A indecência da divulgação de brigas de casal, por Luis Nassif

Arte Banksy

A violência masculina é uma doença social que precisa ser extirpada. A maior força do homem e, em muitos casos, a dependência financeira da mulher, abrem espaço para toda sorte de abusos.

A Lei Maria da Penha combate apenas os abusos mais evidentes. Mas cada um de nós conhece dezenas de mulheres cujas carreiras foram comprometidas pela submissão ao macho alfa, pela herança imemorial de se sujeitar ao homem. Não há tortura maior do que um ambiente doméstico em permanente tensão.

Aliás, um teste que tenho feito com esposas profissionalmente bem-sucedidas, é como se dá a relação em casa com o marido não tão bem-sucedido. Invariavelmente, a repressão se dá com ele chamando a atenção para os pequenos deslizes domésticos, como se fosse de responsabilidade única da esposa.

Um dos grandes avanços do Bolsa Família, aliás, foi tornar a mulher a titular da conta. Foi o que garantiu a estabilidade aos filhos.

Mas tome-se o caso do advogado Roberto Caldas.

Sua esposa passou seis anos grampeando o marido. Seis anos! Como planejadora dos grampos, ela sabia da gravação, ele não. Portanto, sua fala é interpretada, a dele é espontânea. O objetivo foi chantagear o marido para obter um bom acordo de separação.

Quem grava seleciona as falas, possivelmente edita. Não se trata de machismo ou feminismo, mas de uma pessoa que grampeia e outra que é grampeada. Se o autor dos grampos fosse o marido, ele também montaria a encenação para provocar as reações de seu interesse

A possibilidade de manipulação é ampla. Basta @ espos@ provocar o cara metade até obter declarações e reações iradas, e divulgar apenas a parte del@. Bastaria dramatizar um empurrão, para transformar em prova de agressão pesada. Principalmente quando as gravações são feitas como instrumento de chantagem, em uma disputa financeira.

A parte deplorável do episódio é o destaque dado pela mídia, convalidando a chantagem, expondo a família e atiçando a bisbilhotice doentia dos leitores, nesses tempos de perda de privacidade.

A divulgação das gravações foi uma decisão abjeta, típica de uma mídia que perdeu qualquer noção de decência.

 

Luis Nassif

28 Comentários

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    1. E aí?

      Vc leu essa frase?

      “Se o autor dos grampos fosse o marido, ele também montaria a encenação para provocar as reações de seu interesse.”

      1. XIN A LEE?

        CoXINhas não leem. Do contrário teriam vergonha de mostrar sua incompetência ao defender certos juízes. Haja vista o mais recente escândalo: Paulo Preto livre leve e solto, com a denúncia da Suiça de 113milhões de propina. Lula, preso por um apartamento ridículo que não lhe pertence. Haja paciência para aturar os analfabetos políticos e, com um agravante, não sabem interpretar um texto!  

          1. Sinto muito
            Lamento se o anonimato lhe irrita, porém tenho a impressão que está irritação é seletiva para os que não concordam contigo.

            De qualquer forma, enquanto o site permitir, faço questão de me expressar anonimamente, sempre argumentando nas ideias e não atacando as pessoas.

          2. Eis o supra-sumo da argumentação

            “Se o Juiz em questão fosse o Sérgio Moro, o articulista seria o primeiro a condená-lo”.

            Que argumento sublime! Vai para o Guiné Buk.

            Se o juiz em questão fosse o $érgio Moro, o Marco Xin A. Lee seria o primeiro a defendê-lo com unhas e dentes.

  1. Não sei do que se trata

    O Google me leva até lá em 2 segundos, porém não tenho o mínimo interesse em acessar os detalhes sórdidos, e assim vou permanecer, nenhuma curiosidade. 

      1. :0

        A noticia que dominou a França no fim de semana foi o ataque com faca do jovem de origem chechenia em Paris e parte da imprensa pedindo uma espécie de ‘minority report” ao MJ. De resto, Macron andou viajando com Brigitte e apareceu de mau humor numa coletiva, a sucessão de Johnny Halliday não sai dos tabloides com a briga entre a ma-drasta e os filhos do cantor deserdados de amor e de todo o resto e a chuva que voltou.

  2. De pleno acordo, Nassif.

    De pleno acordo, Nassif. Vivemos a sociedade do espetáculo. Ao acessar sites como o Uol, vemos “notícias” sobre cenas de novelas no mesmo plano de notícias de política e economia.  Tudo muito deprimente e repugnante. A grande mídia é mais uma arma de desumanização.

  3. A mídia não teve qualquer consideração pelos proles do casal

    Ao publicar essas gravações, a imprensa não teve o mínimo de respeito pelos filhos do casal.

     

    Noticia de Jornal
    Chico Buarque

    Atentou contra a existência
    Num humilde barracão
    Joana de tal, por causa de um tal João

    Depois de medicada
    Retirou-se pro seu lar
    Aí a notícia carece de exatidão

    O lar não mais existe
    Ninguém volta ao que acabou
    Joana é mais uma mulata triste que errou

    Errou na dose
    Errou no amor
    Joana errou de João
    Ninguém notou
    Ninguém morou na dor que era o seu mal
    A dor da gente não sai no jornal

  4. Pseudos

    “típica de uma mídia que perdeu qualquer noção de decência.”

    Uma frase que diz tudo sobre uma mídia que se julga “imprensa” e lança a pergunta: o que ensinam hoje nas faculdades de jornalismo? Com certeza, não ser calhorda. Com certeza,  ter escrúpulos.

