Os alvos esquecidos, por Janio de Freitas

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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da Folha

Os alvos esquecidos, por Janio de Freitas

Ninguém se entende sobre o que é liberdade, humorismo, direitos, charge, terror –é o vale tudo da desinteligência

Deu no que era de esperar. Além das mortes parisienses, os jihadistas assassinos conseguiram uma vitória cruel sobre todo o Ocidente: “instauraram a cizânia”, como diziam na aldeia de Obelix, e entre os ocidentais ninguém se entende sobre o que é liberdade, humorismo, direitos, expressão, charge, convivência, terror — é o vale tudo da desinteligência.

Ainda que a possibilidade de debate não fosse bloqueada pelos que se supõem detentores de direitos e liberdade absolutos, como encarnações de todos os profetas, e dos que se valem das diferenças para expelir suas iras neuróticas, o ponto de partida era por si mesmo complicador. Propôs aos raciocínios, ou ao que deles poderia sobreviver sob o jugo emocional, uma associação improvável de conceitos: terrorismo e liberdade de expressão.

Não está estabelecido que do lado de “Charlie Hebdo” houvesse apenas a liberdade de expressão em seu sentido mais puro e pleno. Os que assim entendem não dissolveram, até hoje, os argumentos que os contestam. Nem estes se impuseram àqueles. Nesse impasse a divergência perdeu o rumo.

O jihadismo homicida, por sua vez, não se mobilizou com a ideia posta no cerceamento à plenitude da liberdade expressão. Moveu-o um sentimento justiceiro, vingativo, amálgama de fé no divino e ódio animal. Contra o abuso que via no “Charlie”, mas não só. O vídeo gravado com antecedência por Amedy Coulibaly, o assassino do mercado judeu, foi explícito: eles iriam vingar o seu profeta, as humilhações impostas pelo tratamento ocidental aos muçulmanos e, precisão dele, os palestinos.

A ação dos assassinos fundamentalistas foi, portanto, de sentido muito mais amplo do que o ataque ao “Charlie”. Isso mesmo se poderia entender, antes ainda de ser encontrado o vídeo, pelo ataque e sequestro feitos por Coulibaly no mercado judeu. E pelo assassinato de um policial, que cometeu ainda antes da invasão do “Charlie”. Se, porém, os seus foram atos diversionistas, como em geral os interpretaram, o vídeo é enfático quanto ao sentido largo da ação terrorista.

As análises teriam ganho se tratassem os diferentes em separado, cada qual voltado para o tipo de problema que representa.

No Brasil distante dos acontecimentos, e menos do que secundário em suas conceituações, as divergências foram infiltradas por agressividades que não se mostraram nem nos centros europeus da discussão obsessiva. Não por acaso, claro. Oportunidade para afirmações assim: “Os jovens países [da África] até deveriam agradecer aos ‘opressores’ [europeus] por coisas que nunca tinham visto”. Pois é, ainda um defensor do colonialismo genocida na África, e entre os que publicam coisas na Folha como gente da casa.

Em grande parte dos escritos e entrevistas de brasileiros sobre o ataque ao “Charlie”, viu-se a mesma inadmissão de opiniões divergentes criticada pelos autores nos jihadistas extremados. Não é a única semelhança.

12 Comentários

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  1. O Pato Acorrentado

    Durante a Primeira Guerra Mundial, o desenho foi usado como ferramenta de propaganda e é neste contexto, para ironizar esta solicitação, nasceu Le Canard Enchaîné em 1915, que incluía os desenhos de Lucien Laforge.

  2. Mano, na boa… o Pegida é o
    Mano, na boa… o Pegida é o único grupo terrorista europeu que pode chegar ao poder através de eleições, mas como seus membros são cristãos provavelmente a imprensa brasileira não vai combater este mal (como, aliás, não combateu o nazismo nos anos 1930).

  3. Stefen Fry

     

    Os Versos Satânicos, a Entrevista e o Profeta Furioso

    “Em Paris, eu gostaria de olhar mais para o meu próprio nariz, que para os leitores de uma vulgar e tão imatura publicação como o Charlie H.”

