
Ontem eu vi o carnaval baiano celebrando o Oscar. E também o mineiro. Vi crianças de uma tribo de índios cantando em homenagem a Eunice Paiva. Vi a torcida no Rio de Janeiro e em São Paulo.
O que estava em jogo era um filme, uma atriz brasileira? Era muito mais que isso: era o orgulho nacional. Tudo isso demonstrou a enorme demanda por otimismo, por orgulho, que está soterrada por anos e anos de negativismo, pela preponderância do espírito de vira-lata que se apossou do país.
Muitos analistas conseguem enxergar apenas a ponta do desgaste, o lado por onde se materializa a frustração com o país. Seria a inflação. A inflação teria derrubado Biden, a inflação de alimentos está derrubando Lula.
Ora, as críticas contra a inflação são apenas a materialização de uma frustração enorme em relação ao que o país poderia ser, e não é. A superestimação dos efeitos políticos da inflação é apenas uma das formas do mercado manter seu controle absoluto sobre a política econômica, desviando do tema central da frustração: o desencanto com um país que não cumpre com sua vocação de grande.
Donald Trump foi eleito devido ao “Make America Great Again” (Tornar a América Grande Novamente). Há um sem-número de pensadores – entre os quais o grande Noam Chomsky, Mark Lilla, Pankaj Mishra – que reconhecem que o discurso sobre a recuperação da grandeza nacional – foi central na primeira vitória de Trump e calaram fundo na alma norte-americana, sobretudo os que se sentem deixados para trás pela globalização e pelas políticas neoliberais.

Um dos pontos centrais da grande euforia brasileira dos anos 50, do rompimento do espírito da viralatice, foi a Copa do Mundo de 1958 e, nela, a cena de Didi, no primeiro gol da Suécia. Quando os fantasmas da Copa de 1950 obscureciam o país, Didi foi até o fundo do gol, pegou a bola, veio andando calmamente em direção ao meio do campo, acalmando os colegas mais novos e preparando para a grande virada de 5 x 2.
Em crônica na Folha, comparei aquela cena à de Iwo Jima para os americanos, símbolo da Segunda Guerra.
O espírito nacional do Brasil de JK foi construído por Brasília, sim, mas pelas conquistas no futebol, no boxe, no salto tríplice, no tênis de mesa. Lembro-me, do alto de meus 8, 10 anos, agradecendo a Deus por ter me dado o presente de ter nascido no Brasil.
Esse espírito nacional renasceu em 2008, quando explodiu a crise nacional. Sob a liderança de Lula, o país se moveu, se encontrou. Lembro-me de uma pesquisa de opinião feita por um instituto mineiro, sobre o que os brasileiros pensavam do brasileiro. Os temas mais mencionados eram a resistência (o brasileiro é um lutador), a esperança e o jeitinho. Sim, o jeitinho, característica maior da flexibilidade do brasileiro nas artes, no trabalho, na convivência.
Tome o Brasil de 2013. Os brasileiro viviam muito melhores do que dez anos antes. Tinha havido uma notável inclusão social, formando uma nova classe média. Porque o descontentamento? Por que não se via mais a expectativa de futuro.
Mais lá atrás, o metalúrgico do ABC nos anos 70. No final da década, estavam em situação muito melhor do que no início. Mas olhavam para frente, e nada viam. O resultado foi uma reação capitaneada por Lula.
É muito exigir dos analistas da realidade explícita que consigam penetrar na alma do brasileiro. Mas Lula já conseguiu, seja nos primeiros anos de governo – quando levantou a bandeira do combate à fome -, seja em 2008, quando comandou a Linha Maginot contra a crise.
É hora de começar a reconstruir o sonho. As condições internacionais favorecem, já há bons programas em andamento, falta apenas o Lula de 2008 baixar dos céus, antes que o Sr. Crise ocupe o espaço político.
Em 1987, em pleno período das diretas, Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Sérgio Britto, descreveram de modo magistral o sonho que movimenta nações com sua “Comida”: “Nós não queremos só comida, nós queremos comida, diversão e arte”. E sonhos.
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Mouro, gostaria que você explicasse como no governo Lula um carro popular custava 30 mil e hoje mais que o dobro! Abração.
Esse pode colocar na conta do Bozo.
Nassif, querido, respeito e admiro muito seu trabalho tão dedicado. Mas observo que vc eventualmente comete alguns deslizes com terminologias ultrapassadas,como “tribo de índios”. Por favor, fique atento e siga firme no seu trabalho! Grande abraço!
Deveria ser um orgulho internacionalista dos anti-fascistas. Disse Marx que “o domínio de classe já não se pode esconder sob um uniforme nacional, pois os governos nacionais formam um todo unido contra o proletariado.”
“Orgulho nacional”?
Orgulho de quê?
Da maior desigualdade do planeta?
De uma das maiores taxas de homicídios por cem mil habitantes do mundo?
Do trânsito mais fatal da Terra?
De 4 milhões de pessoas sem um buraco em casa para cagar?
Afinal, o que é esse sentimento de orgulho reivindicado pelo autor?
Pode o “orgulho” sobrepor-se a tudo mais?
Mas por que faríamos isso, em nome de quê, ou de quem?
Luis Nassif é um dos brasileiros raros e caros.
Homem de rara coragem, e de caros serviços prestados, não há dúvidas.
Concordemos ou não com seu instinto conciliador e afável, que limita sua visão política, é um homem de bem.
Por isso me dói tanto ler essas frases de efeito, esses lugares comuns que, de quando em vez, ele escreve.
É quase um transe.
Eu sei, é desespero, porque lhe disseram que esse troço aqui, esse monstro territorial, cuja unidade se construiu a base de muita violência e compadrios imperiais, muito massacre de pretos e pobres, muito Cálice, muita igreja e pouca escola, esse país aleijado daria certo algum dia.
