Precisamos falar sobre militares e soberania, por Gleisi Hoffmann

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN

Precisamos falar sobre militares e soberania

por Gleisi Hoffmann

Jair Bolsonaro nomeou inúmeros oficiais-generais para o governo. A Constituição lhe garante o direito de nomear ministros e, a estes, de exercer as funções. As Forças Armadas têm homens e mulheres preparados, competentes. Convivi e trabalhei com muitos quando exerci a chefia da Casa Civil. Mas, como ministros, deixam de ser chefes militares e passam a ser cidadãos que ocupam cargos públicos importantes.

É assim que é preciso ser. Política com armas leva, inexoravelmente, à imposição, à ditadura. Nossa Constituição cuidou de deixar claro os papéis das instituições, afastando as Forças Armadas da política. Por isso é muito preocupante que Bolsonaro chegue a sugerir que sua autoridade se lastreia mais nos companheiros das Forças do que no voto popular. Isso é perigoso para o país, a democracia e as Forças Armadas. Também é grave que alguns generais ecoem e até pautem o discurso do presidente contra as esquerdas e movimentos sociais, falseando o modo como o PT se relacionou com os militares. Alto lá!

Os governos do PT trataram as Forças Armadas com respeito e dignidade, integrando-as ao esforço democrático de desenvolvimento nacional. Devem se recordar que, em agosto de 2002, o Exército teve de dispensar 44 mil recrutas (quase 90% do total) porque o então presidente FHC – filho, sobrinho e neto de generais – cortou as verbas do soldo e da alimentação. Os recrutas que ficaram eram dispensados ao meio-dia: faltava rancho. Cabos e sargentos não tinham dinheiro para comprar botas.

A partir de 2004 houve recuperação do soldo e aumentos reais. O último decreto dessa nova política foi assinado por Dilma Rousseff, em dezembro 2015: um aumento médio de 30% escalonado em 3 anos, que se completou no dia da posse de Bolsonaro. Graças a Lula e Dilma, o soldo de um general, que em 2004 era de R$ 4.950, é hoje de R$ 14.031, um ganho real de 32,7% sobre a inflação do INPC. O soldo do ex-capitão Bolsonaro, que era de R$ 2.970, agora é de R$ 9.135; aumento real de 50%. Fora os adicionais, que variam de 13% a 28%, quanto mais alta a patente, e outras gratificações.

Aquelas tropas desmoralizadas, mal armadas e mal treinadas, foram usadas nos governos tucanos para reprimir o povo em greves e movimentos sociais. Em maio de 1995, o Exército ocupou 5 refinarias da Petrobrás para esmagar a greve dos petroleiros. Em 1996, 97 e 98, o Exército reprimiu protestos e ocupações em Curionópolis, Eldorado dos Carajás e Sul do Pará. Foi criada uma divisão de inteligência exclusivamente para espionar o MST, que utilizou até imagens de satélites para mapear acampamentos.

O governo Lula convocou as Forças Armadas a defender o povo, o território e a soberania nacional. Estes são os valores inscritos na Estratégia Nacional de Defesa, lançada em 2008, em rico diálogo com os militares, e atualizada em 2012. A END previu o desenvolvimento da indústria bélica e o reequipamento e instrução necessários para a defesa do espaço aéreo, do vasto território pátrio e da chamada Amazônia Azul, onde é explorada nossa maior riqueza: o pré-sal.

Para cumprir esses objetivos, o Orçamento da Defesa (incluindo as três Forças), passou de R$ 33 bilhões para R$ 92,3 bilhões nos governos do PT. Segundo o respeitado Instituto Internacional de Pesquisas da Paz de Estocolmo, o gasto militar brasileiro passou de US$ 15 bilhões em 2002 para US $ 25 bilhões em 2014 (dólar médio de 2015). Ou seja: um país que há 150 anos não tem conflitos de fronteira passou a ocupar a 11a. posição em investimentos militares no mundo (em dois anos de golpe já perdemos 3 posições e desde fevereiro o Exército voltou a reduzir o expediente por corte de verbas).

Iniciamos a construção do submarino nuclear, submarinos convencionais, navios-patrulha e mísseis antinavios. Renovamos a frota de helicópteros, investimos R$ 4,5 bilhões para a Embraer desenvolver o cargueiro KC-390, um sucesso mundial, e contratamos os caças Grippen, escolhidos pela Aeronáutica por critérios técnicos, com transferência de tecnologia. Contratamos o Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicação Estratégica, para garantir a soberania nas telecomunicações, os blindados Guarani e os fuzis IA2, fabricados no Brasil. Aumentamos a segurança criando empregos e desenvolvendo tecnologia.

E ao invés de servir como cossacos contra os trabalhadores, as Forças Armadas foram convocadas nos governos petistas para tarefas de alto prestígio – como o comando das Forças de Paz da ONU no Haiti e no Líbano, além de ações em outros 7 países. E para programas sociais relevantes, como o Soldado-Cidadão, o combate à seca e a construção de obras estratégicas, como a do rio São Francisco.