    Eu não posso ter certeza exatamente quantas pessoas já viram uma ou mais das charges Charlie Hebdo que “insultaram” o Islã ou zombaram do seu profeta, desde os assassinatos, mas eu imagino que o número agora está na casa das dezenas de milhões, contra 60.000, no máximo, antes das mãos sujas de sangue dos atiradores islamitas.

    Maomé deve estar muito furioso com o fato de que seus dois cretinos representantes agiram para propagar os insultos para tão, inimaginavelmente, longe, com tamanha amplitude. 

    Se Said e Cherif Kouachi tivessem um único grão de sentido em seus idiotas miolos assassinas, eles teriam previsto que as suas ações poderiam criar mártires seculares, além de propagar as imagens que eles tão detestavam e aumentar ainda mais antipatia pela fé que eles alegam professar (a fé de pessoas razoáveis ​​com ou sem razão).

    Stephen Fry

    Stephen Fry foi muito elogiado pelos críticos pelo desempenho em Twelfth Night (Belasco Theatre)

    Foi-me dito no Twitter que a equipe do Charlie Hebdo vomitava “ódio”. É extremamente importante lembrar que o que eles realmente vomitavam, se você quiser usar essa palavra, era o desprezo. O desprezo pelo Islã, pelo Cristianismo, pelo Judaísmo – por qualquer coisa. Muitas vezes, na palavra mais babaca da nossa era, o Charle foi ‘INADEQUADO’. Seus cartuns beiravam o racismo e o repulsivo. Se eu tivesse sido um parisiense, não duvido que eu fosse um leitor regular de Le Canard Enchaîné (que se aproxima da nossa venerável e excelente Private Eye) e gostaria de olhar mais para o meu próprio nariz em Paris do que para os leitores de uma vulgar e tão imatura publicação como Charlie H.

    Mas o que isso tem a ver com alguma coisa? Lembro-me, há anos atrás, quando a Fatwa foi declarada para Salman Rushdie, como surgiu uma miríade de escritores britânicos e comentaristas, que deve ter conhecido melhor os Versos Satânicos, e alegou que “eles, realmente, não eram tão bons”, implicando, que, por isso, não valia tomar uma posição contra a pena de morte colocada sobre o seu autor. Como acontece (não que isso importe, claro), The Satanic Verses é um dos grandes romances em desenho do pós-guerra. Da mesma forma similar, horrível e absurda, foi vomitado, recentemente, por alguns, os comentários sobre o tema do filme “A Entrevista”, da Sony: “Oh, realmente, ele é bastante tosco.”

    Stephen Fry é ator, escritor e ativista. Seus créditos no cinema incluem Sherlock Holmes: A Game of Shadows, Jeeves and Wooster e O Hobbit. Ele estrelou a nova produção da Broadway, Twelfth Night, de Shakespeare, que estreou no Teatro Belasco em 10 de novembro de 2013, na sequência de previews de 15 de outubro de 2013, e foi encerrada em 16 de fevereiro de 2014.

    [video:http://youtu.be/ldNPKYbeBCM width:600 height:450]

    “Isto é como Shakespeare deve ser feito. Eu não me lembro ter sido tão ridiculamente feliz com a totalidade de uma performance de Shakespeare – deixe-me pensar – talvez, agosto de 2002”, escreveu Ben Brantley para o New York Times.

    http://www.ibtimes.co.uk/stephen-fry-praised-critics-twelfth-night-malvolio-521268

    Imagens: Belasco Theatre | 111 West 44th Street New York, NY

  4. Jânio de Freitas

    “Oportunidade para afirmações assim: “Os jovens países [da África] até deveriam agradecer aos ‘opressores’ [europeus] por coisas que nunca tinham visto”. Pois é, ainda um defensor do colonialismo genocida na África, e entre os que publicam coisas na Folha como gente da casa”.

    Sempre me indago por quanto tempo Jânio ainda terá estômago para conviver com a linha editorial da “Folha” e, principalmente, com seus novos colunistas saídos do esgoto do jornalismo?

    Só pod ser um claro sinal de se reconhecer o melhor jornalista político do País, e aos imbecis dar de ombros.  

  5. O mundo certo por linhas tortas

    Há um ditado bastante conhecido que diz que “Deus escreve certo por linhas tortas”.

