O colapso do sistema político e os próximos passos do golpe, por Jeferson Miola

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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O colapso do sistema político e os próximos passos do golpe

por Jeferson Miola

O sistema político está colapsado; sua implosão é parte da estratégia da força-tarefa da Lava Jato. A política não está sendo dirigida pela própria política, no sentido abrangente do termo, porque não está sendo deliberada no âmbito da democracia, da eleição e da representação.

A política está sendo decidida pelos sem-voto; por aqueles não-investidos de mandato popular ou de representação partidária. A democracia representativa, já debilitada pela corrupção e pela ilegitimidade de um Congresso apodrecido, está com seu funcionamento perigosamente mais comprometido pelo hiper-ativismo jurídico na política.

Não se trata somente da judicialização da política; que é, em si mesmo, uma grave anomalia democrática; mas da preponderância nociva das corporações jurídicas sobre a política. Entenda-se por corporações jurídicasesferas do Judiciário, o Ministério Público e a Polícia Federal [a polícia judiciária federal].

Os expoentes destas corporações altamente partidarizadas – Moro, Dalagnoll, Janot, Gilmar, juízes, procuradores e delegados da PF – todos com marcado viés ideológico, afrontam o Legislativo e disputam com os políticos, parlamentares e governantes, a primazia na arena política.

A mobilização fanático-religiosa em defesa das dez medidas de combate à corrupção e o combate histérico ao projeto de lei que pune o crime de abuso de autoridade, são exemplos das investidas recentes das corporações jurídicas contra o sistema político. A convivência íntima, normalmente dominical, do juiz Gilmar Mendes com seu réu Michel Temer no Palácio do Jaburu, é a expressão escancarada da dominância do judicial sobre o político – Gilmar saiu de todos os encontros com mais poder e maior influência na arena política.

O ativismo político de juízes, procuradores e delegados da PF é proibido pela Constituição e pelas Leis do Brasil. O poder político exercido pelos atores das corporações jurídicas não se origina de mandato constitucional; mas é um poder usurpado, originado na intimidação e no medo; um poder fundado na autoridade ameaçadora da condenação e do castigo que é intrínseca à função judicial.

A associação das corporações jurídicas com a Rede Globo instaurou esta verdadeira ditadura jurídico-midiática que confere legitimidade ao golpe de Estado e ao regime de exceção com o sofisma do “funcionamento normal das instituições” [sic].

A Lava Jato, quando surgiu, aparentou ser uma Operação determinada a atacar a raiz da corrupção do sistema. Com o passar do tempo, todavia, ficou evidente a manipulação do seu escopo. Hoje, não restam dúvidas de que a Operação é uma estratégia de poder para viabilizar um projeto anti-popular e anti-nacional que coesiona os interesses dos grandes capitais nacionais e estrangeiros.

A Lava Jato, inspirada na Operação Mãos Limpas da Itália dos anos 1990, está em busca do seu Sílvio Berlusconi; procura o outsider, o “gestor não-político, puro e limpo” para governar o Brasil depois da devastação moralista que promove. As apostas para o posto, por enquanto, se concentram no prefeito paulistano [e proto-fascista] João Dória.

A popularidade do ex-presidente Lula atrapalha o plano. Lula lidera com folga todas as pesquisas eleitorais, vence em qualquer cenário. Ele é, dentro do sistema político, além de eleitoralmente viável, o único com estatura política e moral para comandar a reconstrução econômico-social do Brasil e a restauração democrática do país.

Esse é o impasse do golpe: ou cancela a eleição presidencial de 2018 para impedir a vitória do Lula; ou, então, consegue impedir a candidatura Lula e, neste caso, mantém a eleição. A segunda hipótese parece ser a escolhida pela classe dominante – que, para lográ-la, tem de atender dois requisitos.

O primeiro requisito é a condenação do Lula na Lava Jato nos próximos meses. Ajuda decisiva para isso veio da família Odebrecht, que mudou radicalmente sua estratégia de defesa e trocou o discurso dos últimos três anos, de total inocência e isenção do Lula, pelo da acusação e incriminação do ex-presidente que mais contribuiu para a expansão do conglomerado.

A inflexão judicial da Odebrecht, neste sentido, pode ser sinal de um grande consenso pelo alto; de um pacto para a continuidade e o aprofundamento do golpe e das medidas anti-populares e anti-nacionais.

