Carta em defesa da democracia, por Luiz Inácio Lula da Silva

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Jornal GGN – Hoje, o ex-presidente Lula divulgou um manifesto onde fala sobre toda a injustiça contida no processo que o levou à prisão. O documento foi lido pela presidente naiconal do PT, senadora Gleisi Hoffmann. 

O ex-presidente relata todos os passos da justiça brasileira, montando um inquérito baseado em informações de uma notícia publicada no O Globo que tinha como fontes a própria justiça. Questão complicada para garantir a isenção necessária. Lula entende que, juntando as linhas soltas, fica difícil acreditar que terá um julgamento justo, que a justiça será por ele como deve ser para todo brasileiro.

Eis a íntegra do documento.

CARTA EM DEFESA DA DEMOCRACIA

Meus amigos e minhas amigas,

Chegou a hora de todos os democratas comprometidos com a defesa do Estado Democrático de Direito repudiarem as manobras de que estou sendo vítima, de modo que prevaleça a Constituição e não os artifícios daqueles que a desrespeitam por medo das notícias da Televisão.

A única coisa que quero é que a Força Tarefa da Lava Jato, integrada pela Polícia Federal, pelo Ministério Público, pelo Moro e pelo TRF-4, mostrem à sociedade uma única prova material de que cometi algum crime. Não basta palavra de delator nem convicção de power point. Se houvesse imparcialidade e seriedade no meu julgamento, o processo não precisaria ter milhares de páginas, pois era só mostrar um documento que provasse que sou o proprietário do tal imóvel no Guarujá.

Com base em uma mentira publicada pelo jornal O Globo, atribuindo-me a propriedade de um apartamento em Guarujá, a Polícia Federal, reproduzindo a mentira, deu início a um inquérito; o Ministério Público, acolhendo a mesma mentira, fez a acusação e, finalmente, sempre com fundamento na mentira nunca provada, o Juiz Moro me condenou. O TRF-4, seguindo o mesmo enredo iniciado com a mentira, confirmou a condenação.

Tudo isso me leva a crer que já não há razões para acreditar que terei Justiça, pois o que vejo agora, no comportamento público de alguns ministros da Suprema Corte, é a mera reprodução do que se passou na primeira e na segunda instâncias.

Primeiro, o Ministro Fachin retirou da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal o julgamento do habeas corpus que poderia impedir minha prisão e o remeteu para o Plenário. Tal manobra evitou que a Segunda Turma, cujo posicionamento majoritário contra a prisão antes do trânsito em julgado já era de todos conhecido, concedesse o habeas corpus. Isso ficou demonstrado no julgamento do Plenário, em que quatro do cinco ministros da Segunda Turma votaram pela concessão da ordem.

Em seguida, na medida cautelar em que minha defesa postulou o efeito suspensivo ao recurso extraordinário, para me colocar em liberdade, o mesmo Ministro resolveu levar o processo diretamente para a Segunda Turma, tendo o julgamento sido pautado para o dia 26 de junho. A questão posta nesta cautelar nunca foi apreciada pelo Plenário ou pela Turma, pois o que nela se discute é se as razões do meu recurso são capazes de justificar a suspensão dos efeitos do acordão do TRF-4, para que eu responda ao processo em liberdade.

No entanto, no apagar das luzes da sexta-feira, 22 de junho, poucos minutos depois de ter sido publicada a decisão do TRF-4 que negou seguimento ao meu recurso (o que ocorreu às 19h05m), como se estivesse armada uma tocaia, a medida cautelar foi dada por prejudicada e o processo extinto, artifício que, mais uma vez, evitou que o meu caso fosse julgado pelo órgão judicial competente (decisão divulgada às 19h40m).

Minha defesa recorreu da decisão do TRF-4 e também da decisão que extinguiu o processo da cautelar. Contudo, surpreendentemente, mais uma vez o relator remeteu o julgamento deste recurso diretamente ao Plenário. Com mais esta manobra, foi subtraída, outra vez, a competência natural do órgão a que cabia o julgamento do meu caso. Como ficou demonstrado na sessão do dia 26 de junho, em que minha cautelar seria julgada, a Segunda Turma tem o firme entendimento de que é possível a concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário interposto em situação semelhante à do meu. As manobras atingiram seu objetivo: meu pedido de liberdade não foi julgado.

Cabe perguntar: por que o relator, num primeiro momento, remeteu o julgamento da cautelar diretamente para a Segunda Turma e, logo a seguir, enviou para o Plenário o julgamento do agravo regimental, que pela lei deve ser apreciado pelo mesmo colegiado competente para julgar o recurso?

