orçamento doméstico. Não vejo jovens destas idades trabalhando, como antes via. Porém, quando ando pelas ruas observo muitos jovens estudando, passeando em turma, brincando, fazendo outras coisas.  

    Os jovens da classe C estão na roda do consumo, como qualquer outro jovem das antigas classes média, média alta e alta dos tempos de FHC para trás. O poder aquisitivo pode ser menor unitariamente, mas no conjunto a pesquisa do Data Popular mostrou que o consumo deles é pelo menos 30% maior que todas as outras classes sociais juntas.

    Uma matemática simples sabe que ninguém precisa comprar 10 calças de uma vez. Cada pessoa compra uma ou duas, certo? 

    Imagina se você impede os milhões de jovens da classe C de irem nos shoppings por causa de sua cor, de sua origem social, do bairro onde moram, porque resolveram fazer um “rolezinho” no estabelecimento? E os jovens chegam lá com dinheiro no bolso, não vão de mão abanando, certamente. E, chegam lá, com a roupa que compraram em um desses shoppings, o que é mais contraditório. Combinam via Facebook, via internet. Para isso precisam ter Ipod, Ipad, Smartphone comprados, onde? No shopping Center que, segundo o autor do texto, merecia “fechar” as portas para esses jovens.

    O problema dessa defesa de classe, que alguns porta-vozes da elite apregoam é que eles sonham com a exclusividade e determinados centros de compras só para eles. Sonham com um mundo idealizado, onde só branco de descendência europeia tem acesso. E, acabam fazendo análises, onde o preconceito de classe social se põe acima da realidade econômica.

    Que empresário em sã consciência vai rejeitar a presença dessa massa consumidora nos shoppings centers?

    Só mesmo o desserviço desses analistas sociais vinculados a uma sociedade de exclusão para ainda enxergar o mundo em o dos privilegiados e outro enorme da “ralé” ou da turma do “rolé”. Esse desde começo do Governo LULA está, gradativamente, sendo implodido.

    O mesmo consumidor pode não ser da mesma origem social. Só que ele consome, também. O novo consumidor da Classe C e o antigo consumidor da Classe Média de FHC vão no mesmo shopping. A diferença é que tem muito mais Classe C que Classe Média de FHC consumindo num mesmo momento em um shopping. Ontem fui no shopping Ibirapuera, não tenho dúvidas mais de 75% das pessoas que estavam comprando e consumindo eram classe C do LULA.

    Hoje não dá mais para pensar o Brasil dos 20% de antigamente. Agora é para pensar o Brasil da inclusão social. Não tem retorno. Todos querem estar nesta roda de consumo. Todos buscam e sabem que podem melhorar de Vida e participar do banquete de consumo. Viram seus pares melhorando de Vida e querem melhorar, também.

    Desde quando ter acesso à bens de consumo é ruim ou é pecado? Só o purista da ecologia pode assim pensar. Podemos querer um processo de consciência maior do ato de consumir, mas não o ato de impedir o consumo.

    Ninguém pode mais pensar em exclusão. Tem que se analisar as coisas como elas se apresentam e não com a ideologia das classes sociais, que foram privilegiadas nos direitos de consumir e de bem morar até uma década atrás. Por que alguns puderam e podem e muitos têm que se contentar em comprar roupas, apenas na Rua José Paulino ou no Brás?

    Rolezinhos, manifestações populares são de outra monta, nos dias de hoje. O jovem da Classe C quer respeito, quer mostrar que pode fazer o que antes não fazia, quer que a polícia e segurança do shopping o respeite, quer que seu bairro esteja melhor estruturado, quer um transporte de qualidade, uma escola melhor cuidada e com melhor ensino, etc. Consumir ele já pode!

    O que mostra que a direção a ser buscada não é a de fechar portas, de impedir os “rolezinhos” e sim, de tratar a juventude da Classe C de maneira mais humana e cidadã.

    Uma reflexão:

    Os rolezinhos não seriam a resposta dessa juventude da classe C pelo tratamento dado a elas, em determinadas ocasiões, quando chegam nos shoppings e a segurança de olho neles por causa da cor, do modo diverso de se vestir, do cabelo moicano, do boné para trás, essas coisas? 

    É muito fácil inverter a discussão para uma questão de garantia da segurança dos frequentadores, eivada de preconceitos de classe social, crendo que devemos tornar o ambiente de compras um local de passividade absoluta, não é verdade?

  11. Isto não é verdade…

    A afirmação abaixo do autor não procede:

    “O Brasil definitivamente consegue ser atrasado até no “rolezinho”. Esse fenômeno é realidade há anos em shoppings dos EUA. Aqui só estamos vivenciando-o agora, mas mesmo assim, reputo-o como insignificante e sem propósito.”

    Há uns 3/4 anos acontecem encontros de jovens em shoppings (em especial da capital paulista) e cito como exemplo o shopping Tatuapé (mas em especial entre o acesso do estabelecimento e a estação de metrô). Lembro da aflição de uma amiga e mãe de um adolescente de 15 anos que ia a esses encontros da sua “tribo” todas as terças, nesse caso, os chamados emocores (emo) e a cada dia da semana ocorriam encontros de algumas “tribos”. Nada diferente do que esta acontecendo hoje.

    A única diferença é que com a abertura de novas praças em bairros distantes (Shopping Itaquera, por exemplo), novos jovens que nunca tinha ido a esses encontros passaram a frequenta-lo perto da sua casa, não havendo necessidade de ir até quase o centro da cidade até porque esses encontros não representam a sua “tribo” ou “turma”.

    O que de fato é novo é que com a popularização do Facebook mais a opções de shoppings e a identificação com novos estilos mais de gosto popular (funk, sertanejo) criou-se esse tal fenomeno chamado “rolenzinho”. Mas no resumo, não há novidade alguma na forma…

     

     

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador