Os Sem-Teto e as lendas urbanas, por Police Neto

Alguns dos obstáculos à reforma urbana que a cidade de São Paulo tanto precisa são a incompreensão e o estereótipo gerado entre os atores políticos, sociais e econômicos que constroem a cidade. Muitas vezes grupos geram e intensificam conflitos e falsas polêmicas em vez de buscar consenso em torno de soluções.

A hostilidade de muitos segmentos da opinião pública aos sem-teto e à causa da Moradia Digna vem aumentando desde o início do ano quando o prefeito Fernando Haddad resolveu usar o MTST para pressionar a Câmara Municipal a aprovar o Plano Diretor de São Paulo concedendo, em troca, o direito ao movimento de furar e a garantia de valorização de áreas de retenção especulativa na periferia.

O problema aqui é que dificilmente este jovem movimento político travestido de social e comandado por um pop star corresponde ao perfil médio de movimentos de moradia consolidados e ativos na cidade.

Sinto-me absolutamente confortável tanto em ser um dos que não tem se curvado às ameaças e injúrias do MTST como em defender, em qualquer espaço, a necessidade da reforma urbana para que São Paulo seja um lugar melhor para todos e em defender movimentos de moradia sérios que trabalham para que esta reforma aconteça.

Isso porque boa parte da minha produção legislativa nestes 10 anos de mandato dedicou-se a produzir leis que viabilizam a luta pela moradia digna e combatem a especulação.  

Não interessa a ninguém, por exemplo, a manutenção do Centro de São Paulo da forma como ele está hoje: vazio, abandonado, malcuidado, repleto de cortiços ao lado de prédios desocupados, gerando enormes prejuízos ao não utilizar a infraestrutura existente na região. Todos podem ganhar com um centro ocupado e revitalizado.

A realidade dos Sem-Teto é bem diferente da imagem deixada recentemente pelo MTST. Em primeiro lugar é preciso deixar claro que a crítica mais disseminada é também a menos verdadeira: O movimento de moradia não quer, nem recebe, nada de graça.

O que os movimentos pleiteiam é que existam financiamento e condições viáveis para que adquiram um imóvel. Nas palavras da minha amiga Cida Pontes, uma das mais tradicionais lideranças do movimento de moradia, nascida na luta pela erradicação dos cortiços na região central: “Nós não queremos receber nada, queremos é pagar”.

Também é lenda urbana a informação de que os sem-teto, tão logo recebem as casas, as vendem e vão ocupar outro lugar repetindo o ciclo. Alguns sem-teto que se tornam mutuários vendem seus imóveis, alguns porque vão comprar outro maior quando a família cresce e o nível de vida melhora, outros porque mudam de emprego e procuram um lugar mais próximo.

Alguns, poucos, realmente o fazem por esperteza. Mas, em relação a estes últimos, é preciso dizer que muitos poucos daqueles forjados na luta da moradia fazem isto. E quem já recebeu financiamento de programas de habitação de baixa renda jamais vai receber outro. Esta é uma norma de todos os programas em todos os governos.

Portanto, se a primeira parte da lenda pode até ser verdadeira em uma minoria de casos, a segunda é sempre falsa. Além disso, é necessário destacar que vários destes empreendimentos habitacionais populares são baseados em programas de arrendamento, incluindo prazos de carência para venda mesmo após o imóvel ter sido quitado.

Um terceiro equívoco é a noção de que um empreendimento de interesse social desvaloriza a região. O que desvaloriza uma região é ela estar repleta de prédios e terrenos vazios, esconderijo de marginais e traficantes, sujos e mal cuidados. Trazer população para morar nestes locais beneficia não só as famílias, mas gera circulação de dinheiro e de mercadorias, revitaliza o comércio, cria empregos e, acima de tudo, reduz os prejuízos que existem com a infraestrutura existente, em especial a de transporte público.

Por fim é fundamental dizer que o proprietário destas áreas reservadas à especulação imobiliária não terão a área tomada. Ele é penalizado por manter a área vazia ou subutilizada enquanto espera que os investimentos públicos e privados feitos na região valorizem, sem qualquer esforço próprio, a sua área, mas ficará livre da penalização a partir do momento em que der a área uma destinação compatível com a infraestrutura existente. Mesmo se não fizer nada ao longo de cinco anos não tem a área “tomada”, mas sim estará sujeito a desapropriação recebendo o valor justo pela área.

Vamos separar aparência e essência, discurso e ação, politicagem e política social.

A administração do prefeito Gilberto Kassab traçou um amplo programa para tornar o ideal da Cidade Compacta uma realidade com decretos de interesse social em prédios subutilizados, sancionando a lei de minha autoria da Função Social da Propriedade, estabelecendo uma prioridade para a área no Plano Municipal de Habitação – detalhado e cuidadoso levantamento do déficit habitacional com cronograma e custos para cada área da cidade – ou seja, planejamento de verdade.  

Já o prefeito Fernando Haddad vem fazendo de tudo para que isto não aconteça. Em primeiro lugar não está honrando os decretos de Interesse Social dos prédios subutilizados, inclusive os ocupados por movimentos de moradia – e por coincidência tão logo alguns desses prédios têm o prazo do DIS concluído são alvos de ações de reintegração de posse. Engavetou até agora a Lei da Função Social da Propriedade nem sequer dando prosseguimento as 1.043 notificações feitas durante o Governo Kassab.