    Sem entrar no mérito da questão religiosa, posso usar pelo menos parte da frase para falar de como algumas coisas acontecem no mundo nos dias atuais.

    A história registra que alguns dos momentos marcantes da raça humana não tiveram um desenrolar muito tranquilo.

    Para não divagarmos muito, citaria como exemplo o episódio que envolveu inicialmente Nicolau Copérnico e na sequência Galileu Galilei na polêmica sobre ser ou não a Terra o centro do Universo.

    Ressaltando desde já que não há nenhuma pretensão de tentar tornar semelhantes os acontecimentos, reporto-me ao recentemente ocorrido com o jornal francês Charlie Hebdo.

    Lamentando desde já as mortes ocorridas, o caso do jornal francês assume lugar importante no desenvolvimento do homem.

    “Se meu amigo Dr. Gasparri xinga a minha mãe, ele pode esperar um soco. é normal”.

    Jamais imaginei que fosse ouvir uma frase tão simples, tão comum e com tamanha força e grandeza.

    Não foi dita por um dos homens que simbolizam o notório saber que a história registra daqueles que engrandecem a raça humana.

    Não foi dita por um filósofo ou um pensador predestinado.

    Foi dita por Francisco.

    Ainda que a imprensa tenha corretamente dado destaque à outra frase dele sobre o mesmo episódio, “há limites para a liberdade de expressão”, pelo que a primeira simboliza ponho ambas em pé de igualdade.

    Somente esse homem extraordinário, Francisco, com a grandeza da sua simplicidade e despojamento, poderia ser tão claro e direto para nos dizer:

    Eu sou um de vocês.

    De que outro Papa se poderia esperar essa maneira de se expressar, como se fosse um simples mortal e não o representante de Deus para milhões de pessoas mundo afora; “Se meu amigo Dr. Gasparri xinga a minha mãe, ele pode esperar um soco. É normal.”

    Que Papa ousaria dizer ser normal esperar um soco diante de uma ofensa?

    Mas quem suportaria a ofensa ao mais amado dos seres, a mãe?

    É pregação da violência como resposta à violência?

    Jamais.

    É a compreensão do que somos.

    Não somos absolutos.

    Somos relativos.

    “A religião é o ópio do povo”.

    Para essa frase de Karl Marx podem ser dadas interpretações diversas. A mais comum é no sentido pejorativo.

    Mas se aprendermos a deixar de ver as coisas sob uma única perspectiva, se aprendermos a relatividade das coisas, também podemos dizer que para muitos a religião é abrigo, proteção.

    Como o colo da mãe.

    Desrespeitado e invadido no seu refúgio sagrado, o que restaria ao homem?

    Justifica a violência?

    Não.

    Explica?

    Quem sabe!

    E o que quis dizer o Papa?

    Volto à frase que mereceu destaque por parte da imprensa:

    “Há limites para a liberdade de expressão”.

    E reside justamente nessa frase a explicação para a revolta dos pequenos jornalistas.

    Como disse Paulo Nogueira no Diário do Centro do Mundo (leia aqui http://www.diariodocentrodomundo.com.br/demorou-para-francisco-ser-atacado-pela-imprensa/):

    “O papa representa o exato oposto daquilo pelo que se batem os donos das grandes empresas jornalísticas.

    Desde o primeiro momento de seu pontificado, Francisco tomou o partido dos pobres. Em quase todos os seus pronunciamentos, ele investe contra a desigualdade social”.

    E quem investe a favor da desigualdade social?

    Está claro desde o início que esse não é o Papa que vai agradar a esses segmentos.

    Mas como atacar o Papa num país tão católico como o Brasil?

    Essa foi a chance que esperavam.

    E o que fez a imprensa brasileira?

    O de sempre.

    Distorceu as palavras de Francisco.

    Manipulou.

    As insinuações, ofensas dissimuladas e interpretações enviesadas são de um cinismo e má fé poucas vezes vistos.

    Arrogantes e prepotentes, ao verem os interesses dos seus patrões atingidos esquecem dos riscos.

    Partem pra cima de um homem cujo simbolismo dispensa comentários.

    Mas, sobretudo, partem pra cima de um homem que já mostrou estar acima do simbolismo do cargo.