Porém, isso não é desculpa.
Orgulho nacional, Nassif, ou é matéria-prima do triunfo da vontade (nazista) ou da vira-latice tropical, que é o nosso caso.
O mais próximo e bem sucedido modelo de “orgulho nacional” que nos aproximamos foi quando os militares emplacaram aquela musiquinha “setenta milhões em ação, salve a seleção.”
E o preço, sabemos qual foi.
Não soubemos conquistar nossa independência, porque não lutamos por ela, assim como não honramos a democracia que dizemos amar, porque não punimos nunca seus conspurcadores.
Nós somos uma anomalia moral e cívica, caro autor.
Deixe seu pessimismo para tempos piores…
Muito bom, Nassif. O assunto poderia dar um programa
Enquanto a história de um deputado que foi morto pela ditadura por denunciar o envolvimento americano no golpe de 1964 ganha um oscar, o “americanófilo” Gaspari passa vergonha ao escrever um monte de volumes para negar o que os próprios americanos confirmam em seus documentos públicos: eles estavam prontos para invadir o Brasil se houvesse resistência ao golpe.
Ser “americanófilo” sempre acaba em xabu.
Concordo totalmente com a pregação do nassif sobre a importância de um sonho, uma perspectiva para unir o país. Por outro lado a minha questão: porque o Jair genocida pode e o Lula não? O custo dos alimentos está derrubando Lula mas o povo quer a volta do Jair ou outro fascista pra comer pé de galinha galinha?
Essa pode colocar na conta das fakenews da extrema direita e sua eficácia em termos de alcance.
Cabe lembrar que a crise de 2013 foi orquestrada pelas mídias, e encomendada pelos americanos que não gostaram da recusa de Dilma Roussef em abrir a exploração do pré sal às petroleiras multinacionais.
Exatamente, assim como o rentismo nacional, que estava babando de ódio com a queda da SELIC, e o Centrão, com sede de vingança pelas demissões de ministros deles. Dilma comprou muitas brigas ao mesmo tempo, abriu muitas frentes de batalha acreditando ter o apoio popular necessário para isso; mas como sempre a comunicação com o povo foi negligenciada, acreditando-se tolamente que os fatos triunfariam sobre as narrativas midiáticas envenenadas. O julgamento do Mensalão abriu o primeiro rombo no casco e daí em diante a mídia deitou e rolou, até a eclosão da Primavera Brasileira, as famigeradas cagadas de junho, em que se juntaram grupos financiados pelos americanos. Tudo foi feito para Dilma perder a reeleição em 2014, como não deu certo precisaram tirar o fascismo da coleira (com as manifestações em 2015 e 2016) e dar o golpe…
Interessante essa necessidade atávica que todos temos de sentir esse orgulho da pátria. Num post no Instagram que vi hoje sobre “cinco países felizes”, que citava Islândia, Suíça, Dinamarca entre outros, como “países felizes”, a grande maioria dos comentários era discordando da premissa de que eram “mais felizes que os brasileiros”, e os comentaristas falavam da frieza desses povos, a ocorrência de depressão em larga escala, o clima, etc., sempre em contrapartida à alegria e empatia da maioria dos brasileiros. Era evidente nas entrelinhas essa necessidade de relatarem os motivos que temos para nos orgulhar do Brasil e ser felizes. Se um líder catalisar essa “pré-disposição” com um projeto de nação envolvente e de credibilidade, SE a grande mídia não boicotar ainda podemos dar certo….
O “orgulho nacional” mantém o entusiasmo da grande parcela da população, descontente com a própria situação econômica, por certo tempo. Mas não dura muito e vem a “caída na real”, seja em governos de direita ou socialistas . Só quando os políticos polarizados tomarem medidas para melhorar a situação do país e do povo, e não puramente eleitoreiras e corruptas, o país poderá melhorar e manter o orgulho nacional.
Apesar das pesquisas, tão estranhas, o que vejo é a volta do sentimento de orgulho de ser brasileiro. Sou feliz por ser brasileiro.
Que cosa linda essa fala em formato de texto.
Quem se mistura com porcos farelo come. Passarinho que acompanha morcego acorda de cabeça para baixo.Etc.
Existem outros ditados e provérbios que podem ser citados para, na comparação, justificar a depravação galopante da ética, da honra e daquele que já foi um virtuoso e franco sistema político. Imagino que influenciado pela parte indecorosa do empresariado nacional e estrangeiro, e também pela parte podre de instituições públicas, que atualmente finge que regula, que fiscaliza, que investiga e que pune. Os supostos poderosos cartéis corporativistas providenciam a segurança e blindagem dos seus. Os territórios parece que estão mapeados e controlados pelos poderes locais, que talvez e coemunere com um pedaço do seu bolo, ao núcleo o central da cartelização política.
O preço e o ganho são produtos subtraídos da parte do povo ou da verba social, que afasta cada vez mais da inclusão social, justamente os mais e os menos excluídos.
Para os Barões impatrióticos e seus asseclas, quanto menos saber e mais dependência da população, maior poder e maior concentração de renda haverá em nossas terras.
Quanto mais são combatidos pelos nossos escassos heróis, muitos mais surgirão com maior apetite.
Temos que seguir com a resistência e a coragem.
“Eles tentam nos calar e nós gritamos mais. Eles nos prendem sem provas e nós escapamos pela lei.
E quanto menos esperam, os assombramos com a verdade da lei e da ordem.
A luta é árdua, muito desigual e desfavorável para nós.
Ainda assim somos muito mais que maioria.
O nosso 1 + 1 é infinitamente muito mais que 2.
corrigindo: … que talvez remunere com um pedaço do seu bolo,…