
O passo inicial foi a ultra financeirização da economia ocidental. A relação inicial entre produção e preços foi para o espaço. Todos os negócios foram financeirizados e os preços passaram a ser fixados por movimentos especulativos de ondas.
Processo similar ocorreu na grande onda especulativa de fins do século 19 até a grande crise de 1929. Não bastavam os ativos tradicionais – ações, empresas. Criaram-se toda espécie de derivativos, derivativos de derivativos, em um processo exponencial de criação de bolhas.
O mesmo acontece agora com derivativos, títulos de dívida, criptomoedas, bets. O mundo virou um cassino. E esse cassino transborda para a política monetária.
A política monetária não reflete o nível real de atividade econômica, mas as expectativas dos agentes econômicos, manipuladas por uma parceria ignominiosa com a imprensa. É o terrorismo com a tal da gastança, ou então com a taxa de emprego nos Estados Unidos, com o nível de inflação, qualquer motivo é invocado para aumento de juros.
Blair Fix, um economista baseado em Toronto, preparou um paper comprovando o óbvio: as taxas de juros são, antes de qualquer coisa, uma variável distributiva, e não uma variável para trazer “mercados ao equilíbrio financeiro”.
Em vez de “taxa de juros” ele emprega o termo “taxa salarial”. Uma das razões é que ambas são taxas de retorno: os salários são o retorno sobre o emprego; as taxas de juros são o retorno sobre o crédito. E as taxas de retorno são “variáveis distribucionais”, que determinam como o bolo de renda é dividido.
Lá fora, como aqui, quando se fala em aumento do salário mínimo, empresas e muitos economistas reclamam sobre a redução dos juros. Mas quando os credores aumentam as taxas de juros, falar de distribuição de renda é um tema ausente do debate público. “Em vez disso, temos uma enxurrada de jargões econômicos, termos como “taxa natural de juros” ou “taxa de desemprego não aceleradora da inflação”.
Irônico, ele diz que uma possibilidade é que os economistas saibam algo que os mortais comuns não conhecem. Talvez eles tenham olhado para as evidências e concluído que as taxas de juros têm efeito “neutro” na distribuição de renda. Outra possibilidade, continua ele, é que o jargão macroeconômico seja principalmente uma distração.
Quando o estudo da economia política ganhou fôlego, no século 19, pensadores como Karl Marx e Henry George reconheceram que distribuir renda envolvia conflito óbvio. Aí entra John Bates Clark tentando mostrar que o conflito era desnecessário, “provando” que, em um mercado competitivo, cada agente recebe de volta a riqueza que criou. Assim nasceu a teoria da “produtividade marginal”. Ou seja, todos ganham o que merecem e em uma economia de mercado não existe a luta de classes. Para ser correta a teoria, teria que se assumir que a sociedade produz uma única mercadoria. “Então, por que os economistas estabeleceram uma teoria que estava claramente errada?”, indaga ele.
A primeira explicação é que a teoria da produtividade marginal dizia às pessoas poderosas o que elas queriam ouvir – que a distribuição de renda é “justa”.
A segunda explicação é que a teoria combinava bem com a obsessão emergente com o crescimento econômico. Se tratassem toda sociedade como uma única empresa, os economistas poderiam usar uma função de produção para “explicar” o crescimento econômico. Essa função assumia não apenas que cada classe ganhava seu “produto marginal”, mas que suas parcelas de renda eram constantes. Enfim, poderiam criar seus modelos tratando a questão da distribuição de renda como uma questão não problemática. A teoria ficou muito mais fácil.
Blair foi buscar no Google a frequência de utilização de “crescimento econômico” e “distribuição de renda” nas publicações econômicas..
Agora, à medida que a era dos combustíveis fósseis diminui, diz ele, o crescimento econômico se tornará uma relíquia do passado e os economistas serão arrastados de volta ao negócios de estudar como o bolo da renda é dividido.