    A sabedoria da simplicidade, cada vez mais rara entre nós, é algo marcante e tocante em Francisco e o torna um homem especial.

    Com a clareza e dignidade que o têm caracterizado, o Papa Francisco mostra porque cada vez mais trilha o caminho que o levará ao mais elevado dos altares:

    O coração dos homens. 

    1. ACERTOU UM CRUZADO NO QUEIXO DOS PITBULLS DE VEJA E GLOBO

      Ronaldo de Souza, você acertou um petardo no queixo dos quatro vira-latas REINALDO AZEVEDO, RICARDO NOBLAT, GUILHERME FIÚZA e JOSÉ ROBERTO GUZZO. Só faltou chamá-los de doce de leite.

  6. quando a folha era mais

    quando a folha era mais pluralista, janio de freitas até  que

    meio se perdia nessa pluralidade, era mais um apenas.

    mas agora destaca-se com um dos principais articulistas políticos do país,

    com essa direitização esdrúxula da folha. .

  7. O conceito de terrorismo

    Primeiro é preciso dar nome ao boi, o que não foi feito pelo colunista talvez por elegância: Ricardo Bonalume Neto é o nome da insignificância que ganha espaço na Folha para escrever a estupidez que o Jânio transcreve no penúltimo parágrafo. A Folha virou isso.

    Mas eu queria me meter em outro ponto, o do conceito de terrorismo. Provavelmente o que vou tentar expor será alvo de porradas.

    Proponho a seguinte questão a quem sabe argumentar melhor que eu:

    – O ataque ao Charlie foi mesmo terrorismo, como se diz em todo canto?

    Não é mera questão de sinônimos e antônimos. A grande mídia carimba e batiza a seu gosto e interesse, e assim pastoreia e molda a opinião pública.

     O que se entende por terrorismo é o ato violento destinado a aterrorizar a população. É, em nome de uma causa, matar ou ferir inocentes para que todo o resto se sinta em perigo, disseminando o terror – aquilo pode acontecer de novo, em qualquer lugar e a qualquer momento.

    O que aconteceu em Paris foi diferente.

    Os jihadistas mataram aqueles que, no juízo deles, haviam ofendido o Islã. As vítimas foram eles – além dos policiais, o que seria de se esperar, lamentavelmente – e ninguém mais.

    Terrorismo é explodir uma bomba num restaurante e matar indiscriminadamente homens, mulheres, crianças e eventualmente um ou outro soldado.

    Terrorismo é o que pretendiam no Riocentro.

    É o atentado de 11/9.

    O que houve em Paris foi uma chacina movida pelo desejo insano de vingança e justiçamento, como menciona o grande colunista da Folha. Mas com alvos definidos. O Charlie era um alvo evidente, já havia sido ameaçado e atacado. Parece que um atirador até perguntou quem era o editor do Charlie antes de matá-lo. O terrorismo não age assim, pelo menos até agora.

    É fúria homicida da pior espécie, merece o repúdio da civilização.

    Mas terrorismo, não sei não. Acho que o conceito aí está um pouco alargado.

     

     

    1. Outro motivo(invisível)

      Prezado Plínio, acho que no calor da discussão, e no envolvimento da religiosidade neste contêxto, estamos nos esquecendo talvez da ameaça, nada velada, ao contrário profundamente difundida e alimentada nas nações islãmicas, feitas pela Al Qaeda, logo após a execução(tambem de modo sumário) do seu líder Bin Laden, de que os seus seguidores, implantassem a prática de “aterrorizar” as nações ocidentais pro-E.U.A, se é que se entende por ordem, estes atos programados e executados, para mostrar a fôrça das nações fundamentalistas islãmicos, que não aceitam as invasões dos países ditos democráticos ocidentais, aos seus países e desrespeito ás suas religiões e símbolos.

      Este constante estado de pavor, e o tambem constante medo, que outras ações terroristas iguais a que ocorreu na França, vai ficar martelando os ocidentais, e desequilibrando as tênues relações daqueles países, com o mundo ocidental, até que deixemos que eles resolvam seus problemas políticos e religiosos internos, sem a intromissão e a ingerência dos capitalistas, eternos e satânicos(no modo de ver deles)inimigos do Islã.  

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