As decisões monocráticas têm sido usadas para a escolha do colegiado que momentaneamente parece ser mais conveniente, como se houvesse algum compromisso com o resultado do julgamento. São concebidas como estratégia processual e não como instrumento de Justiça. Tal comportamento, além de me privar da garantia do Juiz natural, é concebível somente para acusadores e defensores, mas totalmente inapropriado para um magistrado, cuja função exige imparcialidade e distanciamento da arena política.

Não estou pedindo favor; estou exigindo respeito.

Ao longo da minha vida, e já conto 72 anos, acreditei e preguei que mais cedo ou mais tarde sempre prevalece a Justiça para pessoas vítimas da irresponsabilidade de falsas acusações. Com maior razão no meu caso, em que as falsas acusações são corroboradas apenas por delatores que confessaram ter roubado, que estão condenados a dezenas de anos de prisão e em desesperada busca do beneplácito das delações, por meio das quais obtêm a liberdade, a posse e conservação de parte do dinheiro roubado. Pessoas que seriam capazes de acusar a própria mãe para obter benefícios.

É dramática e cruel a dúvida entre continuar acreditando que possa haver Justiça e a recusa de participar de uma farsa.

Se não querem que eu seja Presidente, a forma mais simples de o conseguir é ter a coragem de praticar a democracia e me derrotar nas urnas.

Não cometi nenhum crime. Repito: não cometi nenhum crime. Por isso, até que apresentem pelo menos uma prova material que macule minha inocência, sou candidato a Presidente da República. Desafio meus acusadores a apresentar esta prova até o dia 15 de agosto deste ano, quando minha candidatura será registrada na Justiça Eleitoral.

Curitiba, 3 de julho de 2018

Luiz Inácio Lula da Silva

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

6 Comentários

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  1. Exatamente como aqui discutido

    Se querem jogar Lula fora da política devem apresentar sequer uma única prova da sua culpabilidade.

    Se não tem capacidade para gerar uma prova é porque estão blefando com essa condenação – que não se sustenta, apenas para evitar que Lula volte ao Planalto.

  2. DELAÇÃO FALSA: 7 INOCENTES

    DELAÇÃO FALSA: 7 INOCENTES CONDENADOS À PRISÃO PERPÉTUA NA ITÁLIA. DENUNCIADO POLICIAIS ENVOLVIDOS NA OBTENÇÃO DA DELAÇÃO FALSA: MONTARAM UMA VERSÃO FALSA E OBRIGARAM O FALSO DELATOR CITAR NOMES DE INOCENTES.

    Ansa

    Policiais são denunciados em caso sobre morte de Borsellino

    02/07/2018

    (ANSA) – O Ministério Público de Caltanissetta, no sul da Itália, denunciou três policiais por tentarem atrapalhar as investigações sobre o atentado que tirou a vida do juiz antimáfia Paolo Borsellino, em 1992.

    Os agentes Mario Bo, Michele Ribaudo e Fabrizio Mattei são acusados de ter montado uma versão sobre os preparativos do ataque e obrigado o falso delator Vincenzo Scarantino a citar nomes de pessoas inocentes.

    Os três agiam sob comando do policial Arnaldo la Barbera, já morto, e responderão pelo crime de “calúnia”. Por causa da armação, sete inocentes chegaram a ser condenados à prisão perpétua. “Foi uma das mais graves despistagens da história judiciária italiana”, diz a acusação, que ainda não conseguiu descobrir as motivações por trás do suposto esquema.

    Borsellino foi assassinado em 19 de julho de 1992, em Palermo, quando um carro repleto de explosivos foi detonado em frente à casa de sua mãe no momento em que ele chegava.

    Os mandantes e executores do crime foram os mafiosos da Cosa Nostra Salvo Madonia e Vittorio Tutino. O chamado “massacre de via D’Amelio” também vitimou cinco agentes da escolta do magistrado, que, ao lado de Giovanni Falcone, também assassinado, liderava os processos contra a Máfia. (ANSA)

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  3. O aparente conflito entre os teores dos arts. 637 e 283 do CPP.

    Como resolver essa aparente antinomia?

    Ora, o aparente conflito deveria ser solucionado pelo critério cronológico, segundo o qual, lei posterior revoga lei anterior com ela incompatível. A redação do art. 283 do CPP é de 2011. A redação do art. 637 do mesmo diploma legal é anterior a 2011.

    Mesmo que as redações das duas normas tivessem sido dadas pela mesma lei, a solução se daria pela norma mais benéfica ao réu, com arrimo no princípio da primazia da norma mais favorável à pessoa humana. A norma mais benéfica ao réu é a norma do art. 283 do CPP.

    Lula Livre!

    Cadeia para o Moro, Dallagnol e demais larápios do judiciário e do MP!

  4. Eles não têm coragem, Presidente.

    Presidente LULA, o problema é que eles não têm coragem. Não passam de covardes, a serviço de interesses absolutamente escusos, que se acoitam nas funções de autoridades para destruir o País.

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