    “Juro que no exercício da funções de jornalista, seguirei os caminhos doconhecimento, da ética e da justiça”. (isenção)

     

     

  5. Surpresa

    “Um dos grandes avanços do Bolsa Família, aliás, foi tornar a mulher a titular da conta. Foi o que garantiu a estabilidade aos filhos.”

    Eu desconhecia que este programa social fosse capaz de tal feito.

     

    Valor por criança R$ 39,00Valor por Jovem R$ 45,00Valor por família* R$ 85,00

     

  6. Violência doméstica tem sido

    Violência doméstica tem sido tratada pela mídia como o “8 ou 80”: ou menospreza-se a vítima, ou supervaloriza-se o agressor. Isso poderia ser resolvido com uma análise mais subjetiva dos fatos, tratando cada caso isoladamente.

    Entretanto, como fazer isso quando tudo é generalizado? A própria lei acaba sendo desmoralizada, pois as exceções saltam aos olhos da sociedade – principalmente quando a média das relações é de pessoas que “batem e apanham”, “apanham e batem”, expondo a si próprias e suas famílias ao horror de relacionamentos completamente irracionais.

  7. A mídia indecente

    Em 1999, o BB me deu um tranco, era o único da agência Corporate que não tinha curso superior (aposentei sem ter e continuo não tendo). Argumentei que jamais iria fazer um curso de ADM apenas para cumprir uma exigência, ainda mais aos 45 anos, responderam que poderia ser qualquer um. Assim, entrei em 2000 no curso de Jornalismo da PUCCAMP. Cursei apenas 2 anos, portanto o que vem a seguir ou foi em 2000 ou 2001. 

    Assinava a Folha, um dia no caderno Cotidiano uma notícia escabrosa. Um casal da alta burocracia de Brasília, a fim de agitar a monotonia da vida conjugal e sexual, contratou uma garota de programa e foram ao motel. Quando a garota percebeu que eram bacanas, na hora do acerto de contas apresentou uma fatura muito além do combinado e armou um escândalo. O motel chamou a polícia e o caso foi parar na Folha, com nomes e sobrenomes dos envolvidos, além dos Ministérios onde trabalhavam, fora os detalhes sórdidos. Percebia-se pelo texto, um prazer mórbido na descrição do caso. Imagine a situação do casal no dia seguinte no ambiente de trabalho. Detalhe: o que acontece entre quatro paredes de forma consensual não é da conta de ninguém. 

    Recortei o jornal e levei para sala de aula. O professor resumiu para a sala numa frase: abominável. 

  8. Violência = medo

    Caro Nassif, considero muito importante o ponto em que vc toca neste post. Há tempos me pergunto onde foi parar a ética na mídia televisiva no Brasil.
    Não sei exatamente a que brigas de casal vc se refere,  mas o que se vê na TV brasileira hoje é um festival de violência e de pautas que se ocupam da equação polícia-armas-drogas-violência, sem falar nos filmes programados pela emissora mais rica do país. Ontem mesmo logo após o Fantástico entrou um filme que começava com cenas de tortura a uma mulher.
    Eu vi por acaso, pois os gols do Fantástico é a única coisa que eu ainda assisto na Globo, isso porque sou voto vencido em casa.
    São inúmeros os filmes com nomes e temáticas de guerra e de violência que são diariamente exibidos sem o menor critério ético. Isso é cinismo e hipocrisia sendo usados como armas de guerra para confundir as vítimas.
    Essa naturalização e propagação da violência só pode ter uma finalidade: Colocar medo na população e dessa forma paralisá-la com mensagens subliminares.
    Devia ser proibido veicular imagens de brigas, de agressões físicas e de corpos sendo tombados por armas.
     

  9. Boi de piranha

    Boi de piranha, caro Nassif. Condenar esse juiz no fórum da opinião pública acrescenta, ainda que um pouquinho e apenas nos mais ingênuos, a impressão de que juiz que erra realmente é condenado. Condenado a não ter mais que trabalhar diariamente como juiz e continuar recebendo salário, aposentadoria…

    “Se o juiz não foi condenado é porque não errou.”, podem alegar os irmãos Leandro Karnal e Marco Antonio Villa no Jornal da Cultura. Fagner entra com a melodia.

    (***)

    Agora que aquela imprensa é indecente… sim, é. E por absurdos muito mais graves do que divulgar briga “fake” de casal.

  10. texto

    Amigos, recomendo vivamente o texto da filósofa Suely Rolnik, que aprofunda muito essa questão da ética

    “A aliança entre neoconservadores e neoliberais é facilitada pela coincidência de seus interesses em relação a este objetivo específico. Tal interesse por parte dos neoconservadores, acrescido do fato de que sua torpe subjetividade seja arraigadamente classista e racista, os leva a cumprir o papel de capangas sem qualquer barreira ética e numa velocidade estonteante. Quando nem bem nos damos conta de uma de suas tacadas, uma outra já está em vias de acontecer, geralmente decidida pelo congresso na calada da noite. O exercício desta tarefa lhes proporciona um gozo narcísico perverso, a tal ponto inescrupuloso, que chega a ser obsceno. Com o trabalho sujo destes capangas do neoliberalismo, prepara-se o terreno para o livre fluxo do capital transnacional. É neste cenário que se dá o novo tipo de golpe, criado pela atual versão do capitalismo: um seriado que se desenrola em três temporadas”.

     

    https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/O-novo-tipo-de-golpe-de-estado-um-seriado-em-tres-temporadas/4/40206

  11. De pleno acordo com a falta

    De pleno acordo com a falta de ética de imprensa, onde se pretentende apenas vender exemplares lixo e alienar o leitor. Porém, se o juiz tivesse um comportamento civilizado no interior do lar, a esperteza da gravação não surtiria efeito.

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