Neste pacto por cima, a Lava Jato dobrou a Odebrecht. As corporações jurídicas eliminaram um competidor de peso; um competidor que age como um verdadeiro Estado paralelo do capital dentro do Estado de Direito.

O segundo requisito é deixar o moribundo Temer no cargo até o final do mandato, sobrevivendo com o auxílio de aparelhos e sendo manietado como um títere. Qual a razão, do ponto de vista racional, qual a justificativa para se preservar a cleptocracia com 60% dos ministros implicados em corrupção, além do próprio chefe do bando, e responsável pela maior recessão da história do país? Talvez porque manter Temer até o fim seja preferível a ter de alterar a rota do golpe sem deter o controle total da manobra.

De acordo com a regra vigente, se Temer for afastado, o Congresso escolhe o sucessor para terminar o mandato. A eleição indireta, por parlamentares corruptos e ilegítimos, é indesejável, porque pode aprofundar a crise e radicalizar o conflito social.

Por outro lado, uma emenda à Constituição para antecipar a eleição direta não poderia ser aprovada sem que, antes, Lula fosse condenado pelo Moro e, assim, ficasse impedido de disputar o pleito. A condenação do Lula, por outro lado, poderá significar o fim do governo Temer, que então deixará de ser um estorvo para a eleição antecipada para escolher, entre os sem-carimbo da Lava Jato na testa, o próximo cônsul dos EUA no Brasil.

Por detrás do noticiário dos últimos dias, que entorpece com os vídeos das delações da Odebrecht, se escondem algumas pistas sobre os próximos passos do golpe. A condenação do Lula e a manutenção do Temer são duas variáveis relevantes da estratégia dos sem-voto.

Esses são tempos difíceis e complexos; são tempos de caos e de perigosa confusão institucional. Quando a política cede lugar a quem não tem legitimidade, a democracia fica ameaçada de morte.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

10 Comentários

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  1. Mídia Golpista

    Pode se falar tudo, porém, uma coisa é insofismável: Com a essa mídia que aí está e com a legislação que a suporta, jamais seremos um país com democracia verdadeira. Olhando os jornais e blogs de hoje ficamos sabemos o por que eles passaram de todos os limites em nome da liberdade de imprensa. Essea turma vende a própria alma em benefício de seus interesses.

  2. O Brasil está dominado por

    O Brasil está dominado por bandidos de altíssima periculosidade, que o diga o ex estorvo Teori. Qualquer análise sem levarmos isso em consideração, só prá começar já é uma não aceitação da duríssima ditadura em vigor sem vestígio algum de democracia. Mas, é bom lembrar que, nas mãos dos bandidos que dominaram o Brasil, nenhum regime funciona! Nem ditadura, nem democracia, nem comunismo, nem socialismo e nem o pôrra nenhuma! Os piores golpistas são os que estão iludindo os 55 milhões de brasileiros que foram saqueados em seus votos, com conversinhas moles que servem de fumaça para esconder o que realmente está acontecendo, inclusive propondo acordos com golpistas mantendo-os longe da cadeia, e estamos falando de demotucanos peemedebistas e mais alguns menores, que representam milhões de meliantes que de políticos não tem absolutamente nada, são apenas criminosos do colarinho branco.

  3. o nó górdio

    Está mais do que na hora de pararmos com a autoilusão. O Judiciário veio para o centro da Política trazido, em primeiro e especial momento, pelos partidos e seus políticos no Mensalão. Os mesmos, capitaneados pelo mesmo PSDB  que capitaneou o golpe contra DIlma. Se acabou gostando e ampliando espaço foi porque, não só lhe incentivaran a abrir os braços, mas pelo vácuo de poder que foi criado no País.

    É cristalino ao observador mediano que a antiga oposição, com PSDB sempre à frente, desde que o êxito do governo Lula tirou-lhes o discurso foi sendo empurrada para uma posição onde radicalizou o quanto pior melhor. Não o fez por ideologia ou mesmo por conta de ser pau-mandado de A ou de B e ter como missão implantar o neoliberalismo, se submeter ao irmão do norte ou qualquer outra dessas hipóteses corriqueiras. Isso ocorreu porque a ex-oposição e atual governo é um balaio de gatos e não tem como construir um programa, um plano próprio e um discurso coerente. Logo, brigou e conquistou o poder sem a menor idéia do que fazer depois e, assim, resta-lhe exercer o poder pelo poder. Portanto, está no colo de quem está por falta de condições de se acomodar de outra forma e fará de tudo – destaque-se que fará de tudo mesmo –  para ali ficar. Mesmo que isso signifique implantar um modelo que não foi submetido ao voto  e que, se o fosse, não elegeria ninguém.

