Uma vida, uma história em troca do Brasil, por Fernando Horta

Então prepare-se, Spin

Prepare-se para votar no Ciro, que écom quem o PT irá se aliar, fornecendo, talvez, o vice. Para quem nunca jogou pedras no Ciro, como eu, e que enxergou desde 2014 que o nome para 2018 era o dele, nenhum problema; já para aqueles que jogaram pedras, primeiro cumprirão silêncio obsequioso, depois votarão nele, envergonhados mas votarão. 

Quanto ao presente artigo, um breve comentário. Há dois tipos de petismo, o desvairado e o pé no chão. O artigo acima enquadra-se no primeiro caso. No segundo caso, o pé no chão, enquadra-se o do prof. Rudá Guedes Ricci, que vai abaixo, e que serve de contraponto ao desvario inútil acima: 

Rudá Guedes Ricci 14 h ·    Pode dar qualquer coisa em outubro

1) A decisão do TRF4 foi surpreendente porque unânime, uníssona. Não há como alterar a decisão porque, sem qualquer contradição entre os votos dos juízes, o embargo de declaração só pode alterar erros secundários, mas não o mérito da decisão (caso dos embargos infringentes, quando a decisão não é unânime ou a dosimetria não é a mesma definida entre os juízes). Os advogados de Lula tentaram habeas corpus preventivo. Levaram uma traulitada. Então, está mais que certo que estamos diante de um acordo político em relação ao futuro de Lula. Uma unidade política que é marcada pela pressa;

2) A reação da direção nacional do PT foi pífia, revelando mais uma vez que este partido mergulhou num inferno astral em termos de capacidade de formulação e direção política. Há relatos – como o de Aldo Fornazieri – que evidenciam como a militância petista se ressente de orientação e comando político. Alguns discursos de dirigentes chegaram a ameaçar adotar a desobediência civil. Em seguida, e como sempre, recuaram e ficaram amuados. Não há estratégia ou plano político para enfrentar esta situação. Para dar um exemplo de como esta direção é incapaz para enfrentar o momento atual à luz de nossa própria experiência, basta compararmos com a greve metalúrgica de 1980, quando Lula foi preso. Naquele momento, uma segunda direção (na verdade, havia até mesmo uma terceira) sindical e da greve já havia sido preparada e os metalúrgicos não recuaram. Um fundo de greve potente abasteceria os grevistas por muito tempo. Os dirigentes do movimento haviam construído apoios com artistas, intelectuais, religiosos e jornalistas. Lula saiu da prisão como dirigente nacional; 

3) O PT vive um risco alto de, sem Lula, mergulhar numa letargia política sem alma. Não construiu alternativas, desmontou as lideranças nacionais que poderiam substituir Lula e centrou todos seus esforços nas eleições. Não há uma orientação política para a militância, orientação para organização de base, algo que acumule politicamente na sociedade ou nos segmentos sociais que podem dar sustentação ao partido. O retrato de uma cúpula débil com um exército em frangalhos; 

4) A executiva nacional do PT deliberou uma resolução sobre a formação de uma aliança com as forças de esquerda, nomeando quais seriam as agremiações. Apenas Ciro Gomes parece ter se apresentado e, embora sem nenhuma informação oficial, parece ter se reunido com Lula para discutir a possibilidade de formação de uma chapa com o PT para disputar a Presidência da República. As outras forças políticas mantém suas candidaturas e não houve informação alguma sobre tratativas em curso para formação de tal aliança. Sem notícias concretas, a resolução da Executiva Nacional do PT parece, ao menos é a impressão, ter sido desmoralizada. O partido vive, então, uma crise de direção considerável, mas a desorganização e fragmentação da militância acaba por não gerar reação contra erros sucessivos do comando do partido. Ao contrário, há uma nítida alimentação de um sentimento de revolta e frustração por parte da base partidária em relação aos desmandos do judiciário, dos partidos que derrubaram Dilma Rousseff, da grande imprensa, sem que tal sentimento gere uma ação política responsável e decidida que procure alterar este quadro. O PT, o maior partido de esquerda que governou este país por mais de uma década, se revela frágil e embalado numa descarga de energia contra tudo e todos, numa espécie de luta contra moinhos imaginários. Uma direção partidária não pode alimentar tal desorganização emocional absolutamente improdutiva por muito tempo; 

5) Ocorre que da vitória de Lula até hoje, todas eleições nacionais foram marcadas pela polarização entre PT e PSDB. Hoje, os dois partidos parecem gravemente feridos, o que torna a eleição deste ano dramática. Em outras palavras, as dificuldades do PT poderiam ensejar a hipótese que esta situação daria fortuna ao PSDB, seu adversário eleitoral histórico. Contudo, o PSDB parece ser o partido mais afetado pelo impacto social negativo do radicalismo ultraliberal do governo Temer. Surpreendentemente, parte significativa do eleitorado identifica a agenda de destruição dos direitos sociais como responsabilidade dos tucanos. Este seria o motivo para a situação constrangedora em que se encontram os possíveis presidenciáveis do PSDB em várias pesquisas de opinião, incluindo a mais recente do Datafolha, que indica Alckmin como o tucano com melhor posicionamento, mas atrás de Bolsonaro e Marina, e em empate técnico com Ciro Gomes, num segundo pelotão de candidaturas, num cenário sem a presença de Lula. Apenas Alckmin, vale registrar, tem uma poderosa máquina pública em suas mãos, dentre os candidatos que acabo de citar. Pior: sem Lula, Bolsonaro estaciona entre 16% e 18% das intenções de voto (dentro da margem de erro de 2%) revelando que teremos uma eleição entre nanicos;

6) Tal situação parece indicar uma profunda crise de legitimidade de partidos e lideranças políticas em nosso país, ainda mais evidente com o aumento dos percentuais de não-voto (brancos, nulos e abstenções) indicado na última pesquisa Datafolha;

7) Um cenário tão instável e degradado sugere que é possível ocorrer qualquer resultado em outubro, até mesmo, a vitória de um outsider, um populista, mas também, um candidato com mais estrutura eleitoral ou currículo. Tudo está em aberto. Não há mais certezas, já que rebaixamos significativamente o perfil dos candidatos nesta eleição. Vivemos um hiato de representação em que a maioria da população não se vê espelhada em ninguém e os candidatos a nos representar nacionalmente não conseguem formular nem mesmo um diagnóstico que tenha alguma semelhança com o que é sentido no cotidiano do brasileiro médio; 

8) Assim, a vitória de Pirro do vencedor da corrida de cavalos paraguaios desta eleição nacional jogará o país num limbo político a partir de 2019. Qualquer que seja o eleito, a não ser que receba uma lufada de sorte que a nossa memória não registra mais, a probabilidade de instabilidade política parece alta. A aventura da disputa de 2014, em que as biografias foram o eixo do embate eleitoral (e não os programas), transformou a competição entre partidos numa guerra entre inimigos. Ocorre que para o jogo democrático acontecer é preciso que o jogo seja preservado. Entretanto, de 2014 para cá não há jogo, mas destruição. Assim, o tabuleiro não existe mais ou está em tal estado deplorável que os jogadores não sabem ao certo qual movimento determinar. O impeachment deu cores de tragédia à conjuntura política nacional, em que os poderes da República passaram a se recusar ouvir os anseios da população. Chegamos nesta quadra da vida nacional em que tudo o que parecia sólido no reino da política se desmanchou no ar. Tudo parece sem base, fluido, irreconhecível, incerto. 

Para concluir: depois de tanto tentar, o Brasil conseguiu criar sua versão do 18 Brumário.