Para todo mal há cura: educação midiática e desinformação no Brasil, por Pâmela Pinto

A educação midiática tem sido uma das principais frentes para desmobilizar o avanço da desinformação em diferentes contextos socioculturais.

Para todo mal há cura: educação midiática e desinformação no Brasil

por Pâmela Pinto

Transcorreram apenas sete dias entre a histórica posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os atos terroristas que macularam a democracia brasileira, no último domingo (8/1). As imagens representativas de uma sociedade inclusiva deram lugar a um retrato triste de barbárie. Tudo isso organizado e transmitido em tempo real por plataformas de redes sociais. Esse episódio consolidou a desinformação como um método de sobrevivência da extrema-direita no Brasil. 

O terceiro governo de Lula mostrou-se atento a esse tema, pois ainda no 1º de janeiro instituiu novas diretrizes para a Comunicação Social pública no Brasil. Estruturou a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (SECOM) para criar políticas públicas a fim de garantir o direto à comunicação e o enfrentamento à desinformação. No âmbito do sistema de justiça, a Advocacia Geral da União (AGU) anunciou a criação da Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia, outra aliada do governo para abordar a desinformação.

Na virada de 2022 para 2023, a desinformação passou de uma estratégia de atuação do governo para um mal a ser enfrentado, transversalmente, em uma perspectiva democrática. O governo do PT seguiu estratégias exitosas e criou, na SECOM, a Secretaria de Políticas Digitais, com os departamentos de “Promoção da Liberdade de Expressão” e de “Direitos na Rede e Educação Midiática”.

A educação midiática tem sido uma das principais frentes para desmobilizar o avanço da desinformação em diferentes contextos socioculturais. Ela implica em mudanças estruturais na produção e consumo de informação e em um novo pacto entre governos, grupos de mídia e sociedade. Esse tipo de educação refere-se a uma orientação crítica para o consumo e a produção de mídia em ambientes digitais e nos veículos tradicionais. 

A educação midiática não é uma responsabilização dos cidadãos no consumo de informações, mas busca um diálogo entre profissionais de comunicação (e de outras áreas) e comunidades sobre como acessar notícias e fontes confiáveis, como identificar notícias suspeitas, e acerca do uso responsável da informação. 

Ela deve ser pensada para múltiplas mídias, pois o Brasil não é um país plenamente conectado, e há uma concentração de mídias nas mãos de poucos. É expressivo o conjunto de veículos regionais controlados por políticos, inclusive parlamentares da base do governo. Isso mostra que os desafios dessa mobilização são a longo prazo e passam pela necessidade  de regulação das mídias no Brasil. 

Esse novo modelo de “comunicação” implica em um pacto dos grupos de mídia, dos gigantes aos veículos independentes, com a ética e a transparência na produção noticiosa. Tal proximidade com os cidadãos não será opcional, mas uma forma de sobrevivência nos contextos da desinformação. Atores como as agências de checagem de notícias e as checagens de instituições públicas (como Tribunal Superior Eleitoral) ganharam espaço nesse ecossistema, mas sozinhas não alcançaram o mesmo público das campanhas orquestradas de desinformação. 

As políticas públicas governamentais também devem atentar para um fortalecimento da diversidade midiática no Brasil, principalmente para equalizar o avanço das plataformas digitais enquanto fontes principais de informação. O esforço da regulação dessas plataformas privadas será necessário para garantir a soberania informacional brasileira. 

Por fim, entende-se que o enfrentamento à desinformação deve ser uma agenda pública de pesquisa fomentada em diferentes instâncias do conhecimento. A educação midiática pressupõe a confiança entre os atores e deve respeitar a cultura das diferentes partes do país. Isso demandará a atuação conjunta da nova SECOM, a sociedade civil, atores públicos e privados. A liderança dessa agenda pelo governo federal poderá dar uma unidade na busca da comunicação com um direito humano pleno em 2023.  

Pâmela Pinto – Professora do Programa de Pós-Graduação em Informação e Comunicação em Saúde – PPGICS/ICICT/FIOCRUZ

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