Além disso, o prefeito demonstrou claramente que o projeto da administração para o Centro é botar tudo abaixo e construir empreendimentos novos de alto padrão. Haddad não só não aceitou que fosse eliminado o chamado “destrufit” – incentivo urbanístico à demolição de prédios existentes na área da Operação Urbana Centro – como ainda vetou todos os dispositivos da lei do Retrofit Social, de minha autoria, que garantiu mais agilidade ao licenciamento para a transformação de prédios abandonados em moradia de interesse social.

São Paulo não conseguirá resolver nenhum de seus outros problemas urbanos – enchentes, mobilidade, proteção ambiental – enquanto não conseguir reduzir o monstruoso déficit habitacional de quase 900 mil moradias. E precisa aproveitar, em especial, as áreas já dotadas de infraestrutura paga com recursos da população. Infelizmente, a atual administração só está preocupada em fazer discursos sobre o assunto, criando o mito de que faz algo pela moradia popular, enquanto as ações concretas vão no sentido contrário.

 

 

Redação

7 Comentários

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  1. Faz tempinho que o Kassab

    Faz tempinho que o Kassab aprovou os projetos de lei do Police. Em São Paulo, o que está no papel dificilmente sai daí. Haddad sabe da urgência! Sobre os dados mencionados, o artigo necessita apresentar os números, caso contrário, é mais papel e papel.

  2. Respeito a opinião do

    Respeito a opinião do político embora discorde.

    Mas faltou colocar de que partido ele é, assim faz mais sentido o texto dele.

    É do PSD, partido do Kassab.

  3. os sem tento e as lendas urbanas
    Infelizmente o Prefeito Haddad erra ao dar apoio ao MTST ajudando esse movimento a “furar a fila” na espera por moradias que todos outros movimentos respeitam. Erra pela segunda vez ao não cumprir a Lei do Police Neto da função social da propriedade, deixando claro que não tem a intenção de cuidar da situação com seriedade e pior desrespeita a Lei fato que poderia ser levado ao Judiciário, porque é obrigação de fazer do administrador e por último é contra o retrofit; solução simples de ocupar os imóveis centrais de forma digna. Haddad maltrata a cidade e a si mesmo como comprovam seus índices de aprovação.

  4. Informação oportuna, porque o

    Informação oportuna, porque o tal vereador nao a coloca no site dele. Só coloca o número, nao o partido. Deve ter alguma razão para isso.

  5. De quem falamos?

    “A administração do prefeito Gilberto Kassab traçou um amplo programa para tornar o ideal da Cidade Compacta uma realidade com decretos de interesse social em prédios subutilizados, … ou seja, planejamento de verdade.  

    Já o prefeito Fernando Haddad vem fazendo de tudo para que isto não aconteça”.

    Trata-se de um texto de opinião, logo, creio que é necessário conhecermos quem a emite.

    José Police Neto (PSD), 40 anos, está em seu terceiro mandato como vereador na cidade de São Paulo. Foi presidente da Câmara em 2011 e foi reeleito para o cargo em 2012. Pesquisador Social, cursou Ciências Sociais na Universidade Federal de São Carlos.

    Coordenou a campanha de Mário Covas e de Geraldo Alckmin ao governo do Estado de São Paulo. Foi presidente do Diretório Municipal do PSDB na capital paulista de 2000 a 2002, partido ao qual esteve filiado por mais de 20 anos.

    Em 2008, foi apontado como o melhor Vereador da Câmara Municipal de São Paulo pela ONG Voto Consciente e pela Revista Veja São Paulo. O vereador também exerceu a liderança do governo Kassab na Câmara de 2007 a 2010.

    http://www1.camara.sp.gov.br/vereador_joomla2.asp?vereador=102

     

  6. Em plena campanha né?!!!!
    Faz

    Em plena campanha né?!!!!

    Faz o discurso da esquerda, dando um tom de direita. Beija o pé do SECOV e da tapinha nas costas do Nabil.

     Nos vimos como o governo PSDB/ DEM/ PSD fez planejamento! É um cara de pau.

     

     

    José Police Neto (PSD), 40 anos, está em seu terceiro mandato como vereador na cidade de São Paulo. Foi presidente da Câmara em 2011 e foi reeleito para o cargo em 2012. Pesquisador Social, cursou Ciências Sociais na Universidade Federal de São Carlos.

    Coordenou a campanha de Mário Covas e de Geraldo Alckmin ao governo do Estado de São Paulo. Foi presidente do Diretório Municipal do PSDB na capital

  7. Entendo sobremodo lucido o

    Entendo sobremodo lucido o artigo de Police Neto. Realmente não faz sentido movimento recem fundado, liderado por radical, “furar fila”, prejudicando demais e longevos movimentos de “sem teto”. A atitude de pressionar a Câmara para atingir seus objetivos particulares e isolados demonstra aversão à ordem e organização e, tambem, aos demais movimentos organizados. Prejudica ainda políticas organizadas que intentam diminiur o deficit habitacional.

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