A divisão do bolo
Aí se entra em um conceito, o da sabotagem estratégica , desenvolvido pelos economistas políticos Jonathan Nitzan e Shimshon Bichler. Trata-se da prática de restringir a capacidade produtiva ou limitar o potencial econômico de uma sociedade para maximizar os lucros e o poder de grupos dominantes, especialmente corporações e elites financeiras. Esse conceito entra na teoria que definir o capital como relação de poder, não como um recurso físico ou produtivo.
Há várias maneiras de exercer esse poder. Os autores dão três exemplos de sabotagem estratégica:
- Indústria Farmacêutica : Restrição ao acesso a medicamentos por meio de patentes ou controle de preços.
- Setor Energético : Redução da produção de petróleo ou gás para criar volatilidade e aumentar lucros.
- Financeirização : Priorizar ganhos especulativos em vez de investimentos em setores produtivos, restringindo o crescimento econômico real.
Voltando a Blair Fix, ele desenvolve o seguinte raciocínio:
- Crédito gera renda. Ou seja, o tomador recebe o crédito e vai montar seu negócio ou adquirir algum bem, gerando renda.
- Juros são os royalties pagos pelo uso do crédito. Quanto maior os juros, maior o royaltie sobre um insumo básico.
Há um bordão dos financistas, de que o dinheiro que administram é a poupança do trabalhador. Blair montou um gráfico comparando o percentual de renda do trabalho e de juros dos americanos. O eixo horizontal classifica os americanos pelo percentil de renda; o eixo vertical plota a relação juros-salário. À medida que se chega à crosta superior dos assalariados, a renda de juros explode.
Por isso, qualquer aumento de juros aumenta a concentração da renda e envia mais dinheiro para as pessoas que possuem mais crédito. E as que possuem mais crédito são justamente as que mais ganham.
A conclusão óbvia é que as taxas de juros são uma arma de guerra de classes – não apenas entre capital e trabalho, mas entre finanças e produção.
Ao contrário do que dizem os economistas neoclássicos, não há forças de mercado neutras, que alocam renda em proporção à produtividade. Há apenas ideias e poder de implementá-las.
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Quando penso no potencial de desenvolvimento econômico que possui o Brasil, aumentam as minhas esperanças que ainda vamos dar certo como um país que pode propiciar aos seus habitantes um bom padrão de vida. No entanto, ao constatar que somos vítimas de uma elite constituida por agiotas que só querem usufruir dos lucros auferidos em operações nem sempre honestas e que a maioria dos políticos que deveriam se contraporem ao grupo de parasitas que se apropriam dos recursos que deveriam ser direcionados aos investimentos produtivos, na realidade estão a serviço do capital improdutivos. Além de tudo isso, ou para piorar, temos uma imprensa livre de isenção que também está a serviço do famigerado mercado financeiro. Diante do quadro desolador,as minhas esperanças fraquejam, mas apesar de tudo, temos que continuar lutando, pois como diz o dito popular: NÃO HÁ BEM QUE SEMPRE DURE, NEM MAU QUE PERDURE. Obs.: Os economistas ditos, neo-liberais, o são por interesse escusos, pois eles sabem que as suas teorias são falsa.
Então, Cuba, Venezuela, China, Coreia do Norte, devendo ser um paraíso
A taxa de juros cumpre no Brasil o mesmo papel que a indústria de armamentos nos EUA e a ambição de superioridade eurocêntrica sobre Rússia e China na Europa. Não é possível melhorar o nível de vida da população quando o Estado é obrigado a sustentar espertalhões enriquecidos que mamam nas tetas do Estado de uma maneira ou de outra. Desmamar esses espertalhões não é algo que pode ser feito por líderes políticos neoliberais que dependem deles. O mundo terá que ser devastado por uma guerra nuclear para que os espertalhões percam tudo poder, riqueza e suas vidas? Infelizmente eu suponho que sim. Enquanto algo realmente cataclísmico não ocorrer os espertalhões continuarão a comandar o show de horrores que mata crianças de fome ou de outra maneira qualquer. Ter esperança no futuro já se tornou um luxo, um indício de loucura ou uma manifestação de hipocrisia.