    Por outro lado, a atual oposição não demonstra força para mudar o quadro frente à tal situação. Não há como mudá-lo sem mobilização popular. A greve geral marcada para o próximo dia 28 será o termômetro dessa capacidade de mobilização e de enfrentamento. Se falhar mostrará que há espaço para tudo que aí está  se manter e se ampliar. O calendário é curto, pouco mais de uma semana e ainda não dá para sentir nas pessoas a antecipação que seria esperada. Aparentemente, ou não há militância disponível ou falta a competência para mobilizá-la.

    De um povo que foi roubado de seu voto, que está sendo roubado de sua representatividade, de seus direitos trabalhistas, de sua aposentadoria, até do seu pão-de-cada-dia e que assiste a tudo inerte, roubar-lhe o que resta de cidanania é a progressão natural.

    Irão se gastar laudas e laudas, terabytes e terabytes com artigos de crítica e denúncia e com seus respectivos comentários, sem qualquer efeito prático. A única esperança é a pressão popular, o povo nas ruas e a alternativa é conhecida. Teremos que tolerar mais um período de trevas até que a insatisfação geral alcance o insuportável, torne-se insustentável e, então, elegeremos outro poste?

    O nó górdio está a nossa frente e a espada nas nossas mãos, dia 28 saberemos se vamos usá-la ou não.

     

     

  4. Prezado Jeferson, faltou o

    Prezado Jeferson, faltou o nome do supremo nesse seu texto. Não podemos nos esquecer, nem daqui há 200 anos, que 80% da culpa de toda a confusão, de todo o quadro grave de recessão e desemprego, da volta da fome e da miséria; da falta de remédios e de precarização grave dos serviços públicos e do tal de stf (escrevo propositalmente com letra pequena). Eles que estão permitindo todo tipo de usurpação à nossa Constituição.

  5. Estava lendo agora o

    Estava lendo agora o Tijolaço. O Brito falou algo que é a mais pura verdade. A lava a jato virou uma instituição a parte. Não é mais uma operação de uma força tarefa, uma investigação compartilhada por PF, MP e juiz. O primeiro não mais responde ao ministério da justiça, está acime dele. O segundo é uma casta inquestionável e o último se impõe ao STF e ignora a constituiçao.

    A lava a jato em si, virou um poder, o quinto poder, acoplado ao quarto. E o Miola destectou bem, foi a forma que o capital financeiro e o imperialismo, tendo a mídia como voz, encontrou de institucionalizar seu poder. Agora não apenas influencia, age objetivamente e diretamente sobre a sociedade. Manda prender e manda soltar, literalmente

  6. AI-5

    O golpe para se sustentar em breve editará o seu AI-5.

    Era previsto, quando do afastamento da Presidenta eleita, um endurecimento e uma erosão das garantias democráticas. Não há condições de sustentação de um regime ilegítimo sem repressão.

    Retornaremos a 1968.

    Nesta velocidade, em breve chegaremos a 1930, 1889, 1888, 1789. Paro por aí.

    Pois quem sabe, ao chegarmos em 1789, a Bastilha do Jardim Botânico venha finalmente a ser tomada?

  7. O lado cômico disso é que

    O lado cômico disso é que dependemos da justiça para colocar freios na própria “justiça”. Se os franceses (ou cubanos, ou russos, ou sei lá que povo) fossem ficar esperando pela justiça nacional de sua época, teriam morrido de velhice sem ver nada mudar. Esperar alguma coisa do povo? Esquece! “Plim! Plim!” comanda seu exército de zumbis. Já, já vão aparecer grupos de pessoas dispostos a resolver a questão na base da porrada (quem sabe, faz a hora, não espera acontecer). É isto que os senhores do mundo ocidental, os ianques, desejam para ter um pretexto para realizar uma “intervenção humanitária” por estas bandas, claro, assim que o nosso “governo” pedir ajuda. Será mais fácil do que tem sido no oriente médio e região.

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