Lula adotou o critério da antiguidade e experiência na indicação dos comandantes. Alguns dos que hoje o atacam, velada ou publicamente, tiveram nos governos do PT as oportunidades que lhes conferiram prestígio dentro e fora das Forças Armadas, sem que ninguém lhes perguntasse suas opiniões políticas. Não têm moral para acusar o PT de fazer nomeações “ideológicas”, como diz Bolsonaro. Discordem de Lula e do PT; critiquem, governem diferente, mas não percam o respeito à verdade nem ao ex-comandante supremo a quem um dia juraram lealdade e que lhes devolveu a dignidade. E defendam a soberania.

Os generais-ministros de Bolsonaro eram adolescentes em 1964. Alguns talvez tenham reprimido passeatas em 1968. Na Academia Militar, certamente ouviam falar das torturas e perseguições; em 79, compartilhavam angústias morais e corporativas sobre a Anistia; e devem ter se envergonhado, em 1981, com o atentado do Riocentro, que desmoralizou toda uma geração de comandantes. Mas viveram o pacto democrático da Constituição de 1988 e tiveram, a partir de 2003, a oportunidade de servir à pátria num governo que lhes deu condições objetivas de promover a soberania nacional.

Hoje, no conturbado governo Bolsonaro, estão associados ao financista Paulo Guedes, que pretende aprofundar a destruição do país: a venda da Embraer (e com ela nossa tecnologia), a paralisação do submarino nuclear (urdida por procuradores e juízes a serviço dos EUA); a desnacionalização da base de Alcântara; a quebra do contrato dos caças Grippen (outro interesse dos EUA); a entrega do pré-sal aos estrangeiros; a privatização dos bancos que financiam a agricultura pequena ou grande. Seu único projeto conhecido na área militar é a involução do GSI para uma polícia política, cúmplice do Ministério Moro.

De resto, Bolsonaro humilha o Brasil com a subserviência ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e sua política externa irracional e prejudicial ao país. Os generais-ministros respondem à própria consciência pela opção política e os métodos que empregaram na conspiração para derrubar Dilma e vetar a candidatura Lula. Servem hoje a um governo sem rumo e sem comando, que enfrentará muitas divergências para implantar as propostas antinacionais. Mas os generais-ministros não serão julgados pela história e pelas futuras gerações de militares apenas por suas opções políticas e morais. Serão julgados principalmente pelo compromisso com a soberania nacional.

Gleisi Hoffmann (PT-PR) é senadora, eleita deputada federal e presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores

 

13 Comentários

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  1. Moro o rei do Nordeste

    Enquanto Gleisi fala de soberania. Moro faz a festa no Ceará. O PT vai entrar pelo cano logo logo também no nordeste. 

  2. Eu já acho que a esquerda tem

    Eu já acho que a esquerda tem que trabalhar com a ideia de que o Brasil é um país sem exército, porque na prática, não tem mesmo.

  3. Muito bem lembrada nesse

    Muito bem lembrada nesse texto a situação do Exército que foi usado pelo governo FHC para atacar trabalhadores e sem terra e ao mesmo tempo eram humilhados com a falta de investimentos. Não têm memoria, assim como a Policia Federal, que tiveram muitos bonus com os governos petistas e foram respeitados. Agora com a desculpa da caça ao comunismo para destruir qualquer possibilidade de que o PT volte a governar, apoiam essa sabujice ao estrangeiro e venda de todos os nosses bens imposta por um idiota eleito presidente.  

  4. Comparativo

    O Brasil tem 1 General para cada grupo de 1.400 militares

    Israel tem 1 General para cada grupo de 9.000 militares

     

    Israel esta permanentemente em guerra.

    No Brasil os generais estão permanentemente mamando nas tetas.

  5. Por falar em milico…

    O general da banda diz ao que veio: nepotismo na veia!

    Ou será general do bando? Daqueles que batem continência pra “bunda suja”.

    Da IstoÉ:

    Filho de Mourão ganha novo cargo no Banco do Brasil e triplica salário

    Antonio Hamilton Rossell Mourão, filho do vice-presidente Hamilton Mourão, ganhou um novo cargo no Banco do Brasil. Agora, ele será assessor especial do presidente do banco. As informações são do jornal Folha de S.Paulo.

    A promoção do filho do vice-presidente foi confirmada pela assessoria do Banco do Brasil. Na nova função, ele ganhará R$ 36,3 mil por mês, mais do que o triplo de seu atual salário. De acordo com a publicação, a nova função de Antonio equivale a um cargo de executivo.

    O filho de Hamilton Mourão atuou por 11 anos como assessor na área de agronegócio do Banco do Brasil, com salário mensal de R$ 12 mil, e agora vai continuar na função, mas trabalhando diretamente com o presidente da instituição. Sua esposa, nora do atual vice-presidente, também é funcionária do banco.

