Jornal GGN – Michel Temer não se identifica nem com os governos pelos quais foi vice, nem com o atual. Critica ambos e quer ser reconhecido pela história pelos supostos aportes que fez ao país, dando início às reformas neoliberais, como a trabalhista, a da Previdência e as privatizações.
A entrevista dada a ele à BBC News, nesta sexta-feira (18) é divulgada ao mesmo tempo que as novas revelações do The Intercept Brasil com o El Pais, de que uma delação da Engevix que denunciava o repasse de R$ 1 milhão ao coronel Lima, amigo de Temer, foi ignorada pelo ex-PGR Rodrigo Janot para não prejudicar o andamento do impeachment contra Dilma Rousseff (leia aqui).
A BBC entrevistou Temer antes das divulgações do El Pais nesta sexta (18), mas o ex-mandatário chegou a dizer que conversou com Janot sobre as investigações da Lava Jato que afetavam políticos, como a do ex-deputado Eduardo Cunha.
NÃO HÁ OUTRO CAMINHO PARA CUNHA?
Janot teria avisado Temer que Cunha, à época presidente da Câmara dos Deputados, seria alvo de inquérito: “Eu me surpreendi um pouco com aquilo e ponderei a ele: mas Dr. Janot, o senhor é procurador-geral da República, ele é presidente da Câmara, isso vai criar um problema institucional extraordinário, não há um outro caminho?”, narrou Temer.
A versão do ex-PGR, em seu livro de memórias recém publicado, é que tanto o ex-presidente como Henrique Eduardo Alves teriam pedido a ele que não investigasse Cunha. Supostamente, ainda na versão de Janot, ele respondeu duramente e com palavrões.
Com base neste episódio é que a BBC questionou Michel Temer. Agora, sabe-se que além deste caso, Janot teria segurado a delação da Engevix que afetaria Temer e engavetado nas vésperas de Dilma Rousseff ser afastada do poder pelo impeachment na Câmara, em abril de 2016.
Ainda, o ex-vice que assumiu o Executivo após a queda de Dilma tergiversou ao ser questionado sobre ter dito que a ex-presidente foi alvo de um “golpe”, fala que havia sido feita durante entrevista recente ao Roda Viva. Disse que falar que “não participou do golpe” significa que “não houve golpe” e que a menção era para negar que ele “tramou” ou “trabalhou” para o impeachment.
ELOGIA BOLSONARO
Ao comentar sobre o atual governo de Jair Bolsonaro, entrou em contradição, primeiramente mantendo a avaliação positiva sobre a gestão dele ter “continuado” a sua. “O que ele providenciou foi dar sequência a tudo aquilo que fizemos ao longo do meu governo. Nesse sentido, acho que o governo vai bem”, elogiou.
CRITICA BOLSONARO
Depois, ao responder sobre as polêmicas de Bolsonaro sobre a Amazônia e a nível internacional com outros líderes políticos, Temer disse que Bolsonaro tem “um estilo mais de confronto” e que “claro que isso não é bom para a imagem do país”.
“Ele que criou essa crise, então?”, questionou a BBC. “É a forma de falar, a forma de manifestar, talvez tenha sido isso. E criou um problema internacional. Porque eu vejo, estamos aqui no Reino Unido, eu vejo a preocupação com as mudanças climáticas, que permeia a mentalidade de todos os países europeus. É uma coisa grave. Precisamos tomar muito cuidado. Eu tomei muito cuidado com isso”, afirmou.
ACUSA JANOT: Grampo da JBS impediu aprovar reforma
Em outro trecho, a BBC questiona o fato de Michel Temer querer o crédito das reformas, sendo que em seu governo elas foram barradas e não avançaram no Congresso. Michel Temer acusou o ex-PGR Rodrigo Janot de ter atrapalhado a aprovação da reforma durante o seu governo, com o vazamento do grampo da JBS:
“Por que não consegui aprovar? Foi precisamente em face daquele gesto do procurador-geral que, percebendo que eu ia colocar a reforma da Previdência entre doze e quinze dias, já com 326 votos contados (são necessários 308 votos na Câmara para aprovar PEC), ele soltou aquela gravação. Entre tantas razões, uma delas foi, certa e seguramente, impedir a reforma da Previdência. Causou um mal para o país”, acusou.
Mas insistiu de que o crédito dos supostos “avanços econômicos” de Bolsonaro é dele: “Durante dois anos, [meu governo] batalhou pela reforma da Previdência. Enfrentamos as maiores discussões. Praticamente dois anos. Fui eu que lancei a reforma da Previdência no nosso país, como lancei também a tese da simplificação tributária.”
MACHISMO
Ao ser questionado se, após ter sido preso duas vezes alvo de inquéritos, ele tinha “medo de ser preso de novo”, Michel Temer beirou ao machismo e, apesar de a pergunta ter sido objetiva e realista, respondeu: “eu só não tomo a pergunta como ofensiva porque veio de uma gentil senhorita, com toda a franqueza”.
“Porque eu não tenho a menor preocupação sobre o enfoque jurídico. A preocupação que nós temos é com as arbitrariedades de natureza jurídica cometidas ao longo do tempo no país, especialmente no meu caso”, continuou, respondendo à pergunta de que o receio só existe se forem cometidas “arbitrariedades”, em referência a ele ser novamente preso.
A repórter que fez a pergunta se sentiu incomodada com o comentário inicial de Temer, esclarecendo: “O senhor não precisa tomar como uma ofensa porque eu estou aqui no meu papel de fazer as perguntas que eu acho que muita gente gostaria de fazer para o senhor.”
“Eu, aliás, ao responder-lhe acredito que lhe fiz um elogio, que vinha de uma gentil senhorita e delicada na pergunta”, continuou Michel Temer, ainda no tom machista.
Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.
Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.