Bem, o que eu acho que o texto trouxe de mais relevante foi a sentença que difere crédito de juros.
Sim, é muito comum que os defensores da “financeirização” confundam essas instâncias, para dar ao senso comum a (falsa) ideia que de tacam o sistema de crédito.
Pois bem, o resto é o de sempre.
Sim, juros são os “tributos privados”, que se instalaram como a totalidade capitalista, a partir de mantras que foram engolidos como panaceias:
Não se pode emitir dinheiro (salvo para salvar os bancos) e nem tributar.
Subtraídos os poderes únicos do Estado (valorar as trocas e corrigir desigualdades com os impostos) veio o caos.
Este processo tomou corpo, de verdade, após o fim da regulamentação nos EUA, que proibia bancos de varejo atuarem como bancos de investimentos.
Nem Breton Woods significou tanto para o mundo como essa porteira aberta (2008 confirma).
Como o dinheiro dos juros não se relaciona com os outros “preços” da realidade, e são mera arbitragem artificial de distribuição de renda (e de expectativas), essa montanha de dinheiro pode ser direcionada ao estudo de tecnologias que aumentassem exponencialmente a capacidade desse dinheiro se replicar por ele mesmo (algoritmos e transferências).
É como se nesse ambiente, todas as demandas de cada ator fossem sempre ilegítimas! E são!
Apesar da aparência de que as plataformas digitais pudessem guardar alguma relação com algum estágio superior (inovação) do capitalismo, é justamente o contrário!
Não importam muito mais os empregos, as taxas de lucro, amortizações de capitais investidos, equações contábeis de dívidas e variações cambiais.
Estas grandeza e variáveis não estão mais justapostas de formas sistemáticas, complementares, e às vezes, opostas.
A atomização completa da economia, com todas estas partículas se movendo à velocidade dos fluxos digitais, levando de roldão toda vida coletiva, vai gerar, em breve, seu big bang.
Disso tudo, eu só posso dizer: com 54 anos, ainda bem que me falta pouco tempo!
Perfeito. É o que sinto na minha vida cotidiana
.é impossível pagar os juros bancários que estão km acima da selic
Ainda, além das criativas facilidades para investimentos financeiros, há, descaradamente, a punição fiscal do trabalho: a incidência de até 27,5%. Basta uma comparação entre ganhos financeiros e trabalhistas para verificar a proteção que a legislação dá ao capital e punição ao trabalho.
O alegado risco às aplicações de capital em muito pouco diferem dos enfrentados por trabalhadores considerado os rendimentos e custos fiscais envolvidos.
Perfeito!
Luiz
Tudo que voce falou esta correto.
Na verdade o banco central é uma banca de agiotas que definem como o devedor poderá pegar mais dinheiro ,e como nao paga. Ojuros vao aumentando.
Só que uma hora vai quebrar a banca.
Ai veremos como fica.
Bravo Nassif! Iluminação ao mundo do Capital, das finanças da economia.
Mas, o quadro brasileiro de crédito é de criminosos pesados.
O Santander cobra aos europeus, 14 a 15% de interest rate anual no cartão
de crédito. Aqui eles cobram aos brasileiros, os mesmo que o restante dos
bancos brasileiros 400% ou mais de interest rate anual; ou eles acompanham ou
não terá vida fácil no Brasil. Isso que os financistas fazem com o Brasil é
tudo menos crédito.
TAEG de Portugal (Taxa anual de encargos efetiva global)
As taxas máximas para os diferentes tipos de crédito aos consumidores
são divulgadas trimestralmente pelo Banco de Portugal.
Nesse sitio do Banco eles especificam a taxa máxima para último trimestre 2024: 19% taxa anual.
https://www.bportugal.pt/comunicado/taxas-maximas-aplicaveis-aos-contratos-de-credito-aos-consumidores-no-4o-trimestre-de-6