  6. Artigo de Gleisi Hoffman
    Parabéns Senadora. O ódio fabricado contra o PT não pode fazer com que as Forças Armadas se metamorfose em outra aventura que desmoralizante.

  7. candente crítica à falta de

    candente crítica à falta de política atualpara  o setor e a defesa do que foi feito nos tempops de lula….

    .antológico….

  8. INFELIZMENTE, ASSIM COMO TEMER, CASSAB, ETC

    GRANDE PARTE DESSES GENERAIS SÃO SIMPLESMENTE TRAIDORES.   TRAIDORES DE PRESIDENTES DA REPÚBLICA (LULA E DILMA) QUE OS BENEFICIARAM PESSOALMENTE E ÀS SUAS CORPORAÇÕES.   COMO RECONHECIMENTO ENVIEZADO PELO MAU-CARATISMO DE CADA UM, AGEM COMO CALABARES, JOAQUINS SILVÉRIOS, JUDAS, TRAMANDO A IMPOSSIBILIDADE DE LULA DISPUTAR A ELEIÇÃO E PROVAVELMENTE AJUDANDO A PRESSIONAR PARA QUE OUTROS CAFAJESTES POLÍTICOS, DO JUDICIÁRIO E DO MINISTÉRIO PÚBLICO ARMASSEM PARA DERRUBAR DILMA..    INFELIZMENTE NÃO TEMOS FORÇAS PARA REAGIR À COVARDIA DE AGIREM ARMADOS…..MAS PODEMOS DESEJAR DO FUNDO DA ALMA, COM TODA FORÇA DO NOSSO PENSAMENTO, QUE CADA UM DESSES VERMES MALDITOS SEJA ACOMETIDO DE UM CÂNCER OU DOENÇA DEGENERATIVA QUE OS MATEM BEM LENTA E DOLOROSAMENTE.     INFELIZMENTE É SÓ ISSO QUE MERECEM, PELO MENOS ENQUANTO NÃO TOMAREM VERGONHA NA CARA E METEREM O PÉ NA BUNDA DO IDIOTA QUE AJUDARAM A COLOCAR NO PODER, E AOS SEUS FILHOS TÃO IDIOTAS QUANTO, IDIOTAS ESTES QUE AGORA COLOCAM OS ´PRÓPRIOS MILITARES PISANDO EM OVOS PARA DESFAZEREM AS BURRADAS QUE PRETENDEM IMPLANTAR NO PAÍS.   E, COMO PARTE DO MAU-CARATISMO, TALVEZ SE VINGUÉM EM QUEM LHES DIZ ESSE TIPO DE VERDADE QUE OS SEUS ESPELHOS NÃO LHES NEGAM.

  9. Incrível.

    Brilhante artigo da Gleisi que derruba a idiotisse dos pronunciamentos idiotas de todo o dia. Eles não terão nem a coragem de ler até o fim.

    O PT fez tudo e mais um pouco pelas forças armadas. Condição, salário, respeito, independência, prestigio internacional com as missões da ONU, industria armamentista, submarino atômico, aviões super modernos, caças a jato super modernos, etc, etc.

    O que Sarnei, collor e fhc NÂO tinham feito.

    E os militares, pelo menos os que se manifestam, creio eu, odeiam o PT.

    E para “vencer” o PT eles elegem os mais idiotas e o desastroso grupo bolsonaro/damares/enesto araujo/moro/lorenzeti/etc. Nem precisa esperar, já fracassou. O que é um mergulho no desastre.

    Qeria entender.

    Chama o psicanalista.

    1. O Risco de Ser Impedido Chegar

      Mire-se no exemplo do Mourão e passe a entender.

      Eles odeiam o PT não pelos seus erros e defeitos, mas pelo seus acertos, pois os acertos do PT em relação a libertação do povo condenado a desigualdade, rumo as oportunidades em igualdade de condições com os demais, faz com que esses, muitos incompetentes, sintam-se ameaçados onde chegaram e principalmente no sonho de poderem um dia chegar onde aspiram, ao ‘bem bom’ da Classe Dominante, sem concorrências e garantia da desigualdade para sustentá-los na situação por todo o tempo, como há seculos vem se mantendo. 

  10. Já que o Brasil não entra em
    Já que o Brasil não entra em guerra, para que exército? Para que quartéis? Parece que o PT ajudou a armar os mmilitares contra o próprio país. Acho que já está provado que nossos soldadinhos só sabem mesmo agir contra o próprio povo ou contra povos fracos, como fez o general Heleno no Haiti. Depois do que fizeram os generais tuiteiros, seria bom pensar em outro modelo, tipo criar uma força enxuta apenas para defesa territorial, fechar todos os quartéis dentro das cidades, acabar com essa fábrica de milicos que ficam fazendo educação física no quartel, acabar com as intervenções militares. Ninguém explica, por exemplo, porque o narcotráfico tem armas de uso exclusivo do exército. As forças armadas apenas se somam ao conjunto das instituições desacreditadas no Brasil. Se pensamos em reforma política, precisamos pensar em reforma militar também.

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